A Dama do Coração Partido escrita por Claen


Capítulo 2
A Dama Relutante




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Era uma tarde cinzenta e fria, não diferente de tantas outras tardes londrinas, e há semanas não surgia um caso que chamasse a atenção de Sherlock Holmes. Todo esse ostracismo levava muito rapidamente meu colega hiperativo ao desespero.

— Um caso Watson! Preciso de um caso! – esbravejava Holmes erguendo seu violino e o arco quase que em súplica, enquanto olhava pela janela, a rua por onde pouquíssimas pessoas se aventuravam a passear debaixo da garoa fina que caía.

— Tenha paciência Holmes, sinto que em breve seremos visitados por alguém que trará um caso interessante. – respondi enquanto baixava meu jornal calmamente e pegava uma xícara de chá da mesinha ao lado.

— Você sente? Não me diga que agora você desenvolveu o “dom da premonição”, meu caro Watson? – indagou sarcasticamente.

— Não Holmes, essa foi apenas uma maneira de falar. Quero dizer, que acredito que em breve algo surgirá. Nós nunca ficamos tanto tempo sem clientes com casos interessantes, já que os clientes com casos comuns você despacha praticamente todos os dias.

Enquanto eu ainda falava, Holmes deixou de me dar atenção e voltou seu olhar para a janela e reiniciou a música que estava tocando poucos minutos antes, até que parou subitamente.

— Ora, ora! – exclamou ele – Parece que sua previsão se concretizou Watson! Uma dama se aproxima de nossa porta! Espere... acho que mudou de ideia, já deu as costas. Que pena... Ah, ela está voltando, agora ela vai bater! Não... parece que vai embora outra vez. Espere!

— Por Deus, homem! Pare com a narrativa! – Levantei impaciente e me juntei a Holmes na janela para ver se ele não estava fazendo troça de mim, mas comprovei que realmente havia uma mulher demonstrando bastante relutância em frente à porta.

Antes que a dama finalmente decidisse se bateria ou iria embora, Holmes largou o violino e o arco sobre a poltrona e desceu pelas escadas como um raio rumo à porta, abrindo-a abruptamente. Segui rapidamente a mesma direção e do alto da escada pude ver a expressão de surpresa da moça ao dar de cara com meu colega que ainda vestia o pijama por baixo do robe cor de vinho, apesar de o relógio já estar marcando duas e meia da tarde.

— Sherlock Holmes, ao seu dispor. – cumprimentou-a estendendo a mão.

A pobre moça arregalou os olhos incrivelmente azuis pela surpresa causada por Sherlock e permaneceu imóvel por alguns segundos, até que finalmente pegou a mão estendida de meu colega e cumprimentou-o.

— Emma Edwards, muito prazer.

— Muito prazer. Agora que já fomos devidamente apresentados, a senhora gostaria de entrar? Como o meu estimado colega, o Doutor John Watson que está bem ali no alto da escada nos observando, – e apontou para mim – diria: ficar na garoa não faz bem a saúde.

Eu desci até a porta e fui ajudar Holmes a convencer a moça a entrar.

— É verdade senhorita...

— Senhora, Watson! Não seja deselegante, homem!

— Perdão, senhora. Vamos entrar e tomar um chá quente para nos aquecermos.

— Como o senhor tem tanta certeza de que sou senhora e não senhorita? – perguntou a moça, já curiosa.

— A senhora veio até a porta de um detetive. Faz parte da minha profissão saber coisas. E digo mais, digo que a senhora já foi casada, mas agora não é mais. Apesar de ainda ser bastante jovem, me atrevo a dizer que é viúva e que esse é um acontecimento bastante recente. Estou certo?

— Sim, mas como é que... – tentou argumentar incrédula. Era costume de Holmes dizer coisas do tipo para conquistar seus clientes com mais facilidade. Já tinha presenciado tais demonstrações de deduções incontáveis vezes que nem me surpreendia mais.

— Isso é muito simples, eu percebi a marca em seu dedo anelar, que me mostra que já houve uma aliança nele por algum tempo. – Apenas Holmes teria conseguido ver uma marca tão imperceptível como aquela. Confesso que olhei e não vi nada.

—Entendo... – disse a moça olhando tristemente para o dedo agora vazio.

— Mas vamos entrar, está muito frio.

A moça finalmente cedeu e entrou. Assim que subíamos as escadas de volta para a sala, Holmes gritou pela Senhora Hudson.

— Sra. Hudson! Traga mais chá, pois temos uma convidada que precisa se aquecer. Ah! Traga de camomila, porque ela me parece precisar se acalmar também!

— Claro querido, mas lembre-se de que eu não sou sua empregada! – gritou ela educadamente de volta.

Em poucos instantes nós já estávamos na sala e pela primeira vez, Holmes moveu a cadeira na qual nossos visitantes costumavam se sentar e a colocou perto da lareira para que a moça pudesse se aquecer. Ela tremia bastante, mas algo me dizia que não era apenas pelo frio, e sim por medo, mas medo de quê?

— Sente-se aqui senhora Edwards e se acalme, porque vejo que está muito nervosa.

Logo após a moça se sentar, a Sra. Hudson apareceu trazendo um bule de chá e serviu nossa misteriosa possível cliente.

— Aqui querida. Tome só um gole e verá como vai te fazer bem. – disse a senhoria com um sorriso amigável no rosto, que ajudou a acalmar a moça.

Minutos depois ela já parecia estar em condições de contar o que a tinha trazido até a nossa porta. Agora que estava mais tranquila e segura, até mesmo suas feições tinham mudado e pudemos observa-la melhor. A dama era muito bonita. Trazia parte dos longos cabelos negros ondulados presos com um discreto prendedor, aparentemente de prata com algumas pequenas gemas incrustadas. O que poderia indicar ser uma mulher de algumas posses. Tinha seus vinte e poucos anos, era bastante alta, cerca de 1,75m, magra trajava um vestido verde escuro simples, mas bonito, que agora estava molhado pela garoa assim como seus cabelos. Não entendi por que alguém sairia de casa naquele clima horrível sem um guarda-chuva, ou sequer uma capa, mas ela saiu. Apesar de toda a beleza, seus olhos traziam medo e preocupação.

 Holmes e eu viramos nossas poltronas na direção da lareira para que pudéssemos finalmente conversar com a moça.


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