Detetive Potiguar escrita por Helen


Capítulo 4
Capítulo 4 — Satisfação.




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No dia seguinte, eu acordei radiante. Ia dar uma notícia triste, então pelo menos eu deveria estar arrumado. Vesti uma camisa, uma calça jeans e calcei os tênis de corrida que eu usava para ficar parado. Eu até pensei em colocar gel no cabelo, mas eu não sabia se ele tinha passado da validade. Deixei meu cabelo preto e liso do mesmo jeito de sempre, e até lavei minha cara amarela. P eguei meu carrinho lindo, companheiro de todas as horas, e fui. Estacionei na ladeira, já que não sou obrigado a pagar estacionamento de shopping metido. Tive que fazer um esforço para subir, mas cheguei enfim na praça de alimentação.

Mixele já havia chegado, e estava mexendo no celular. Eu me aproximei, disse "boa tarde" (porque educação é importante) e sentei. A mulher estava com uma blusa com uma imagem de uma onça desbotada, que parecia ter sido feita no paint. Ignorei o mau gosto e me preparei para dar a notícia: – Então, dona Mixele...

— Ele está me traindo, né?

— Sim, está. Eu gravei o momento em que...

— Eu sabia. – ela me interrompeu. – Desculpa, senhor detetive, mas pode parar por aí. Eu não preciso ouvir mais nada.

— Mas eu...

— Já chega. Eu vou abrir o processo de divórcio amanhã. Ai ai, Deus castigue aquele cafajeste. Sabe o que ele me fez passar?!

— Não imagino...

— Pois aquele desgraçado...

E lá se passaram mais duas horas em que dona Mixele falou sobre o primeiro encontro deles, os flertes mal interpretados, a insensibilidade de Linaldo para com datas comemorativas, a mãe de Linaldo ser uma "vagabunda intrometida", Linaldo isso, Linaldo aquilo. Talvez aquela mulher precisasse de um psicólogo, e não de um detetive particular.

Quando ela terminou seu relato, disse que ia me pagar ali mesmo. Ela puxou o celular e abriu o aplicativo do banco. No entanto, ela começou a reclamar com o aparelho, o que me disse que ela nunca tinha feito uma transferência por telefone antes. Eu ofereci ajuda, que ela recusou inicialmente, porém desistiu e me entregou o aparelho.

Mesmo eu, detetive particular, tinha dificuldades em mexer no aplicativo. Eram tantos botões, abas, termos bancários malucos e setas aleatórias que eu demorei quase tanto quanto a Mixele para descobrir como fazer transferências. Quando enfim descobri, tive a alegria de mandar o dinheiro da conta dela para a minha. Conferi no meu próprio celular os dígitos se multiplicarem. "Ah, que satisfação." pensei comigo mesmo.

— Obrigada, senhor detetive.

Mais satisfação do que o dinheiro foi ouvir essa frase. Claro que metade dela não viria se eu não tivesse recebido o dinheiro, mas mesmo assim eu estava feliz em ajudar uma pessoa, de verdade.

Com um sorriso no rosto, vi Mixele saindo apressada da praça de alimentação. Mesmo o grito birrento de uma criança e o burburinho das pessoas não me tiraram do clima. Logo eu me levantei, e caminhei com as mãos nos bolsos para fora do shopping. Eu estava pleno.

Sentei no meu carro, feliz, liguei o rádio na MIX e comecei a ouvir o reggaeton como se fosse uma trilha sonora de filmes Noir. Mesmo assim era meio difícil associar as duas coisas.

Tirei do freio de mão e resolvi passar no supermercado. Entrei no estacionamento (gratuito, como todo o estacionamento deveria ser) e parei o carro. Entrei naquele lugar enorme, passei por todas as seções e levei uma maçã. Uma única maçã.

Passei minha compra no caixa e fiquei sentado em um dos banquinhos, namorando um estande de óculos escuros que ficava ali perto. Um dia eu ainda iria comprar um negócio desses. Imagina quão estiloso eu vou parecer com óculos escuros num carro quadrado no pôr do sol de Ponta Negra? Rapaz, ninguém ia me segurar.

Ao terminar a maçã, voltei ao carro. Pelo céu, deviam ser umas quatro e meia. Olhei meu celular antes de partir e nada. Que novidade!

Voltei à minha humilde residência e fiquei assistindo TV. A novela que eu tinha começado a ver estava em seus últimos capítulos. Eu não entendia nada do que estava acontecendo, mas eu gostei. Parecia um pouco com a minha vida. Quando o programa terminou, eu desliguei e fiquei pensando na vida, deitado no sofá. Talvez um dia eu pegasse um caso grande o suficiente para me tornar o melhor detetive que o Brasil já ouviu falar. Mas, pelo menos por enquanto, eu continuaria sendo simplesmente um detetive potiguar.


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