As Serpentes do Som escrita por Goth-Lady


Capítulo 2
Cap.2 As Serpentes Verde e Rosa




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Kyandi era conhecida como cidade da gula. Possuía ruas largas para quatro carroças transitarem lado a lado, as casas eram de arquitetura germânica podendo ter dois, três ou até quatro andares, sendo que normalmente a parte de baixo era usada para comércio e a de cima como moradia. A maioria dos habitantes já tinha engordado há tempos.

Não era preciso olhar as fumaças nas chaminés para saber que algo estava assando, o cheiro era constante. Kyandi nada mais era que uma vila feita de padarias, docerias, cafés e confeitarias e tudo que provinha de lá tinha qualidade, afinal, era preciso conquistar a fidelidade do cliente se quisesse prosperar em Kyandi ou outro estabelecimento o faria.

Para se chegar à Kyandi era preciso passar pelas Hofu Farms. As Hofu Farms nada mais eram do que fazendas grandes, médias ou pequenas de tudo quanto era espécie de produção. Seus produtos abasteciam tanto Kyandi como o resto do País do Mistério, mas era em Kyandi que se transformavam em verdadeiras guloseimas e a aldeia as vendia de volta para as fazendas a preços baixos.

Em uma dessas fazendas, que produzia farinha, estava Trystane. Trystane era uma jovem de longos cabelos verdes presos em uma trança que ficava do lado direito passando sobre o ombro juntamente com uma mecha solta que formava uma franja, o comprimento chegava até o quadril. Seus olhos também eram verdes. Ela usava uma saia preta em camadas, regata branca, casaco de malha verde e sandálias de salto verdes com uma flor laranja cada uma. Um anel em forma de serpente feito de esmeralda enfeitava o dedo e um sapo a acompanhava.

— Quantos sacos vai levar?

— Sete. Essa época vai ser uma loucura.

— É o Festival da Lua. Essas épocas comemorativas são muito boas para os negócios.

E muito estressantes. — Pensou Trystane.

Épocas festivas eram um estresse que Trystane conhecia bem. Os ingredientes encareciam e eram vendidos aos montes, as demandas aumentavam também, pois ninguém queria ficar sem os seus bolinhos de lua, seus doces e biscoitos da lua. Seria uma maratona como tinha sido o Festival do Sol ou até pior.

Trystane pagou ao fazendeiro, carregou a carroça com os sacos e subiu com seu sapo. Ela conduziu a égua cinzenta pelo caminho.

— Mais uma época conturbada. – Disse o sapo.

— Arianne que o diga, Flint. Ela está tendo muito trabalho na cozinha e o familiar dela não ajuda muito.

— O que esperar de um porco? – Perguntou Flint, o sapo. – Nós familiares servimos para ajudar, mas um porco continua sendo um porco.

Familiares eram espíritos invocados por magia que se materializavam em formas de animais e serviam seus donos como servos domésticos, ajudantes, espiões ou até companhias. Eram muito comuns no País do Mistério, principalmente para aqueles que frequentaram Holy Chie ou moravam em Mahou.

Pouco tempo depois, Trystane chegou ao seu destino. Era uma casa de arquitetura germânica modesta com as paredes pintadas de cor de menta e detalhes em um rosa delicado. Colocou a carroça nos fundos, onde ficavam o estábulo e a horta bem variada que plantara. Além da horta ela plantara um jardim com as mais variadas plantas. Os moradores de Kyandi sabiam sobre as habilidades botânicas de Trystane, tanto que ela podia trabalhar em qualquer fazenda das Hofu Farms, mas o comércio era sempre melhor. Trystane não tinha um dedo verde, tinha dez dedos verdes, tanto que essa era uma das razões de ser conhecida como A Serpente Verde. A outra razão para esse apelido eram seu cabelo e seus olhos verdes.

Era um apelido comum entre ela e suas irmãs. Seu pai podia ser conhecido pelo nome que fosse pelo mundo, mas no País do Mistério ele era chamado pelos moradores de A Víbora que Anda ou a Serpente Andante. Por conta disso, suas filhas acabaram sendo conhecidas como serpentes também, e como ele tinha fundado uma vila em algum fim de mundo conhecida como Otogakure, elas passaram a ser chamadas de Serpentes do Som, embora nenhuma delas tenha sequer visto a tal vila.

— Arianne, cheguei! – Anunciou entrando na cozinha pela porta dos fundos. – E trouxe a farinha.

— Obrigada, Trys. Só você para me salvar. Coloquei Oinky para dar conta do balcão enquanto estava fora.

Arianne era irmã gêmea de Trystane. As duas eram iguais na aparência e usavam o mesmo penteado e corte de cabelo e até mesmo as mesmas roupas. A diferença era que a cor do cabelo e dos olhos de Arianne era rosa fúcsia. Suas roupas eram idênticas às de Trystane, porém o casaco que usava não era verde e sim rosa, assim como as sandálias de salto, porém a flor não era laranja e sim roxa. Um anel de serpente de rodocrosita se fazia presente em seu dedo. Arianne tinha recebido o apelido de A Serpente Rosa, não só por suas cores, mas por ser confeiteira e rosa era uma cor muito ligada aos doces. Arianne cozinhava muito bem, talvez até demais.

— Já vou atender. Venha Flint.

— Ah, aproveite e leve essa fornada de biscoitos da lua. Tem outra no forno. Enquanto espero, adianto algumas encomendas.

Era possível ver o tamanho da demanda por encomendas pela quantidade de papéis no mural exclusivo para encomendas. Trystane e Arianne odiavam vésperas de feriados, o trabalho dobrava, as despesas também, mas os lucros também. Um dia antes do feriado, elas fechavam a confeitaria e iam para Chugo encontrar as irmãs e participarem das festas.

Ao passar para o balcão, ela viu o familiar porco atendendo aos clientes e reclamando que não podia comer nada. Não que familiares precisassem comer, pois não precisavam, mas Oinky era guloso e Arianne cozinhava bem, a receita certa para o desastre. Trystane o dispensou do cargo, reabasteceu o estoque e colocou os familiares para limparem as mesas enquanto ela cuidava dos clientes.

O estabelecimento era muito simples, tinha algumas mesas do lado de dentro e outras duas do lado de fora, um balcão diverso e vários doces. De dia era usado como confeitaria e à noite era usado como um bar com vitaminas e drinks com ou sem álcool. Nos fundos, na parte da cozinha, tinha uma escada que levava para o andar de cima onde ficava outra cozinha, uma pequena sala, um banheiro e dois quartos onde as gêmeas verde e rosa moravam.

Arianne saiu da cozinha com mais guloseimas e as repôs em seus devidos lugares, mas antes de voltar para lá, se virou para a irmã.

— Trys, pode entregar algumas coisas? Já tenho algumas entregas preparadas para ir.

— Tudo bem. Flint pode cuidar do balcão.

As duas cuidavam de tudo sozinhas, tanto da confeitaria quanto do serviço de entregas e à noite era Trystane quem assumia os serviços e preparava as bebidas enquanto Arianne cuidava do caixa e dos afazeres. Ela deixou seu familiar cuidando do balcão e do caixa enquanto foi para os fundos com a irmã e começou a carregar a carroça. Quando terminou de carregar tudo, inclusive as novas encomendas prontas que tinham acabado de ficar prontas, Trystane partiu.

As ruas de Kyandi estavam lotadas de pessoas. Não eram apenas parentes dos moradores ou pessoas das Hofu Farms e seus parentes, milhares de estrangeiros iam à aldeia todos os anos em busca de guloseimas e quando chegavam os feriados, esse número dobrava ou triplicava. Ao passar pelas ruas para fazer suas entregas, Trystane pôde ver que não era a única naquele serviço, muitas carroças andavam pelas ruas enquanto a maioria dos estabelecimentos estava lotada de gente em busca dos doces tradicionais do festival.

Por que faziam entregas de doces na famosa aldeia dos doces? A aldeia não era tão doce assim, haviam lugares especializados apenas em pão, outros em salgados, outros em sucos e vitaminas e outros em sorvetes, além das Hofu Farms. Algumas encomendas podiam levar à aldeia vizinha, Brute Diamond.

Brute Diamond, a aldeia vizinha, era um shopping em forma de aldeia. Sua arquitetura era estranha, pois a parte de baixo dos edifícios eram lojas com vitrines e mostruários e a parte de cima se assemelhavam a chalés com janelas de madeira e telhados triangulares, podendo chegar a quatro andares. Lá se vendia de tudo, desde matéria bruta como madeira, coisas de madeira ainda crua, metal, vidro, couro e tecidos à matérias manufaturadas como roupas, sapatos, joias, objetos de decoração, artesanato, portas e portões. A comida que era vendida na cidade, na verdade era revendida de Kyandi à população. Como Brute Diamond ficava só 10 km ao norte das Hofu Farms, Trystane agradeceu mentalmente por não precisar da roupa de viagem.

Havia um costume no País do Mistério que consistia em ter roupas próprias para viagens. Tais roupas não só serviam para deixar os viajantes em pequenos grupos mais preparados para o caso de encontrar foras da lei como também impediam que a sujeira da viagem ficasse nas roupas casuais.

Trystane percorreu a cidade inteira, viajou para Brute Diamond e por fim, retornou à confeitaria para pegar mais entregas para reiniciar toda a tarefa. Ao final do dia, os papéis se inverteram. Arianne assumiu o caixa enquanto a irmã preparava as bebidas. O estabelecimento estava cheio novamente, mas dessa vez as pessoas pediam vitaminas ou bebidas alcóolicas. Também tinha a opção de bebidas sem álcool, não eram vitaminas e também não eram suco, água ou refrigerante.

Quando fecharam o estabelecimento, as gêmeas estavam esgotadas. Foi um verdadeiro alívio virar a placa para indicar que o estabelecimento estava fechado. Agora ambas estavam na parte de cima, a parte em que moravam. Tal parte consistia em uma sala de estar, um banheiro e dois quartos, sendo um verde e um rosa.

— Pensei que nunca mais iria sair da cozinha. – Disse Arianne se jogando no sofá.

— E eu que nunca iria parar de trabalhar. Ainda faltam alguns dias para o Festival da Lua.

— Nem me fale. Por que todo mundo deixa para fazer as coisas na última hora?

— Eu também gostaria de saber. Vamos dormir, amanhã será um dia cheio também.

— Só espero que o fluxo não aumente tanto como no ano passado. Ou vamos ter que contratar funcionários.

— Sabe que eu não gosto dessa ideia. Iria fazer a qualidade despencar.

— Contrate pelo menos um caixa, Trys. Assim Flint e Oinky não precisariam assumir o caixa enquanto você estivesse fora e poderiam se concentrar em servir as mesas ou na limpeza.

— Eu vou pensar sobre isso.

— Trys...

— Eu vou mesmo. Um caixa seria de grande ajuda, talvez contrate um ou dois garçons, os familiares não vão aguentar servir mesas para sempre.

— Bem pensado. Boa noite.

— Boa noite, Ari.


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