Persistente escrita por Ginger Bones


Capítulo 2
Não era a vida que eu queria.




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TOBIAS EATON

Há seis meses, eu já não sabia o que era ser feliz.

Todos as noites eu sonhava com ela, quando eu era feliz e não sabia. Por muito tempo eu havia sofrido sozinho com meu passado na Abnegação. Meu pai abusivo, a minha mãe me abandonando com aquele monstro para fugir sozinha, me deixando à própria sorte.

Quando cheguei à Audácia, vi uma chance de recomeçar minha vida. Eu não imaginava me recuperar completamente dos meus medos, mas lá eu via que podia ter uma vida nova, sem nada que lembrasse minha infância dolorosa.

Até que ela chegou.

Quando a vi pular, não era mais do que um borrão cinza, uma cor que eu não esperava voltar a ver, principalmente não na turma de iniciandos transferidos da Audácia.

Ela era tão lisa em todos os sentidos, tão pequena e magra, os cabelos dourados como a luz do sol. Seus olhos azuis eram tão lindos, tão insististes.
Ela parecia tão frágil, como uma boneca de porcelana. Mas ela pulou primeiro, a Careta havia pulado primeiro. Nem eu havia feito isso.

Quando estávamos juntos, eu passei a imaginar um futuro. Nunca tinha pensado que eu dia poderia ter uma vida normal, mesmo quando vivia na Audácia.

Depois que reencontrei minha mãe depois de quase 9 anos, eu comecei a pensar na possibilidade de abandonar minha facção. Eu iria terminar o treinamento dos iniciandos e então iria embora para sempre, mas me apaixonei por Beatrice Prior e não pude mais fazer isso.

Quando ela morreu, uma parte de mim também se foi. Vê-la naquela mesa tão pálida e a pele começando a esfriar, foi provavelmente o momento mais doloroso da minha vida, muito pior do que qualquer surra de Marcus Eaton.

Desde aquele dia, minhas noites alternavam entre sonhos com ela viva e bem, revivendo nossos momentos juntos como quando subimos a roda gigante e eu a toquei pela primeira vez, impedindo que caísse daquela escada enferrujada. Foi naquele momento que percebi que começava a sentir algo por ela, só não imaginava que pudesse virar amor.

As dores do coração jamais se curavam, e eu ainda tinha pesadelos em que a via ser morta e não podia fazer nada, como em minha paisagem do medo. Nessas noites, eu acordava com o coração acelerado e chorava. Tentava lembrar que era apenas um sonho, mas sabia que nunca a teria de volta.

Evelyn havia morado comigo durante quase um ano depois que tudo aconteceu, e eu perdi a conta de quantas vezes chorei em seu ombro durante a noite. Depois de tanto tempo comigo, achei melhor que ela seguisse em frente. Eu já era um adulto e não podia mantê-lá acordada à noite por minha causa, embora eu soubesse que estava com depressão. Era um conceito novo para mim, mas os novos moradores da cidade vieram com novos termos, novas ciências, que eu nunca tinha ouvido falar antes. A psicologia que trouxeram de fora da cerca me esclareceu muitas coisas, mas ainda era difícil falar.

Evelyn se mudou para perto do antigo Prédio da Franqueza, onde a cidade voltava a ser reconstruída.

Eu nunca mais iria querer tocar em uma arma de novo, então recusei os vários convites de Amah e George para me juntar à Polícia de Chicago que agora comandavam.

Havia arrumado um emprego com Johanna, ajudando-a na reconstrução da cidade. Era bom ver Chicago de novo uma metrópole como foi um dia. Supervisionava a recuperação da cidade, me certificando de que tudo ficaria bem, já que por dentro, não imaginava que poderia estar novo em folha algum dia. Talvez depois que todas as reformas estivessem prontas, eu pudesse trabalhar com computadores. Tinha jeito pra isso e realmente gostava da tecnologia, mas era assunto para um futuro que eu não queria ficar pensando.

Não sei se estava grato que Christina tivesse me impedido de beber o soro da memória, mas nós mal nos falávamos desde o dia em que ela confessara sentir alguma coisa por mim e tentara me beijar. Não que eu não gostasse dela, mas eu nunca poderia sentir algo assim por ela. Christina me lembrava de Tris, e isso parecia demais com uma traição, mesmo que meu amor já não estivesse mais aqui.

Eu ainda sofria, muito, mas tive uma recaída quando soltei suas cinzas na tirolesa do 100° andar daquele prédio, cerca de dois anos depois de perdê-la.

Há muito tempo eu já não via Caleb ou Cara, embora soubesse que eles vinham trabalhando em uma nova empresa de tecnologia, com a mesma equipe que havia criado o aparelho metálico que permitia Shauna voltar a andar.

Eu agora trabalhava na prefeitura com Johanna e muitos dos novos moradores que vinham de todas as partes do país desde que os Muros da cidade foram derrubados.

Meu apartamento ficava em um dos andares baixos de um prédio afastado do Eixo, mas de lá eu podia ver a construção da Sede da Athena Biotecnologies, a cada ano mais uma perfeita junção da arquitetura grega antiga e os prédios de metal e vidro que agora enchiam a cidade com cada dia mais habitantes vindos de fora.

Eu já havia ouvido muito sobre a Corporação Athena, era onde Cara e Caleb agora trabalhavam, e eu quase sempre passava por lá no caminho para o trabalho.

Tudo aquilo pertencia à uma garota da extinta Audácia. Com os bancos voltando a funcionar, as famílias que já existiam antes da Guerra da Pureza passaram a receber herança dos parentes com contas nos Bancos de todo o país, incluindo mais de 100 anos de juros para cada um. Sendo a última pessoa viva da sua família, ela havia recebido muito dinheiro que um dia haviam sido de parentes há muito mortos. Avós, tios, primos, todos os que compartilhavam do seu sobrenome que tiveram contas no Banco algum dia.

Apaixonada por biotecnologia e não tendo onde colocar tanto dinheiro, ela criou uma empresa que em pouco mais de dois anos havia se tornado uma das mais importantes que ainda resistiram depois da Guerra. O que aquela mulher fez sozinha foi impressionante, e Shauna deve suas pernas de volta à ajuda daquela empresa também.

Ao contrário do que as pessoas que trabalhavam lá diziam poder fazer, eu não podia ser consertado.

Essa não era a vida que eu queria ter, mas desde que Beatrice Prior se foi, eu apenas existia.

Sonhava em poder vê-la de novo, mas infelizmente eu tinha consciência de que meus desejos não passavam disso. Sonhos.


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