Metabolismo basal escrita por Lehninger


Capítulo 1
O mínimo necessário


Notas iniciais do capítulo

Hoye~

Boa leitura ♥



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Imayoshi acordou assustado. Mesmo para alguém tão centrado, era possível perder o controle da situação, e foi isso que aconteceu ao se permitir levar por um sono profundo oriundo de uma sequência de noites mal dormidas. As feições em seu rosto delatavam seu cansaço, embora o capitão parecesse sustentar o dia inteiro sua típica expressão simpática com o detalhe de um sorriso pouco apreciado por aqueles de paciência curta. Ainda que o estresse estivesse se acumulando como uma bola de neve, era incapaz de explodir, direcionando todo o estrondoso resultado às pessoas ao redor. Permanecia equilibrado, ostentando uma paciência implícita em uma calma quase palpável.

Com o fim da Winter Cup, Imayoshi, assim como os outros terceiranistas do time, pôde se dedicar inteiramente a resolver os últimos e mais importantes detalhes referentes ao ingresso à universidade. A papelada era extensa, fazendo jus à famosa burocracia tão falado no meio acadêmico. Por mais que seu pai houvesse se formado na mesma universidade que pretendia, e, logo, soubesse o que de fato era necessário, acontecia uma atualização de anos em anos que complicava a situação.

Como se não bastasse o estresse por se preocupar em preparar a vida acadêmica, os exames finais na escola não deixavam de existir.  Estava sobrecarregado, mas não deixava esse pensamento se tornar uma verdade em sua cabeça, já que, em seu ponto de vista, isso atrapalhava, agindo de forma inconsciente como uma barreira, um desestímulo para chegar até o desfecho daquilo tudo.

E foi numa tarde em que os alunos foram liberados mais cedo que Shouichi finalmente pôde ir à universidade para sanar a última dúvida quanto a certa requisição, podendo, enfim, relaxar os ombros e suspirar aliviado enquanto voltava para casa. Com a parte mais complicada resolvida, restava apenas se concentrar na etapa final do ensino médio e, talvez, revisar algo para o vestibular. Já tinha a certeza que escolheria o curso de Matemática e tinha planos de fazer tanto a licenciatura como o bacharelado, logo, não havia mais preocupação. E só ao finalmente suspirar dentro do metrô que percebeu o quanto estava cansado, chegando a cochilar sentado em um dos bancos, tomando cuidado para não encostar a cabeça no ombro da pessoa ao lado.

Quando chegou em casa, já havia escurecido. Lembrava bem que seu irmão passaria a noite na casa de um amigo, enquanto seu pai tinha compromisso com um tio distante. Era sexta-feira e passaria a noite sozinho, provavelmente com a cara enfiada nos livros para garantir um bom resultado nos exames - todos. Não era como se fosse um problema. Virando a esquina, avistou a residência, bem como a silhueta de alguém sentado com a face oculta pelos joelhos nos dois três solitários degraus que separavam a porta do jardim. Imayoshi enxergava perfeitamente de longe. Seus óculos tinham como finalidade auxiliar quanto à hipermetropia severa, no entanto, havia sido agraciado com uma bela visão a longa distância.

O uniforme escolar que o indivíduo trajava não se destacava, mas, devido ao desleixo, era possível visualizar a gravata arroxeada que serpenteava por seus joelhos, estes unidos como um apoio para seu tronco em um breve cochilo. Hanamiya detestava esperar. E Imayoshi não fez questão alguma de apressar o passo, gostando de ver, pouco a pouco, a aproximação. Ao chegar ao jardim, sua presença foi notada por Makoto, que levantou a cabeça mínima e preguiçosamente, como se acabasse de acordar numa manhã e não quisesse encarar a claridade.

Ao contrário de cumprimento, um silêncio preenchido pela expressão – como de praxe – pouco amigável do mais novo e um sorriso característico no outro. E como nenhuma palavra seria pronunciada por Hanamiya mesmo, Shouichi não conteve a vontade de importunar seu kouhai agindo simplesmente naturalmente. Cantarolando “Mako-chan” como uma espécie clichê de suspense proferindo seu “ora, ora, vejamos quem está aqui”, procurou pelo molho de chaves na mochila e abriu a porta, passando por Hanamiya sem retribuir o olhar. O mais novo levantou-se sem pressa, adentrando a casa logo em seguida. Imayoshi trancou logo em seguida, cessando o cantarolar para, enfim, começar a falar. No entanto, e talvez obviamente, não abandonou o satisfatório tom de voz relativamente irônico que carregava consigo.

― Sei que talvez não deva perguntar, mas assumo que seria interessante saber o motivo de sua presença.

― Hum? Então é preciso um motivo específico para um kouhai saudoso visitar seu queridíssimo senpai ausente, já que este está pouco se lixando o tempo todo?

― Ora, não me diga que adquiriu sentimentos. Onde comprou? eBay? Tome cuidado, geralmente são produtos falsificados. E a propaganda é enganosa, também, como pode ver.

Imayoshi afrouxou a gravata do uniforme, tirando o paletó logo em seguida. Hanamiya já tinha o seu jogado em um dos ombros há muito, como se lembrasse do fato de que não haveria aula no dia seguinte.

― Quer mesmo falar de produtos falsificados, Imayoshi? É especialista nesse assunto. Na verdade, além de produtos, personalidades também. Um vasto leque de falsidade, devo dizer.

Shouichi pareceu se divertir ainda mais com a resposta perfeitamente à altura. Não era para menos, afinal. Forçou uma expressão ofendida, executando uma pose dramática, cuja cereja do bolo foi o bico formado nos lábios.

― Assim você fere meus sentimentos, Mako-chan.

― Você também não tem moral alguma para falar de sentimentos. Não seja idiota; ou melhor, não seja ainda mais.

Imayoshi não respondeu. Acomodou-se no sofá da sala de estar, permitindo todo seu corpo relaxar. Hanamiya, no entanto, não repetiu o ato, colocando-se em pé à sua frente, como se exigisse algo. Curvou o tronco para frente, aproximando-se do mais velho e arrancando as armações do rosto do mesmo, sem se importar em ser delicado para não machucá-lo.

― Precisa agradecer por ser quatro olhos. Se não fosse por essa porcaria, qualquer um poderia ver no seu olhar o quanto está acabado. Um lixo completo. Vai ser lembrado pelo time como o capitão lixoso.

Imayoshi soltou uma gostosa gargalhada, divertindo-se com a criatividade alheia para articular termos pejorativos.

― Não seja tão bonzinho comigo. Sabemos que serei lembrado como o capitão que permitiu que o time perdesse para Seirin.

― Seria essa a primeira característica que temos em comum, capitão?

O escárnio de Hanamiya era quase palpável, como se pudesse criar vida, tomar forma e andar ao lado do rapaz. Um pequeno monstrinho – provavelmente maior que o próprio Makoto.

Imayoshi sorriu de lado, erguendo-se minimamente apenas para alcançar a gravata de coloração roxa do uniforme da Kirisaki, puxando o rapaz abusado até o rosto deste se encontrar a milímetros do seu. O ato, naturalmente, irritou o mais novo, principalmente pelo fato da aproximação repentina ter aquecido, ainda que pouquíssimo, suas bochechas. Era humilhação demais. Shouichi era imprevisível, nunca podia esperar atitudes padronizadas, logo, não estava preparado para os acontecimentos que podiam se desenrolar em um simples diálogo.

― Mako-chan... Não negue a imensidão que temos em comum. Somos unha e carne.

A aproximação foi mantida e Imayoshi não fez menção de quebrá-la. Trocaram um pesado olhar, como se desafiassem um ao outro a desviar primeiro. Repentinamente, o mais velho soltou a gravata, ao que o dono desta recompôs a postura rapidamente; no entanto, jogou-se ao lado no sofá, permitindo que o corpo afundasse no estofado macio.

― Vai mesmo fazer matemática? Há tantas outras opções.

― Como uma engenharia qualquer?

― Isso. Daquelas bem genéricas.

Shouichi não pôde deixar de ver graça na empolgação que o outro tinha em lhe desejar o pior.

― Todas as engenharias recorrem ao departamento de matemática quando o aluno reprova em Cálculo. Inclusive a química, Mako-chan. Não se preocupe, nos veremos nessa situação. Continuarei sendo bom para meu kouhai preferido.

A provocação era tão ridícula que Hanamiya realmente achou engraçada. Shouichi sabia perfeitamente que, quando entrasse na universidade, Makoto seria um dos únicos a não reprovar disciplina alguma.

― Me ofende que acredite que irei para engenharia química, senpai. Só mostra o quão está aéreo em relação a mim. É um sinal? Serei em breve substituído?

Durante o ensino fundamental, Hanamiya sempre oscilou entre a química propriamente dita e a engenharia química, ambas como escolhas para o futuro. No entanto, com a chegada da metade do ensino médio, passou a repensar suas opções. Se estivesse disposto a contar ao mais velho sobre o curso que tinha em mente, poderia fazer uma piada sobre a escolha, na verdade, combinar com Shouichi, já que ele que era um manipulador de primeira.

Imayoshi ficou relativamente surpreso, permitindo que um ar de dúvida tomasse suas feições. De fato, estava perdendo detalhes do desenvolvimento de Hanamiya, mas havia sido inevitável. Makoto tinha mais tempo livre pelo fato de não precisar estudar para os exames e mesmo assim se sair bem, ao passo que Shouichi precisava se dedicar, ainda que também fosse inteligente.

O mais velho insistiu para que o outro lhe contasse a nova opção que tinha em mente para o futuro, mas não obteve sucesso. Entre alfinetadas e mais alfinetadas, Hanamiya indo à cozinha iniciando sua procura por chocolate, remexendo os livros na estante da sala de estar, enfim subiram ao quarto de Shouichi. Makoto sabia andar por cada milímetro daquela residência, afinal, no ensino fundamental, ia muito ali, tornando-se até mesmo próximo do pai e irmão de Shouichi, que sempre se animavam com sua presença.

Explicando preguiçosamente que havia falado aos pais que possivelmente passaria a noite fora, Hanamiya jogou-se na cama de Imayoshi, esticando os membros e tomando praticamente todo o espaço. Estava cansado, embora soubesse que não se comparava ao mais velho naquele momento, cuja exaustão era visível ao mínimo contato visual.

Foi conversando sobre besteiras, trocando alfinetadas e retribuindo escárnio com escárnio que ambos adormecerem de maneira desajeitada, ambos trajando os uniformes escolares. E, retomando, Imayoshi acordou assustado. Por ter dormido sem perceber, não programou o despertador do celular; precisava acordar cedo para estudar. E ao ver Makoto ali, do seu lado, ainda que mantivesse uma distância considerável, soube que a saudade é um sentimento avassalador ao ponto de amansar até mesmo alguém como Hanamiya. Ou, na verdade, simplesmente Hanamiya, visto que, certamente, não havia outra pessoa na Terra que pudesse se assemelhar veementemente a ele.

Não haviam trocado um toque sequer na noite anterior. O máximo que o mais novo fez foi usar seu tronco como travesseiro, alegando que já estavam perto demais. A ausência de beijos e contato mais próximo deixava tudo aquilo ainda mais íntimo, demonstrando a verdadeira saudade por trás de tudo.

Havia algo de anormal. Talvez Makoto houvesse tomado algum calmante na noite anterior, antes de chegar à sua casa, ou tivesse brigado feio com a irmã. De qualquer forma, Shouichi sabia bem que aquela situação só iria repetir, quem sabe, na próxima translação ― e ainda seria cedo demais.

Por hora, Imayoshi iria apenas aproveitar o silêncio compartilhando. Permanecia cansado e ter dormido de mau jeito não colaborou muito, mas, o simples fato de ver Hanamiya à sua frente, por incrível que pareça, era capaz de lhe suprir com a mínima energia necessária.

Até que Makoto não era um kouhai tão terrível assim.

Heh, que exagero. Ele é terrível sim.


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Notas finais do capítulo

Obrigada a você que leu até aqui! ♥

Mako-chan lendo isso: "ata"



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