Eu não quero confessar, eu sei, não quero me entregar tão fácil, mas você chega devagar, com esse jeito de me olhar bem fundo...

A letra ressoava na mente de Gabriela, juntamente com a melodia alta dos fones de ouvido. Já era a terceira vez que a música tocava, e em todas as vezes, a garota cantava praticamente suspirando.

De olhos fechados, relembrava dos dias anteriores, e as ondas de sensações a tomaram novamente, como se estivesse revivendo tudo. De fato, poucas horas haviam se passado desde o último contato com ele, mas não impedia que a saudade já estivesse presente.

Aquela viagem estava valendo muito mais a pena do que Gabriela havia pensado dias antes de tomar sua scooter bege em um momento de energia. Não tinha planejado ir à praia nas férias, mas ficar em casa a estava deixando cheia de tédio. Em uma manhã de quinta-feira, teve um sonho com o mar, e como fazia anos que não ia ao litoral, a fez considerar a ideia, e acabou por concretizá-la, arrumando uma mochila, enchendo o tanque de gasolina e partindo.

Ela nunca havia viajado sozinha antes, e em partes isso acabava deixando seu estômago levemente nervoso, mas nada que não passasse assim que sentisse os ouvidos tampando conforme descia a serra.

Agora, Gabriela estava deitada na cama do hotel após um banho, ouvindo uma banda que marcara sua adolescência, apenas para reforçar ainda mais aquela sensação gostosa de liberdade e interesse por alguém.

Graças a um quiosque cheio, acabou deixando que um moreno simpático se sentasse com ela na mesa, iniciando assim uma conversa acalorada, regada a petiscos e caipirinhas. Mesmo que ele tivesse se mostrado tão gentil a primeiro momento, Gabriela não esperava que ele fosse tão interessante e cheio de assuntos diversos. A conversa foi até altas horas da noite, sem que percebessem, tanto é que só notaram o horário quando os funcionários do local estavam limpando e recolhendo as mesas.

A noite finalizou quando ele a deixou no hotel, indicando que estava hospedado na pensão do outro lado da rua. Nos outros dois dias, eles se encontraram por acaso, na praia e em um mercado local.

Nesse último encontro, o assunto foi para profissão: Gabriela explicou que trabalhava como psicóloga infantil em uma escola pública em São Paulo, e ele disse que era professor de Arte Moderna e Contemporânea em uma universidade, na mesma cidade, mas que não era nativo dali, e sim, da França, e que decidiu trabalhar no país depois de uma viagem de férias para lá, assim que terminou seu bacharel em Artes Plásticas. Gostou tanto do povo brasileiro que resolveu tentar a vida ali, fez sua pós-graduação e mestrado e conseguiu o emprego de professor na universidade.

Era incrível como seu conhecimento era abrangente. Sabia falar sobre tudo um pouco, mesmo sobre assuntos que não eram de sua área. Ele era um ótimo falante, mas também era um bom ouvinte, que se mostrou interessado em psicologia infantil.

Gabriela se pegava lembrando da forma que Rayan jogava os cabelos escuros para trás sempre que resolviam ir para sua testa, ou mesmo como gesticulava as mãos quando falava empolgado sobre alguma coisa. Com certeza ela estava admirada por aquele cara tão profundo, mas estava começando a considerar o que sentia.

Ela não era do tipo que se interessava primeiramente em aparência, mas sim no quanto tinham a oferecer sobre conhecimentos. E Ryan se mostrou cheio deles, e de bônus, era bonito e charmoso, mesmo que aparentemente não percebesse.

Agora, ali na cama, se perguntava se estaria sendo boba, pensando nele e desejando mais um encontro inesperado, já que não o vira naquele dia.

Não dá pra resistir ao teu amor. Você me olha, baby, eu vou. Teus beijos só pra mim e teu sabor, não dá pra resistir. Preciso ter o seu amor.

Com um último refrão, Gabriela desligou o player e levantou, deixando o celular na cama. Se olhou rapidamente no espelho, certificando que seus cachos estavam em ordem, e saiu do quarto, trancando a porta e guardando a chave no bolso do short. Saiu para a rua, contemplando o pôr do sol colorindo o ambiente com tons alaranjados.

Era uma típica noite de verão: Quente e tranquila.

Começou a caminhar tranquilamente pelo calçadão da praia, observando alguns banhistas ainda na água, outros aproveitando o restinho de sol, outros arrumando suas coisas, e grande parte caminhando na beira do mar.

Resolveu se sentar no banco mais próximo, para aproveitar o final do dia. Contemplou a visão que tinha e sorriu, se sentindo abençoada e feliz.

De repente, pensou em como seria quando voltasse para casa. Será que algum dia encontraria acidentalmente Ryan? Será que teriam a oportunidade de continuar conversando ou mesmo de sair?

Talvez aquela fosse apenas uma paixão de verão, como outras que já tivera.

— Se despedindo do sol?

Ouviu uma voz masculina, e ao se virar, viu Ryan sentando ao seu lado no banco.

— Quase isso. — Acabou sorrindo timidamente, notando seu bronzeado ainda mais evidente do que estava antes. — Ficou o dia debaixo do sol?

Ele ergueu o braço, o observando. — Praticamente. Mas na realidade, acabo me bronzeando facilmente, mesmo com bloqueador solar.

— Entendo. Eu custo para me bronzear, preciso ficar horas tomando sol.

— Ficou na praia hoje? Não a vi, mas está mais bronzeada do que ontem.

— Fiquei... Então quer dizer que me procurou? — Deu um sorriso brincalhão.

Ryan desviou o olhar rapidamente, voltando a observá-la com um sorriso de canto. — Admito que me acostumei a vê-la todos os dias.

Gabriela riu, um pouco envergonhada. — Bom, admito que eu também.

Ambos se olharam sem saber mais o que dizer, apenas sentindo que deviam agir de algum modo. Assim, Ryan se curvou lentamente em direção a ela, e parou antes de mais nada, encarando os olhos castanhos, se certificando de que poderia avançar.

A mão de Gabriela foi ao encontro do rosto moreno, se aproximando para que seus lábios se tocassem em um beijo singelo e ansiado.