Delirium escrita por Karina A de Souza


Capítulo 23
Nós Vimos o Monstro


Notas iniciais do capítulo

E aí seus fantasmas? Vou chamar o Constantine e os Winchester pra vocês.



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—Então você me abandonou e foi para Nova Orleans. Que surpresa.

—Está chateada?-Desviei de um grupo de garotas e continuei andando, aproveitando a escuridão da noite.

—Sabe que não sinto nada, Klaus.

—Quando você não apareceu, achei que tinha ido embora. Não fazia ideia de que os Salvatore conseguiram capturá-la.

—Ah, surpresa.

—Qual a situação atual?-Sorri.

—Jeremy está morto. Caroline está assustada. Matt está ileso e me contou que Elena por pouco não desligou a humanidade, após o enterro do irmão.

—O que a impediu?

—Stefan. Ele é a única coisa entre ela e seu monstro interior. Quando eu matá-lo, é provável que ela desligue tudo.

—Certo. Eu preciso ir, ligo mais tarde.

—Okay. -Desliguei o celular e o enfiei no bolso. Um movimento repentino atrás de mim me fez parar e virar. -Oh, Bonnie. Ainda de luto pelo seu namorado?

De repente, a dor.

Começou na minha cabeça, e se espalhou pelo corpo. Cada osso estalando e quebrando ao mesmo tempo. Caí de joelhos, gritando.

Se eu encostasse na bruxa, ela estaria morta.

—Você foi longe demais, Ludmille. -Avisou, tentando falar por cima dos meus gritos. -Agora é um caminho sem volta. Phasmatos...

—Nem pensar, Bennet.

—Damon.

—Se matá-la, aí sim será um caminho sem volta.

—Faça ela parar!-Gritei, tentando ignorar a dor. -Pare!

—Bonnie...

—Ela matou Jeremy. -Sussurrou. -Eu não posso deixá-la ir.

—Uma última chance. Se não funcionar, eu mesmo a mato. -Segundos depois, a dor parou. Me preparei para correr, mas Damon quebrou meu pescoço antes que eu conseguisse.

***

Abri os olhos e olhei em volta. Estava no banco do passageiro, enquanto Damon dirigia.

—Bom dia.

—Onde está me levando?-Exigi.

—Estou te levando para a sua salvação.

—O que?-Estacionou.

—Chegamos. -Olhou pra mim. -Espero que esteja disposta a colaborar. Ou posso chamar Bonnie e o “phasmatos-pega-fogo-na-vadia” dela. Entendeu?-Assenti. -Maravilha, vamos.

Saímos do carro. O sol ainda não tinha nascido, mas não devia demorar. Olhei para a construção a nossa frente. Eu sabia onde estávamos.

Segui Damon para dentro, levemente curiosa e entediada. Minutos depois, uma das portas de correr foi destrancada e aberta. Damon fez um gesto, me mandando entrar, passei por ele, que entrou também e fechou a porta.

—Por que me trouxe aqui?-Perguntei. Damon ligou a luz.

—Algo familiar?

Olhei em volta. Havia muitas coisas no depósito: roupas, baús, caixas, uma vitrola... Sim, era tudo familiar, por que eram minhas coisas.

Me aproximei das primeiras caixas onde haviam alguns livros muito antigos, autografados pelos autores, que já tinham morrido. Me lembrava de ir até os escritores e pedir por suas assinaturas...

Passei para as roupas penduradas: vestidos e trajes muito antigos, todos bem cuidados, cobertos por plástico para afastar as traças. Conseguia lembrar de cada ocasião onde eu havia usado aquelas roupas.

Continuei andando, encontrando um baú onde havia vários álbuns de fotos, todos divididos por datas. Peguei um deles, o mais recente. Na primeiro página uma foto de Gustav e eu, sorridentes na virada de noventa e nove. Joguei o álbum no baú, evitando as lembranças.

Passei por uma caixa com alguns discos, por estantes onde haviam algumas câmeras fotográficas e lembrancinhas de vários lugares do mundo e cheguei até uma boneca de pano, que estava numa prateleira alta. Ela pertencia a...

“-Emma Dawson. -A menina respondeu, abraçada a uma boneca que estava tão suja quanto ela.

—Onde estão seus pais?-Apontou para a casa em chamas, de onde a tirei minutos atrás. Não havia sinal de mais ninguém vivo na mansão. Todos estavam mortos.

—Eles não vão voltar, não é?-Neguei com a cabeça. A menina suspirou. Parecia tão pequena e delicada.

—Vamos, temos que ir.”

Passei os dedos pelo rosto da boneca, presa na lembrança. Emma. Eu a tirei do fogo. Eu a salvei.

“-Fique com ela. -Insistiu, oferecendo a boneca. -E não esqueça de mim.”

Fechei os olhos com força. Pare de lembrar. Pare. Pare! “Obrigada, Ludmille. Obrigada por me salvar”.

Abri os olhos, encarando o vazio.

—Ludmille?-Damon chamou, hesitante. -Lud?

Então tudo estava lá, todas as coisas ruins que eu tinha feito. Cada pessoa que eu feri, assustei... Jeremy, eu tinha o assassinado, na frente da própria irmã.

Cobri a boca com a mão.

—O que foi que eu fiz?

***

—Eles nunca vão me perdoar. Eu nunca vou me perdoar.

—Ludmille...

—Eu matei Jeremy Gilbert na frente da irmã dele!-Gritei. -Meu Deus, Damon, como ela vai superar isso? Ela quase desligou a humanidade! Por minha culpa!-Parou o carro na frente da mansão Salvatore.

—Pare de chorar e se acalme.

—Eles estão todos lá, não é? Eu não vou conseguir fazer isso.

—Lud...

—Não!-Saí do carro e comecei a me afastar. Damon me seguiu. -Eu não vou conseguir encará-los... Eu não...

—Tranque a sua dor. Foque em outra coisa, outro sentimento.

—Só tem dor... E culpa e... Medo. Eu não quero... E se eu desligar...

—Não vai. -Segurou meus ombros. -Eu te trouxe de volta uma vez, posso fazer de novo e de novo... Mil vezes se for preciso. Você não está sozinha.

Não sei como consegui dar um passo após o outro, entrando na casa ao lado de Damon. Quando paramos na entrada da sala, eu quis sumir. Estavam todos lá, como se nos esperassem.

Elena ficou de pé e se aproximou. Esperei por um tapa ou por um soco. Nada aconteceu.

—Eu sei que me odeia. -Comecei. -Mas... Sinto muito. Lamento pelo que fiz. Sinto muito por... Desculpe.

—Eu não odeio você. Não posso negar que odiei, mas aquela não era você. Ainda dói muito... Mas eu perdoo você. -Uma lágrima escorreu pelo meu rosto, a limpei rapidamente.

—Obrigada.

—Você não está falando sério!-Essa foi Bonnie. A bruxa ficou de pé. -Ela matou Jeremy! Ele está morto por que ela o matou. Ela!

—Ludmille fez isso por que desligou a humanidade. -Damon interferiu. -Se quer culpar alguém, culpe Klaus.

—Klaus não atacou Matt; não jogou facas na Elena; não ameaçou a mãe de Caroline e certamente não matou Jeremy.

—Eu sinto muito!-Exclamei.

—Isso não vai trazê-lo de volta. -Então saiu da sala rapidamente, sem olhar para trás.

***

ALGUNS DIAS DEPOIS

—Lud?-Damon empurrou a porta e entrou. -Você está bem?

—Não. -Se sentou ao meu lado, na ponta da cama.

—Quer conversar?

—Eu tenho me sentido tão perdida nesses últimos dias, desde que liguei minha humanidade. Você conseguiu me trazer de volta, mas foi tarde demais. E se na próxima...

—Não haverá uma próxima vez. Eu prometo. Sabe, você podia se livrar dessa coisa. -Apontou para o meu vestido de noiva, estendido na cama. -É um bom começo.

—Você tem razão. Esse tempo todo eu odiei esse vestido, mas continuei com ele. Se eu quero um novo começo, preciso me livrar dele.

Peguei o vestido e fui para o quintal, Damon me seguiu. Estendeu uma caixinha de fósforos.

—É tão velho que vai queimar como papel. -Brincou. Joguei o vestido no chão.

—Espero que sim. -Risquei o fósforo na caixa, e o lancei no vestido. A chama brilhou por um momento, então apagou. -Merda. -Me abaixei e ascendi outro fósforo, um que apagou assim que encostou no vestido. -O que está acontecendo? Por que ele não queima?

—Tenta de novo. -Tentei. O vestido permaneceu intacto. -Okay, essa coisa é das trevas. Talvez tenha vida própria.

—Damon.

—Desculpe. -Peguei o vestido e fiquei de pé.

—Talvez haja um motivo pra não queimar. Talvez eu tenha que ficar com ele, como um castigo: jamais esquecer que sou um monstro.

—Ludmille.

—Depois de tudo o que eu fiz, não pode me defender. E não se trata só das coisas que aconteceram em Mystic Falls. Estive há séculos matando lá fora. Vê o sangue no tecido? É das pessoas que eu matei. Agora o Universo está me punindo. E eu não posso fugir disso.

***

—Você não achou que ia fugir de mim para sempre, achou?-Klaus perguntou, largado no sofá dos Salvatore, os pés na mesa de centro. -Uma hora você ia ter que voltar pra mim.

—Desculpe, acho que está me confundindo com algum dos seus híbridos. Não pertenço a você.

—Eu vim pela Noiva de Sangue.

—Lamento, ela está morta. -Fez que não com o dedo indicador.

—Ela está adormecida. E eu vim despertá-la.

—Acho que perdeu seu tempo. Eu não vou desligar minha humanidade de novo. Sabe, fiquei com muita raiva de você por me fazer ceder ao monstro que sou, mas depois... Descobri que você me dá pena. Você não tem ninguém, Klaus. E o único jeito de ter amigos é se controlá-los. Você tinha controle sobre Stefan e Ludmille sem humanidade. Mas só isso. Eles não eram seus amigos. Seus irmãos estão dormindo, com estacas no peito, você está sozinho e sempre vai ficar por que ninguém nesse mundo jamais vai conseguir amar você.

—E o que você é, Ludmille?-Ficou de pé e parou na minha frente. -Quão diferente de mim você é? Tem um monstro dentro de você, preso numa jaula quebrada, por que você quer que ele saia. Lembra do que me disse quando tinha desligado sua humanidade? Que se sentia viva, pela primeira vez. Você prefere o monstro, mas se nega a admitir.

—Sabe o que eu acho? Que você tem muita sorte de não poder ser morto. Por que se pudesse, eu já teria acabado com você. Agora saia dessa casa e nos deixe em paz. Você perdeu, Klaus. Foi derrotado. Seja um bom perdedor e admita sua derrota.

—O jogo só acaba quando eu morrer. -Abriu os braços. -Estou vivo. O que significa que não perdi ainda. E considerando os fatos... Eu não vou perder. -Sorriu. -Foi bom ver você. Mande lembranças aos Salvatore, à Elena e Jeremy... Oh, espera. Você o matou, não é mesmo? Então mande lembranças só aos vivos. -Passou por mim e se foi.
Respirei fundo. Não era fácil enfrentar Klaus Mikaelson. Talvez eu fosse louca por tentar, mas... Não havia outra escolha. Não ia recuar. Não agora.

***

Eu não sabia como tinha ido parar lá. Talvez tivesse ido enquanto dormia. Na verdade, não importava como, só queria saber por que.

Me levantei, tirando algumas folhas que grudaram na minha roupa. Olhei em volta, para a floresta. Tudo estava num silêncio assustador... Até aquele som começar. Era o mesmo que ouvi quando aquela névoa negra me perseguiu.

Dessa vez, o som não anunciava a névoa, mas algo que parecia muito, muito pior.

—Papai. -Sussurrei, lágrimas escorrendo pelo meu rosto. Ele parecia exatamente o mesmo desde que o vi pela última vez.

—Eu devia ter terminado antes que começasse. -Se aproximou. -Eu vi o monstro em você, mas não tive coragem de acabar com ele. Com você. Devia ter te matado.

—Não... Papai...

—Você nunca sentiu culpa pelo que nos fez. -Minha mãe disse, surgindo do escuro. -Nunca se arrependeu por ter se sujado com nosso sangue. Eu vi o monstro em você, mas fingi não ver. Devia tê-la matado.

—Não... Eu não sou um monstro...

—Robert viu o monstro em você. -Começou a andar em volta de mim, meu pai fez o mesmo. -Ele teve coragem de fazer alguma coisa. E você o matou. Matou o único que podia te curar.

—Eu não sou um monstro!-Gritei, sem conseguir parar de chorar.

—Você o matou, nos matou e depois se sujou com o sangue de centenas de inocentes. -Meu pai disse. -Como consegue fingir que não tem culpa?

—Eu nunca quis machucar ninguém! Eu não queria...

—Queria sim. Você sempre quis.

—Não. Não...

—Nós vimos o monstro em você, -Começaram, ao mesmo tempo. -mas não fizemos nada.

—Eu fiz. -Robert disse, aparecendo de repente. -Eu tentei concertar você. -O barulho da névoa aumentou, se juntando ao coro que meus pais faziam: “nós vimos o monstro em você. Nós vimos”. -Tudo o que você fez foi me odiar, quando devia me agradecer. Eu vi o monstro em você. Eu vi!

—Por favor, parem -Pedi, cobrindo os ouvidos com as mãos.

—Nós vimos o monstro em você. -Os três disseram. -Nós vimos. Nós vimos o monstro em você...

—Parem!

Empurrei meus pais para o lado e comecei a correr o mais rápido que podia. O som da névoa me seguiu, se tornando cada vez mais alto, até fazer meus ouvidos doerem e me deixarem tonta.

Caí no chão, torcendo pra ter uma morte rápida.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo.



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