9 Zonas escrita por Cas Hunt


Capítulo 45
Veredito - Jug




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Encarando o homem não consigo ver muitas semelhanças com Al. Diferentemente do meu, o pai dela parece inteiramente controlado mesmo em uma situação extrema. Sua filha desacordada, o filho do inimigo clamando que a ama e parte de seu povo exterminada. Sequer posso imaginar o que lhe custa para manter o autocontrole.

Mesmo assim, o pai dela respira fundo, pedindo um silêncio ao qual lhe é entregue de imediato. Ele avalia a mim, os olhos passando minunciosamente pelo meu rosto, pensando em alguma coisa.

—O que faria se Lya realmente te mandasse embora?

Pisco, atordoado. Apesar de ter verbalizado a possibilidade, não a via chegando em momento algum, principalmente depois do ocorrido. Ela ainda me escolheria e agora eu faria o mesmo. Parecia a mim natural que Al me quisesse por perto, que ficássemos juntos. Ter de imaginar sua expressão de decepção mandando-me seriamente voltar é uma sensação fantasmagoricamente possível.

—O que ia me restar se não obedecer?

Os dez integrantes junto a Lion continuam me observando, em silêncio. Parecem esperar que o pai de Alya dê o veredito. Sinto-me diante de juízes esfregando em minha cara meus próprios erros. Olhando fixamente ao homem de traços gentis consigo começar a distinguir algumas semelhanças. A cor do cabelo, as clavículas proeminentes, olhos desconfiados com muito por trás.

—Uma decisão tomada no calor do momento raramente é uma boa decisão — ele suspira, passando o olhar aos outros — Lion, você o defendeu, então fica responsável por mantê-lo observado 24 horas por dia, entendido?

—Sim, capitão.

—Também certifique-se que ele não tem nenhum rastreador ou qualquer aparelho do tipo, não podemos trazer guerra para os que vieram até aqui em busca de paz.

—Como vão ter paz no meio de um... — o robusto começa, mas é cortado apenas com um gesto da mão do capitão.

—Poupe-me. Somos intrusos. O que precisamos pensar agora é em como vamos lidar com a nossa realidade. Não temos um lugar, não temos comida e não podemos abusar da bondade de nossos salvadores. Eles não querem se envolver na guerra e devemos respeitar isso. Nesse lugar não somos lei, eles que devem decidir se o garoto fica ou não. Dou ao Baratheon um voto de confiança... — ele ergue o olhar parcialmente para mim — Em nome da minha filha. Não a traia novamente. Se quiser ficar ao lado dela, conquiste as pessoas daqui.

Sinto-me parcialmente aliviado e pressionado. Só consigo pensar que agora posso ficar ao lado de Al. Assinto, agradecendo baixinho ao pai dela. Estagnado, não sei como reagir a tantas palavras tão coerentes e tão rápidas saídas da boca dele. Minhas próprias parecem ter desaparecido. Aceitando a cartada de sorte por ter alguém racional dentro do grupo, retiro-me ás pressas, ansioso por estar ao lado de Al de novo.

Meus pés tocam o concreto no mesmo instante que uma mão pousa no ombro esquerdo, fazendo-me pensar por meio segundo se não acabaram se arrependendo de me deixar ir.

—Você me dá muito trabalho — Lion resmunga empurrando-me para conseguir passar — Melhor ficar bem próximo. Gesabel não é a única que detesta você.

Junto as sobrancelhas. Ignoro-o, tomando o caminho na direção do quarto de Al, apressando-me ao imaginar se ela não teria acordado de novo e pensado que a deixei outra vez.

—Não vai ser tão simples — Lion surge ao meu lado.

Suspiro, finalmente lhe dando a atenção que parece querer.

—O que não vai ser simples?

—Com a Ally.

Semicerro os olhos.

—Ela me salvou.

—É, ela salvou muita gente — Lion aponta para suas costas — Isso não significa que quer todos eles por perto.

Cruzo os braços, esperando que ele diga alguma novidade.

—É diferente.

Lion, na luz fraca do corredor, parece mais pálido e cansado do que imaginava. A viagem, o socorro às pressas ao seu povo, a caminhada infernal até aqui e até a situação. Todos estão cansados em muitos sentidos, nesse quesito consigo me diferir deles. Não estou tão cansado quanto imaginava, a fadiga ainda não me atingiu. Acontecia constantemente em campo, quando era o último a ficar de pé, sem entender como outros poderiam fraquejar tão rápido.

Fecho os olhos, respirando fundo e me questionando o quão idiota e arrogante fui nesses últimos anos.

—Não é. Ally não dá segundas chances.

—Não tem como você saber o que ela sente.

—E nem você. Mas não pode negar que passei mais tempo ao lado da Ally. Conheço partes dela que você nunca nem chegou perto.

Entendo o duplo sentido e imediatamente desvio o olhar, trincando os dentes.

—Você é mesmo um babaca.

—Você também. Melhor se acostumar logo. Vamos passar bastante tempo juntos.

Faço uma careta. Lion segue-me de perto até o quarto de Al. Tomo cuidado para que antes dele entrar ela esteja coberta. Sento-me de volta em meu posto de observação segurando a mão dela tentando ignorar a presença de Lion, sua respiração presa por ser a primeira vez que a vê dessa forma depois do ataque de ontem.

Sei bem o que passa na cabeça dele. Lion não se aproxima mais, encarando de longe. Al faz uma careta e penso em chamar a médica, mas relaxa no segundo seguinte, sem abrir os olhos. Questiono-me se ela vai estar fora de perigo em algum momento próximo, a ansiedade e preocupação corroendo meus ossos.

—Por que acredita em mim? — pergunto quebrando o silêncio assustador no cômodo.

Lion sabe que estou falando com ele. Respira fundo, entrando em um modo diferente dos quais já vi. Vi-o sofrendo quieto, vi-o focado, com raiva e até observei o desespero crescente sem encontrar sua irmã ou sobrinha. Mais do que isso, até a determinação brilhando no olhar dele pareceu semelhante a de Al.

—Tá dizendo que eu não tenho motivos pra acreditar em você?

—E teria?

Lion não responde por alguns segundos. Deve estar formulando algo, o que me deixa ainda mais curioso por ter acreditado em mim logo no início. Viro-me, encontrando o rosto dele baixo, o semblante decepcionado com algo.

—Ally te escolheu. Defendeu com unhas e dentes. Não falou nada nem aos pais, mesmo depois do seu episódio dos soros. Mesmo depois de ver que você mentiu, de te ver matando nosso povo. Ela continuou a te escolher até depois do seu noivado.

Junto as sobrancelhas, o peso do que fiz somado a culpa da traição parece correr tanto quanto a ansiedade e preocupação. Tudo assomando-se em um medo maciço de perde-la.

—E o que isso tem a ver com você confiando em mim?

—Eu a amo —ele ergue o olhar na minha direção — Acredito que ela só escolheu a você e não ao ditador. Não foi traição. Foi... Uma retirada. Al é inteligente. Quero acreditar nela e se ela acredita em você... Sou forçado a fazer o mesmo, por mais que não goste.

E realmente parece desagradá-lo. Volto-me para Al, respirando com dificuldade. Se eu pudesse fazer alguma coisa, qualquer coisa, para parar sua dor já estaria decidido a tal.

—Não sei se ela vai te escolher pra ficar ao lado dela quando acordar — Lion confessa — E sinceramente, eu espero que não.

—Veremos.

—É. Veremos. E se você pensar em trair ela daquela maneira, eu juro que te caço e o melhor que pode acontecer é a sua morte.

—Não precisa me ameaçar — seguro a mão de Al tocando meu rosto — Sou um traidor aos olhos do meu pai. Muito provavelmente ele me quer mais morto do que vocês.

Lion bufa. Volto minha atenção para Al, silenciosamente pedindo que acorde.


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Notas finais do capítulo

Não amigos, eu ainda não desisti dessa história. Digamos que levei tempo aprimorando a ideia de como continuar e peço milhões de perdões por ter demorado tanto. Mas aqui está! Um presentinho de natal.



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