Solo Per Me escrita por Helly Nivoeh


Capítulo 3
Mais sopa de Nico, menos farinha & sem ovos.


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoinhas!
Muito obrigada pelos comentários maravilhosos!
Como essa semana eu tive um problema chamado "crise de ansiedade", não consegui responder todos os comentários. Então, espero que me perdõe por ter demorado um tantinho para respondê-los. Ademais, boa leitura!



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— Eu vou te matar, Nico di Angelo! — Thalia exclamou tentando tirar toda a farinha impregnada no cabelo, desistindo e enfiando a mão na vasilha com mais da substância, virando-se para o melhor amigo.

— É só uma brincadeira, amore mio. — Nico argumentou, dando passos cautelosos para trás.

— Uma brincadeira?!

Ele correu no momento em que Thalia ergueu a mão na direção dele, jogando um punhado de farinha que coloriu ainda mais o piso da cozinha em branco. Ela o xingou e correu atrás de Nico, desviando dos móveis e escorregando algumas vezes.

— Desista, amore, você nunca vai me pegar! — Nico ria, dando a volta nos sofás.

— Não sem quebrar seu pescoço antes! — retrucou, quase o alcançando até que ele corresse para o quarto e fechasse a porta.

Para manter o resto da sua sanidade, Thalia achou melhor não segui-lo.

Um mês era o tempo exato que Nico estava morando ali e as coisas estavam ficando realmente complicadas para a Grace. Não havia lhe ocorrido que morar com Nico e esconder seus sentimentos seria tão difícil: mais de uma vez haviam se esbarrado só de toalha depois do banho ou na cozinha a noite quando Nico desfilava pela casa só de cueca. E, para piorar, havia os sonhos de Thalia que estavam cada vez mais frequentes e realistas depois daquela noite no Dionisiaco.

Aquela noite, aquelas palavras e aquela música. Thalia não entendia nada e tinha medo de entender, quando ele acordou no dia seguinte com cara de ressaca, ela decidiu agir como se tudo fosse fruto do álcool. Mas bastou seus olhos se encontrarem para saber que Nico falou sério.

Thalia suspirou, arrumando a bagunça sobre a mesa o máximo que conseguia, recusando-se a cozinhar naquela imundície. Seus pensamentos voltaram-se para a última vez em que ela e Nico decidiram cozinhar juntos, uma época que ela se deixou levar pelas piadinhas e insinuações dos seus amigos, uma época em que ela acreditou quando disseram que Nico estava apaixonado por ela, uma época que teve seu coração partido.

Thalia estava feliz por faltar uma semana pro aniversário de dezesseis anos de Nico, ele já tinha até a habilitação provisória. Beryl e Maria haviam combinado de passar a noite se divertindo como na adolescência e haviam concordado que Jason e Bianca poderiam ficar de olho nos irmãos mais novos por uma noite, agora que estavam perto de completar dezoito anos.

Para comemorar, eles pediram pizza e Nico e Thalia resolveram fazer cupcakes para comemorar o aniversário do italiano, contudo, o mais importante é que Thalia havia escolhido a data para se declarar.

Ela havia comprado um anel de prata para Nico com pequenas pedrinhas âmbar que oscilavam para o preto, dependendo da luz, como os olhos de Nico.

Eles estavam enfeitando os cupcakes quando Thalia enfiou a pequena jóia na massa de um, cobrindo-o com chantilly vermelho.

— Esse é especial. Pro final da noite. — Havia dito, ao colocar confetes por cima.

Nico sorriu e a beijou na bochecha, como sempre fazia, escolhendo um e o preparando especialmente para Thalia também, dizendo que, no final da noite, ele queria falar à sós com ela.  Quando eles se juntaram a Bianca e Jason para comerem, os dois cupcakes ficaram escondidos na cozinha.

Thalia se lembrava da ansiedade que sentiu naquela noite, do nervosismo por Jason e Bianca não irem dormir — mas o tempo todo incentivando os irmãos mais novos, como se eles fossem bebês — e a hora avançando, enquanto Nico parecia nervoso também. Ele ia se declarar!, era o que ela pensava. Aquela primeira noite longe dos pais ia ser perfeita para isso.

No entanto, Jason e Bianca não ajudavam! Quando ia dar três horas da manhã, Jason ativou seu modo irmão-mais-velho-super-chato e a mandou dormir, dizendo que já era muito tarde. Claro que Thalia não obedeceu.

— Nico, você podia ir dormir. — Jason argumentou. — Assim Thalia vai também.

Felizmente, Nico também era expert em desobedecer Jason.

— Bom, eu vou. — Bianca enfim disse. — Vocês se virem na hora dos mortos.

À contragosto e muitas ordens, Jason subiu para o quarto logo depois, deixando Thalia e Nico enfim à sós.

— Os cupcakes! — Thalia comemorou, correndo até a cozinha e voltando logo depois, com os dois bolinhos na mão. Nico estava sentado no chão com os pensamentos longe quando ela voltou, sua expressão anormalmente séria. Talvez fosse o contrário, a mente dela lhe disse daquela vez, talvez ele só tenha percebido como ela se sentia e ia acabar com tudo.

No entanto, não era nada daquilo. Quando Thalia colocou os bolinhos em cima da mesa e Nico pediu pra falar primeiro, a garota apenas sentiu todos os seus sonhos desmoronarem.

— Minha família vai voltar pra Itália. — Nico havia dito com os olhos marejados. — Isso é uma despedida.

— Você não pode! — Ela se lembrava de gritar, a raiva sendo o retrato de toda a dor que sentia. — Você precisa ficar aqui comigo!

— Eu não posso, Thalia.

A lembrança mais forte era dele lhe chamando de Thalia. Não de amore mio, mia bella ou qualquer outro apelido em italiano, apenas Thalia, como qualquer outro fazia, não como seu melhor amigo. Ele a estava abandonado, não só fisicamente, mas também como amigo. Ele ia embora e ela ficaria sozinha.

Thalia se lembrava de gritar e xingar, se lembrava de pegar o bolinho vermelho, o que havia confeitado e tinha um anel no meio, e o apertar todo, despedaçando-o como sentia que Nico tinha feito com seu coração. Ela jogou os restos do cupcake na parede e saiu correndo para o quarto, trancando a porta e enfim se permitindo chorar, ignorando todos os protestos de Nico, até que Jason quem pedia para ela abrir a porta.

Naquele dia, ela se jogou nos braços do irmão, chorando e tremendo pelo resto da madrugada, arrependendo-se de não ter ido dormir mais cedo como ele havia dito.

Thalia balançou a cabeça, tentando se desfazer da memória. Olhou para a bancada quase limpa e depois para o relógio, sabendo que duas horas para cozinhar com Nico e ainda se arrumar era muito pouco. Em breve os pais de Nico e a família de Thalia estariam batendo na porta do apartamento e, se os encontrassem daquela forma, jamais deixaria de reclamar sobre a decisão deles morarem juntos.

— Nico, sai logo daí! — Thalia reclamou, despejando mais farinha na vasilha. —  Nossos pais vão chegar daqui a pouco pro jantar!

— Você vai me bater! — O italiano gritou de volta, ainda trancado dentro do quarto.

— É claro que não! — retrucou, cruzando os dedos atrás das costas. — Vamos, temos que terminar o jantar!

— Vai se vingar? — Ele perguntou receoso e Thalia já pedia a paciência:

— Se você não sair daí agora, eu vou te pegar e vai ser muito pior!

A porta foi aberta lentamente, rangendo, apenas uma fresta na qual Nico colocou a cabeça pra fora. Ele sorriu malicioso e piscou para ela:

— Vai me pegar, amore mio?

Thalia atirou um copo de plástico como resposta, mas a porta já havia se fechado de novo. Ela tentou conter o sorriso, virando-se para a pia e já descascando algumas batatas, apesar de não fazer ideia de como preparar os pratos que Nico havia escolhido.

Ele queria impressionar os pais, por mais que sua experiência na cozinha não fosse grande coisa. Para isso, havia decidido fazer um grande jantar à moda italiana, que iam desde aperitivos, até a sobremesa com café, passando pelo primeiro primeiro e segundo prato. Thalia, que estava acostumada a pizzas e hambúrgueres, achava tudo aquilo muito estranho.

Ela já estava terminando de picar as batatas quando sentiu mãos passearam por sua cintura, o hálito fresco de Nico lhe causando arrepios e os lábios gélidos pressionando seu pescoço.

— Está mais calma?— Ele perguntou com a voz rouca, pressionando o corpo contra o de Thalia, deixando mais beijos e a acariciando na cintura.

— Você não pode se livrar de tudo assim. — Tentou soar dura, mas tudo o que conseguiu foi conter um suspiro, seu corpo arrepiando a cada toque, um calor familiar se espalhando.

— Assim como? — Ele sussurrou novamente, sua mão infiltrando-se por baixo da camiseta de Thalia, surpreendendo-a. Ele nunca havia feito aquilo antes.

— Você sabe do que eu estou falando. — Thalia suspirou, deixando a faca sobre a tábua, tentando controlar o tremor que se espalhava por seu corpo enquanto Nico subia a mão sorrateiramente, acariciando-a até que os dedos tocassem no tecido do sutiã.

— Eu sei? — Ele questionou rouco, mordiscando-lhe a orelha com cuidado.

— Você sabe o que está fazendo. — A Grace arfou, sentindo sua mente girar quando o polegar do italiano roçou na parte de seus seios exposta pelo sutiã meia-taça. Thalia o sentiu deslizar o nariz, desenhando padrões na nuca dela, enquanto os dedos deslizavam novamente pelos seios, traçando mais desenhos, provocando mais arrepios e calor.

— Sim, Thalia. Eu sei. — Nico sussurrou com o forte sotaque italiano. — E você? Sabe?

Ele lhe deixou um beijo demorado no pescoço enquanto a mão deslizava novamente pelo ventre de Thalia, soltando-a lentamente.

Cínico. Nico di Angelo era um filho da puta cínico, Thalia pensou ao vê-lo ligar o fogão como se nada tivesse acontecido, como se tocá-la daquela forma estivesse na lista de “como tratar sua melhor amiga”.

— Estou em dúvida entre um filé grelhado ao vinho ou um carpaccio, o que acha? — Era óbvio que Nico estava tentando manter o tom neutro, Thalia reparou, mas quando ele virou o rosto na direção dela, suas bochechas estavam um pouco mais rosada que o comum e ele não conseguia olhá-la nos olhos.

Carpaccio¹. — Thalia decidiu, sorrindo de canto como se lhe dissesse “está tudo bem, não vou arrancar sua cabeça por isso. E nem deixar de ser sua amiga. Eu gostei.”. — Acho difícil você queimar carne crua.

Nico lhe respondeu dando língua, mas aceitou a escolha e começou a separar os ingredientes, também pedindo ajuda para decidirem o primeiro prato e os acompanhamentos, enquanto Thalia reclamava que ele deveria ter escolhido isso antes de comprar os ingredientes.

Thalia gostava daquela sintonia deles, da forma como Nico cantarolava — e, às vezes, rebolava sem perceber — músicas pops italianas enquanto cozinhava, fazendo caretas cada vez que provava de molhos que não estavam do seu gosto, ou como xingava cada vez que se queimava. No passado, o máximo que podiam chamar de “cozinhar juntos” havia sido fazer biscoitos e cupcakes, com direito a muita sujeira e terceiro fiscalizando o tempo de forno. Cozinhar aquele jantar era outro patamar.

— Você quer um equipamento de proteção industrial pra cozinhar, Neeks? — Thalia riu, vendo-o levar o dedo indicador aos lábios depois de encostar na panela quente. Ele a olhou de cara-feia, mas a amiga apenas lhe segurou a mão, analisando a pequena queimadura antes de abrir a torneira e guiar a mão do amigo para a água.

— Isso não tem graça. — O rapaz reclamou, vendo-a verificar as panelas e provar dos molhos com um sorriso de aprovação.

— Não, não tem. — Ela sorriu, pegando um punhado de farinha quando ele estava de costas. — Mas isso tem.

Ele se virou, confuso, e no momento seguinte Thalia assoprava a farinha no rosto dele, deixando-o com uma careta e o rosto todo branco. Ela começou a rir ao se afastar, colocando a mesa entre eles:

— Você não deveria ter feito isso, mia bella. — Nico ameaçou, abrindo os olhos lentamente e tirando o excesso de farinha do rosto.

— Só estava me perguntando como você ficaria como gueixa. — Thalia riu, dando de ombros. — Além do mais, você quem me sujou primeiro. É vingança!

— Vingança? — Nico ergueu a sobrancelha, avançando na direção dela pela direita.

— Não pode correr na cozinha com o fogão ligado. — Ela o lembrou, mas Nico não estava correndo: ele sorria como um felino e avançava devagar em sua direção.

— Vingança? — Nico repetiu, parando ao lado da mesa e cruzando os braços. — Você se lembra do que você fez comigo quando éramos criança?

— Eu? — Thalia perguntou confusa, seus olhos estreitos ao se perguntar se aquilo era algum truque de Nico. — Diz das mordidas?

Ela abriu e fechou a boca várias vezes, fingindo preparar-se para mordê-lo, mas o italiano apenas riu, balançando a cabeça. Thalia observou enquanto ele pegava um punhado de farinha com cuidado, esperando que ela não percebesse.

— Não só isso. Na verdade, eu me referia à “sopa de Nico”.

— Sopa de Nico? — Thalia questionou, estranhando o termo, mas não deixando de perceber quando Nico se aproximou com a mão cheia. — Ei, eu estou vendo isso!

— Sem correr na cozinha, lembra? — Nico questionou, avançando rapidamente na direção dela, que só teve tempo de gritar e correr em direção a sala, mandando que ele não sujasse o chão todo. — A comida vai queimar!

Ela gritou, se escondendo no quarto e batendo a porta, com medo que ele a seguisse. No entanto, Nico foi um pouco mais ajuizado e, quando Thalia saiu do quarto, ele já estava organizando a cozinha, reservando a massa alla sorrentina² e guardando o molho do carpaccio na geladeira junto com a salada.

— Ainda somos amigos? — Thalia perguntou, aproximando-se com cuidado, tentada a abraçá-lo e tocá-lo da mesma forma como ele havia feito mais cedo.

— Claro, amore mio. — Ele sorriu, colocando as vasilhas na pia. — Pode pegar a travessa suja pra mim?

Thalia deu de ombros, pegando e levando até a pia, observando enquanto Nico abria a torneira. Antes que ela pudesse perceber o sorriso  malicioso, Nico colocou o dedo sob a torneira, direcionando o jato para Thalia, molhando-a numa fração de segundos.

Ela somente teve tempo de gritar e se afastar, completamente encharcada.

— Eu vou te matar! — Thalia gritou, ouvindo-o gargalhar tanto que precisou se apoiar na pia.

Estreitando os olhos, Thalia alcançou o que restava da farinha em cima da mesa e avançou, jogando sobre Nico novamente.

— Farinha de novo?! — Ele retorquiu, tirando a camiseta preta, e jogando-a no chão. — Você precisa de criatividade, Thalia…

Ele pegou a caixa de leite e virou o que restava, não mais que 100 mls, na cabeça de Thalia, que já desistira de correr.

Ela jogou o cabelo úmido para trás e passou a língua nos lábios, limpando os resquícios de leite, seus olhos azuis brilhando ao encará-lo. Alcançou a pilha de ovos, mas Nico segurou seu pulso antes que pegasse, balançando a cabeça:

— Depois da “sopa de Nico” vai me transformar em um bolo? — Ele replicou, fazendo-a soltar os ovos.

— Ou em um pão doce. — Ela sorriu, lentamente guiando a mão de Nico até o que restava da calda de chocolate, lambrecando os dedos.

Nico ainda segurava seu pulso, mas não a impediu de passar a calda sobre os ombros dele e descer, contornando a linha dos músculos com cuidado e carinho até chegar ao umbigo. Ela traçou o caminho de volta, ainda que não houvesse mais chocolate em seus dedos, tocando-o por todo o tórax até alcançar-lhe o pescoço.

Os olhos de Nico estava semicerrados ao observá-la, as pupilas dilatadas e, nos lábios entreabertos, um sorriso indecifrável. Thalia assistiu enquanto ele passava os dedos pela cobertura lentamente e depois, seus olhos se dirigiram para Thalia, tocando-a com cuidado nos lábios, sujando-os de chocolate.

Ela se aproximou mais, tocando-o sobre as costelas, colando seus corpos e  não se importando que agora ela quem se sujava toda. Ainda que Nico fosse mais alto, Thalia alcançou-lhe o pescoço com os lábios, cada beijo deixando uma marca enquanto seguia até o queixo do italiano, receosa de percorrer mais o caminho, ao passo que queria marcá-lo nos lábios.

— Você sabe o que está fazendo, amore mio? — Nico questionou com a voz baixa, passando seus dedos lentamente pela bochecha de Thalia.

Ela não teve tempo de responder, ou de enfim beijá-lo: o som irritante do celular ecoou no ambiente, dispersando todo o clima.

Nico desviou os olhos, afastando-se enquanto Thalia pegava o celular esquecido sobre o balcão, xingando Bianca assim viu o nome no visor.

— Hey. — Thalia murmurou, tentando não soar tão abalada quanto estava, colocando o celular no viva voz.

— Lia, Leo vai jantar com a gente. — A Di Angelo comunicou. — Coloca mais um prato na mesa.

— Mas já, sorella? — Nico questionou, sua voz soando ainda mais rouca que o comum. — Estão nesse nível?

— Não sou como alguma pessoas que demoram dez anos pra decidir o que quer! — Bianca retrucou e Thalia ouviu a risada de Leo ao fundo. — Mamma disse que vai chegar às sete, então prepare o coração dela pra conhecer o Leo. Ainda não contei nada pra eles!

— Tudo bem, Bia. — Nico concordou, parecendo ansioso para desligar. — Mais alguma coisa?

— Está com pressa? — Bianca implicou. — O que estavam aprontando?!

— Temos que terminar o jantar. — Nico resmungou e Thalia olhou para o relógio, se surpreendendo que teriam menos de uma hora para se arrumar e arrumar a casa.

— Por acaso Thalia estava fazendo “sopa de Nico” de novo? — Bianca acrescentou com um tom malicioso. — Soube que as roupas dão um gosto bem amargo, mas aposto que tiraram...

— Nós não passamos a tarde nos agarrando como você e Leo. — Nico retrucou, mal humorado.

Não exatamente”, Thalia pensou, terminando de colocar as louças na pia e dando uma rápida olhada no que restava da bagunça, suficiente para Nico limpar enquanto ela tomava banho. Depois poderia organizar a mesa de jantar direito.

— Deveriam tentar, é bem divertido. — Bianca implicou, e Thalia lançou um olhar para Nico que estava mais vermelho que o normal.

— Então vá se divertir, sorella. — Ele retrucou, desligando o celular sem se despedir.

Thalia apertou os lábios, sem saber muito como encará-lo, decidindo ir pelo caminho familiar de “por ora vamos fingir que isso não aconteceu”.

— Estou ficando bem curiosa com essa “sopa de Nico”. — Thalia comentou, tentando agir normalmente.

Nico riu, ainda um pouco vermelho e com o pescoço salpicado de chocolate na forma de beijos.

— Só um minuto. — O italiano replicou, sumindo no quarto enquanto Thalia terminava de lavar a louça. Quando ele voltou, segurava nas mãos o notebook, colocando sobre a bancada. — Bianca e eu estávamos procurando vídeos constrangedores de Jason pro casamento. E encontramos alguns bem legais.

Thalia se recostou no balcão, observando a tela se iluminar em um vídeo antigo, exibindo Thalia e Nico por volta dos seus dois anos.

O pequeno Nico chorava e isso não era nenhuma surpresa, nem mesmo Thalia puxando os brinquedos da mão dele, com ciúme das suas coisas. Ele balbuciava em italiano, tentando pegar de volta e, quando Bianca se aproximou, ele murmurou em sua linguagem de bebê italiano chorão que Thalia tomava tudo o que ele pegava.

Bianca tomou as dores do irmão e puxou os brinquedos de Thalia, entregando-os a Nico que sorriu animado, até ver Thalia começar a espernear querendo avançar nele. Pra variar, eles só pararam quando Maria interviu e os convenceu a brincarem juntos.

A pequena Thalia aceitou a ideia, pegando diversas comidas de plástico e depois olhando para Nico, os olhinhos azuis brilhando em uma ideia suspeita. Ela deixou os brinquedos caírem e virou a grande bacia vermelha que continha todos os outros brinquedos, espalhando-os no chão.

Ela se virou para Nico, mandando ele entrar na bacia e apontando para lá, até que o puxou pela mão e o fez entrar e se sentar na bacia.

— Comida. — Thalia balbuciou, pegando uma faca de brinquedo e um milho de plástico, mandando Nico descascar e parando agachada na frente dele, enquanto o italiano olhava os brinquedos em suas mãos sem saber o que fazer. — Casca!

Ela ordenou de novo, pegando nas mãos dele e fazendo o movimento de descascar com a faca, até que ele entendesse e fizesse sozinho. Ela sorriu e pegou uma cenoura de plástico, fingindo também descascar e depois jogando na bacia com Nico dentro. Ela pegou novos vegetais e juntos foram “descascando e cortando”, enchendo a bacia de Nico e legumes.

— O que você está fazendo, Thalia? — A voz de Maria soou ao fundo do vídeo, abaixando-se perto das crianças que cortavam o último tomate.

— Sopa de Nico. — Thalia respondeu simplesmente, levantando-se como se explicasse tudo e pegando um caneco de plástico.

Nico começou a rir, jogando os brinquedos para cima, adorando fazer parte de uma comida mirabolante de Thalia Grace.

E, então, a pequena aparecia de novo, equilibrando o caneco precariamente, água e folhas derramando a cada passo que ela dava. Antes que alguém pudesse impedir, Thalia derramou todo o “molho” sobre a cabeça de Nico que apenas a olhou assustado antes de começar a chorar de novo. O vídeo terminava com Maria dando uma bronca na menina que apenas fazia um bico, argumentando que era “sopa de Nico”, como se explicasse tudo.

Talvez eu fosse um pouco custosa quando pequena. — Thalia concordou rindo quando o vídeo terminou e ela encarou Nico limpando o chão entre a pia e a mesa. — Mas pelo menos eu não te mordi dessa vez.

— Só porque não teve tempo de me provar, amore. — Ele sorriu malicioso e abriu a boca para completar, mas desistiu.

— Talvez eu devesse fazer outra sopa de Nico qualquer hora. — Ela revidou o flerte diante da hesitação dele.

— Acha que já estou temperado o bastante para tentarmos agora? — O italiano replicou, gesticulando para o tórax repleto de chocolate.

— Preferiu você salgado, querido. — Thalia riu, fechando o aplicativo de reprodução no computador e reparando que havia um vídeo intitulado “primeiro beijo Thalico”. Fez uma nota mental de verificar depois.

— Falando nisso, vou tomar banho, pode ficar de olho no fogo? Não quero que as batatas queimem.

— Ah, não, eu vou primeiro. — Thalia resmungou. — Olha o estado do meu cabelo que alguém jogou leite e farinha!

— Eu estou mais sujo. — Nico argumentou.

— E eu estou ensopada! — Thalia olhou pro próprio corpo, onde a camiseta molhada delineava cada curva que tinha. — Vou acabar doente e você vai ter que passar a madrugada cuidando de mim!

— Mas eu tenho que terminar a janta. — O italiano replicou. — E eu estou sendo avaliado por meus pais, quer que eles me arrastem pra Veneza? Minha mãe é capaz de obrigar o presidente a me deportar!

Thalia apertou os lábios, procurando mais algum argumento e não encontrou. Olhou para a porta do banheiro e para Nico, formando um plano trapaceiro.

— É, só que eu sou mais rápida!

Antes que ele pudesse reagir, Thalia correu para o banheiro, trancando a porta em seguida.

— Você vai se arrepender, amore mio. — Nico sibilou. — Mais cedo do que imagina!

Thalia só entendeu o quão cedo isso seria quando desligou o chuveiro e foi pegar a toalha que não estava lá. Se xingou, ao pensar que ela mesma havia tirado para lavar mais cedo e agora ela estava nua, no banheiro, com Nico na sala ou na cozinha, dois locais em que ela teria que passar até chegar no quarto.

Engolindo o orgulho, abriu uma pequena fresta da porta, encontrando-o sentado de frente pra porta do banheiro, o corpo apoiado no balcão e um sorriso vitorioso como quem sabia exatamente o que estava acontecendo.

Neeks, pega minha toalha pra mim? — Ela pediu, adocicando a voz e percebendo que o sorriso de Nico de tornava ainda mais malicioso.

— Não. — Ele replicou simplesmente, cruzando os braços sobre o peito ainda nu.

— Por favor. — Thalia suplicou, fazendo um bico e o Di Angelo apenas meneou a cabeça.

— Ninguém mandou trapacear. Se tivesse esperado, eu poderia dizer que estava sem toalha, mas agora vai ter que sair daí nua.

— Nico! — Thalia protestou, observando o maquiavélico amigo apenas virar de costas, ainda sentado no banquinho. — Você realmente vai fazer isso comigo?

No entanto, Nico apenas a ignorou, tomando uma xícara de café como se estivesse sozinho.

— Você realmente vai fazer isso com sua melhor amiga? — Fez um muxoxo que foi ignorado, assim como a sequência  de pedidos e xingamentos, até que ela desistisse. — Tudo bem, você venceu. — suspirou, cansada. — Não olhe!

Com o resto de coragem que tinha, abriu a porta do banheiro, tentando se tapar com as mãos, por mais que Nico sequer havia se movido, ainda de costas.

— Sua toalha está na maçaneta de fora. — O italiano falou calmamente depois que Thalia deu dois passos.

Ela suspirou, pegando a toalha vermelha e se enrolando, sorrindo de canto em seguida.

— Sabia que não ia ser tão mau. — Thalia riu, caminhando até ele, mesmo com o corpo molhado, e deixando um beijo na bochecha de Nico, que ainda estava de costas.

— Não achei que ia sair nua.

— Eu sabia que você não ia olhar.

— Por que eu não olharia? — Nico questionou, seus olhos ônix brilhando maliciosamente ao se virar para ela. — Acha que eu não queria?

Thalia sentiu um arrepio, os fios úmidos roçando nos ombros nus de Nico quando o beijou novamente na bochecha.

— Talvez. — Pontuou, sentindo suas bochechas queimarem. — Mas você é meu melhor amigo. Eu confio em você.

Nico abaixou o olhar, também envergonhado e Thalia lhe bagunçou os cabelos polvilhados de farinha.

—  Agora vá tomar seu banho, ainda temos um jantar pra terminar.

 

(...)

 

Thalia deixou os Di Angelos e Leo se despedindo na sala e rumou para a cozinha, organizando a pia o melhor que pode, tentada a deixar a bagunça pro dia seguinte.

O jantar havia sido melhor que esperava — apesar da massa ter cozinhado um pouco mais e os pratos não combinarem exatamente — e, a melhor parte, é que o foco das conversas não foi Thalia. Como Jason e Piper estavam presentes, havia muito a se falar dos preparativos para o casamento iminente, ao mesmo tempo que os Di Angelo pareciam interessados em interrogar Leo e, talvez, torturá-lo mentalmente.

Mesmo o fato de Nico ter decidido ir pra Los Angeles não foi tão comentado, apenas Maria opinou que estava feliz por Thalia poder cuidar de Nico, parecendo mais feliz do que quando o filho ia ficar sob os cuidados da meia-irmã mais nova.

Só houve um infortúnio, um pequeno detalhezinho que ecoava na mente de Thalia, deixando-a um pouco melancólica. Quando Bianca apresentou Leo, deixou claro para os pais que estavam em um relacionamento, ao passo que retorquia que não era como Nico e Thalia, que não era de protelar sentimentos, quando seus pais alegaram que o namoro era muito repentino.

Isso havia causado risos na mesa, porque era uma brincadeira comum, mesmo que Thalia e Nico sempre se sentissem constrangidos. Não era como se Thalia tivesse escolhido aquela “friendzone”, como chamavam. Longe disso.

Havia se preparado para se declarar há uma década, quando assumiu seus sentimentos para si e se viu pronta para tentar algo mais. No entanto, aquela noite havia resultado em um coração e um bolinho despedaçados, junto com um anel escondido no fundo da gaveta.

E sobre tentar novamente… Qual sentido faria se declarar para Nico quando ele estava na Itália? Eles já eram melhores amigos e ele a tratava como uma namorada, com atenção e apelidos especiais, o que ficava de fora era apenas o contato físico mais íntimo de beijos e até sexo.  E, se admitisse para Nico que estava apaixonada por ele e ele retribuisse, daria no mesmo: Não poderiam se tocar com um oceano de distância.

Então, qual o sentido de se declarar? Viver de beijos uma vez por ano? Trocar o status no Facebook? Usar uma aliança apenas para mostrar aos outros?

Sem falar, é claro, na assustadora possibilidade dele não sentir o mesmo e tudo se tornar estranho.

Era melhor que fossem melhores amigos enquanto Nico di Angelo estivesse na Itália.

Mas ele não estava mais lá.

— O que pensa tanto, mia bella? — Nico perguntou baixo, assustando-a com a presença sorrateira na cozinha. — Te assustei?

Ela assentiu, limpando os dedos no pano de prato e se virando para ele.

— Achei que estivesse com seus pais.

— Eles estão torturando o Valdez mais um pouco. — Nico sorriu diabólico, aproximando-se o suficiente para colocar um fio dos cachos de Thalia atrás da orelha. — Algo me diz que minha irmã vai mudar pra cá logo-logo.

— Ou Leo pode ir pra lá. — Thalia comentou, sentindo sua mente girar com o vinho que havia tomado e o olhar de Nico sobre si. — Eles estão apaixonados.

Nico sorriu, concordando e fechando os olhos em seguida, parecendo cansado.

— O que foi, meu amor? — Thalia sussurrou sem pensar, tocando-o no rosto com um afago.

— Achei que minha mãe ia me arrastar pra Veneza. — O italiano confessou, pressionando o rosto como se  pedisse mais carinho. — Sabe como ela é super protetora.

— Tia Maria sabe que vou cuidar de você. — Thalia sorriu ao lembrar da aprovação da italiana e também de Beryl com a notícia. — Assim como minha mãe sabe que você vai cuidar de mim. Talvez com algumas sopas de Nico ou mordidas pelo caminho, mas…

Nico sorriu, enfim abrindo os olhos e a encarando. Ele tocou o queixo de Thalia e deslizou os dedos até a nuca dela, aproximando mais seus rostos, a outra mão segurando a cintura dela.

— Você confia mesmo em mim, Thalia? — Nico perguntou em um tom rouco, a luz fraca sobre o balcão iluminando parcialmente o rosto de Nico.

— Mais do que tudo. — Ela concordou, acariciando-lhe ainda na face, sua mente inebriada de sentimentos e vinho. — Eu não deixaria ela te levar de novo. — Acrescentou num sussurro. — Não sem mim.

Nico sorriu e fechou os olhos novamente, puxando-a para um abraço apertado. Thalia afagou os fios negros de seu cabelo, sentindo ambos os corações acelerados e o perfume de Nico misturado ao cheiro do vinho, algo que havia sentido falta por uma década.

Nico di Angelo estava ali agora e ela não iria deixá-lo se afastar, também não iria se afastar.

Iriam se aproximar mais, do jeito deles, no ritmo deles. Afinal, todos diziam que viviam em um mundo próprio e eles tinham o direito de ter suas próprias regras.

Quando Nico se afastou, ainda a olhando nos olhos, Thalia se lembrou do pequeno anel de prata em seu bolso, o anel que iria lhe dar há dez anos. Ela suspirou e alcançou a pequena jóia, estendo-a para Nico, algo que já estava planejado desde cedo.

— O que é isso? — Nico questionou, analisando-o antes de pegar. Os dedos de Nico ainda eram um tanto finos para os padrões masculinos, mas não tão finos quanto era aos dezesseis, então o anel só lhe serviu em um dedo de cada mão, o anelar.

Ele sorriu, da forma como sorria quando sabia que Thalia lhe escondia algo que só mais tarde ele descobriria. Ela se pôs na ponta dos pés e lhe deixou um beijo na testa, como ele costumava fazer.

Quando seus olhos se encontraram de novo, Thalia sorriu, segurando-lhe as mãos.

— Bem-vindo de volta, Nico di Angelo.


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Notas finais do capítulo

Postado enquanto faço miojo pra entrar no clima.
¹ Carpaccio: Prato típico italiano feito com carne crua. Fonte: https://sobreitalia.com/2008/09/02/carpaccio-receta-italiana/
² Massa Alla Sorrentina: Uma massa com extrato de tomate e muçarela de bufala. Fonte: http://saboresdaitalia.com/massa-alla-sorrentina/
Tema da terceira semana: A primeira vez que cozinhamos juntos.
Tentar fazer uma sopa com seu melhor amigo vale? Eis a questão. De qualquer forma, essa foi a primeira vez que eles quem cozinharam, não só fizeram a massa e alguém terminou de assar. Então tá valendo, né?
Aviso:
Crianças, cuidado ao jogar farinha no rosto das pessoas: Isso pode machucar os olhos. Cuidado também ao cozinhar, correr pela casa ou implicar com seu melhor amigo, isso pode causar danos irreparáveis principalmente se feito juntos.
Ademais, vou comer meu miojo. Alguém aceita?
Até os comentários!

Edit: Deu tanto erro na hora de postar que meu miojo já esfriou :(