O Despertar escrita por Nani Milani


Capítulo 3
Capitulo 3




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Um sonho ruim pode ser fajuto, ao ponto de tirar sua energia para um dia inteiro. Um sonho ruim, seguido de “temos aula hoje”, conseguia ser ainda pior. Após ser acordada a chacoalhas, levantei-me rapidamente e tentei me recompor para a saga de tortura. Tomei um banho corrido. Prendi meus cabelos secos em uma trança lateral e mesmo não gostando muito de maquiagem, tapeei minhas olheiras com base e cobri meus lábios de gloss labial, fazendo com que o cheiro de menta, exalasse pelo meu nariz.

Pronta a parecer, desci as escadas e todos me esperam na sala. Sem fome, recusei o café da manhã e seguimos para o centro de concentração.

Não precisamos estacionar os dois carros, para que a atenção se virasse para nós e isso, como em todas as outras vezes, me incomodava. Demorou anos para que eu não me intimidasse com olhares da minha família – imagine com olhares tortos de estranhos. Às vezes, seria bom poder ler pensamentos como Edward, para saber o que eles pensavam ao nos encarar. Seria algo útil, diferentemente do meu dom, sendo que eu mal conseguia falar sobre meus sentimentos – imagine mostra-los para alguém.

— Nessie? – Ouvi Alice chamar ao fundo, enquanto eu rondava pelos meus pensamentos e encarava o nada. – Nessiiiie, heeeey?

— Oi Alice. – Retruquei calmamente, ao sair de minha mente. – Desculpe-me, eu estava distante.

— Lhe perguntei, qual é sua primeira aula.

— Ah sim. – Peguei minha bolsa e comecei a caçar o papel que havia dobrado, quando Edward me entregou no carro. - Álgebra. – Isso não pode ficar pior. Pensei.

— Oh não. – Ela se chateou.

— O que houve?

— Acho que você ficara sozinha a primeira aula. – Jasper se intrometeu, ao se aproximar e passar o braço comprido, pelo pescoço de Alice.

— Retiro o que eu disse. – Bufei. – O dia definitivamente poderia ficar pior. – Passei a mão pelos olhos e os esfreguei com os dedos, provavelmente, tirando de minha pele uma camada, da base que havia passado.

— Parem de estorva-la. – Bella pediu enquanto colocava as mãos em meus ombros. Mesmo agasalhada, podia sentir sua mão congelando o tecido de minha roupa. – Não vai ser tão ruim assim, é uma escola pequena, não possui muitos estudantes e isso facilitara nossa adaptação. – Ela tentou ajudar.

— Vamos acabar logo com isso. – Me convenci, arrumando a mochila novamente em minhas costas.

Após adentrarmos a escola, Edward e Bella me acompanharam até a sala de aula e se despediram na porta. Enquanto todos estavam em seus devidos lugares e eu estava perdida, perto do quadro negro, enquanto o professor se levantava, para me receber. Ele era de um tom moreno, com o cabelo cotiado e os lábios carnudos, que contrastava perfeitamente com seus olhos profundos, seu blazer aberto e a gravata listrada em seu colarinho.

— Bom dia. Sou o professor Joseph. – O saudou ao esticar sua mão, para me cumprimentar, com um enorme sorriso branco estampado em seu rosto.  – Você deve ser a Renesmee Cullen. Nome interessante.

— Bom dia, prazer. – Retruquei ainda receosa pela temperatura de sua pele, que diferentemente da de minha família, era idêntica a minha. – Minha mãe quis combinar o nome dela e da minha avó... – Menti, com o intuito de não quebrar o disfarce de Esmee como minha mãe. – Acabou saindo isso.

— Bom, seja bem vinda. Tem um lugar ao fundo, se não se importar. – Ele apontou para o fundo da sala e eu segui sua mão com o olhar. O que me fez reparar em como as pessoas me encaravam.

— Está ótimo, obrigada.

Entre as carteiras, segui até o lugar marcado pelo professor e em minhas costas escutei Antony, dar início a aula. Ao sentar em minha mesa, me concentrei para não escutar o que as outras pessoas diziam sobre mim – afinal, o que os olhos não veem o coração não sente.

Em minha frente estava sentada uma garota. Seus cabelos eram tão compridos e castanhos quantos os meus, porem menos cacheados e avermelhados. Ela batia constantemente a caneta em sua mesa, o que a fez trincar a ponta cristalizada. Parecia ansiosa, como se esperasse qualquer oportunidade para fazer algo que a fazia suar. Não puxe assunto comigo, por favor. Pensei. Mas era tarde demais, ela se virou gentilmente e com um sorriso no rosto me cortejou.

— Oi... – Ela gaguejou de inicio. – Sou a Crystal, Crystal Morgan. – Seus olhos eram azuis e pareciam brilhar por baixo de seus óculos. 

— Renesmee Cullen. – Retruquei com um sorriso esguio.

— Então você é nova aqui. Deve estar sendo difícil se adaptar com o tempo.

Tempo. Uma ótima maneira de puxar assunto, quando se quer saber mais coisas. Olhei para a janela e estanhei ao não ter percebido que havia voltado a chover.

— Na verdade já estou acostumada.

— Melhor assim, as pessoas que se mudam pra cá, geralmente demoram a se adaptar. – Sem respostas ou perguntas de volta, ela sorriu sem graça. – Bom, se precisar de alguma coisa, pode me procurar.

— Obrigada. – Agradeci contente, pelo fim da conversa.

Felizmente, alguns minutos depois ela se virou para frente e voltou a escrever em seu caderno. Respirei aliviada e assim comecei a copiar os exercícios da lousa. Não que eu não quisesse fazer alguma amizade um dia, mas geralmente a maior parte das pessoas que entravam em nossas vidas, acabava de alguma maneira totalmente prejudicada.

Conforme as horas iam passando, a manhã ia ficando mais tranquila. Talvez ter alguém familiar nas outras aulas tenha ajudado um pouco, mas contudo, não foi uma manhã tão ruim.

Saímos da escola, pouco depois das duas da tarde e chegamos em casa minutos depois, por conta dos pés pesados nos acelerados.

Era bom estar em casa novamente.

Adentramos a casa e como sempre, a mesma estava silenciosa.

— Nessie. – Ouvi Emmett me chamar, antes que eu pudesse subir as escadas e me esconder em meu quarto. – Vamos jogar pôquer essa noite e precisamos de alguém para dar as fichas. – Ele brincou. – Você está dentro?

— Claro. – Respondi animada. – Será uma honra acabar com você, se quiser algumas dicas, estarei no meu quarto.

Todos riram.

Subi as escadas até meu quarto e joguei-me na cama, com o intuito de rever os episódios perdidos na noite passada. Tentando me espreguiçar, ajoelhei-me no colchão e estiquei meus braços para cima – como sempre a rainha do desastre – bati minhas mãos na prateleira e deixei cair sobre minha cabeça, uma caixa cheia de ursos de pelúcia, que havia vindo junto à mudança. Entre eles, estava o senhor Astrid, um dos meus ursos favoritos, que ganhei no meu aniversário de sete anos.

Vivendo toda aquela nostalgia, percebi que agora não precisava mais daqueles ursos – tirando o Sr. Astrid – e que talvez, outra criança estivesse precisando de algo para compartilhar seus segredos.

Rapidamente, levantei-me da cama com a caixa nas mãos e desci as escadas.

— Pai. – O chamei, enquanto o procurava pela casa.

— Nessie. – Ele retrucou calmamente, saindo por um dos cômodos no corredor.

— Achei isso no meu quarto.

— Ah sim. – Ele guardou a caneta que segurava nas mãos, no bolso e cutucou a caixa. – Fui eu, quem deixou lá, achei que iria querer guardar de recordação.

— Devem existir crianças, que iram fazer melhor uso, do que eu.   

— Agora preciso terminar de ajudar Carlisle com algumas coisas no escritório, mas mais tarde, posso te levar em algum lugar para deixarmos.

— Na verdade, estou sem fazer nada agora, posso pegar o carro e ir, afinal, a cidade não é muito grande.

— Tem certeza de que quer ir sozinha?

— Sim.

— Tudo bem, só não volte tarde, o jogo começara cedo hoje.

— Okay. – Concordei.

— As chaves estão na garagem, não desligue o celular.

— Entendido.

Coloquei a caixa no banco de trás do Volvo e tirei o carro da garagem. Ainda era estranho dirigir sozinha, mesmo tendo tirado carta de motorista há alguns anos. Geralmente, nós não nos separávamos. Na verdade era quase raro não ter alguém por perto para me vigiar ou me proteger do meu lado negro – humano – da família.

Pisei no acelerador e peguei a rota direta para o centro da cidade. Liguei o som do carro e em seguida o GPS, para tentar localizar a igreja central. Alguns minutos mais tarde, encontrei a pequena capela e entreguei a caixa para uma freira. Naquele momento, ganhei meu dia por completo. Saber que estaria fazendo uma criança feliz, havia enchido meu coração novamente.

Animada, montei no carro e escutei meu estomago roncar. Um cappucchino quente e alguns bolinhos, seria a opção perfeita para tapear minha fome, até a janta. Procurei por alguns trocados no carro – já que havia esquecido minha bolsa em casa – e estacionei um pouco mais a frente, a frente de uma lanchonete.

Desci do carro e segui diretamente até o balcão. Sentei-me na banqueta e esperei alguém me atender.

— Boa tarde, em que posso ajuda-la? – Perguntou a senhora atrás do balcão.

— Gostaria de um cappucchino para a viagem e um bolinho com recheio de chocolate. – Respondi, enquanto apontava para a imagem no cardápio.

— Vai comer aqui, ou é para a viagem.

— Vou comer aqui. – Retruquei.

Ela terminou de anotar o pedido em um bloquinho e adentrou a porta que abria para os dois lados, deixando por alguns segundos em amostra a cozinha interna.

Esperei meu pedido, lendo um PDF de um livro em meu celular. Talvez a fome, ajudasse para que isso acontecesse, mas o segundos pareciam como uma eternidade. Algum tempo depois, a senhora voltou com o copo térmico e descartável, e o bolinho em um prato.

— Aqui está. – Ela sorriu gentilmente. – Bom apetite.

— Obrigada.

Ansiosa para dar a primeira mordida, na massa fofa e suculenta, senti meu celular vibrar. Ao olhar a tela, vi a chamada de Bella.

— Oi. Onde você está? – Perguntou ela, depois de atender.

— Deixei as coisas em uma igreja e agora estou tomando um café, em uma lanchonete aqui perto.

— Uns amigos estão vindo para jogo, será que teria como você vir agora?

— Sim, claro. – Concordei, descordando internamente.

— Perfeito. Não demore.

— Tudo bem.

Chateada, paguei o que devia, enrolei o bolinho em um papel e peguei o copo com a outra mão. Ao atravessar a porta de entrada, senti o líquido quente escorrer pela minha blusa, após sentir o impacto de alguém contra meu corpo. No momento, não soube o que me deixou mais irritada: o líquido queimando a minha pele aos poucos ou saber que não teria mais algo para acompanhar meus bolinhos, bolinhos que no momento com o susto, caíram ao chão.

— Que droga! – Exclamei, enquanto tentava secar minha blusa com a manga comprida.

— Por favor, me desculpe! – Escutei a voz calorosa do rapaz, que vinha um pouco mais acima de minha cabeça.

Querendo fazer a pessoa se sentir culpada por me deixar faminta, levantei minha cabeça e tentei olhar no fundo de seus olhos, o olhar que parava de sua feição. Seus olhos eram escuros, assim como o tom de seu cabelo. Sua pele era bronzeada e parecia contornar os músculos de seu corpo, que iriam rasgar a camiseta de manga curta, que ele usava.

— Está tudo bem. – Retruquei desanimada, não querendo ser tão rude.

Mas ainda, seus olhos estavam vidrados em mim.

— Qual o seu nome? – Ele perguntou pasmo, como se estivesse vendo um fantasma.

— Eu preciso ir agora. – Afastei-me irritada.

— Não, não! – Pediu ele ao segurar meu pulso. Sua mão era quente, como se estivesse em estado febril.

— Me solte agora! – Pedi assustada, com medo do rumo que aquilo poderia levar.

— Me desculpe, mas, por favor, deixe-me lhe pagar outro café.

— Fique longe de mim. – Puxei meu braço e acelerei os passos até o carro.

Ainda chocada com o que havia acontecido, travei as portas do carro e passei por ele, que ainda estava paralisado na rua. Sem pensar muito, pisei novamente no acelerador e segui para casa. 

 


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