Os Cuecas e as Chiquititas escrita por SnowShy


Capítulo 59
Forçando a barra




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Quando chegou em casa, Eleanora já estava se sentindo culpada pelo que havia dito a Sandy na escola, mas se sentiu ainda mais culpada quando viu a tia e se lembrou de que não havia pedido permissão nem avisado a ela que ia pra casa dos meninos. Não levou bronca, apenas um discurso parecido com o que Janete ouviu na vez em que fez a mesma coisa. Esta, no momento, estava estudando no quarto, tão concentrada, que nem ouviu nada. Sandy, por sua vez, apareceu na sala na hora. 

Apesar de ainda estar com um pouco de raiva da irmã, ficou atenta para ver como Flora a tratava. Sandy era a única das Chiquititas que a tia não tinha coragem de corrigir, já que foi a que mais relutou para aceitá-la de volta. E, após ver que a menina as observava, decidiu finalizar a conversa com Eleanora e deixá-las a sós para que fizessem as pazes.

A pequena não reparou a postura da irmã em relação à tia, apenas começou a dizer o quanto estava arrependida e pedir desculpas.

— Você precisa entender que eu só falei aquelas coisas porque eu tava com raiva, não é o que eu penso de verdade! Eu adoro ser sua irmã, você e a Janete são pessoas mais importantes da minha vida!

Eleanora estava tão fofinha, que toda a raiva que Sandy sentia sumiu na hora, ela a desculpou e as duas se abraçaram.

 — Pode ficar tranquila, que eu não vou tentar mudar o seu penteado de novo! — Disse a mais velha.

— Ainda bem!

As duas riram, mas, em seguida, Sandy ficou séria e disse:

— Mas só pra você saber, eu não queria transformar vocês em "cópias" minhas. Eu só sugeri a mudança porque achei que tava fazendo uma coisa legal.

— Tudo bem, eu entendo.

— Se você não quer, tudo bem. Mas a Janete quis mudar porque... ah, se você quiser saber, é melhor ela mesma te contar.

— É, eu tava mesmo pensando em perguntar isso...

Quando chegaram no quarto e viram que Janete estava estudando pra olimpíada de matemática, Eleanora pensou que talvez ela não tivesse mudado tanto assim, apenas por fora mesmo. Janete ficou muito feliz ao saber que as irmãs haviam feito as pazes e perguntou o porquê da briga, o que levou a mais nova, após elas contarem tudo, a perguntar o porquê da mudança de Janete. Esta explicou que se achava feia e Sandy tentou ajudá-la a aumentar sua autoestima. 

— Entendi... — disse Eleanora. — Nesse caso, foi legal mesmo o que você fez, Sandy! Mas, Janete, tem algum motivo específico pra você ter começado a se preocupar com a sua aparência assim do nada?

Janete ficou meio sem graça, mas admitiu que tinha a ver com Samuca e com o fato de ele gostar de uma menina "mais bonita que ela".

— Credo, Janete! — Exclamou a mais nova. — Eu não acredito que você só ficou com essa paranoia por causa de um garoto. Ainda mais o Samuca, que nunca foi superficial... e que gostava de você do jeito que você era. Até porque você nunca foi feia, né?

— Pois é, eu falei isso pra ela! — Disse Sandy. Então, voltando-se pra Janete, falou: — Mas eu acho que... talvez o que eu fiz não tenha sido assim tão bom, porque eu fiz parecer que você precisava de acessórios e todas essas coisas pra ficar bonita... sendo que eu nem sei se você gosta...

Janete demorou um pouco pra responder, já que não tinha tido coragem nem de admitir pra si mesma que não havia gostado tanto da mudança, mas acabou dizendo que era muito desgastante ter que acordar tão cedo pra se arrumar e se olhar no espelho a cada cinco minutos na escola. A sensação de ser especial acabava ofuscando essas coisas, mas ela realmente preferia deixar pra se arrumar tanto só quando tivesse algum evento importante da banda.

— É uma boa decisão. — Disse Sandy. — Mas, por favor, não esquece de pentear o cabelo todo dia!

Janete riu e prometeu que não esqueceria mais.

— Ah, e você também podia usar o secador de cabelo depois que lava, né?

— Ah, isso, não! Já existe o vento natural, pra que eu vou gastar energia?

— É, a nossa Janete tá de volta! — Exclamou Eleanora, e as irmãs riram.

— Mas tem mais uma coisa. — Sandy voltou a falar com Janete. — Você tem que parar de ficar se achando feia, dizendo que outras meninas são mais bonitas que você.

— A Sandy tem razão. — Concordou Eleanora. — Você tem que entender que só porque o Samuca começou a gostar de outra pessoa, não significa que ela é mais bonita do que você... Você já parou pra pensar que talvez ele só goste dela agora porque você deu um fora nele?

Janete disse que entendeu o recado das irmãs e resolveu parar de se preocupar com essas coisas. Ela percebeu que não adiantava tentar mudar quem era por causa de Samuca, até porque, ele pareceu prestar menos atenção nela depois da "transformação"...

Depois que a questão de Janete foi resolvida, Eleanora começou a falar com Sandy sobre Joaquim, pra ela também parar com paranoias de ciúmes e voltar a falar com ele. Janete ainda nem sabia que eles tinham brigado, mas quando ouviu o que aconteceu, ficou do lado da irmã mais nova. Mas, infelizmente, Sandy é uma pessoa bem mais inflexível do que Janete...

***

Joaquim estava entediado porque não tinha nada pra fazer no fim de semana. Não tinha nenhum evento da banda, nenhuma programação divertida e nem mesmo alguma coisa urgente da escola pra semana seguinte (com o tédio que sentia, até isso era capaz de deixá-lo animado!). Davi e Samuca estavam ocupados e teriam compromissos. O primeiro se encontraria com Clarinha e sua amiga de escola (e os meninos notaram a falta de animação dele pra isso). O segundo estava trabalhando num projeto misterioso e depois sairia com Bel no domingo, tinha convidado a garota por telefone, mesmo, na sexta à noite. Joaquim percebeu que estava errado em querer impedi-lo, afinal, isso acabou trazendo problemas com Sandy, então preferiu não dizer nada a respeito. Porém, admitir para si mesmo que estava errado era uma coisa, mas confessar isso à namorada era demais pra ele. Preferia que ela reconhecesse primeiro o quanto estava sendo ciumenta.

Téo tentou resolver o problema do fim de semana chato sugerindo que ele e Joaquim fizessem alguma coisa com as Chiquititas, mas este não concordou de jeito nenhum. Disse que Sandy não gostava mais dele e que não queria ficar perto dela.

— Você tem sorte, Davi. — Disse o menino. — A amiga da sua namorada pode ser chata, mas pelo menos ela não é...

Com esse comentário, Davi pensou que estava certo em achar que seu filho não tinha maturidade pra namorar. Pelo jeito, aqueles dois não iam parar com as briguinhas bobas tão cedo... O lado bom é que eles sempre fazem as pazes no final. Então era só esperar que a raiva de ambos passasse.

Por outro lado, o homem estava um pouco preocupado com Samuca. Ele andava meio estranho e ia sair com essa menina... Davi não tinha nada contra ela, afinal, nem a conhecia, só sabia que Joaquim também já tinha saído com ela... Mas sabia que, há muito pouco tempo, Samuca gostava de Janete, então não sabia o que pensar sobre esse encontro dele... Porém, ao contrário de Joaquim, Samuca era muito fechado em relação a seus sentimentos, nunca havia conversado com Davi sobre eles, então não tinha nem como o pai ter certeza de que ele gostava de Janete pra chegar e falar a respeito disso um dia antes dele se encontrar com a outra menina, né? Bom, como o encontro já estava marcado, Davi resolveu que deixaria o filho ir, mas que conversaria com ele sobre essas coisas logo depois que voltasse.

Enquanto esse momento não chegava, ele voltava a se preocupar com a ideia de ter que se encontrar com Suzana. Clarinha marcou com eles numa lanchonete. Davi estava pessimista, mas acabou se surpreendendo. A antiga encrenqueira parecia ter amadurecido. Estava super simpática e educada, falando com Clarinha como se realmente fosse sua amiga e demonstrando estar feliz pelo reencontro dela e de Davi. Bom, uma preocupação a menos. Pelo jeito como as coisas estavam, o homem achou que estava tudo bem ela ir ao casamento, afinal, seria bem injusto se ela fosse a única professora da Escola Mundial a não ser convidada.

***

Se Davi achava que Samuca andava meio estranho, no dia seguinte, viu que o garoto estava completamente estranho. Além de usar um boné estiloso, estava agindo de uma maneira totalmente diferente de como costumava agir, estava relaxado, fazendo piadas... parecia até que tinha trocado de personalidade com o Joaquim. Aliás, pela primeira vez, eles estavam realmente parecendo irmãos gêmeos, mesmo que sua aparência física ainda fosse diferente. Mas nenhum dos dois ficou muito contente quando Davi e Téo apontaram isso. Joaquim disse que era único e que Samuca estava imitando ele.

— Por que eu iria querer te imitar se eu sou melhor do que você? — Foi a resposta de Samuca. — Aqui é o Samucão na área!

Téo ficou surpreso por ver que o irmão estava tão tranquilo no dia em que teria seu primeiro encontro com uma garota. Davi imaginou que Samuca estivesse agindo daquele jeito apenas para disfarçar o nervosismo que sentia. Joaquim, por outro lado, estava achando tudo muito suspeito, desconfiava que tinha alguma coisa por trás desse comportamento. E estava disposto a descobrir o que era.

No final da tarde, Samuca levou Bel pra comer num lugar chamado Café Boutique. Lá era bem agradável, a comida muito boa e Bel estava animada para o encontro, mas percebeu logo de cara o quanto Samuca estava agindo diferente e não gostou muito disso. Talvez estivesse tentando impressioná-la, o que era ótimo pra garota, pois significava que ele gostava dela. Porém, Bel achava que ele estava forçando um pouco a barra. E quando ele decidiu cantar no karaokê do café, ela começou a achar que ele estava forçando muito a barra.

***

Clipe musical: "Adolescente" por Samuca.

***

Apesar disso, acabou gostando muito de ouvir a música e ficou impressionada com a performance de Samuca. Mesmo sendo cantor, ele quase nunca fazia solo por ser muito tímido, então ela sabia que ele cantava bem, mas não imaginava que era tanto! Começou a achar que ele devia ter mais destaque nas músicas da banda. Aliás, ela não foi a única que gostou, todos no café pareciam estar se divertindo.

— Nossa, Samuca, você mandou muito bem! — Ela disse, sorrindo.

— Valeu! Você gostou mesmo?

— Eu adorei! Você tá tão diferente hoje...

— Eu acho que acordei de bom humor...

— Entendi... Sabe, eu gostei de verdade de te ver cantando e tô gostando do nosso encontro, mas...

— Mas... você prefere que a gente pare de enrolar e vá direto ao ponto?

— Nossa! Eu não esperava ouvir isso... eh... na verdade eu ia dizer que você não precisa agir de maneira diferente comigo, sabe? Eu gosto de você do jeito que você é...

— Isso quer dizer que existe uma grande probabilidade de nós sermos mais do que amigos? — Ele disse, dando uma piscadinha pra ela.

Antes que Bel, que ficou muito surpresa, pudesse responder alguma coisa, Joaquim apareceu lá correndo e disse:

— Cuidado com ele, Bel, ele tá mentindo pra você!

— O que você tá fazendo aqui?! — Perguntou Samuca, com raiva.

— Do que você tá falando? — Bel perguntou a Joaquim.

— Disso. — Joaquim tirou o boné que estava na cabeça de Samuca e o garoto, como num passe de mágica, ficou super envergonhado e voltou a se parecer com o Samuca de sempre.

Acontece que Joaquim foi bisbilhotar a invenção de Samuca na casinha da árvore enquanto este tomava banho no dia anterior. Era um dispositivo bem esquisito que o irmão não entendeu direito do que se tratava, mas depois de reparar no boné e ver como Samuca estava estranho, Joaquim imaginou que ele devia ter colocado a invenção dentro do boné, voltou lá na casinha e olhou mais uma vez as anotações do irmão. A conclusão a que chegou foi que o dispositivo servia para tirar a inteligência de Samuca e deixá-lo descolado. E foi que disse pra Bel.

— Como assim, Samuca? — Ela perguntou, indignada.

— Não é nada disso! Eu só... queria ficar mais confiante pra sair com você hoje e...

Samuca estava com muita raiva de Joaquim, mas ao mesmo tempo arrependido pelo que fez, já que Bel não pareceu gostar nem um pouco. Joaquim estava de boa, achou que estivesse fazendo a coisa certa, pois Bel não merecia ser enganada desse jeito. Porém, é preciso dizer que ele estava se divertindo com aquela situação que tirou todo o seu tédio, o que Samuca percebeu, ficando com mais raiva ainda.

Os três ficaram discutindo (e chamaram a atenção dos funcionários e dos outros clientes do café), até que, de repente, Joaquim arregalou os olhos e ficou muito pálido, como se tivesse visto um fantasma. Será que era a culpa batendo? Antes que o irmão ou Bel perguntassem o que houve, todos no café ouviram uma voz estridente, gritando:

— O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI?

Samuca reconheceu a voz na hora. Não podia ser... Ele se virou e viu que, sim, era ela: dona Carmen, a diretora do orfanato Raio de Luz. Os dois meninos não conseguiram pensar em mais nada, só saíram correndo em disparada (ainda bem que Samuca já tinha pagado a conta), deixando Bel e a ex-diretora muito confusas e o resto do Café achando que eles eram malucos. Até o boné que havia causado tanta discórdia ficou pra trás, ele acabou escapando da mão de Joaquim quando começou a correria.

— Odeio esse tipo de cliente que causa tumulto no café! — Exclamou Carmen, que agora era a dona do lugar.

Em seguida, perguntou aos funcionários se aqueles meninos já tinham ido lá antes, porque os achou familiares. Mas eles disseram que não, que ela devia tê-los reconhecido porque eram cantores famosos. Bel pegou o boné, pediu desculpa por todo o transtorno e saiu, morrendo de vergonha. Estava decidida a nunca mais voltar naquele café, não importava o quanto a comida fosse boa. Os meninos já estavam bem longe àquela altura, Bel não fazia ideia de pra onde eles tinham ido. Então foi pra casa e deixou pra devolver o boné de Samuca e perguntar o porquê da fuga repentina dos gêmeos no dia seguinte na escola.

Infelizmente, ela não era a única que não sabia onde eles estavam: nem eles mesmos tinham noção disso, estavam correndo sem rumo pela cidade como quando fugiram do orfanato.


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