A Fortaleza das Feras - Livro 01 (Caos e Ruína) escrita por Manon Blackbeak


Capítulo 18
Capítulo 17 - Vincent




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Ansélia, capital de Edésia

Por fim, ele havia concluído que a arqueira mork era o menor de seus problemas, e que talvez ele tivesse um pouco, mas muito pouco mesmo, de sorte. Por ela estar dia e noite monitorando-o, e não outro soldado, muito menos um daqueles que haviam lhe espancado.

Com o passar dos dias Vincent também havia adquirido um pouco de saúde, não estava sendo mal alimentado, mas passava a maior parte do tempo trancafiado em seu próprio quarto. Sempre acorrentado, e agora três vezes ao dia os criados entravam ali. A primeira para largar o café da manhã, a segunda para o almoço e a terceira para um banho e o jantar. E claro, sempre escoltados pela fêmea mork, Robin.

Vincent estava quase enlouquecendo, passava praticamente o dia e a noite pensando em alguma forma de fugir. Não poderia saltar pela janela, pois além dela estar trancada, saltar pela sacada seria suicídio, ao julgar pelo desfiladeiro que tinha do outro lado... De qual ancestral estúpido fora a ideia de construir um castelo nas montanhas? Mas suicídio não era uma má ideia também, embora, não fosse possível com a janela trancada, no entanto, poderia tentar outros métodos... Também já verificara a passagem secreta que havia em seu quarto, estava selada. Então apenas descartou a ideia. E como não o deixavam sair, a não ser que houvesse pelo menos uns quinze soldados o escoltando.

Era impossível sair dali, e talvez a morte fosse a melhor opção de paz no momento.

Mordra o chamava quase todos os dias para conversar, ou melhor, para humilhá-lo no trono. Sempre acompanhada por Eleazar, um dos três Príncipes Mork. Ele havia visto apenas dois, Eleazar e Genesis, havia um terceiro, Raiden, mas este não dera as caras ainda. Mas Vincent também pouco estava se importando com aquilo.

Ele estava sentado em sua mesa de desenho, encarando as tintas e as telas espalhadas, o pincel pendia de sua mão esquerda. Poderia pintar. No passado, ter tempo e absolutamente ninguém que interrompesse para fazer aquilo, era um sonho. Mas naquele momento... Não conseguia. Não conseguia ter nenhuma ideia para criar algo. Havia apenas vazio, profundo e sem criatividade em seu peito. E também não poderia se cobrar, não quando era um prisioneiro de sua própria casa.

Talvez... Talvez Aquele lugar jamais tivesse sido sua casa, de fato. E agora, nada mais era do que uma prisão.

A porta se abriu, Vincent lentamente virou-se para ver a mork entrando.

Robin.

Normalmente, eles mal se falavam. E não fazia sentido querer conversar com o inimigo, Vincent estava destruído emocionalmente. Não queria conversar com ninguém, não confiaria em ninguém, e muito menos trocaria qualquer tipo de palavra, que não fosse hostilidade, com aquela criatura desgraçada.

― Você tem direito a fazer uma visita. ― Ela disse simplesmente, quando pegou a corrente que estava ligada a coleira de metal no pescoço do príncipe, e então saiu o arrastando.

Ele não protestou, não reclamou em momento algum, conforme seguiram pelo extenso corredor do castelo. É claro que ele teria o direito de fazer uma visita, mas também não poderia escolher qual seria. Poderia ser para Ethan, ou para Olivia, ele não tinha ideia.

A mork caminhou em passos rápidos e firmes, a cicatriz que cortava o rosto delicado e imortal servia apenas para deixá-la ainda mais assustadora. Eles caminharam por minutos, e Vincent constatou que estavam se direcionando para o templo nas montanhas. Era uma edificação que reluzia branco junto com a neve, a construção ficava do outro lado da extensa ponte de pedra coberta.

Mais soldados os escoltavam, mas Vincent não se importava mais com aquilo.

Ele observou a paisagem ao redor.

Em alguns meses chegaria o inverno, e seria sombrio. Seria rigoroso como todo ano era, mas não teria festivais, seria silencioso e mortalmente frio. A paisagem branca se estendia ao longe, e ele percebeu, que de todas as formas possíveis, estava sozinho. Seus pais, os reis de Edésia estavam mortos, e uma rainha sombria se sentava em seu trono.

A qual ele ainda não conseguira desmitificar quais eram os planos.

A guerreira mork parou de caminhar, arrastou a porta do templo adiante e deixou que Vincent e os guardas passassem. O local era amplo, arredondado e de um branco cegante. Um típico templo edesiano, com pilares e círculos imortais gravados no chão. O ar estava demasiadamente frio.

E a sua frente, havia um altar.

Ele disparou quando percebeu a figura deitada ali, os cabelos negros escorrendo lisos pela pedra.

Olivia. 

***

― Ela está bem, não se preocupe. ― A fêmea mork aproximou-se, os olhos ambares fixados no corpo da princesa adormecida. ― A magia em seu continente não foi bloqueada, ela está adormecida assim como Olivia está.

Vincent sacudiu a cabeça, os olhos azuis estavam cinzentos como o céu do inverno, ele queria chorar, estava nervoso, mas engoliu cada vontade de explodir ali.

Então observou o corpo da irmã, ela parecia estar em paz. Em A expressão era calma, como se realmente estivesse dormindo. Os cabelos negros caiam para fora do altar, eram longos, e o vestido de seda azul claro que usava contrastava com a pele pálida.

― Mordra esperou o momento certo para agir, quando a magia começou a despertar. ― Todas aquelas informações, Vincent ponderou se Robin não estava se arriscando demais ao falar aquilo, ainda mais por estarem afastados dos guardas. Os soldados eram humanos, não poderiam ouvir naquela distância. ― Talvez você não sinta isso, se não houver poder correndo em suas veias. Mas, Olivia o tem, e por esse motivo, Mordra precisa que ela continue dormindo.

― Mas por quê?

― Não posso falar mais do que isso. ― A guerreira ponderou, então olhou ao redor. Então sussurrou: ― Não sei o paradeiro de Ethan, e não tive informações sobre Raiden, o irmão do meio. Parece que nenhum dos dois estão aqui em Ansélia.

― Por que está passando todas essas informações?

― Porque aqui, nas terras de Sidgar, Mordra não tem poderes. Ela pode ter o controle, mas não tem poder. Pelo menos, não ainda, e levaria algumas décadas para que a magia possa se restaurar.

― E Olivia vai continuar dormindo?

― Enquanto a rainha achar necessário, sim.

Vincent observou o corpo da irmã adormecida e ponderou. O que seria necessário para desperta-la, que força tão grande a garota tinha para que Mordra considerasse uma ameaça e a mantivesse daquele jeito? Deveria descobrir. Deveria tentar entender por que aquela soldado mork estava dando aquelas informações. Mas ao mesmo tempo... Não se sentia disposto em tentar.

― Mordra acredita que ela tem o poder de uma entidade antiga, uma deusa do gelo e do inverno. Eu duvido muito, não acredito em lendas.

O príncipe observou a guerreira de braços cruzados, então suspirou, sentindo o ar gelado adentrar seu corpo.

― Obrigado.

― Pelo que? ― Ela arqueou uma sobrancelha, espantada.

― Por deixar eu ver minha irmã.

Mesmo que talvez, aquela fosse a última vez que ele poderia encarar o rosto da jovem.

***

Era frio e vazio, nada.

Essa sensação que ele tinha naqueles últimos dias. As imagens que haviam passado em sua cabeça, as memórias que Vincent tinha, já haviam passado do estágio de tristeza profunda para um completo e profundo vazio. Após aquela visita rápida à princesa, Robin havia o levado de volta para seus aposentos, e o trancafiado, como todos os dias.

Ele se encolheu na cama, sequer o ar frio de Edésia o incomodava.

Talvez devesse tomar uma atitude desesperada, talvez ele já tivesse também passado deste estágio. O príncipe não sabia o que fazer. Mordra lhe contara sobre seus parentes e os nobres que moravam no castelo, a grande maioria havia bebido um veneno mortal durante o ataque, distribuído como uma medida que evitaria a morte cruel pelas mãos dos soldados. Por escolha própria, haviam tirado a própria vida, e aqueles que foram pegos pelas lâminas dos morks... Havia sido sangrento. Darllarya não fazia prisioneiros. Jamais. E aqueles que faziam, duravam apenas o tempo necessário.

Em todos aqueles anos, a relação complicada que tivera com seu pai, o rei, por causa de suas opções e gostos pessoais. Talvez influenciasse naquela sensação. Nunca fora um guerreiro viril, sempre fora mais sensível do que Ethan, embora, fosse forçado a ter algumas lições bélicas pelo pai, afinal, fazia parte de suas obrigações. Sempre fora melhor com a história, com a arte e com os livros, nunca fora bom com as garotas, e sequer gostava delas, não da forma como o rei gostaria.

Vincent era o completo oposto de Ethan, e a total decepção do rei. Mas seu irmão sempre fora acolhedor e compreensivo, e ele sentia falta. Ou talvez não lembrasse mais o que era sentir falta.

O príncipe observou a mão esquerda sobre o travesseiro, as cicatrizes de quando seu pai percebera que ele era canhoto. “Homens devem usar a mão direita, para manejar uma espada e matar o inimigo. Homens não usam a mão esquerda para pintar e desenhar igual uma mulherzinha.” E com aquelas palavras, o rei fizera questão de arrasta-lo e quebrar sua mão, para que Vincent pudesse aprender a usar o braço certo, para que ele deixasse de ser uma mulherzinha que preferia pintar e ler livros.

Ao menos, o rei não tirara dele o dom de desenhar, mas conseguira atingir seu objetivo quando Vincent tornou-se ambidestro. Talvez, no fundo, bem no fundo, ele estivesse grato que seu pai estava morto, e ainda mais profundamente, ele o odiava.

Mas não estava grato com aquela situação.

Não quando o isolamento e a tortura psicológica de Mordra estava destruindo sua sanidade.

Lentamente ele levantou-se, o barulho das correntes batendo ecoou no quarto sombrio. Seus pulsos e seus tornozelos estavam machucados por causa do metal, seu pescoço dolorido devido a coleira. Talvez ele fosse um egoísta por agir daquela forma, sabia que poderiam existir pessoas em situações bem piores, mas não importava, não mais.

Mas ele já havia planejado aquele momento, já ponderara sobre aquela ideia nos últimos dias.

Pensara em várias, várias formas de o fazer.

E de qualquer modo, ele estava sozinho.

Vincent abriu a gaveta de sua escrivaninha e observou a lâmina que utilizava para apontar lápis e carvão, devidamente afiada, embora, utilizasse para desenho. Ele pegou o metal, com a mão esquerda cortou a palma da mão direita, para testar o fio da lâmina. O sangue quente escorreu, mas a dor não o incomodou.

A dor não incomodou quando ele fez o primeiro corte.


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