— E ainda assim eu amaria você, porque eu te amo com todos os seus defeitos e qualidades. Amo seus pequenos detalhes, como o modo que você ri e como você faz uma coisa engraçada com o nariz quando está com vergonha. Amo você, completa e irrevogavelmente. – Repeti a frase junto com Luke Moyes e me desfiz em lágrimas – pela sei lá qual vez – quando o casal se beijou.

— Eu não acredito nisso Lily, francamente. – Marlene revirou os olhos e desligou a TV.

— Ei!

— Não, pelo amor. Eu estou cansada de assistir essa série, eu vou lá na cozinha e quando eu voltar a TV vai estar ligada em outra coisa. – ela frisou as duas últimas palavras, se levanta da cama e sai do quarto.

É uma verdade universal que eu – Lily Evans – sou apaixonada pela série “Bittersweet” uma estória contemporânea que acompanha diversos núcleos em uma faculdade. Eu me identifico bastante porque eu também estou na faculdade, mas nem de longe a minha vida é tão agitada.

Antes dessa série, eu não me considerava uma fã de muitas coisas – acho que eu não era fã de nada, não tinha pôsteres de ninguém, nem participava de eventos e nem ia a shows -, porém essa série é diferente e conseguiu criar uma fangirl muito intensa em mim.

Ou talvez a fangirl já estivesse lá, só esperando alguma série, cantor ou banda para finalmente aparecer.

E claro, como uma boa fangirl, eu não sou totalmente apaixonada pela série em si, mas também pelos atores – em especial James Potter, que interpreta Luke Moyes, e é simplesmente o melhor personagem da série e completamente apaixonante, a propósito.

Ouvi os passos de Marlene subindo a escada e rapidamente liguei a TV, selecionando outra coisa.

Ela me lançou um olhar desconfiado, mas logo se deitou na cama com um novo pote de pipoca.

Marlene já tinha dormido quando finalmente desliguei a televisão, já era madrugada alta e ainda não estava com sono – o que era um grande desperdício porque as aulas começavam em menos de um mês e eu deveria estar dormindo e acumulando energia.

Entrei na fanpage sobre “Bittersweet” no Twitter em que sou uma das administradoras e postei uma foto dos bastidores – o rolo da câmera quase todo do meu celular era só sobre isso.

“A terceira temporada volta dia 5 de setembro! Faltam 15 dias!!!”

Botei vários pontos de exclamação, porque sou dessas.

Uma colega minha, também administradora, mandou uma DM segundos depois de eu postar a foto.

Louise
@bitterlouiswe

Você viu??
A Inside está promovendo um super evento sobre Bittersweet em Londres

Não vi não
Eles postaram quando?

Agora
É uma promoção e aaaaa 
MEU DEUS

O que foi?

ENTRA LÁ AGORA LILY

Entrei na página da Inside no Twitter. Inside é uma empresa que vive criando eventos sobre séries, filmes e música na Inglaterra. É uma das empresas que mais atua nesse campo e era a preferida de muitos fãs ingleses.

Inside @insidenow

Você é fã de Bittersweet? A Inside criou uma promoção que vai levar você e mais um acompanhante para a première da terceira temporada da série! É bem fácil participar!

Tinha um link que eu cliquei instantaneamente quase surtando ao ver que o número de favoritos só crescia.

“Para participar da promoção, basta enviar uma mensagem até o dia 25 de agosto falando porque você deveria ganhar a promoção. Você é fã o suficiente para ganhar?”

Se tinha uma coisa que eu sou, essa coisa é ser fã o suficiente.

— Marlene! – comecei a sacudi-la. – Marlene!

— O que é? – ela resmungou.

— Tá tendo uma promoção da Inside sobre “Bittersweet”! Meu Deus! Meu Deus!

— Pelo amor! Vai dormir mulher!

— Não dá! Eu tenho que me inscrever agora! Você faz Inglês e é boa com palavras e eu preciso escrever o porquê eu mereço ganhar!

— Acho que todo mundo que se inscreve nessa palhaçada é fã o suficiente pra gostar dessa série de merda.

— Marlene, você para.

— Não tem como gostar dessa série quando ela me acorda em plena 2:15 da manhã, Lily Evans. – ela se senta na cama. Os cabelos loiros uma bagunça em volta do seu rosto. Ela está com uma expressão raivosa e quando ela abriu a boca e levantou o dedo indicador, eu soube que ela ia começar a gritar.

— Se você me ajudar, eu te levo comigo para Londres. – falei rapidamente. Ela baixou o dedo indicador.

— Sério?

— Sério. – respondi ainda com medo que ela começasse a gritar e acordasse a vizinhança inteira.

— Tá bom. – ela deu de ombros. – Sobre o que é mesmo essa tal promoção?

— Eu acabei de te falar!

— Eu não estava prestando atenção. – reviro os olhos, mas explico novamente a promoção para Marlene.

— Tá, então faz uma coisa bem filosófica para as pessoas pensarem “Nossa que menina inteligente acho que ela merece”. Não, melhor. – seus olhos brilharam. – Fala que você tinha depressão e “Bittersweet” te deu forças para lutar.

— Meu Deus, Marlene eu não vou fazer isso.

— Por que não?

— Porque isso é injusto com as pessoas que são realmente depressivas.

— Ninguém vai ficar sabendo.

— Marlene. – ela revirou os olhos.

— Tá bom, se você quer fazer do jeito mais difícil...

— Eu quero fazer do jeito mais correto. – ela fez uma careta.

— Desde quando você é tão moralista?

— Acho que eu sempre fui assim né? – comento mais focada em começar meu texto.

— Tá e como eu virei sua amiga?

— Marlene. Vamos focar, por favor?

— Tá, tá. Eu tive uma ideia.

— Nada que seja ilegal ou imoral, certo?

— Certo. Fala que Bittersweet é importante pra você, porque antes de Bittersweet você não via outra série de TV que pudesse te permitir se reconhecer tanto. Como é o nome daquela menina ruiva que você gosta mesmo?

— Karen?

— Deve ser. Fala como a Karen é ruiva e você também e fala que pessoas ruivas têm conexão uma com a outra. Fala que antes não existiam pessoas ruivas na TV e que você se identificou com a Karen.

— Eu não acho que não existiam pessoas ruivas na TV antes de Bittersweet.

— Lily, não tem problema mentir um pouquinho. Seja dramática é disso que o povo gosta. Fala que você tá na faculdade, cita o personagem mais ansioso na série e fala que você também se identifica ou coisa assim.

— Tá, tá. – comecei a escrever uma mensagem com a ajuda de Marlene.

— Você tem até quando para entregar? – Marlene perguntou quando terminamos de escrever.

— Até dia 25. – guardei o celular e puxei a coberta para me deitar, finalmente.

— Já estou me imaginando em Londres, andar por aquela rua... – Marlene começou a falar e a falar sobre todas as coisas que ela ia fazer em Londres, mas subitamente eu fiquei com sono e não ouvi mais nada que Marlene dizia.

— Você é uma vaca ridícula. – é a primeira coisa que eu ouço quando acordo naquela manhã. Marlene está na porta me encarando com raiva, suspiro. Lá vem.

— O que foi?

— O que foi? Você me acorda, me obriga a fazer uma mensagem para ver aquele povo chato, me tira o sono e quando eu começo a conversar com você, você dorme. – reprimo um bocejo.

— Desculpa, Marley. – ela sorri.

— Tudo bem. Toma, fiz chá para você. – com a Marlene era sempre assim. Isso se chama Sol em Gêmeos e ascendente em Libra. Peguei a xícara. Marlene devia estar de bom humor hoje porque ela fez o meu chá predileto.

— Você acha que eu tenho chance de ganhar essa promoção? – pergunto depois de tomar um gole.

— Acho que sim, porque o meu texto ficou incrível. – meu celular começou a vibrar com mensagens no grupo que participo com outros fãs de Bittersweet.

Sarah
Vocês viram a promoção da Inside?
Eu já me inscrevi

Benjamin
Eu também
Mas não sei se o meu texto ficou tão bom assim

Louise
Também achei difícil, mas espero que tenha ficado bom

Sarah
Já imaginou se alguém daqui ganha?

Louise
Gente a atriz que faz a Karen (Juliet Keyes) acabou de postar na conta dela
no TT sobre a promoção da Inside

Sarah
Ah então é sério mesmo

Benjamin
Você achou que não era sério?

Sarah
Ah sei lá

Louise
O James disse alguma coisa?

Sarah
Até agora nada, ele não usa muito o twitter pra falar com os fãs

Benjamin
Ele nem fala direito com os fãs tem cara de ser meio arrogante

Entrei no Twitter para ver o que a Juliet havia falado. A Inside não tinha dado muitos detalhes sobre a promoção, nem sobre a première e nem nada do tipo.

Juliet @julietkeyesofficial
Ansiosa para a première! Vocês já viram a promoção da Inside? Espero que estejam participando, vai ser muito legal!

Benjamin
Acabei de ver o que a Juliet disse. Eu tenho um pouco
de dó dela, ela não tem carisma algum

Sarah
Eu acho ela carismática

Louise
Pelo menos ela tenta

Benjamin
Ao contrário de certas pessoas né @James?

Eu estava quase entrando ali para defender arduamente os atores quando Marlene começa a falar alguma coisa e eu bloqueio o celular antes que ela começasse a gritar.

— Você vai trabalhar hoje? Porque a Alice está nos chamando para sair.

— Eu vou, mas saio cedo. Aliás, que horas são?

— Quase meio dia.

— Quem vai fazer o almoço hoje?

— Você. – Marlene falou como se fosse óbvio, mas só era para ela.

— Hoje é o seu dia de cozinhar.

— Não quero cozinhar hoje. – e era nesses momentos que eu me arrependia de ter saído da casa dos meus pais e ter vindo morar com a Marlene. Honestamente, o que eu estava pensando?

— Eu cozinho hoje se você limpar a casa amanhã.

— Isso não é justo! Eu não gosto de limpar a casa!

— E eu não gosto de cozinhar.

— Você cozinha melhor do que eu.

— Mas eu não gosto. Não muito.

— Sei. – terminei de beber o chá e saí do quarto. – Tá bom, eu limpo o apartamento amanhã.

Depois do almoço, me arrumo e vou à loja a qual eu trabalho. É uma loja de camisetas do tipo que faz várias estampas sobre séries, filmes e música. O uniforme dos funcionários é uma das camisetas da loja e hoje eu estou usando uma sobre Bittersweet. Uma das melhores coisas de se trabalhar aqui é o desconto dos funcionários, porque assim eu consigo comprar as camisetas necessárias a todos os fãs de Bittersweet.

De fato, o desconto dos funcionários é um dos restritos fatores que me fazem continuar nesse emprego. Começo a acelerar quando percebo que vou me atrasar.

Entro em silêncio, tentando ao máximo não atrair a atenção da minha chefe. Talvez se eu corresse para o balcão, ela ia pensar que eu estava lá desde o começo do turno.

— Atrasada mocinha! – a voz fina de Dolores Umbridge – minha terrível chefe – soa atrás de mim. Me encolho ao pensar no que ela ia fazer dessa vez. Porém, coloco um sorriso no rosto quando me viro. Ela está vestida de rosa como sempre, da cabeça aos pés.

— Só dois minutos. – eu desfaço o sorriso quando vejo que ela permanece séria.

— Ao trabalho. – concordo com a cabeça e corro para o balcão aliviada por ela não ter ameaçado reduzir meu salário, aumentar minhas horas ou tirar minhas folgas do final de semana, ou qualquer outra coisa que me fizesse se arrepender de ter entrado nessa loja no dia que eu saí para arranjar emprego.

A loja estava calma e atendi poucos clientes. O tempo todo eu queria pegar no celular e mexer na fanpage, mas os gatos da Sra. Umbridge ficavam circulando pela loja e aqueles gatos... Aqueles gatos. Eles sempre me encaram quando eu pego meu celular e eu simplesmente não consigo ficar tranquila com medo deles chamarem Dolores e eu me ferrar.

Eu não faço ideia de como os gatos podem chamar a sra. Umbridge, mas eu prefiro não me arriscar.

Além disso, tem câmeras em todos os cantos dessa loja e eu tenho quase certeza de que a maioria aqui é para a sra. Umbridge monitorar os funcionários.

Então, só fiquei entrando em algumas páginas aleatórias pelo computador já que a minha agradabilíssima chefe monitorava as páginas que eu entrava através da câmera cuidadosamente colocada atrás de mim.

Ela não se importava de eu mexer na Internet quando não houvesse clientes, mas era só ela ver uma rede social que eu iria ouvir um sermão de duas horas.

— Meu turno acabou. – eu grito em frente a porta que leva ao escritório da sra. Umbridge quando finalmente dá 18 horas. Ela não gosta que ninguém entre sem ser convidado e eu não gosto de entrar na sala extremamente rosa.

De repente a porta é aberta e eu pulo de susto.

— Se eu bem me lembro, Lily Evans. Seu turno nas sextas feiras só acaba 20 horas. - meu queixo cai. Ela dá uma risadinha – aquela risadinha desprezível - e fecha a porta na minha cara.

Eu encaro a porta branca com detalhes rosa por mais um tempo antes de sair e voltar para o balcão. Xingo minha chefe maluca por mais um tempo na minha cabeça, sem expressar qualquer reação, porque eu sei que ela deve estar me observando.

Quando eu cheguei aqui e minha chefe não me conhecia e me odiava – apesar de eu achar que ela ainda me odeia – eu trabalhava de segunda a sexta das 13 horas até às 20 horas.

Porém, após um tempo ela diminuiu meu horário até às 19 horas nas sextas e depois eu tive a liberdade de poder sair mais cedo quando necessário. Agora, depois de um atraso de dois minutos eu voltei à ditadura rosa. Francamente.

Mando uma mensagem para Marlene.

A cara de sapo só vai me deixar sair 20 horas

Mano
Sai desse emprego

Você vai arranjar um pra mim?
Não né
20 horas eu tô aí

Que grosseria
Você tá passando tempo demais nesse trabalho
Encontra a gente naquele pub lá tá?

A Marlene é tão folgada que eu nem sei.

Como ela espera que eu saiba qual o pub que ela e Alice vão?

— Mexendo no celular, Lily? – levo um susto quando a voz da sra. Umbridge soa muito perto de mim, meu celular escapa da minha mão, mas eu consigo pegá-lo antes que ele caia no chão.

— Só avisando meus pais que eu ia sair mais tarde hoje, sra. Umbridge. – ela estreita os olhos para mim, mas depois relaxa.

— Estou indo embora. Feche a loja, sim? – ela sai da loja carregando uma bolsa com os gatos dela e me deixa só na loja.

Muitas pessoas podem pensar agora: “Pronto, Lily. Pode entrar no Twitter agora e ser feliz conversando sobre Bittersweet”.

Ah se fosse simples assim... Uma vez eu fiz isso e na segunda pela manhã, ouvi um sermão de duas horas sobre deslealdade.

Ela fica me espionando essa maluca, mesmo quando não está aqui.

As duas horas restantes para meu turno acabar parecem se arrastar. Só mais uma garota entra na loja e quando finalmente dá 20 horas, eu fecho a loja o mais rápido possível para sair.

Antes, porém, mando uma mensagem para Alice perguntando onde ela e Marlene estão já que a última não parece disposta a me informar.

O tal pub fica razoavelmente perto, mas hoje ficou frio de repente e meu casaco não é tão quente assim. Quando, finalmente, chego ao pub eu só quero uma bebida que possa me esquentar.

Porém, ao entrar no pub eu ouço uma risada escandalosa e eu só penso “Marlene”.

Marlene é a pessoa mais maluca que eu conheço nessa Terra, mesmo ela sabendo e todo mundo sabendo que ela é fraca para bebidas, Marlene McKinnon continuava a insistir e a beber mais do que devia.

Geralmente, isso acontecia na metade do terceiro copo.

Alice estava vermelha quando eu localizei a mesa alta que as duas dividiam, dois rapazes estavam ao lado das duas. Eles estão sorrindo e conversando alto o que faz Marlene rir mais e Alice se encolher.

— Lily! – Marlene exclamou quando me viu e Alice pareceu aliviada.

— Oi Marley, Alice. – Alice arregalou os olhos e depois os moveu para onde os dois garotos estavam prostrados e eu acenei com a cabeça.

— Venha se juntar a gente. – Marlene disse e ergueu um copo, mas ela se desequilibrou e derramou mais da metade do líquido na camisa de um dos rapazes. Ela riu e começou a se desculpar.

Alice escorregou para fora do banco.

— Eu tentei fazer ela parar de beber, mas foi mais rápido do que eu pensei que seria.

— Tudo bem, Alice. A Marlene consegue ser bem escorregadia. – me aproximei de Marlene que continuava rindo, o rapaz que teve a camiseta arruinada não estava mais ali. – Marley, o que acha de irmos embora?

— Não. – ela alongou as letras com uma voz manhosa. – Você acabou de chegar.

— Pois é, mas estou cansada. A Umbridge consegue ser bem chata quando quer. – ela concordou com a cabeça, mas logo voltou a sorrir.

— Mas eu e o Richie aqui...

— Rick. – o rapaz corrigiu.

— Estamos prestes a sair. – ela continuou, ignorando o garoto.

— Não mais. Vem logo. – peguei no braço dela e Alice pegou no outro.

Marlene ficava mais teimosa do que o normal quando bêbada e, raramente, ela saía de um bar apenas pela conversa. Geralmente, era eu, Alice e Dorcas – que foi fazer a faculdade em outra cidade – para conseguir tirar ela do bar.

Hoje, porém, ela estava até quieta e eu e Alice conseguimos segurar ela.

Ela veio xingando e tentando se soltar, mas veio. Assim que saímos do bar, Marlene se curvou e vomitou.

— Vai precisar de ajuda?  - Alice pergunta, olhando preocupada para Marlene que agora encostava a cabeça na parede do pub.

— Vou.

Alice pediu um táxi e juntas carregamos uma Marlene semi acordada até o apartamento. Depois de tudo, já estava tarde e Alice resolveu dormir aqui. Entrei mais uma vez no Twitter para conferir se tinha saído algo sobre a promoção, mas nada novo.

Essa vida de fangirl é muito difícil e muito subestimada. Só eu sei o que eu passo todo dia sendo uma fã de Bittersweet. Já havia chorado mais vezes do que eu gostaria de comentar. Já havia me apaixonado pelos personagens fictícios mais vezes do que é considerado saudável.

E já havia desejado mais vezes do que o normal viver no mundo fictício da criadora da série do que no mundo real.

Triste, mas é a verdade.

Os dias se passaram e finalmente chegou o dia 25. O último dia para mandar as respostas ao desafio da Inside e provavelmente o dia em que eles iriam divulgar mais alguma coisa.

Meus dedos estavam coçando para pegar o celular, mas eu não queria dar nenhuma satisfação para a Umbridge – e eu também não queria voltar a sair só às 20 horas nas sextas feiras, já que agora eu voltei a sair às 19 horas.

Saí da loja ansiosa por uma xícara de chá, a sra. Umbridge tinha feito chá hoje à tarde, mas ela não me ofereceu. Então, eu fiquei o resto do meu turno inteiro pensando em uma xícara cheia de chá.

O clima estava nublado desde manhã, mas o clima em Chelmsford é sempre nublado e eu decidi deixar o guarda-chuva em casa – porque não fazia sentido algum levar aquele guarda-chuva enorme todo dia se não chovia. E é claro que no dia que eu decidi não trazer o guarda-chuva, chove.

Me encolhi e amaldiçoei o clima quando senti as primeiras gotas frias e grossas.

Peguei um casaco que estava na mochila e coloquei sobre a cabeça. Então, vejo o carro rosa da Umbridge passar por mim.

— É melhor correr se não quiser pegar um resfriado, Lily querida. Se não aparecer no trabalho amanhã. Você vai voltar a sair às 20 horas. – ela dá uma risadinha, pisa no acelerador e me deixa sozinha na rua.

Inacreditável.

Eu não sei porque ainda me presto a esse papel, se não fosse o desconto dos funcionários e o salário – que fica relativamente maior devido as minhas gorjetas - eu já teria ido embora e deixado a cara de sapo, seus gatos desprezíveis e suas roupas rosas para trás.

Corro mantendo o casaco em cima da minha cabeça, mas depois meus braços cansam e eu desisto de tentar proteger meus cabelos.

Quando chego ao prédio em que moro, estou encharcada e já consigo imaginar os gritos de Marlene quando eu chegar a casa, já que ela limpou o apartamento hoje mais cedo.

Começo a retirar os sapatos assim que chego em frente a porta para não sujar o apartamento e pego meu celular quando ele vibra. É o grupo dos administradores da fanpage de Bittersweet.

Benjamin
AAAAAAAAAAA
A INSIDE AAAAA

Sarah
O que foi?

Benjamin
Eles divulgaram os detalhes da promoção
Meu Deus, eu preciso ganhar essa promoção aaaaaa

Entrei na página da Inside, mas acabo perdendo o equilíbrio – visto que eu fiquei mais de 30 segundos em um pé só – e caio. Mas eu não estou preocupada com isso, eu preciso saber tudo sobre essa promoção agora.

— Meu Deus, Lily. – ergo os olhos ao ver que a porta foi aberta e Marlene me encara com preocupação. – O que foi agora? – ela se abaixa para pegar meus sapatos e eu me arrasto para dentro do apartamento buscando o wi-fi e esperando a página carregar. – Deve ser sobre Bittersweet. – me viro de barriga para cima e Marlene se deita ao meu lado.

A página finalmente carrega.

“A Inside está promovendo um concurso para todos os fãs ingleses de Bittersweet. Você e um acompanhante terão a oportunidade de ir para a première londrina no dia 4 de setembro com tudo pago pela Inside. Você terá a oportunidade de assistir os dois primeiros episódios da terceira temporada de Bittersweet primeiro do que todo mundo. Durante a première, você terá a chance de conhecer os seus atores preferidos como James Potter e...”

O texto continuava, mas eu não consegui ler mais nada depois de James Potter. Se antes eu queria ganhar apenas pela chance de ir para a première, agora com a chance de conhecer meu crush supremo – James Potter – eu preciso ganhar.

— Ah meu Deus, Marlene. Ah meu Deus.

— É agora que você vai começar a surtar? Porque se for outra coisa, fala logo, eu tenho que terminar um trabalho que a embuste da professora passou nas férias.

Eu acho que eu comecei a gritar e a falar rápido, porque a Marlene revirou os olhos e sumiu para dentro do apartamento. Eu não conseguia nem raciocinar direito, tudo o que eu pensava era na première e no que eu ia falar quando visse James Potter na minha frente. Não sei nem se conseguiria respirar, capaz de eu cair dura ali mesmo.

O resultado ia sair dia 27 de agosto, eu queria dormir e acordar só daqui a dois dias para eu ver o meu nome como vencedora da promoção.

Eu estava em um frenesi, ninguém poderia me tirar dali a não ser a Marlene e o balde de água fria veio na noite do dia 26.

— Lily Evans! Se você falar mais alguma coisa sobre Bittersweet ou James Potter, eu juro que mato você! – seus olhos estavam arregalados e seu dedo indicador levantado. Eu não levei a ameaça muito a sério, mas sei lá né.

— Tá bom. – respondo em tom apaziguador para ver se ela relaxava. Porém, continuei a conversar com os outros administradores da fanpage. Pude ouvir Marlene bufar, mas eu não falei mais nada, então estava tudo bem.

— Que roupa a gente usa para ir a uma première? – eu falei pensando alto e Marlene se virou para mim. Ela só me encarava com os olhos arregalados. – Quer dizer, hipoteticamente, se eu fosse a uma, é claro. – ela só continuou me encarando e eu fiquei quieta.

Decidi procurar no Google, mas só achei notícias sobre a roupa que a Katy Perry usou ou sobre atrizes que causaram polêmica ao usar vestidos reveladores. Porém, nada sobre o que uma fã usar. Francamente.

— Você nem sabe se ganhou ainda, Lily.

— Eu sei, mas eu tenho que torcer por mim mesma. Se não for eu, quem será?

— Eu. Porque eu também quero ir a Londres.

— Você deveria ser mais espirituosa, então. Não estou sentindo a sua torcida.

— Meu Deus, Lily. Essa promoção tá mudando você. – revirei os olhos, mas sorri.

— É só que... Minha nossa. Eu realmente quero ganhar essa promoção.

— Relaxa. – Marlene disse com um pequeno sorriso. – O que for pra ser, será. – eu simplesmente não conseguia jogar tudo isso nas mãos do destino, mas decidi me focar em outra coisa, por ora.

No outro dia, porém, eu acordei já pensando no resultado.

Entrei na página do Twitter da Inside e vi que eles iam divulgar os resultados somente 10 horas da manhã e eu fiquei me sentindo muito obcecada por ter acordado às 6 horas. Por Deus.

Tentei então, liberar a minha mente de qualquer coisa relacionada à Bittersweet. Peguei meu caderno que estava dentro da mochila no fundo do guarda-roupa e comecei a estudar um pouco. A faculdade ia retornar dia 11 de setembro e eu tinha que relembrar algumas coisas.

Marlene acordou às 09 horas e fez chá para nós duas. Depois ficamos em frente ao meu celular, atualizando a página da Inside.

— Eu espero muito que você ganhe, Lily Evans. Já montei um roteiro para nós duas em Londres.

— E depois você disse que eu que estava com expectativas altas.

— Pelo menos não era eu que toda vez que abria a boca era para falar sobre Bittersweet ou James Potter. – revirei os olhos.

— Um dia, Marlene, você vai se tornar muito fã de alguma coisa e eu vou me lembrar. – ela abriu a boca para rebater, mas então ela arregalou os olhos e apontou para a tela do celular.

— Saiu! Saiu! – cliquei estranhamente calma no link e senti meu coração acelerar durante o carregamento da página. – Meu Deus, meu Deus. – Marlene murmurava baixinho e quando a página carregou, ela gritou bem no meu ouvido.

Depois eu que sou a eufórica.

Rolei a página até chegar lá embaixo onde um nome estava escrito no centro, em itálico:

Lily Evans

Marlene começou a gritar, ou fui eu, e logo a sala foi tomada por gritos. Marlene se levantou e começou a pular, então nós pulamos gritando e abraçadas até cansarmos e eu fui ver os detalhes.

Mandaremos para a ganhadora um e-mail com mais detalhes. Aguarde nosso contato ;)

— Eu não acredito que você realmente ganhou. – Marlene disse.

— Eu acredito! Eu acreditei! – Marlene começa a rir porque eu falei como se estivesse em uma propaganda ou coisa assim e eu a acompanhei.

Ficamos à mercê do ócio por um tempo e comecei a pensar em como a ida a Londres ia afetar a minha vida cotidiana. As aulas só iam começar na semana seguinte a da première, então ia conseguir colocar os estudos em dia. Só então me lembrei que eu tenho um emprego.

— Ah meu Deus, a Umbridge. – falei, endireitando a minha postura.

— O que tem ela?

— Ela nunca vai me deixar pegar, sei lá, quantos dias de folga.

— Ela vai ter que deixar. Você não vai perder essa oportunidade porque sua chefe psicótica te odeia. – respirei fundo.

— Eu posso conseguir outro emprego, certo?

— Lily, relaxa. A Umbridge é terrível, mas ela não vai te demitir né? Ninguém mais aguentaria aquela mulher.

— O marido dela aguenta, ela é casada.

— Ela é casada?

— Sim, eu a chamo de sra. Umbridge e não srta. Umbridge.

— Até porque não tem como chamar alguém da idade da Umbridge de senhorita. – ela ri.

— Será que ela é casada?

— Claro que não Lily. É até um pouco triste na verdade, mas também com aquele monte de gato...

— A sra. Umbridge e o Filch iam se dar bem. – falo de repente, pensando no nosso vizinho solitário. – Ambos gostam de gatos.

— Ambos são chatos.

— Solitários. – termino com um pouco de pena.

— Credo, Lily. Se você está pensando em bancar a casamenteira, pode esquecer.

— Claro que não. – digo balançando a cabeça. – Só foi um pensamento aleatório.

— Sei. – Marlene estreitou os olhos.

— Sério. – apesar de eu me considerar uma pessoa gentil, a Umbridge já havia ultrapassado todos os limites impostos por mim mesma. A começar pelo dia que ela me abandonou na chuva. Mentira. Começou antes, mas eu não sou uma pessoa rancorosa. Só às vezes. E só com a Umbridge.

Eu pensei que ela ia falar alguma coisa, mas quando apareci no outro dia na loja – um pouco resfriada e espirrando mais do que o normal – ela só deu aquela risadinha e nem olhou na minha cara.

E o Filch só é estranho e eu ia ser uma pessoa terrível se colocasse a maluca da Umbridge na vida dele.

— Eu vou falar com ela hoje. – eu disse assim que meu celular vibrou com a chegada de um novo e-mail. Marlene pegou o celular com os olhos brilhando de empolgação.

“Cara senhorita Evans,

Parabéns por ter ganhado o concurso! O seu texto foi escolhido dentro de milhares e de longe foi um dos mais eloquentes. A decisão dos jurados foi unânime.  Em breve, um funcionário entrará em contato com você, mas antes, aqui vão alguns detalhes da sua estadia em Londres!”

Em seguida, havia um roteiro de quatro dias. Iríamos para Londes dia 3 de setembro, no dia 4 veríamos a première, no dia 5 estaríamos em uma série de eventos e dia 6, iríamos para casa à tarde.

— Dois dias para conhecer Londres! – Marlene abriu um sorriso.

— Você já conhece Londres. – eu falo para ela. Chelmsford fica a apenas uma hora de distância.

— Eu sei, mas ainda tem lugares que eu não conheci. Vou alterar nosso roteiro. – ela diz e sai da sala.

Uma funcionária da Inside me liga depois de alguns minutos me dando mais detalhes. Nós iríamos de carro, já que a viagem de Chelmsford até Londres é rápida. Ela deu uma rápida indicação do que deveríamos usar na première e nos eventos, pediu nosso endereço e alguns documentos, também disse que daria mais detalhes quando viesse nos buscar.

Eu não sabia nem o que pensar, estava nervosa por causa da Umbridge, mas a empolgação é maior.

Eu não estou acreditando que vou conhecer o elenco de Bittersweet. Eu não acredito que vou conhecer James Potter.

Não parei de sorrir enquanto fazia o almoço, me arrumava e ia para o trabalho. Só parei de sorrir quando a sra. Umbridge apareceu na minha frente e semicerrou os olhos.

— Por que está sorrindo? – desfiz o sorriso.

— Nada. – ela me encarou por mais um tempo e depois saiu.

Respirei fundo, eu tinha que falar com ela hoje. E ia, depois do turno.

Eu nem sabia ao certo o que falar e até tentei treinar comigo mesma, mas hoje Umbridge trouxe mais gatos que o normal e eles sempre estavam por perto. E eu não conseguia me concentrar com aqueles gatos me encarando.

Quando meu turno acabou, reuni coragem e bati à porta da minha chefe.

— Sim? – abri uma fresta da porta. Dolores está sentada atrás da mesa de madeira bebendo chá, nas paredes estão pendurados inúmeros pratos com ilustrações de gatos e os gatos reais estão circulando pela sala.

— Posso entrar?

— Por que?

— Quero falar com você. – ela apertou os lábios, pousou a xícara, entrelaçou as mãos na mesa.

— Pode entrar.

— Então... – comecei assim que entrei na sala extremamente rosa, ela voltou a beber o chá. – Eu vou sair da cidade por um tempo e vou precisar de uns dias de folga. – quando termino de falar ela bate a xícara com força no pires e eu levo um susto com o barulho repentino.

— Como assim, srta. Evans?

— É porque eu ganhei uma promoção e irei para Londres. – eu disse retorcendo as mãos com nervosismo. Umbridge me encarava com os olhos arregalados.

— Que promoção?

— Uma promoção da Inside sobre Bittersweet. – comecei animada, mas desanimei sob o olhar raivoso da sra. Umbridge. – Mas eu volto rápido. Ficarei só 4 dias fora. – ela respirou fundo.

— Sabe, srta. Evans, se tem uma coisa que não suporto, é deslealdade. – franzo as sobrancelhas. De novo esse papo de deslealdade.

— Eu não entendi, sra. Umbridge. Em nenhum momento fui desleal com a senhora. – ela estreitou os olhos.

— É claro que foi! Se inscreveu nessa promoção, ganhou e agora vai deixar a loja!

— Sra. Umbridge, eu acredito que eu tenho direito a alguns dias de folga. Pode descontar no meu próximo período de férias. – disse tentando me manter calma.

— Não vai haver próximo período de férias porque você está despedida! – Umbridge disse com o rosto vermelho e meu queixo caiu.

— O que? – ela deu um sorriso presunçoso.

— Sim. Está despedida. – meu choque durou 5 segundos.

— Quer saber? Você não precisa me demitir porque eu me demito! Eu não aguentava mais ter você como chefe! Você fica me monitorando com suas câmeras, me deixou largada na chuva e fica deixando esses seus gatos malucos soltos pela loja! E as camisetas ficam cheias de pelo e eu tenho que ficar tirando porque senão os clientes não compram. – respiro fundo para me acalmar. – Aliás, só fiquei aqui esse tempo todo por causa do desconto dos funcionários. – terminei enquanto Umbridge me encarava boquiaberta. – Passar bem. – saí da sala, peguei minha bolsa e deixei a loja.

***

— Eu não acredito que gritei com a minha chefe. – eu disse quando Marlene se sentou ao meu lado me entregando uma xícara de chá.

— Ex chefe, Lily. Já foi tarde, aliás. – ela disse ligando a TV e selecionando o primeiro episódio da primeira temporada da Bittersweet. Franzo a testa para ela.

— Você? Colocando Bittersweet. – ela suspirou, mas sorriu.

— Bem, se eu vou à première da série. Eu preciso, pelo menos, saber falar sobre né. – sorri enquanto me aconchegava puxando a manta branca do sofá.

Naquele dia assistimos todas as temporadas de Bittersweet e eu fiquei, pessoalmente, satisfeita quando Marlene comentou que deveria existir um Luke Moyes na vida dela e que Karen Lewis é a melhor personagem de sempre.

Não seria uma fangirl completa se não convencesse alguém a assistir minha série preferida.