Até a Próxima Noite escrita por Pandora Imperatrix


Capítulo 4
Fogo




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“E tudo que fica entre a libertação da alma
Dessas carne e ossos temporários
E ao saber que que está acabado agora
Eu sinto minha mente desvanecida começar a perambular

Toda vez que você falhou, e toda vez que você tentou
Todo sonho bobo, e todo o compromisso
Toda palavra que você falou, e tudo que você disse
Tudo o que você me deixou, vagueia em minha mente”

The Killers — Goodnight Travel Well

 

Ela mal tinha cedido ao sono quando foi despertada por um par de mãos a chacoalhando pelos ombros.

— Hanabi?

Pálidos olhos grandes e amendoados separados por uma mexa de cabelo castanho que ela sempre estava tentando, sem sucesso, afastar do rosto da irmã a encararam na penumbra. No rosto dono deles, uma expressão urgente.

— Vamos! — E num farfalhar de tecido negro, ela se afastou da cama andando ao redor do quarto. — Pegue as coisas que precisa, mas seja rápida, vai ficar claro logo, logo. Não temos muito tempo.

Hinata afastou as cobertas de cima do próprio corpo, que cansado, exigia que ela voltasse a posição anterior, coisa que Hinata não fez, pois pôs-se a sentar na cama.

— Hanabi? O que você está fazendo aqui? E o que são essas roupas?

— Sério, nee-san? Minhas roupas? — treze anos de pura incredulidade a encararam com as mãos na cintura, Hinata, mesmo sem entender o que estava acontecendo e, se fosse sincera ainda grogue de sono, sentiu o coração inflar de amor.

— Hanabi...

A pequena suspirou dramaticamente.

— Não é óbvio, tola? Vamos te tirar daqui!

— Me tirar? — ela fez uma expressão confusa para depois ficar bem séria. — “Vamos” quem, Hanabi? Esse não é mais um dos seus planos brilhantes com o Konohamaru-kun, não é?

— Quem? — a voz dela subiu um oitavo com falsa curiosidade. — Não conheço ninguém com esse nome — e Hinata quase riu, então eles tinham brigado de novo, acontecia pelo menos duas vezes na semana e ainda assim não a surpreenderia em nada se em apenas alguns anos a amizade instável dos dois não se transformasse em algo mais interessante. — Anda, nee-san! Não temos tempo!

— Não vou a lugar nenhum se você não me disser o que está acontecendo.

Hanabi se aproximou dela, pegando a irmã mais velha pelas mãos. Ela era uma menina orgulhosa, sempre fora, enquanto Hinata se portava com humildade e timidez, Hanabi era tão explosiva e faiscante quanto seu nome sugeria, ela desafiava mais velhos e tinha completo desprezo pela noção de que ela deveria ser mais complacente apenas por ter nascido mulher, mas nunca, em momento algum, Hinata havia visto exposto no rosto da menina que havia ajudado a criar quase como filha uma expressão de total desespero.

— Por favor, venha comigo. Eu não sei se teremos essa oportunidade mais uma vez. Too-san está esperando.

Hinata apenas assentiu. Ela não era idiota, sabia o que estava acontecendo, mas algo em si precisava de uma confirmação verbal para que a situação se tornasse mais real. Ela se levantou e foi a até um dos armários, pegou uma caixa de madeira que continha as coisas que lhe eram mais preciosas no mundo, coisas que haviam pertencido a sua mãe.

— Já terminou? Anda!

— Estou indo, Hanabi! Você não espera que eu saia assim, não é? Aparentemente uma de nós ainda tem algum decoro.

Hanabi revirou os olhos.

— Eu precisei me vestir assim para passar desapercebida, não é óbvio? — ela apontou para as próprias vestes, parecia uma ninja de peça teatral, com roupas masculinas todas em preto, no meio de um palácio tão colorido como o que Hinata vivia, nada chamaria mais atenção.

Hinata achou melhor nem responder e tratou de vestir apenas o uenokino¹ por cima das vestes que estava usando, cairia morta de vergonha e céus sabem o que lhe aconteceria se fossem pegas daquela forma pelos corredores, mas tentou não pensar sobre isso, na verdade, estava tentando com muita força não pensar muito sobre o que estava acontecendo.

Hanabi a guiou por corredores que ela nem sabia que existiam, tudo passou por Hinata como um filme, seu coração batia de vagar, mesmo quando quase foram interceptadas por uma das guardas da Ooku² — Hanabi havia se livrado da que ficava na porta de seu quarto sabem os deuses como, e conhecendo sua irmãzinha, ela sinceramente não queria descobrir — era como se tudo tivesse acontecendo com outra pessoa, não ela e, ela mal havia piscado e, ao abrir os olhos, estava sentada numa carruagem mercante, com todas as janelas bem fechadas e Hanabi espremida ao seu lado.

— Você disse que Chichi-ue³ estaria aqui.

— Shhhh — fez a menina, ela se remexia bastante, visivelmente incomodada.

— Hanabi...

— Ele vai encontrar com a gente logo a frente, está bem? Não fica falando, vão ouvir você. Eu queria ter feito isso durante a madrugada como uma pessoa normal, mas aquele idiota tinha que ficar segurando você a noite inteira, não tinha?

O estômago de Hinata despencou e seu coração começou a bater com força, suas palmas começaram a suar e ela apertou a caixa que tinha nas mãos com força.

Naruto no Miya4.

Ela estava a ponto de deixar Naruto no Miya.

A figura dele se formou diante de si, quase real o bastante para ser tocado e ele tinha a mesma expressão de abandono que ela havia visto em sua versão infantil tantas vezes ao ser diminuído ou excluído por não ser como o primo herdeiro do trono. Ela se lembrou da sensação das mãos dele sobre ela na cerimônia de casamento, quando ela quase havia caído, de como ele se aprumava e erguia as sobrancelhas numa expressão de completo deleite quando ela adicionava algum fato interessante em suas estórias, na verdade nunca antes um homem havia parado para ouvi-la por tanto tempo, mesmo que o motivo pelo qual ele o fazia fosse tão sombrio. Ainda assim... Ela olhou para Hanabi, ela amava tanto a irmã e, quando ela escolheu deixar a casa de seu pai para entrar na Ooku sem saber se voltaria, ela sabia que estava desistindo de enorme parte do relacionamento que haviam construído em sua solidão compartilhada. Ela pensou em seu pai e em como ele havia se oposto àquele casamento, no fundo de se coração estava chocada com o fato de que ele estava se arriscando tanto para salvá-la, ela nunca pensou que valeria tudo isso, não ela, não depois de tudo que seu já havia perdido por sua causa.

Mas no final, seus pensamentos se voltaram para seu marido, ela tentou imaginar a reação que ele teria ao descobrir que ela havia fugido. Sentiria raiva? Alívio? Ele mesmo havia sugerido que ela estaria melhor o mais distante dele o possível. Então porque seu coração partia ao imaginá-lo sozinho? Tennou Heika5 estava longe, Kushina Chuugu6 havia partido quatro anos antes, havia definhado em apenas alguns meses após a morte de seu marido. Naruto no Miya não tinha amigos próximos entre os nobres, ele se saía bem nos campos de batalha, mas não tinha tanta sorte na política, se o poder era algo sujo que exige que quem o deseja se abaixe para obtê-lo, ele se recusava a se curvar ou sujar as mãos e isso o condenava a uma existência difícil.

Ela ouviu conversa do lado de fora, barulho dos portões se abrindo.

Hinata engoliu em seco, uma lembrança querida em que ela lia para Naruto no Miya e ele pegava no sono deixando a cabeça descansar em seu ombro queimou em sua mente e ela soube, naquele instante, que nunca houve chance real de que ela se afastasse dele por vontade própria depois que havia entregado seu destino nas mãos dele sem saber se sobreviveria para ver outro amanhecer.

Sua mente gritava que aquilo era loucura e ela não ousou olhar para Hanabi uma última vez antes de abrir a porta da carruagem.

— O que você está fazendo? — na voz de sua irmã era evidente o terror.

— Fique quieta, eles não podem ver você — Hinata soou fria.

— Hinata!

— Estou falando sério, se eles virem você eu não vou poder te proteger, por favor, fique quieta.

— Eu não acredito nisso! — pelo canto do olho Hinata vislumbrou a expressão traída na criança que ela havia amado mais do que a si mesma desde o dia em que havia sido posta em seus braços. — Você enlouqueceu? Hinata, ele vai matar você!

— Eu sinto muito, Hanabi — disse com uma voz quebrada antes de finalmente sair.

— Vá o mais rápido o possível — ela disse para o cocheiro que não pensou duas vezes.

Então uma parte de si se deu conta que aquilo havia sido muito fácil, os guardas que abriram o portão não haviam feito nada ao ver a cena da princesa sair de uma carruagem mercante, na verdade, não estavam nem em seus postos. Foi então que, num estalo, o estupor que há havia feito surda para o que a cercava desde o momento que Hinata havia sido conduzida para fora da Ooku foi suspenso e ela ouviu os gritos.

Ela correu em direção aos gritos, ao longe ela conseguia sentir cheiro de fumaça, por fim, encontrou uma dama da corte que corria na direção do palácio.

— O que está acontecendo?

— Hinata no Miya! — a mulher deixou o jarro de água que carregava cair no chão e o objeto se quebrou espalhando água no chão e nas duas. — F-fogo!

— O que?

— Os aposentos de Naruto no Miya? Todos achavam que... Hidenka-sama7 não soube?

Um calafrio atravessou o corpo de Hinata, ela ficou tonta e precisou ser segurada pela mulher para não cair.

— O-onde ele está?

— Eu pensei... Nós todos achávamos que ele estava com Hidenka-sama.

— Ele ainda está lá? — perguntou com a voz fraca.

— Pelos deuses — a mulher choramingou.

E então, antes mesmo de passar o mal-estar, Hinata começou a correr.

Ela arfava. O sangue pulsava em suas orelhas e ela simplesmente não conseguia compreender o que se passava diante dela.

A residência do príncipe, o lugar que ela deveria chamar de lar, onde ela havia passado as últimas duas noites lutando para viver, estava em chamas. Labaredas escarlates lambiam a estrutura de papel e madeira que se desfazia em cinzas diante de deus olhos revelando a fragilidade do trabalho humano em relação ao poder do mais terrível dos elementos.

Uma fila de soldados e servos se revezavam em jogar jarros de água, mas as chamas pareciam não ter fim.

— Naruto no Miya... — ela sussurrou.

As pessoas gritavam em volta e Hinata não desviou os olhos do cenário aterrorizante quando a mesma dama da corte finalmente a alcançou, lhe segurando o braço.

— Aconteceu muito rápido, Naruto no Miya foi avisado que Hidenka-sama havia partido. Eu não sei o que aconteceu, eu achei... Eu achei que ele tivesse se juntado aos grupos de busca, então o fogo surgiu. Deuses que me perdoem, mas ninguém viu como começou, quando nos demos conta já estava dessa forma.

Talvez ele tivesse ido até lá atrás dela?

— E as pessoas que estavam lá dentro?

— Todos conseguiram sair, nós achávamos que não tinha mais ninguém.

E porque teria? Enquanto Sasuke Tennou estivesse fora Naruto no Miya estava usando a residência do Imperador e Hinata estava ficando na Ooku, não havia qualquer motivo para o prédio ser usado, excerto, é claro à noite.

A dama da corte largou Hinata e parou um dos soldados que passava com um jarro vazio.

— Hachi-i-dono8, Hinata no Miya está aqui — o homem olhou para Hinata com olhos arregalados, ele tinha suor no rosto e as vestes chamuscadas — ela diz que Denka-sama9 ainda pode estar lá dentro.

O soldado empalideceu.

Ele começou a gritar para os outros e a dama da corte voltou-se a Hinata, ela dizia algo, queria que ela fosse a algum lugar consigo, mas Hinata não ouvia, seus olhos ainda fixos no prédio em chamas, ela pensou em Hanabi outra vez, em seu pai, no que ele havia feito para mantê-la em segurança e, pedindo desculpas a eles e aos deuses, ela se desvencilhou da pobre dama da corte que tentava fazer com que ela escutasse a razão e correu em direção as chamas.

Todos estavam atônitos demais para impedi-la no primeiro momento, mas ela não foi longe, logo soldados sujos de cinzas e suor a agarraram pelo meio, gritando para que ela parasse com aquela loucura enquanto ela só sabia gritar de volta o nome do marido, que ele ainda estava lá dentro, que eles deveriam fazer alguma coisa e então, do mesmo modo súbito que as chamas haviam se formado, foram extintas.

Hinata parou de lutar e o domínio dos soldados sobre seus membros se tornou mais fraco. O mundo pareceu estacionar em surpresa e reverência e então a porta principal se abriu e, se arrastando, a figura de Naruto no Miya surgiu em meio a cortina de fumaça.

Ele tinha o rosto preto de cinzas, os cabelos e as vestes chamuscadas e, para o horror de Hinata, todo o braço direito coberto de bolhas e queimaduras profundas.

Quando ela correu em direção a ele ninguém a parou dessa vez.

Mas antes que ela pudesse chegar até ele, Naruto caiu, primeiro de joelhos e depois tombou contra a terra.

— Você... — ele tossiu — não deveria estar aqui — a voz saiu fraca e ele fechou os olhos, ela se ajoelhou ao lado dele, sem coragem de tocá-lo.

Sakura surgiu ao seu lado e rapidamente se debruçou contra Naruto, Hinata ainda vislumbrou a figura de alguns outros herbalistas e ouviu Sakura gritar ordens para eles quando sua visão começou a ficar turva.

— Hinata no Miya, você está bem? — alguém perguntou, mas ela não sabia dizer quem.

— Naruto no Miya... — foi a última coisa que ela disse antes do mundo dissolver em breu.

Ela acordou ao cair da noite, estava de volta ao seu quarto na Ooku. Uma dama da corte sentada ao seu lado cochilava com a cabeça oscilando.

Ela sentia a boa seca e, ao se levantar, se serviu do jarro de água que ficava ao lado de seu leito. Mas, ao ver seu rosto refletido na água as lembranças lhe voltaram como um turbilhão. O olhar traído de Hanabi, a carruagem, o plano de seu pai, o fogo,...

— Naruto no Miya!

A dama da corte despertou assustada e num instante Hinata estava de pé.

— Miya-sama10, está se sentindo bem?

— O-onde ele está? Aonde está meu marido?

— E-ele está aos cuidados de Tsunade-dono no herbário.

Hinata não perdeu tempo e, com a dama da corte em seu encalço, deixou a Ooku em direção a residência do Imperador.

Mas, ao chegar lá, não encontrou a chefe dos herbalistas e sim Sakura.

— Então está acordada — a voz da amiga soou fria e desinteressada — espero que esteja bem agora.

— C-como ele está? — ela se aproximou do leito onde o marido estava, mesmo com os olhos fechados em seu rosto uma expressão de dor formava linhas profundas. A mão de Hinata pairou sobre o corpo de Naruto, coberto somente até a cintura, a parte superior exposta mostrava que as queimaduras haviam alcançado até o ombro e uma parte do peito, uma crosta de unguento verde com um cheiro pungente mesmo no ambiente perfumado por incensos medicinais cobria a maior parte dos ferimentos.

— Não o toque.

— O-oque?

Sakura fechou os olhos e suspirou, ela parecia exausta.

— Não vai querer desalinhar os chakras dele, o ki dele está fraco.

— Ele... — ela recolheu a mão estendida — ele vai ficar bem?

— Isso não deveria importar para você — a voz dela soou quase agressiva, mas Hinata não recuou.

— Sakura-san, o que há de errado?

— Eu achei que você tinha conseguido escapar, eu achei que essa loucura havia acabado.

— Eu não pude.

— Você não deveria ter voltado Hinata no Miya... Se você tivesse partido isso tudo, pelo menos, teria servido para alguma coisa. Agora você está em perigo outra vez e o Naruto... Kami, o que está acontecendo?

— Você está dizendo que o que aconteceu foi minha culpa? Porque eu não tive a intenção... eu nunca iria querer que algo ferisse Naruto no Miya.

— Eu sei... me desculpe, é só que... Eu queria que Sasuke-kun estivesse aqui.

Hinata sabia bem do relacionamento da herbalista com o imperador, mas nunca a havia a ouvido se referir a ele de modo tão informal.

— Onde está Tsunade-dono?

— Outras pessoas se feriram, a maioria tentando apagar o fogo, ela está coordenando os cuidados a eles.

— Mas e...

— Ele vai ficar bem — Sakura riu fracamente, mas Hinata a viu limpar uma lágrima teimosa — sabe, ele nunca ficou doente antes. Nem um resfriado, nada. Ele pode ser um idiota tão grande, não achei que fosse possível. Ele tem que ficar bem. Mas estou com tanto medo de descobrir como esse fogo começou... Estou com medo, ele não disse nada antes?

— Não... Foi uma noite tranquila, mais do que a primeira, eu e ele... Nós só tivemos uma espécie de discussão e então eu contei minha estória, foi isso.

As duas ficaram em silêncio, a mão de Hinata ainda comichava para que ela tocasse o marido, como se para ter certeza de que ele estava realmente ali, vivo e sólido.

— Me desculpe pelo modo que eu falei antes. Na verdade, estou feliz por você estar aqui. Você está bem mesmo?

Hinata sorriu de leve para a amiga.

— Vou ficar quando ele estiver — ela tocou o braço da amiga — vá descansar, Sakura-san, você parece exausta. Eu ficarei com ele.

Sakura lhe deu um sorriso agradecido e partiu.

Hinata acordou pela segunda vez aquela noite com o som de um gemido de dor.

Ele tinha os olhos arregalados e uma expressão de completo terror, Hinata se alarmou a vê-lo começar a se mexer.

— Denka-sama, por favor se acalme.

O olhar aterrorizado dele se voltou a ela e era como se ele estivesse sufocando um grito.

— Hinata, o que está fazendo aqui’ttebayo?

— Eu... eu estou cuidado de Denka-sama — ela pegou um dos vidros ao lado da cama dele e reconheceu pelo cheiro como uma mistura de ervas para dor. — T-tome, isso vai te fazer se sentir melhor.

Ele fechou os olhos com força.

— Você não deveria estar aqui, Hinata... — ele fechou os olhos com força, seu rosto todo franzido pela dor mal contida.

Hinata estava ficando cansada de ouvir aquilo. Havia toda a sua vida se sentido indesejada, mas quando Naruto, dentre todas as pessoas, dizia aquilo tantas vezes, fazia com que ela se sentisse mil vezes pior.

— Beba, Denka-sama deve estar com dor.

— Eu não me importo.

— M-mas eu me importo — ele abriu os olhos e a encarou. — Naruto no Miya eu disse uma vez e vou repetir pela última: eu não acredito nas suas ameaças. Eu não acredito que a mesma pessoa que era tão gentil comigo quando éramos crianças seria capaz de me causar algum mal. E eu não sei o que aconteceu essa manhã e sinceramente a única coisa que me importa agora é que Denka-sama fique bem porque se não ficar... — a voz dela quebrou — eu não sei o que vou fazer... P-por favor, beba isso.

Ele a encarou por mais alguns segundos antes de, gemendo de dor, levantar um pouco da parte superior do corpo e aceitar o recipiente com o remédio, seus dedos roçando nos de Hinata no processo.

Ele fez uma careta ao beber o líquido resmungando sobre Saskura sempre fazer os remédios mais amargos de propósito, Hinata sorriu fracamente.

— M-melhor?

Ele respirou fundo após voltar a se deitar e nada respondeu.

— Ainda é noite.

Ela dirigiu o olhar para fora e, como ele havia apontado, as estrelas ainda brilhavam suavemente pelo céu.

— Termine.

— O-oque?

— Você não chegou a terminar de contar... — ele engoliu em seco e franziu o cenho, fazendo silêncio por alguns segundos, como se atravessado por mais uma onda de dor — o final da estória.

Hinata viu uma pequena mancha surgir na manga de suas vestes e só aí percebeu que estava chorando.

— N-não — ela fundou — não havia muito depois daquilo, eu s-só fiz parecer que tinha.

Ele tentou sorrir, mas saiu mais parecido com uma careta de dor.

— Mas você disse que não tinha medo?

— Não fiz p-por medo.

— Porque, então?

— Eu só queria uma d-desculpa...

— Uma desculpa?

— Para ficar mais tempo com Denka-sama.

Eles ficaram em silêncio por alguns minutos depois daquilo e somente depois, quando Hinata achava que ele havia caído no sono outra vez, ela o ouviu dizer:

— Termine mesmo assim’ttebayo... Eu quero ouvir... o final.

Ela molhou os lábios antes de começar.

“A carruagem foi atacada por um bando de bandidos. Tsubaki, presa no interior com sua dama de companhia manteve os olhos fechados, rezando para que tudo terminasse logo e para que ninguém com que ela se importava se machucasse. E, quando tudo silenciou, ela abriu a porta para conferir se todos estavam bem.

Assim que se desvencilhou de sua chorosa dama de companhia, Tsubaki começou a procurar pelo noivo, mas encontrou somente corpos ao redor da carruagem, mas ao contornar o veículo ouviu um grito e um par de braços a agarrou pelos ombros e a girou para longe do perigo. Ela olhou para cima aterrorizada e encontrou os mesmos olhos que haviam olhado por ela por toda sua vida. Na infância com amor, por boa parte de suas vidas com ressentimento e, nos últimos anos, com algo indecifrável, mas com o que ela conseguia enxergar muito bem agora.

Ele a deixou e num movimento rápido de sua espada, decapitou o homem que havia tentado matá-la e que, o havia ferido mortalmente.

Os dois caíram sobre a grama, sangue inundava as vestes de Yuuzu e as mãos de Tsubaki que chorava e gritava por ajuda. Os guardas sobreviventes que pareciam ter se distanciado ao correr atrás dos bandidos que haviam fugido para a mata correram em direção dos dois, mas era tarde demais.

Yuuzu estava morrendo e não havia nada que nem eles, Tsubaki ou ninguém pudesse fazer.

Ela colocou cabeça do primo sobre os joelhos, afastando os longos cabelos castanhos dele do rosto marcado pela dor.

Ele havia sido sempre muito bonito, Yuuzu, e Tsubaki tentou usar aqueles últimos momentos para gravar as feições dele em seu coração.

‘Porque fez isso?’ perguntou ela em meio as lágrimas que banhavam seu rosto.

‘Você sabe porquê.’

‘Eu achei que você me odiasse.’

Ele sorriu para ela e tentou tocar seu rosto, ela tentou não pensar em quão raros eram os sorrisos dele e o quão perto eles estavam de se tornarem para sempre extintos.

‘Eu bem que tentei.’

‘Mas... Depois do que aconteceu a seu pai...’

‘Meu pai não morreu por dever e eu o compreendo agora’

E então, ele fechou os olhos que haviam tão diligentemente olhado por ela desde sempre.”

Hinata sentiu a mão não ferida dele tocar seu rosto, limpando suas lágrimas.

— Eu... sinto muito’ttebayo.

Ela apanhou a mão dele e, num ato mais corajoso do que correr em direção a um prédio em chamas, ela beijou a superfície molhadas de seus dedos.

— Só prometa que nunca mais vai fazer algo perigoso assim... Não por minha causa... Eu não quero te perder também.

— Hinata...

— Por favor, Denka-sama.

Ele assentiu e ela se deitou ao lado dele, no chão. E foi onde eles foram encontrados na manhã seguinte, ainda de mãos dadas.

1 - uenokino: uma das partes mais superiores do kimono de várias camadas que as mulheres nobres usavam na era Edo.

2 - Ooku: lugar onde o imperador mantinha as mulheres ligadas a ele, Imperatriz, concubinas e a mãe dele etc.

3 - Chichi-ue: modo respeitoso de se referir ao próprio pai.

4 - Naruto no Miya:"no Miya" é como se referencia ao príncipe.

5 - Tennou Heika: Vossa majestade o Imperador

6 - Chuugu: Imperatriz.

7 - Hidenka-sama: Modo de se adereçar à princesa territorial.

8 - Hachi-i-dono: modo de se referir a uma pessoa nobre sem título, no caso a um soldado real de baixa patente.

9 - Denka-sama: Modo de se adereçar ao príncipe territorial.

10 - Miya-sama: modo respeitoso de se referir ao príncipe ou princesa.

 

 


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo teve mais ação que o outro não teve? Mas espero sinceramente que a letargia que eu estava durante esse feriado não tenha se embrenhado na minha escrita. Mas é sempre assim quando eu tento alguma coisa que exige mais energia social de mim que o normal e eu tive um encontro na quinta, passei o resto dos dias basicamente em coma de exaustão psíquica. Não sejam introspectivas, crianças, é uma merda.

Mas aí está, mais um capítulo e estamos chegando no primeiro timeskip que nos leva para o meio da fic. Pois é! Está passando rápido, né?

Ah, uma dúvida que vocês possam ter ficado é quanto à disposição do palácio. Ao contrário de castelos ocidentais, as construções japonesas (e orientais em geral) não têm mais de um andar, então, um palácio não é feito somente de um prédio, mas de vários deles, é mais para um complexo como do Clã Hyuuga do mangá, sabe? Por isso a Hinata dorme num lugar diferente do Naruto, pois há a residência do Imperador, onde fica o trono de crisântemo, há a residência da Imperatriz que é a Ooku, as residências dos príncipes e até alguns nobres moram nas terras do palácio. Esses prédios têm nomes, mas minha pesquisa não me ajudou muito, então vou ficar devendo a vocês.

Qualquer dúvida pode perguntar que vou fazer o meu melhor para responder, lembrando que eu não sou uma estudiosa da área e meu conhecimento provavelmente tem várias falhas.

Muito obrigada por todos os favoritos e comentários, vocês são uns amores!

No próximo capítulo:

Hanabi tenta mais uma vez salvar a irmã, as feridas de Naruto inflamam, Sasuke não volta ao palácio mesmo ao saber que o Príncipe Regente está impossibilitado de governar.



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