retr(atos) escrita por Lyn Black


Capítulo 4
FRAGMENTO 4 – Lucy Elizabeth


Notas iniciais do capítulo

Esse ficou um pouco mais longo, espero que gostem!!
Não esqueçam de comentar, seria super legal saber a opinião de vcs!
Bjs



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FRAGMENTO 4 – Lucy Elizabeth

(sou uma narradora onisciente, deixemos de pretextos)

 

 

— Hey, L., tem dois caras bem gatos aqui na recepção falando que marcaram horário com você por celular, o que eu tinha a leve impressão que você não tinha, mas tanto faz, né? Posso mandar subir? – a voz entrecortada pela linha ruim chegou aos ouvidos da garota enquanto ela trocava o CD do toca discos que comprara pela manhã. Olhou-se de relance no pequeno espelho pendurado antes de pigarrear e tomar o telefone fixo pela mão, aproximando-o do seu rosto. – Menina, onde você arranja essas pessoas, a loira de ontem tinha o mesmo jeito estranho... – a outra continuou seu sussurro chegando com um tom curioso disfarçado por brincalhão, mas sendo completamente ignorado.

— Pede pra eles esperarem um momento que eu vou descer, Rita.

Ainda pendurada no telefone fiado, se contorceu para não derrubá-lo da mesa ao tentar alcançar a última gaveta da escrivaninha apilhada de bugigangas acumuladas das suas bravas aventuras pelos brechós dos arredores. Percebendo que o outro lado da linha ainda não havia sido desligado, um vinco se formou entre as sobrancelhas da garota.

— Rita? – sua voz ecoou sem encontrar resposta fazendo com que um formigamento crescesse no seu estômago.

Largou com rapidez o telefone, agachando-se e praticamente arrancando a gaveta, até tirá-la por completo da mesinha. Após tomar em mãos uma varinha empoeirada, teve apenas tempo para se levantar antes de escutar a campainha soando estridente pelos seus ouvidos. Ansiosa, usou da flexibilidade da antiga companheira, varinha de sabugueiro e escamas de sereiano, para enfiá-la no coque que sustentava sem muito capricho na cabeça.

Andou calmamente e destrancou os dois fechos antes de virar a chave, a mão ainda bem firme na maçaneta, porém não aparente pelo modo como se apoiou na batente, praticamente jogando o corpo para fora. Talvez outros ficassem desconcertados com os dois pares de olhos verdes que sincronizados viajaram da sua cabeça aos pés, porém ela só revidou com seus olhos grandes e desdém sobrepondo qualquer sentimento.

— Não sabia que também gostava de pintar as unhas, Albus. – falou enquanto sondava as unhas sempre bem feitas de James cobertas por um tom acobreado que cintilava demais para ser trouxa. Não mudou de posição, seu olhar desafiador recebendo um bufar impaciente do mais velho ali. – Como me encontraram?

— Você manteve uma assinatura com O Pasquim sob o nome de uma trouxa assassinada no verão passado, que eu suponho que ainda esteja usando, certo... – James fez uma pausa para olhar para o papel dentro da pasta laranja que carregava – Elizabeth Gibbins?

A mulher revirou os olhos, antes de sair por completo do apartamento, girando a fechadura atrás de si.

— Na verdade é Griddin. – comentou casualmente se direcionando para as escadas com um gesto displicente das mãos.

A voz imperativa do outro Potter se fez presente no momento em que pisou o pé no primeiro degrau.

— Onde pensa que está indo, Lucy? Estamos aqui em nome do Ministério da Magia, você sendo acusada de fraude, coerção e cumplicidade no recente rapto de Dominique Weasley.

Ela sorriu preguiçosamente na direção dos irmãos, vendo a sombra de Lily pairar ao lado de Albus para mais uma foto, os sorrisos impecáveis dos três sempre tão falsos e presunçosos.

— Tão bobinhos, vocês dois. Um inquérito dos Aurores nesses termos requer pelo menos mais um auror e você não é nem oficialmente parte do esquadrão, James. Portanto, a sua visita inoportuna é de caráter pessoal. Vamos direto ao ponto, eu já estou atrasada.

James Potter grunhiu irritado, passando a mão pelos cabelos sem consciência.

— Acho que nós dois sabemos que o seu encontro com a Nott pode esperar um pouco.

Ela revirou os olhos, mais fingindo indignação do que levando a sério a abordagem.

— Discordo, mas tudo bem, o que querem?

O irmão do meio foi o primeiro a soltar a sua verdade por entre os dentes, o rosto avermelhado em estresse, impressionando a menina. Tanta coisa entalada, ela supôs com pena antes de absorver as palavras que lhe eram dirigidas.

— Toda a família entendeu e compreendeu do fundo do coração quando você sumiu do mapa, Lucy, mas isso já foi longe demais! Um tempo para se distanciar e recuperar, foi o que aquela sagrada piedosa carta disse. – sua voz retumbou pelo corredor bege, corroendo barreiras da morena que se escorava na parede, muda. – Nós sabemos que dói, porém já parou para pensar no seu pai? Percy está...

Sua voz foi cortada pela secura embebida de mágoa de Weasley:

— Não, vocês não sabem. E não metam o meu pai nisso, por Morgana.

James suspirou audivelmente, ela apostava que de propósito para ganhar atenção naquele silêncio de cacos de vidro.

— Você ainda gosta de bolo de mel ou a perda de entes queridos também muda os paladares? – o sarcasmo foi mal recebido pelo de globos verdes, mas indiferença na mulher. – Vovó fez hoje cedo. – o garoto, pois embora já tivesse indícios de cabelos brancos, não passava dos 26 anos, estendeu um embrulhado na direção dela. A mão dela tremeu ao pegar o pacote, cruzando os braços protetoramente e se perdendo nos cabelos alaranjados do primo que traziam tantas lembranças.

Trocou olhares com ele, que estendeu uma mão em direção à porta que há pouco ela tinha aberto, deparando-se com os dois. Quando Albus deu dois passos na direção dela, a mão de James firmou-se como garras no ombro dele.

— Se você não vai controlar o temperamento, Albus, é melhor que eu fale com ela sozinho.

O garoto de cabelos pretos arregalou os olhos antes de encolher os ombros, desviando do corpo de Lucy como praga antes de descer pelas escadarias em saltos, logo se perdendo de vista.  Era transparente a ausência de predisposição para estar ali, e ela gastou milissegundos imaginando a razão dele, ou razões.

Coçou a cabeça, não tão certa de si mesma ao se deixar estar sozinha ao lado do amigo de infância, mas andou por ele até a porta, destrancando-a com a chave que tirou do bolso da calça que usava e decidida a dar a James o tempo que tanto pedia com os olhos. Deixou a porta aberta após deixar o olhar vagar para trás, percebendo-o basicamente nos seus calcanhares. Ele olhou ao redor por sobre o ombro da garota, examinando como parecia ter entrado num filme trouxa dos anos 90, tirando os sapatos ao ver que ela já enfiara os dela numa pilha perto de um sofá manchado.

Ainda enfiada na geladeira onde buscava um espaço entre os vários restos de quentinhas, Lucy consegui guardar a generosa fatia de bolo e retirar um jarro d’água.

— Aceita um pouco? – ofereceu seguindo as maneiras de sua mãe, quem tinha já ido há alguns anos, mas deixara manias e trejeitos profundos na Weasley.

James II balançou a cabeça antes de abrir um pequeno sorriso:

— Não tente me envenenar, Lucybeth. – o apelido soou bizarro, e ao mesmo tempo, tão doce que beirava ao enjoativo.

Ela riu suavemente.

— Intoxicação do ar enquanto você estiver dormindo, tome cuidado Jam’ – o comentário saiu com mais acidez do que planejado, mas James não pareceu ligar.

Traçando círculos na mesa, ele batucou no chão dentro do silêncio desconfortável que se expandia no cômodo.

— Sabe, Albus tem razão. Quando você vai voltar para o seu mundo? Não por mim ou pela família, mas pelo seu bem.

Ela pareceu ponderar as palavras dele.

Esse é o meu mundo. Certo, manicure não é o meu futuro, mas eu não me sinto mais eu mesma no mundo bruxo.

Ele tomou um gole da água, a mão rígida ao redor do copo.

— Eu realmente entendo a vontade de se reinventar, Lucy, e você sempre quis estudar em Oxford antes de qualquer especialização bruxa, acho que todo mundo sempre teve uma noção básica disso, mas então era Molly que te ligava a magia? Só ela?

A visão de Lucy estava ficando turva para o seu desespero, fato refletido no espelho que se rachou com tanta emoção borbulhando logo abaixo de sua pele.

— Olha James, eu preciso que você entenda e espalhe a mensagem para o resto da família quando eles vierem te perguntar. – ele abriu a boca para interrompê-la, mas a voz não saiu, calado pelo feitiço que escapara pelos dedos ainda parados no ar em movimento da menina com os lábios crispados. – A magia traz a tona o meu pior. Simplesmente acontece e você sabe que sim.

Sirius estava a caminho de desfazer o encanto por si mesmo, mas se interrompeu, deixando falar a menina que parecia que fazia tempo que não conversava sinceramente com ninguém. Ela continuou com seu monólogo:

— Uma vez você acabou na Ala Hospitalar, e a Safo ainda tem aquela variação de cor na íris, minha culpa não importa o quanto ela se gabe de uma mutação genético-mágica. Alucinação conveniente. Se eu fui pra Corvinal foi porque o Chapéu teve receio do que eu viraria se me mandasse pra Sonserina.

Depois dessa, James se livrou da feitiçaria com um riso seco.

— Sua imaginação vai longe, Lucy. Então você se isolar é um ato altruísta para nos poupar do seu potencial destrutivo? Como você comprou essa grande mentira é uma boa questão.

Ela tirou a varinha dos cabelos, deixando as madeixas escorrerem cacheadas pelos ombros enquanto sem murmurar os encantamentos fazia as louças se lavarem sozinhas e o pó sair dos móveis. Os olhos voltaram a sua desidratação habitual, a luz da janela deixando claras as olheiras para a visão do primo, que buscava a menina que um dia conhecera entre as sardas da clavícula exposta. Voltando a cruzar os braços e dessa vez fazendo da geladeira seu recosto, seus olhos desconcertantes castanhos tiraram o homem da sua balança.   

— Sinceramente, Potter – ela cuspiu o sobrenome, como boa parte dos primos terminara fazendo depois de sair da fase mais tola da adolescência – pare de tentar se convencer que se importa comigo. Eu não sou a primeira razão para Albus ter vindo aqui, obliviando a coitada da Rita lá embaixo, aposto.

Ele passou a mão pela barba, levemente exasperado.

— Bem, querendo ou não voltar para o seu, quer goste ou não, mundo bruxo, é visível quais amizades não deixou ir. Aliás, – ele olhou para o relógio de pulso, herança familiar, e um sorriso afetado dominou seu astuto rosto.  – lamento informar que lovergirl cansou de esperar vossa graça, Lucy Elizabeth.

O grito de raiva foi suficiente para que o copo de James se quebrasse no ar enquanto ele o pousava, diversão misturando-se com assombro ao ver que o ar do pequeno apartamento estava certamente mais agitado e difícil de inspirar, moléculas rebeldes.

— Esplêndido, meus parabéns, Sirius! Resultado: não conseguiu extrair nenhuma informação útil, não de mim. – ela revirou os olhos, farta daquilo. – Quem você representa quando tenta se esgueirar pela minha vida, bem miserável por sinal, atrás de uma menina de dezenove anos que vive entre fogo e espada? E que me odeia, só para constar.

Por favor, o que está tentando dizer com isso? Está beirando ao ridículo, Weasley.

— De um lado, a mãe opressiva drenando as energias da pobre doce Dominique. Do outro, a minha, deixe-me te corrigir, antiga noiva, ótima em iludir os outros, eu sei disso melhor do que ninguém.

— Ah, me poupe eu n... – ele foi interrompido pelos olhos brilhantes da garota, uma mão de distância entre eles, a respiração dele já batendo no seu rosto.

— Pare de acreditar em contos-de-fada e responda em qual nome age quando desperdiça sua vida sem se encontrar, James? Todos sabem as onze letrinhas.

O murmúrio derrotado que sai de um ainda mais quebrado Potter nem é escutado, mas Lucy sabe tão bem que só precisa que a ideia entre na cabeça dele para escutar as palavras Harry Potter reverberando pela sua cabeça.

 Molly tinha perdido a vida para deixar Lucy ver a verdade a tempo de fugir, é o que a irmã mais nova diz dramaticamente diante do espelho quebrado, mais tarde. James está encolhido no seu sofá dormindo e o batom vinho esquecido por Victorie é rolado de uma mão para outra de Elizabeth Griddin antes de ela passá-lo nos lábios. Ele se desintegra na sua palma poucos segundos depois. Com um gesto das mãos, o reflexo se acerta para a realidade.

O toca-discos que comprou pela manhã toca um rock brasileiro sobre tetos de vidro em volume baixo, e Lucy não enxerga a área interno do prédio quando olha pela janela, seus pensamentos bem mais abstratos que isso.


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