SOMBRA

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Ela se parece com a mãe. O que é irritante. Como uma cópia paralisada pelo tempo, um reflexo anacrônico, uma sombra fadada a perseguir o inalcançável. Às vezes acha que é menos do que isso. Às vezes questiona se é de fato real ou apenas uma extensão da existência de Ginevra Weasley.

(I'm a shadow)

Ela possuí o sobrenome do pai. O que é insuportável. Essas cinco letras – cinco malditas letras – contêm todo peso do mundo. Atenção indesejada, expectativas absurdas e rótulos cruéis. É observada, analisada e dissecada diariamente. Sua vida não lhe pertence. Toda sua existência não passa de uma narrativa com início, meio e fim pré-estabelecidos antes mesmo de seu nascimento. Uma narrativa sobre a qual centenas de desconhecidos sentem-se livres para acompanhar e julgar, a fazendo questionar se é de fato uma pessoa ou um animal exposto em um zoológico. Às vezes acha que é menos que isso. Às vezes questiona se há algo além de “Potter” dentro de si. 

(I'm a shadow)

Ela foi nomeada em homenagem a avó paterna. O que é insustentável. Em um passado, não muito distante, houve uma mulher com seu sangue, seu nome e seus cabelos ruivos. Grifinória. Membro da Ordem da Fênix. Heroína de guerra. Esposa. Mãe. Lily. Potter. A “primeira de seu nome” foi uma mulher formidável, corajosa, inesquecível. Ela é um rascunho mal feito, uma reprodução equivocada, uma caricatura infantil. Às vezes acha que é menos que isso. Às vezes questiona se é algo além de um esboço inacabado.

 (I'm a shadow)

Ela recebe um segundo nome – como se precisasse de mais um fardo para carregar –, esse em honra à melhor amiga de seus pais. O que é incômodo. Em sua vida há essa mulher, que chama de tia, e é bonita, exótica, inteligente e amada por todos. Dona de uma personalidade peculiar, um senso de humor excêntrico e uma alma gentil. Luna. A “original” emana vida e luz por onde passa. Ela é uma lâmpada quebrada, um fósforo usado, uma vela derretida. Às vezes acha que é menos que isso. Às vezes acha que tudo o que há dentro de si é um redemoinho de trevas, sugando qualquer vislumbre de luminosidade que habite sua alma.

(I'm a shadow)

Ela é a terceira de três filhos. O que é inconveniente. Por mais que ame seus irmãos – e ela os ama –, eles estão sempre por perto, sendo perfeitos e bem ajustados. James Sirius e Albus Severus são tudo o que todos esperavam que fossem. Seguem com louvor o caminho traçado para suas vidas, jogam conforme as regras, se encaixam no quebra-cabeças. Lily Luna é o parafuso solto. Os irmãos são o sol. A garota é a lua, sendo constantemente eclipsada por cada um dos feitos magníficos que eles alcançaram antes dela, por tudo que são e ela nunca terá a chance de ser. Às vezes acha que é menos que isso. Às vezes questiona se é sequer poeira cósmica.

(I'm a shadow)

Então, ela caminha a passos trôpegos até o espelho e encara seu reflexo desolado por um minuto inteiro. Fita os grandes olhos azuis que deveriam ser seus, mas sempre pertencerão a sua mãe, e questiona quem é. Quando está sozinha e despida de qualquer expectativa ou comparação. No âmago do seu ser. No mais profundo e íntimo de sua alma. Quem é Lily Luna Potter? As lágrimas transbordam quando se dá conta de que não faz ideia. Mas sabe que, apesar da aparência, não é Gina. Sabe que, apesar do nome, não é Lily. Não é Luna. Não é Potter. É a terceira de três, mas não é nada como James Sirius ou Albus Severus.

Ela é...

Ela é...

Ela é uma interrogação. Um fantasma. Uma sombra.

É menos que isso.

É então que percebe que longe das expectativas, das comparações, dos rótulos, da reputação dos pais e da sombra de todos que alcançaram a luz antes dela, Lily Luna é nada.

É menos que isso.