A Aurora de Castelobruxo - A Harry Potter Story escrita por ThaylonP


Capítulo 22
Dia dos Mortos




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A pior sensação ao se levantar, sem contar a dor nas costas, foi a de ver Ruína como o primeiro rosto da manhã. A mulher estava inclinada sobre ela, balançando o beliche para fazê-la despertar. Aurora levantou aflita, olhando ao redor à procura das outras meninas do aposento. Sem vê-las, acreditou que estava sonhando, o mesmo tipo de sonho intranquilo que teve depois da explosão na madrugada. Contudo, a professora, já impaciente por ter de acordá-la, negou a importância do susto da menina.

— Está atrasada. Você tem cinco minutos para estar na base da Torre – anunciou, entredentes. Num sonho, ela não se comportaria de forma tão real.

Antes que a mulher saísse, a pequena lhe entregou um olhar duvidoso. Ruína estava usando maquiagem? Não pôde confirmar, pois a mulher, trajada de um vestido vermelho-vivo, fez a curva para descer as escadas.

Cinco minutos.

A menina passou pelo quarto tropeçando com as roupas em mãos, direto para o banheiro. A barulheira do lado de fora dizia que o festival começara. Aurora tomou o banho mais rápido de sua vida, trajou o quimono presenteado por Nino e levou o uniforme de duelos na mão. Mesmo molhada da ducha, sentiu que estava transpirando enquanto descia as escadas.

Escancarou a porta na pressa, quase despencando na grama do terreno. Ruína conferia um relógio com Nino ao seu lado, que de alguma forma, estava mais elegante do que qualquer outro dia. Cumprimentou-a com o mesmo sorriso torto de pompa que costumava adotar, ofereceu-lhe o braço, a garota agarrou-se nele.

— Está deslumbrante, Aurora – comentou Nino. O cheiro que exalava de seu pescoço era amadeirado, como se acabado de sair de uma selva de eucaliptos. – Será a mais bela do festival.

— Obrigado, mas não sei se é verdade. Isso foi o que deu pra arranjar – disse, lembrando-se do cabelo mal escovado e das roupas amarrotadas.

Ruína tomou tempo para fitar a dupla, impedindo uma próxima resposta de Nino. Portava o cajado agora, cascudo como um galho de árvore, com a enorme pedra esmeralda no núcleo acima. Aurora identificou de que se tratava o ornamento no rosto, havia visto parecido com outros estudantes. Era uma pintura, preenchendo todo o lado esquerdo, vermelha como sangue. O olho circundado representava o sol, junto de uma porção de raios embaixo que iluminavam plantações, seguindo traços que marcavam a mandíbula da professora. Aquilo a fez lembrar de uma classe de História da Magia, onde Aquino comentava a crença dos maias sobre renascimento, e como um novo ciclo da agricultura indicava um traço dessa benção.

Contudo, demorou pouco até que a pintura se modificasse. O sol encurtou, o plantio torceu.

— O que há com você? – perguntou Ruína, avaliando o estado da garota. Depois, Aurora sentiu um arrepio dançar sobre seu rosto, e sabendo que algo havia mudado, pediu um espelho para Nino.

— Por que acha que eu teria um espelho? – perguntou, mas assim que a resposta foi óbvia, puxou de dentro de um dos bolsos um pequeno de moldura preta.

Aurora encarou a sua versão do reflexo, impressionada. As olheiras haviam desaparecido, o cabelo estava lustroso como nunca, e a pele parecia ter saído de um spa.

— Podemos? – Ruína questionou mais uma vez, incomodada.

Distraídos, a dupla fez que sim, apertando o passo para acompanhar a mulher. Mesmo acelerada, Aurora não deixou de apreciar ao redor. Primeiro, a faixa prata-reluzente que circundava as florestas; figuras de pé, olhando clareira adentro com um certo saudosismo. Muitos deles, de forma que se apertasse a visão, via apenas uma linha prateada cercando o lugar. Com um pouco mais de atenção, notou tratar-se de fantasmas, e logo viu que não eram os únicos. Alguns que a garota nunca vira confraternizavam junto dos alunos, passeando enquanto conversavam, atravessando barracas, inferindo em tendas e principalmente, caminhando escada acima em direção ao colégio. Sem contar aqueles formando o aro ao redor do colégio, nenhum era indígena. Nino apressou-se a explicar.

— Mamãe disse que é tradição virem nos visitar a essa época do ano – disse, as costas eretas como se o fraque o apertasse. – Em que outra época viriam, não é?

Em segundo lugar, observou a decoração. Para qualquer lugar que encarasse, tudo parecia vibrar cor. Ao redor dos totens pintados, das barracas, das tochas, dos cercados, dos archotes; cada um com uma porção de laranja, roxo, verde e rosa, combinando com as bandeirolas tremulando acima. Havia ainda uma porção de tapeçarias, dispostas como varais, onde figuras dançavam histórias do passado. Caso quisessem ser lidas por inteiro, um estudante deveria acompanhar a trilha até que o conto terminasse. Nenhum aluno, contudo, estava interessado. Estavam mais focados nas barracas de comida, cujas quais se destacavam As Maravilhas do Milho – com uma "milha" de receitas magicamente deliciosas –, Beldades de Amendoim – onde alérgicos lamentavam suas condições –, Interesses de Alfajor – uma tenda argentina que reunia muitos visitantes – e a Boláceos Panificados – recheada de delícias, com o carro-chefe dos bolos panificados de mel.

Também interessavam-se pelas tendas de tarefas que rendiam premiações. As fichas que eram dadas aos vencedores podiam ser trocadas por comida, o que dizia que quem não estava nas barracas pedindo por doces, estava tentando ganhar fundos para isso. Dentre essas, inúmeras se destacavam: Falecido É Quem Tá Morto – onde precisavam adivinhar figuras antigas que deveriam mas não estavam mortas, e ainda era necessário justificar o motivo –, Havia Um Homenzinho Vivo – onde os participantes tinham que acertar através da mímica da organizadora qual era o bruxo morto representado –, Vivo-Morto de Verdade – onde troncos circundavam em torno de um eixo e os estudantes precisavam se abaixar, pular e levantar até que o único não acertado fosse o vencedor. Todos esses sem contar, é claro, os ambientes de aposta, organizado por um monitor de cada casa, atrás de uma bancada repleta de tazos que indicava cada participante do Clube de Duelos, do primeiro ao sexto ano.

A parte histórica do festival era a menos povoada, contudo, a mais significativa. As enormes caixas que as aves trouxeram nos últimos dias carregavam Rochas Convocatórias, espalhadas pelo local também cercado de decoração fluorescente. Essas, entretanto, pousavam ao abandono, até que chegasse um aluno com uma porção de cinzas e lançasse-as na direção, o que criava uma coluna de chamas, onde se reproduziam imagens. Aurora não soube o que seriam as imagens até que viu uma pessoa conhecida se aproximar. Era Maria, que abandonara a tenda de apostas para utilizar a rocha. Segurava uma fotografia que foi apoiada na base. Ela lançou as cinzas, produzindo a chama, e nela, um grupo de pessoas que só podiam ser da sua família comiam uma erva, antes de posar para uma foto, com um rio atrás deles. A menina deixou escorrer uma lágrima, porém, manteve um sorriso satisfeito antes de dar as costas para o fogaréu. Depois, se dirigiu de volta ao seu serviço, apertando um recado escrito num curto pedaço de pergaminho.

A outra conhecida que viu foi Inara. Com a mesma porção de cinzas, se aproximou da região pedregosa mais próximo à floresta e aguardou as chamas apareceram. Surgiram roxas, e uma porção de imagens passou diante de seus olhos, mas Aurora não conseguiu – e nem queria ter conseguido – ver ao longe.

O grupo terminou a caminhada numa área ainda mais barulhenta. No mesmo campo onde ocorriam as partidas de Quadribol, erguia-se uma arquibancada ovalada, cobrindo uma porção de terreno agora reservada para os Duelos. A área parecia ter sido levantada em palanques, na divisa dos assentos e da base, pendiam tecidos flamulando as figuras de cada time. Ruína pediu que a acompanhassem por uma passagem para competidores, atravessando entre as vigas. Passavam por entre outros grupos dos outros anos, seção por seção, até chegarem a área reservada aos participantes do primeiro e segundo. Finalmente, chegaram a uma região nos fundos da pista oval, com duas divisórias separando Jaci, Guaraci e Anhangá no local. Não havia paredes, como se fossem compartimentos dentro de um estábulo. À frente, separando a vista esverdeada do campo, cada representação animal das respectivas casas. A corça pareceu tremer quando Aurora se aproximou junto de Nino.

A bruxa deu uma breve pesquisada nos seus competidores, vendo o que estava em jogo e o que teria de enfrentar. O quarteto de Guaraci era especialmente curioso, em grande parte devido a dupla peruana primeiranista, que não parava de encará-la como se estivessem dispostos a arrancar seu coro. Em Jaci, o quarteto mais assemelhava-se a um time, conversando entre si, trocando estratégias.

— Sr. Stradivarius – chamou Ruína, antes que Aurora terminasse de vasculhar o lugar. – Você precisa sair. Fique a postos na seção para acompanhantes.

Nino entendeu, concordando com a cabeça. Se virou para Aurora desejando uma boa sorte, antes de sair atravessando os panos. Assim que saiu, mais dois professores adentraram a área através de uma divisória de tecido: Miranda e Aquino. Os inspetores se cumprimentaram, reuniram-se aos seus grupos, e por fim, Aurora não conteve um último olhar a Guaraci. E eles não contiveram um último olhar de volta.

Besteira, pensou, lembrando-se do aviso.

Ruína guiou-a até o restante dos companheiros de Anhangá. O primeiro a cumprimentá-la foi Victor, um simpático rapaz de pele parda, porém, sua parceira, uma garota de cabelos cacheados escuros, teve um pouco mais de dificuldade. Chamava-se Rosa, descobriu assim que se apresentou, desconfortável, e o amigo lhe cochichou que a menina estava muito ansiosa. Foi só então, quando a possibilidade surgiu diante de seus olhos, que lembrou de pensar sobre si mesma. Não havia embrulho no estômago, e muito menos a queimação empolgada que esperava carregar.

Isso mudou quando a nova integrante cruzou a divisória.

Inara seguiu até o grupo sem cumprimentar ninguém, sentando-se na grama bem próxima, de pernas cruzadas, atenta o suficiente à frente, mas evitando contato com todos. Estava calma, porém alerta como nunca vira-a.

— Pensei que teria que buscá-la – Ruína disse, mas a menina não deu atenção. – Pois bem – os primeiros a chegar tremeram, todos de uma vez. – Vou alertá-los de algumas coisas sobre os duelos, mas antes, a apresentação. Entrarão em fila, seus acompanhantes se aproximarão, vão até o meio do campo, e finalmente saudar a plateia. Depois que seus acompanhantes saírem, vocês saem por onde entraram, na mesma fila. A esse ponto, os outros anos já terão sido chamados primeiro, mas vocês serão os primeiros a competir. Ficou claro?

Todos confirmaram com um aceno nervoso. Ela prosseguiu:

— Nos Duelos, atenção à movimentação. Defesas longas – a mulher pousou os olhos em Aurora. – Ataques focados, e nada de avançar muito terreno. Mantenham o suficiente para conseguirem terem espaço para manobras. Novamente, fui clara?

Mais uma vez, uma concordância.

— Ótimo – do lado de fora, como se para pontuar um discurso, alguns fogos estouraram. – Vamos, está na hora.

Quem estava sentado se ergueu, e à direita, os membros das outras casas fizeram o mesmo. A corça encarava os membros de Anhangá, o gavião julgava os de Jaci e o lobo-guará alertava os filhos de Guaraci. Do lado de fora, houve um silêncio, e mesmo com a divisa finíssima, ficou difícil discernir o que a diretora estava dizendo.

Aurora sentiu o nervosismo bater. Recorreu a olhar ao redor, e por pouco não fitou Inara pelo costume de buscar um acalento na amiga. Balançou a cabeça, negando o gesto e encarou a passagem prestes a se abrir, ouvindo o volume do lado de fora aumentar:

— Venham até aqui, duelistas do primeiro e segundo ano de Castelobruxo! – pediu Dourado.

Ruína engatou o passo, sendo a primeira a despontar, disparando à luz do lado de fora sobre os alunos. Demorou até que a visão se acostumasse no clarão, mas quando o fez, Aurora teve de deslumbrar ao redor. Uma multidão de alunos gritava sem parar, repetindo os nomes das casas, dos jogadores e até mesmo dos professores enquanto a caminhada estava em seus primeiros passos. Pararam, aguardando os acompanhantes chegarem. Vieram pela lateral, unindo-se aos seus respectivos parceiros e parceiras, prontos para seguir a caminhada. Nino deu-lhe o braço outra vez, mostrando a dentição para fingir que estava tranquilo, mas seu caminhar tremia, a testa suava.

Na plateia, observou, havia uma divisão clara entre Anhangá, repleto de bandeiras e cartazes de um lado, Jaci de uma empolgação mais serena e Guaraci ao centro bem em frente, explodindo em vivas. Ainda nas corças, Aurora viu diversos cartazes mostrando seu nome, desenhos rústicos de seu rosto, bandeiras com os apelidos e alguns feitiços explodindo acima das cabeças formando frases de incentivo. Recheou-se com as homenagens, porém, uma perturbação atrás de si notificou que alguém no meio deles estava insatisfeito.

Sabendo quem era, ignorou, alcançando o centro do campo. Viraram-se, fazendo uma reverência para cada ângulo da plateia, para logo se despedirem dos acompanhantes. Nino se afastou com um aceno, permitindo que ela visse de onde vinha a voz que narrava tudo aquilo. No canto, dentro de um palanque próprio, a professora Renée, Benedita Dourado, e sua filha Joana, observavam tudo com óculos rebuscados de lentes imensas. Uma aparentava ser a juíza, enquanto a outra servia como mão de honra, auxiliando a mãe no que pudesse. Mais uma vez, a mulher se ergueu, levantando a sabedoria junto consigo. Tossiu um pigarro preso, o que foi uma deixa para que as arquibancadas parassem, e ela voltou a falar, a voz ecoando como nunca.

— O Clube de Duelos está prestes a começar. Duelistas, preparem seus cajados, ajeitem seus uniformes! – exclamou, numa declaração que deveria ser muito mais enérgica.

Os espectadores compreenderam, iniciando uma salva de aplausos, assim, a turma de alunos saiu, deixando apenas os professores ainda no centro do campo. Enquanto tomava distância, Aurora reparou nos outros dois. Miranda estava vestida de um azul ciano belíssimo, que vez ou outra piscava brilhos quando se movia. Aquino estava elegante como nunca vira, o cabelo ainda mais freado de gel aliado de um traje imperial dourado de bordas verdes.

Foram ficando menores a medida que Dourado dava novos avisos aos espectadores sobre o torneio, explicando o que podia, o que não podia e o que levaria a desclassificação. Aurora sabia de cor. 
 
— A utilização de qualquer feitiço fora dos permitidos levará a uma desclassificação – terminou, movendo a mão livre do cajado para o centro, o corpo docente preparado. – Agora, peço que nossos professores queridos demonstrem como se faz um duelo – solicitou Dourado, que fez a plateia explodir de euforia.

Aurora largava o quimono para colocar o uniforme de Caçadora quando ouviu isso, e se apressou o quanto podia. Pendurado, haviam dois pares de equipamentos de proteção para cada um; joelheiras e cotoveleiras. Ela dirigiu-se a um, mas foi retirado de sua vista quando Inara pegou-o numa passada. Aurora conteve o suspiro, pegando o próximo par, voltando à região entre o tecido, para ver a demonstração.

Os joelhos já estavam protegidos quando Dourado deu o comando, e as duas professoras ficaram frente a frente, deixando Aquino se despedir numa reverência. O professor retornou ao refúgio dos duelistas sem se apressar, e só quando o inspetor acomodou-se junto de seus alunos que o duelo começou.

— Eu amo essa parte – cochichou Victor, dirigindo-se à amiga, que mesmo diante da empolgação, manteve-se focada em respirar fundo em seu cantinho.

Tal qual primeiranistas, as mulheres começaram com faíscas. Ruína lançou as suas contra Miranda, que num movimento de punho, refletiu-as, devolvendo depois de adquirirem sua própria cor e alcançar a adversária. O cajado de Ruína fez uma volta, e a fagulha se apagou. A plateia uivou, pedindo mais. Mesmo à distância, Aurora teve quase certeza de que ambas estavam sorrindo.

Subiram um nível. Ruína bateu no chão, disparando um feitiço de desarme, que foi dissipado pela mulher de azul com um cruzado de dedos. Logo, ambas, como se houvessem combinado, decidiram escalar ainda mais os feitiços. Primeiro, Ruína disparou um estuporo, que recocheteou nos dedos de Miranda. Esta, lançou uma azaração como resposta, que também foi defletida com um feitiço de proteção. Miranda ergueu os braços, formando um pequeno incêndio entre suas palmas, fez o fogo cortar o ar, mudando a forma para um enorme gavião que traçou o caminho até explodir direto no rosto de Ruína. Contudo, a pedra do cajado dividiu a explosão, e os rastros dela queimaram o gramado ao redor.

A turba explodiu em volta, gostando, sabendo que aquilo se tratava de uma porção do quanto podiam chegar naquele duelo. 

Boquiaberta, Aurora notou que não tratava-se só de uma defesa de sua treinadora. O mesmo fogo que incendiava a grama, ao invés de causar um efeito devastador, pulverizava o chão como uma espécie de adubo, e o resultado disso veio assim que as chamas se apagaram. Ruína gritou um feitiço e ergueu sua ferramenta, levantando o terreno junto dela. As raízes de uma enorme árvore despontaram atrás de si, cavucando a terra no caminho entre as duas, para chegar na inimiga. Miranda saltou sobre uma delas, antes que acertassem-na com seu poder vegetal. Ruína, contudo, não havia terminado. Moveu o cajado, e uma série de ramos, galhos, troncos se refizeram no meio do campo, esticando seus vários braços para atacar Miranda. Como resposta, a moça saltou da primeira raiz, girando os braços ao redor de si, gritando palavras mágicas junto da dança enfeitiçada. Antes que um galho colossal partisse em sua direção, toda a árvore se transmutou para pura água, e de repente, havia um oceano particular que escorria na direção da conjuração de Miranda, girando ao redor dela como um redemoinho.

Eu... não acredito.

Reunindo o quanto precisava, mexeu a massa d'água como se move água dentro de um balde. A mulher de azul o redirecionou, fazendo avançar como um tsunami na direção de Ruína. Por sua vez, posicionou o cajado à frente, deixando o prisma que compunha seu núcleo, agora vermelho como brasa, encarar a água. Ao se aproximar, a defesa funcionou, criando um escudo de calor que englobou a professora, ebulindo a água em volta. O vapor começou a subir, criando nuvens de névoa por todo o estádio, umedecendo o gramado, as combatentes e a plateia. Ficava difícil de ver além de suas silhuetas marcadas entre a fumaça, porém, deu pra ouvir a voz de Miranda chamando por Ruína:

— Vamos parar por aqui? Meus braços tão me matando!

Mesmo impressionada, todos os espectadores tiveram tempo para bater palmas e gargalhar do que Miranda havia dito. Porém, do outro lado, Ruína tinha uma outra resposta pronta. Apontou o cajado para cima. O jade-esmeralda se inflamou, e a fumaça ao redor da oponente do lado oposto, começou a lampejar estouros azuis. De repente, ouviu-se um trovão que sacudiu os estudantes. Aurora arregalou os olhos.

— Tá bom, tá bom, se quer tanto ganhar assim – comentou Miranda Dourado, erguendo um braço, pedindo desistência.

Renée, do assento reservado, gritou que a partida terminara e que a vitória era de Valéria Ruína. As duas se cumprimentaram no centro do campo e vieram juntas, batendo um papo sobre o que acabara de acontecer. Miranda, de olhos brilhantes como sempre, Ruína mantendo a habitual visão estreita. Ao se separarem para suas devidas casas, Aurora correu para perto da treinadora.

— C-como voc... o qu... por quê ela desistiu!? – das centenas de perguntas, aquela foi a que se destacou. Queria saber porque parar um espetáculo daqueles.

Ruína olhou por cima do ombro, surpresa com a preocupação.

— Eu estava convocando um relâmpago. Com a umidade ao redor dela, era quase impossível desviar – cochichou, aproximando-se uma mesa, recolhendo uma estopa para limpar o cajado.

Aurora não sabia que dava pra parecer tão surpresa como estava no momento.

— M-mas... você ia mat... ela não ia sobreviver a um raio! – afirmou Aurora.

— Eu disse 'quase', srta. Magalhães – repreendeu a mulher, o tom era severo. – Acredito que saiba que está falando de Miranda Dourado.

A menina deixou-se admirar. Sua instrutora era capaz de coisas incríveis, mas aquela mulher à sua direita, parecia ser descendente de uma divindade. E ainda assim, com tanto poder, mantinha o sorriso singelo, as brincadeiras inocentes, o espírito dançante.

— Agora, começarão os duelos – Dourado falou. A garota recuperou suas noções e partiu para o tecido que a impedia de ver o campo. O grupo inteiro de Anhangá veio junto. – Esta é a tabela de combates. A estrutura é a de torneios tradicionais. Quem vence, avança uma etapa de três ao todo, até uma grande final tripla, onde apenas o vencedor deve ficar de pé.

A lista surgiu, e rapidamente a menina fez o caminho até seu nome. No grupo, seu primeiro combate seria com um secundarista de Jaci, enquanto um dos rapazes peruanos enfrentaria uma primeiranista da mesma casa dos gaviões. Aurora tentou refrear um segundo olhar, mas não pôde, vendo que Inara seria a segunda combatente a entrar num duelo, enfrentando Guaraci.

Como se para pontuar seu olhar, Dourado chamou a primeira dupla. A menina, acuada no canto, ergueu-se, sabendo que teria de seguir até lá e enfrentar. Caminhou campo adentro, pisando sobre a grama molhada, que fora recuperada dos ataques do duelo anterior com o auxílio da professora Joana.

Aurora recusou-se a ver a partida, concentrada em si, mas a ouviu por inteiro, numa narração feita pela própria Renée, acompanhando cada movimento. Essa foi uma boa investida, apesar de ser arriscada, comentou no primeiro lance, depois o jogo pareceu virar quando ouviu que o membro de Anhangá estava pressionado. O pé batia no chão enquanto esperava, e foi só quando o lado da arquibancada dos gaviões estourou aplausos que reconheceu quem havia vencido. Depois, a voz de Dourado anunciou que Jaci havia avançado para a segunda etapa.

A segunda a ser chamada foi Inara. Aurora tomou esse tempo para comentar algo com a garota que perdera seu duelo. Mal teve tempo de pensar no que dizer, e a partida do lado de fora havia terminado. As corças venceram. A garota entrou, limpando o suor da testa, sendo recebida com alguns conselhos de Ruína sobre o que fizera de errado, mesmo não tendo tempo algum para errar qualquer coisa.

Aurora se apertou, os joelhos colidindo as proteções dos equipamentos. Do outro lado, o rapaz, chamado Pedro Unaý foi repreendido pelo professor Aquino, e depois acolhido pelo irmão gêmeo. A menina percebeu que os encarava demais, e eles devolveram o olhar de forma sinistra. Do lado de fora, mais uma partida de Anhangá terminava, dessa vez do secundarista, que adentrou a barraca chutando tudo por ter perdido. Na ala de Jaci, houve uma comemoração agitada junto de Miranda. Sobravam duas de Anhangá, e uma delas seria a próxima. 

— Aurora Magalhães – anunciou a diretora.

Nunca seu próprio nome foi tão antecipado e temido ao mesmo tempo. Ela se ergueu, passou pelos companheiros de equipe, por um olhar julgador de Ruína e atravessou a cortina. A grama se abriu para ela, marcada pelo sol da manhã, e os gritos da torcida eram os maiores desde que o torneio começara. No seu flanco, a competidora que ia enfrentar, saiu de sua tenda com menos empolgação, porém de olhar mais determinado. Ouviu que se chamava Ana Hikaro.

Alcançando o centro do estádio, Aurora olhou ao redor, e por um momento, aquele amontoado de pessoas se apertou ao redor dela. Pareceram próximos demais apesar da distância, como se estivessem em seu cangote, esperando que ela vencesse para gritarem mais uma vez, explodindo seus tímpanos. Na sua frente, a oponente se aproximava fazendo a reverência que Aurora nem percebeu que também fazia. Estava prestes a começar. Precisava focar. Precisava vencer.

Ela não vai passar sozinha. 

As duas contaram os passos, se encararam, e preparam-se para o início do duelo. Apenas esperavam a voz de Dourado. Mesmo sem ter se movido nenhum passo ainda, Aurora notou uma gota de puro nervosismo começando a pingar do nariz, formando uma ponte para encarar a garota do outro lado, dentro da refração da gota d'água. Nas mãos, o cajado escorregava.

— Comecem! – pediu a diretora, e Renée apitou o início da partida.

Em seguida, os ouvidos se comprimiram, apenas para ouvir exatamente o que precisava, que acontecia ali dentro no espaço entre as duas. E o que ouviu em seguida, foi um grito rouco:

— Periculum!

A adversária atirou baixo, e a faísca azul quicou duas vezes na grama antes de estourar. Era um ataque rasteiro diferente do que Ruína havia ensinado, mas isso não significava que não conseguiria defender-se dele. Disparou suas próprias faíscas de volta, acertando a porção azul com o vermelho, explodindo-os juntos em uma vastidão roxa. A menina do outro lado, recuou um passo, e sua expressão dizia que esperava que aquilo fosse mais efetivo. Aurora respondeu rápida.

— Periculum! – devolveu, fazendo a faísca vermelha ser disparada como uma pedra de catapulta. 

Ana esperou a faísca vir, querendo defleti-la, e por um momento, esqueceu-se que tinha a possibilidade de ser desarmada. E no alto dessa oportunidade, Aurora aproveitou a brecha. A mão coçou, moveu sua base e o feitiço foi disparado, um pouco além do que precisava.

— Expelliarmus! – urrou, derrubando o membro de Jaci junto de seu cajado.

Ouviu um apito, e em seguida, uma gritaria.

— Aurora Magalhães é a vencedora de Anhangá, e segue para a próxima fase – gritou Dourado, com um certo tom de orgulho na voz.

A menina fitou as arquibancadas. A comemoração com seu nome fervia, até os rivais das outras casas reconheceram sua vitória. Ela, porém, sem que escolhesse fazê-lo, moveu-se até Jaci, para ver quem estava aplaudindo. Um garoto baixo batia palmas lentas, o rosto estava pintado nas bochechas gorduchas, o cabelo cacheado atrapalhava a visão. Por um segundo, antes de deixar a área, Aurora pensou em sorrir. Contudo, do seu lado, a vista das mesmas palmas lentas naquela figura encoberta da cabeça aos pés lhe enojou, fazendo-a desviar o olhar. Ela pedira por isso, afinal. Que os dois ficassem juntos para sempre.

Voltou à barraca e foi aplaudida por Anhangá, menos pelo membro quieto no canto. Aurora nem tivera tempo de aproveitar sua felicidade e já era recebida com aquilo; aquele gelo da mesma menina que chamava de amiga há poucas semanas atrás. Ao menos, depois que o Clube passasse, podia juntar-se a Nino em busca de um outro grupo. Qualquer um, de muitos que teriam para escolher. Houve uma pausa antes que as próximas partidas começassem, e então Ruína se reuniu com a segunda competidora que havia conseguido passar.

— Não estou acostumada com primeiranistas chegarem a esta etapa, mas que seja – disse a elas. Depois, voltou o foco para Aurora. – Já falei com ela, e vou te dizer a mesma coisa. Sua passada está boa, mas veja seus pés. Não tem base. Se seu oponente perceber isso, usará contra você.

— Certo – anotou, observando os próprios pés, colocando-os na posição correta.

O lado de fora explodiu mais vivas, pois a competição retornara, direto para a primeira partida da segunda rodada, Inara contra um rapaz secundarista de Jaci.

Quando foi chamada, levantou-se num salto, percorreu o campo até chegar ao centro. Dessa vez, Aurora quis olhar. Na verdade, algum lugar dentro de si esperava que ela perdesse, para que aprendesse uma lição. Os dois combatentes ficaram frente a frente, a possibilidade ficando cada vez mais clara. Melhor seria se ganhasse, e tivesse de enfrentar Aurora na final. Assim poderia mostrar que estava errada, de uma vez por todas. O apito soou, então a bruxa esperou que a conclusão fosse qualquer uma daquelas opções. Qualquer uma delas lhe satisfaria. 

O que se seguiu, entretanto, foi uma terceira.

Inara derrubara o cajado de propósito, indicando uma desistência. Antes que Dourado pudesse afirmar que a menina desistira da partida, a mesma recolheu sua ferramenta e começou os passos de volta à tenda, vaiada pela torcida das três casas. Contudo, sua expressão estava tranquila, enquanto a de Aurora carregava uma confusão aliada de uma bocarra de espanto. A menina chegou até ela, parou na frente um instante, prestes a receber uma correção de Ruína. Entretanto, falou primeiro:

— Boa sorte, Caçadora – disse, olhando a menina nos olhos. – A fama é toda sua.

Atravessou a cortina, direto para retirar seus equipamentos. Lançou as joelheiras para longe, seguida das cotoveleiras. Ruína tentou falar algo, mas a garota avançou tecido afora sem dar atenção a mais nada. A professora, sem caminho a seguir depois daquilo, virou-se para Aurora. Tentou extrair uma história, porém desistiu ao decidir que não importava-se o bastante para descobrir.

— Que seja. Você é a única representante de Anhangá, agora – cuspiu Ruína. – Nos traga a vitória.

Aurora ainda tentava conceber o ocorrido, quando o membro vencedor de Jaci chegou do outro lado, sem muita comemoração. Miranda até buscou uma explicação para Ruína, que também não sabia dizer. Por sua vez, a bruxa remanescente das corças apertou a boca.

Quem ela pensava que era? Só queria provar que não queria tudo aquilo que Aurora dizia que ela queria? Só queria provar que estava certa? Abandonara os companheiros de equipe depois de meses de treinamento só para parecer correta, sem nem pensar nas consequências do que estava fazendo.

Isso irritava Aurora. Numa quantia que mal conseguia mensurar. E apesar da quantidade de porquês que tinha ao justificar tudo isso, nenhum parecia correto. Tudo aquilo soava pessoal demais, como se aquela atitude falasse outra coisa, como se outra ideia fosse plantada. De repente, começava a pensar se o prêmio de ser a campeã importava tanto para que Inara desse meia volta. E por outro lado, o que poderia importar o bastante para substituir esse mesmo ideal? 

Ela pensou ter chegado numa conclusão, porém quebrou a ideia em pedacinhos. Não passara por tudo para desistir ali. Havia mais duas rodadas pela frente. Lutaria a qualquer custo.

Mais uma batalha ocorreu enquanto pensava, com uma vitória de um membro dos gêmeos de Guaraci. Aurora olhou por cima do ombro, ouvindo seu nome ser chamado enquanto fitava o adversário do outro lado. O sujeito devolveu a encarada, saiu pela cortina e Aurora fez o mesmo.

Enxergou à frente, o gramado mais uma vez brilhando, a plateia enérgica. Enquanto preparava sua reverência, Aurora fitou o assento de Jaci mais uma vez, ainda apegada à imagem que vira da última vez. Viu uma cena diferente agora, mas com os mesmos integrantes. Letícia parecia sem ar, talvez de tanto usar a mesma cobertura sempre, saindo numa tangente apressada para fora dali. Sem nem dar atenção ao duelo de Aurora, Matheus a seguiu. Como sempre, indo atrás dela.

Os dentes de Aurora se arranharam uns nos outros, e ela ergueu o cajado com uma força desnecessária. O sujeito de Guaraci encarou-a nos olhos, balbuciou alguma coisa.

— Essa é pelo nosso artilheiro – disse, fazendo a meia volta e se afastando.

A menina fez o mesmo, tomando distância com aquelas palavras reverberando. Nosso artilheiro, pensou, lembrando-se do recado que recebera na noite anterior. Olhou para o lado que cobria a plateia de Guaraci, e viu Luka saindo naquele mesmo momento. Dourado gritou para começarem, porém Aurora só deu atenção quando ouviu o feitiço que veio depois do apito.

— Rictum Sempra!

O corpo de Aurora subiu, rodopiou e por um segundo achou que jamais terminaria de escalar no ar. Contudo, a ilusão terminou quando a mesma velocidade que a lançou, arremessou-a de volta ao solo; o braço esquerdo caindo primeiro, tentando aparar a queda, e o corpo caindo em cima, logo em seguida. Aurora berrou uma dor de deslocamento que ecoou no estádio, o membro ficou mole. Saiu de cima, ainda sem parar de gritar, encarando o punho torcido com uma centena de piscadas de olho. A plateia havia interrompido os gritos, fitando o caso. Ao longe, viu Ruína se aproximar correndo. Renée, por sua vez, vinha pelo outro lado, prestes a dar um cascudo no rapaz que conjurara o feitiço. Começou a arrastá-lo para fora, depois de uma clara desclassificação. Quando a professora de Anhangá examinou o braço, Aurora tentou fingir que não doía.

— Como está? Dá pra mexer? – perguntou Ruína, com uma preocupação legítima nos olhos.

— Dá – mentiu Aurora.

— Mexa, por gentileza – pediu a professora.

Depois, largou o membro, deixando a mão cair na vértice do punho. Ela conteve um grito, disparando um chiado no lugar. Tentou erguê-lo, e sem sucesso, Ruína fez que não com a cabeça.

— O festival não pode parar por tanto tempo para levá-la a enfermaria... – disse para si própria, depois dirigiu-se a menina. – Vou dizer que está incapaz de continuar. E assim fazem a final com a dupla que se classificou.

— Não! – disse Aurora, segurando a veste vermelha da mulher. – Não precisa. Faz você. Você consegue, não consegue?

Ruína olhou-a segurando a aba do vestido com um pavor. Não acreditava em nada daquilo que via ou ouvia.

— O quê?

— Não me desclassifica, por favor – implorou Aurora. – Faz você o feitiço, me cura.

— Voc... – a mulher segurou um protesto. A língua pareceu chispar. – Não sou especializada nesse tipo de magia. Se eu não souber qual osso se deslocou, pode acarretar consequências graves – explicou a mulher, incomodada. – Tudo ficará melhor depois que for a enfermaria, srta.

— Não! – pediu mais uma vez, quando viu Renée começar a se aproximar para conferir o estado da competidora. A arquibancada ao redor era um muxoxo de sussurros. – Faz de qualquer jeito. Me deixa continuar. Eu preciso continuar – sussurrou a última parte, com afinco.

Ruína estava impressionada. Cerrou os olhos para a menina, tentando avaliar as intenções. Atrás dela, Renée perguntou se tudo estava bem. Demorou até que respondesse:

— Está. Está sim – disse, agora segurando o punho da menina para ajudá-la a se levantar. Aurora obedeceu, mesmo que o puxão fizesse tudo doer outra vez. – Ela só precisa de um momento para se recuperar do choque.

— Certo, faremos uma pausa de dois minutos – disse Renée.

Ruína fez que sim, a juíza se distanciou, e Aurora sentiu mais um puxão, dessa vez no braço, direto para a tenda dos competidores. Os passos pesados se refizeram cortina adentro, e Anhangá se levantou para ver o que tinha acontecido. A professora pediu distância, recolheu seu cajado que estava encostado numa viga próxima, e deixou-o de pé do seu lado. Com a mesma expressão severa de sempre, dessa vez com uma pitada de estranhamento, perguntou:

— Tem certeza?

— Absoluta – respondeu Aurora estendendo o braço.

A mulher apalpou, perguntando onde doía e quando identificou aonde precisava agir, sussurrou um pedido:

— Morde a mão – pediu.

Aurora não sabia do que se tratava, mas obedeceu. Mordeu a mão direita, enquanto estendeu a esquerda. Ruína olhou para o membro, sussurrou:

— Pugnus Reparo.

De repente, a menina entendeu para que servia a mão na boca. Mordeu com tanta força que achou que verteria sangue, porque, de alguma forma, a dor precisava ser transferida para qualquer outro lugar. Quando parou, balançou para ver o estado, e percebeu que ainda não tinha a pegada de antes. Entretanto, o que importava era não doer.

Ruína olhou-a esperando um veredito, que foi respondido por um aceno de cabeça. Aurora viu uma certa compaixão na mulher, e ficou marcado como uma das poucas vezes que isso surgia. Agora, ela confiara a si todo o torneio. Cabia a Aurora fazer por onde.

Eu vou ganhar!

Dourado refez os anúncios, explicou alguns detalhes sobre a desclassificação de um dos gêmeos de Guaraci. Finalmente, sem mais delongas, chamou o trio ao campo. Um de cada casa se dirigiu à arena, e na plateia ao redor, os alunos retornavam do intervalo. Estavam inquietos, e haviam alguns pontos faltando naquela massa, como pequenos buracos numa parede de tijolos. Tirando esse detalhe, aos poucos as vibrações retornaram, recomeçando a baderna das comemorações.

O trio se reuniu no centro, e assim como os professores, tomaram uma distância necessária para começarem o combate, logo após as reverências devidas. Aurora fitou a outra contraparte do gêmeo, sabendo que se o irmão fizera um feitiço ilegal, ele também poderia fazer. O aviso estava certo, afinal de contas. A menina ergueu o olhar para o lado de Jaci na arquibancada, e não viu a dupla que esperava ver. Removeu sua atenção de lá, voltou a encarar o campo, vendo que o tempo de espera estava longo demais. E mesmo depois da espera, Dourado não anunciou, nem Renée apitou. Os três saíram de suas posições, fitando a bancada de juízes. Havia um rapaz, monitor da casa de Guaraci, conversando ao pé de ouvido da diretora. Gesticulava amplo, fazia uma contagem, explica toda a história.

A mulher terminou de ouvir e se levantou, e Renée saiu de sua posição para acompanhar o monitor. Dourado tomou posição, a filha do seu lado, com uma expressão preocupada. De súbito, assim que um vento invadiu a clareira, descendo pela arquibancada direto pelo campo, ouviram-na dizer:

— Inspetores e monitores, reúnam os membros de sua casa, façam uma contagem, pra já – terminou séria, e a plateia protestou alguma coisa, cheia de cochichos.

Não!

Aquela fala foi como um golpe no rosto. Aurora caminhou até a bancada, e quando viu que a dupla começava a se retirar apressada, começou a correr. Como podiam parar o torneio assim? Ainda avançando para chegar na diretora antes que ela atravessasse uma passagem de cortina, ouviu uma voz chamar à esquerda.

— Aurora – gritou Nino, o cabelo bagunçado, Celeste como um cachecol em seu ombro. Agora ventava forte. – Vamos, a gente tem que se juntar.

— Calma, Nino... o q... o que tá acontecendo? – perguntou, chegando perto.

— Parece que alguns alunos sumiram – começou, os olhos apertados. – Não estão em lugar nenhum.

Aqueles dois, lembrou, saindo ao mesmo tempo do estádio, logo antes dela receber um feitiço no peito.

— O Matheus tá entre esses que sumiram? - perguntou, querendo confirmar o que pensava.

— Eu não vi ele por aí - falou Nino.

É isso.

— Isso é pra mim, Nino - disse, cerrando o rosto inteiro. - Tão querendo brincar comigo.

— Aurora do q...

— Ela disse pra eu me cuidar nos duelos, e depois que Guaraci tava atrás de mim. É pra me fazer pensar que são duas coisas separadas, mas não. São os dois. Juntos – concluiu, apertou a mão em punho.

— Acha que podem ter pegado Inara também? Pra te atrair? – perguntou o garoto, adentrando o terreno esquisito das hipóteses de Aurora. 

Ao citar o nome, a menina mordeu o lábio.

— Não sei – admitiu.

— E o que você vai fazer? – Nino olhou para trás. A arquibancada esvaziava seguindo acenos dos professores. Ruína, quase concluindo sua parte, enviava olhadelas a dupla no centro do campo.

— Vou atrás deles – disse, apertando o cajado. – Me ajuda a sair sem Ruína ver. Devem estar em algum lugar que sabem que eu posso estar...

— E você tá pensando me ir sozinha? – começou Nino, com as mãos na cintura. – Nem pensar.

— Nino, você não pode me imp... 

— Não quero te impedir. Quero ir contigo – revelou, com o sorriso de verdade, torto no rosto regular. – São nossos amigos, não são?

Aurora parou por um momento. Será que ainda eram? E se não fossem, por que estava tão acionada pela armadilha de Luka e Letícia? Por que queria tanto evitar que se machucassem?

— São sim – respondeu, depois, antes que Anhangá se retirasse por completo, apressou-se. – Nino, mas se você for pego de novo, toma uma terceira advertência. Podem te suspender, ou te expulsar. 

— É, podem sim – firmou a palavra, acenando que sim com a cabeça.

— É, podem – Aurora confirmou.

Então, os dois fizeram o caminho por debaixo dos palanques. Esperaram os passos se dividirem nos times deixando o estádio e deram a volta, se separando para que cada um fosse atrás de um dos membros. Nino seguiria até Inara, sabendo que poderia encontrar Luka no caminho. Aurora avançaria por Matheus, querendo dar de encontro com Letícia. 

Atravessou algumas tendas, evitou barracas que pudessem ter companheiros de equipe, funcionários ou inspetores e seguiu castelo adentro. Por um momento, interrompeu seu caminho, pois achou que havia visto algo numa das Rochas Convocatórias. Ignorou o que viu, mesmo sabendo que aquele mesmo elemento causara uma confusão meses atrás.

Uma pegada enegrecida. 

 


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