Família De Marttino Coração de Gelo(Degustação escrita por moni


Capítulo 5
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

Jussara e Kamila. Eu amei as recomendações. Como eu fico feliz quando entro aqui e tem recomendação. Fico encantada demais. Vocês são Fantasticas!!!!!! OBRIGADA!!!!!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/736180/chapter/5

Pov – Gabriela

  Vittorio deixa a mesa e fico ali um longo momento em silencio, digerindo o que acaba de acontecer. Tempo, é apenas isso que precisava. Ficar segura com ela por um tempo até Ugo esquecer ou eu conseguir dar um jeito nisso. Então esse homem lindo, rico e importante me oferece justamente o que preciso.

   Todo o tempo ele parece perfeito e ao mesmo tempo... eu não sou nada, nós não somos. Somos duas desconhecidas, acho aceitável que gente boa e justa se compadeça, mas ir tão longe? Nos receber em casa e convidar para ficar?

   Ele nos levou uma bandeja com chá. Um minuto antes Isabella reclamou de fome, meu coração doeu e então ele chega com uma bandeja, se preocupa com a dor dela.

   Acho que por que ela não tem um pai, por que eu não tive por muito tempo, por que não tenho muito jeito com homens ou tudo isso, mas me comove profundamente ver um homem como ele se preocupando com minha filha. Se oferecendo para chamar um médico. Meu coração se apertou. Senti carinho e proteção num nível quase desconhecido para mim.

   Quando me dei conta já estava nos braços dele. Braços fortes, peito protetor. Me senti segura por um breve momento até me tocar e me afastar. Eu vou longe com esse meu jeito invasivo.

   ―Gabriela. – Pietra de Martino me desperta, pisco e uma mulher está de pé ao meu lado. Parece tão séria. Olhos distantes, rosto frio. – Esta é Anna, nossa governanta. Ela vai atender você no que precisar.

   ―Obrigada. Eu não pretendo precisar de nada. Não quero incomodar. Inclusive posso ajudar. – Não quero de jeito nenhum ser um problema.

   ―Bem-vinda senhorita?

   ―Apenas Gabriela. – Não tenho intensão de dar meu sobrenome, ainda não sei se posso confiar neles assim.

   ―Senhorita Gabriela, nós temos uma boa equipe de funcionários. Não será necessário ajudar. Nem seria certo. Agradeço, me chame para o que precisar. – Ela se volta para a dona da casa. – Mais alguma coisa senhora?

   ―Não. Obrigada Anna.

   A mulher se retira. Agora sim tive a dimensão dessa coisa de serem ricos. Governanta é muito coisa de gente rica. Equipe de funcionários. Puxa isso é mesmo grande. A casa é uma mansão, cheia de quartos e salas, natural ter muitos empregados. Motorista particular. Daqui a pouco um helicóptero pousa no jardim. Sorrio com a ideia.

   ―Querida. Está em casa. Quero que tenha livre acesso a tudo. Tem um campo aí atrás, piscina para usarem quando quiserem. Por favor, sinta-se à vontade.

   ―Obrigada. – Ela sorri generosa.

   ―Agora vá acalmar o coração da sua garotinha. Conte a ela que vão ficar.

   ―Sim. Vou fazer isso.

   Deixo a mesa. Isabella está no jardim com os cães, ela está encantada. No fundo, se tivesse escolha o certo seria ir embora. Não deixar que se apegue e se acostume com uma vida que não posso dar a ela, mas é isso que tenho a oferecer. Um mundo de sonhos que vão se desfazer cedo ou tarde.

   ―Olha mamãe. Eles gostam muito de mim. – Ela me conta animada. O rosto corado, os olhos brilhantes. A verdade é que desde a morte de Carina não a vejo tão feliz.

   ―Sim estou vendo. Você é mesmo especial em? – Me sento na grama. Ela se senta ao meu lado e logo os cachorros estão deitados ao lado dela. Por qualquer razão que desconheço o abraço de Vittorio me vem a mente. Penso no jeito como ele olha para ela, como ele parece mais bonito a cada segundo.

   ―Não é? – Pisco olhando para ela. – Me ouviu?

   ―Claro. O que disse?

   ―Que eles são lindos e quero ter dois cachorros agora. É uma boa ideia, não é?

   ―Ideia fantástica. – Ela para de sorrir. – Querida, nós não vamos mais embora hoje. – Lá está o sorriso de volta, ela me envolve o pescoço num de seus melhores abraços. – Não é para sempre, mas vamos ficar mais tempo. Daqui uns dias, quando você estiver bem a vontade e eu me sentir mais segura vou deixar você aqui umas horinhas, para procurar um emprego na região. Quando encontrar um vamos ajeitar um lugar para morarmos e vamos embora.

   ―E se demorar muito, muito, muito, para achar esse emprego?

   ―Vamos torcer para não demorar tanto assim. – Ela parece discordar dos meus planos.

   ―Gosto daqui.

   ―Eu também.

   ―Eles podem dormir comigo?

   ―Não. Isabella, presta atenção. Não é nossa casa. Não pode entrar com eles. São cães de quintal, eles não entram na casa. Notou isso? – Ela afirma. – Então nada de leva-los para dentro. E tem que tomar cuidado com os móveis e as coisas todas caras que tem lá dentro. Para não quebrar.

   ―Posso brincar lá dentro né?

   ―Sem correr, sem tocar nas coisas e sem incomodar as pessoas.

   ―Nossa Gabriela. Você não quer deixar nada. Está parecendo um pouco com a Gina. – Faço cócegas nela. Isabella ri se contorcendo. Deitamos lado a lado na grama olhando o céu azul.

   ―Sou chata é?

   ―Pouquinho só. – Ficamos um momento em silencio olhando o céu. – Acha que de noite podemos vir um pouquinho aqui ver as estrelas? – Afirmo com um nó na garganta. – Acha que minha mãe vê a gente de lá?

   ―Tenho certeza que sim. Tenho certeza que ela está com bons amigos por lá. Usou alguma influência para nos trazer até aqui.

   ―Sinto saudade dela as vezes.

   ―Eu também. Todo tempo. – Ela vem para meus braços. Deita em meu peito e acaricio os cabelos finos. Nem mesmo permitir que sinta falta da mãe eu posso. Ela não pode ficar falando dela aqui. Não pode ficar falando dela em lugar nenhum. Isso é mesmo uma droga. – Vamos guardar a mamãe no coração e não vamos ficar falando dela está bem?

   ―Por que é segredo não é mesmo?

   ―Sim.

   ―Mamãe, você acha o Vittorio bem especial? – Ela está mesmo encantada. – Eu acho. Ele tem cachorros, ele me pega no colo, só um pouquinho, até o carro, lembra? – Afirmo. – Ele leva a gente da estrada, ele deixa a gente ficar aqui e dá biscoitos de noite, muitas coisas. Vamos pedir para morar aqui para sempre?

   ―Não. Isabella com o risco de me tornar a própria encarnação da Gina preciso exigir que não faça isso. – Ela me olha risonha. – Sim. É isso. Nada de pedir para ele.

   ―Eu não peço. Pronto. – Ela me sorri. Afasto os cabelos. – Tem televisão no quarto. Depois vou ver desenho com o Baby e o Rosso.

   ―O que eu disse sobre eles entrarem?

   ―Esqueci. – Ela reclama. – Então vou brincar agora. Você quer ver eles pegarem bolinha?

   ―Quero. – Ela saí dos meus braços e fica brincando com eles. Hoje vai estar esgotada e dormir. É bom. Alguém tem que dormir. Eu não preguei os olhos. Metade do tempo repassando tudo que aconteceu e surpresa em como a noite terminou. A outra metade pensando nele. Uma bobagem. Não sou para ele e não posso nem me dar ao luxo de criar expectativas. O problema é ele ser lindo, forte e enigmático.

   Por volta de onze horas eu entro com ela. O sol está muito forte, os cachorros estão esgotados, ela precisa dar um tempinho a eles. Os dois nos acompanham até a soleira da porta.

   ―Depois eu posso voltar? Eles querem ir comigo.

   ―Depois volta. Agora eles vão fazer as coisas de cachorro.

   ―Que coisas mamãe? Isso não existe.

   ―Claro que sim, eles têm que perseguir o próprio rabo. – Ela acha graça. Ri quando entramos. Anna surge na nossa frente e quase desmaio de susto. Ela não fez um ruído. Parece um fantasma.

   ―Senhorita. Eu já providenciei o quarto da senhorita Isabella. - É difícil conter o riso.

   ―Eu que sou a senhorita Isabella? – Minha pequena questiona orgulhosa.

   ―Sim. Por favor Anna, chame ela apenas de Isabella. E ela fica no quarto comigo, não precisa de todo esse trabalho.

   ―O senhor De Martino me pediu. Disse que é o desejo da senhorita... da Isabella. Então já está pronto e fica ao lado do seu, se puderem me acompanhar eu mostro.

   Não vou discutir se o homem exigiu. Quem sabe eles acham que é deselegante. Já devo ter cometido meia dúzia de gafes, não sei como se trata gente assim. Devia. Sou relações Públicas, mas eu não tenho muito jeito para essa profissão que fui arranjar.

   Seguimos a mulher silenciosa uns passos a nossa frente, eu e Gabriela trocando sorrisos. Nos divertindo com o jeito dela.

   O quarto é colado ao meu, um quarto mais simples, mas aconchegante, com uma varandinha, banheiro e uma cama de solteiro. Moveis vitorianos em tons claros.

   ―Olha essa cadeira mamãe. Parece de princesa. Posso sentar?

   ―Pode.

   Ela se acomoda. Sorri para Anna, depois para mim.

   ―Muito obrigado Anna. Vou ficar com esse quarto mesmo. Parabéns. – Enquanto desato a rir, Anna parece surpresa. Sem saber como lidar com minha espontânea e faladeira garotinha.

   ―O almoço será servido em uma hora. A senhora De Martino está em sua sala particular caso queiram encontrá-la.

   ―Obrigada. – Ela nos deixa. Aproveito para fazer Isabella lavar o rosto e as mãos, ajeito mais uma vez seus cabelos. Ela me observa.

   ―Penteia o seu também mamãe. Está com grama. – Reviro os olhos. Grama no cabelo, eu sou mesmo inadequada para esse mundo De Martino. Me arrumo da melhor forma que posso. Depois deixamos o quarto.

   Ando um pouco com ela pela casa. Tantos cômodos. Tantos lugares vazios. Achamos a cozinha. Tem uma mulher de uniforme cozinhando. Anna está ajeitando a louça numa bandeja.

   ―Posso ajudar?

   ―Senhorita, fico mais à vontade se não insistir. Esse é nosso trabalho. É uma hóspede.

   ―Desculpe. Estava só... andando por aí. Eu nem sou muito boa nisso, ofereci ajuda por pura educação. Acabaria se arrependendo de qualquer modo.

   Deixamos a cozinha. A mulher é toda séria, distante, estranha. Isabella me olha atenta.

   ―Acho que ela briga se eu quebrar alguma coisa. Você tem razão mamãe. Vou bem me comportar.

   ―Acho bom.

   ―Olha mamãe. Que salinha linda de ver televisão. Posso ficar um pouco aqui? – É um ambiente aconchegante, com lareira e televisão em um largo e confortável sofá escuro. Acho que o lugar mais acolhedor e parecido com um lar de toda a casa.

   ―Acho que é ótima ideia. – Ela se senta no sofá e posso me imaginar enrolada a uma manta comendo pipoca e assistindo filmes com a lareira acesa numa noite de inverno. Vittorio surge sentado ao meu lado na imagem e balanço a cabeça afastando minha fantasia.

   Do jeito que eu sou, sem um carro para fugir eu provavelmente me atiraria na lareira e acabaria em chamas no meio da mansão De Martino.

   Me sento com ela. Ligo a televisão e ficamos ali. Sinto paz e segurança. Ugo não pode nos encontrar aqui. Mesmo que nos procure nunca imaginaria que estamos justamente numa casa como essa, acolhidos por pessoas como os De Martino.

   Anna nos busca para o almoço. Quando chegamos a sala de jantar Pietra e o neto estão a nossa espera.

   ―Oi Vittorio. Quanto tempo em? Não te achei mais. – Isabella diz para surpresa dele. O homem parece ter ouvido algo muito fora do normal, olha para ela sem saber como agir e acho ele tão sério. Eu não sei descreve-lo direito. Ele não tem qualquer espontaneidade, mas não é algo ruim, ou frio é como se ele não soubesse o que fazer. Como se ficasse indeciso e com medo de reagir. – Vou sentar aqui do seu lado. – Apesar da louça dela estar posta ao meu lado, Isabella se senta ao lado dele.

   Anna rapidamente ajeita a louça em frente a pequena. Vittorio ainda está mudo, mas olhando para ela.

   ―Pode servir Anna. – Pietra pede e a mulher começa a servir os pratos. Aquilo é mesmo um exagero, mas eu não vou criticar ninguém. É o jeito deles, apenas aceito e espero.

   ―Vittorio, você sabia que eu vou ficar aqui?

   ―Sim, eu soube.

   ―Está muito feliz? – Ela é incontrolável. Ele dá um meio sorriso.

   ―Muito.

   ―Mas a minha mãe não deixa eu pedir para ficar morando aqui, nem para pedir nada.

   ―Isabella. – Eu alerto.

   ―Só estava contando. – Ela comunica. – Tenho um quarto só para mim. Você que mandou. A Anna disse, eu tenho cinco anos. Já pode ter quarto com cinco anos, mas sem cachorro.

   ―Parece que o Vittorio ganhou uma nova amiga. – Pietra comenta quando finalmente estamos todos servidos.

   ―Eu? – Isabella pergunta a ela.

   ―Sim. Você mesma.

   ―Eu gosto de ser amiga dele. Sabia que ele leva chá com biscoitos? Isso é muito fantástico. – Sabia que ainda hoje ela encaixaria fantástico em alguma frase. Me ouviu dizer pela manhã.

   ―Muito. E você é encantadora. – Pietra diz a ela que sorri concordando sem qualquer modéstia.

   ―Eu sou.

   ―Gosto de como ela fica constrangida com elogios. – Eu digo e ela de novo concorda. – Agora come um pouco.

   ―Faltou algo Gabriela?

   ―Não senhora De Martino. Tudo está ótimo. Obrigada.

   ―Pode me chamar de Pietra apenas. O que acha?

   ―Muito melhor. Estava aqui ensaiando para não errar e chama-la assim.

   ―Ótimo. Você também pequena. Pode me chamar de Pietra ou vovó. – Isabella arregala os olhos.

   ―Pode chamar de vovó? Eu não tenho vó sabia? Nunca eu tive uma. Eu falo vovó assim e pronto? Sei como que faz. Não é mamãe? Eu aprendo rápido.

   Fico pálida. Ela vai dizer que aprendeu rápido a me chamar de mãe. Odeio estar fazendo isso. Odeio nos meter nessa confusão. Mais uns dias, apenas o tempo de ter certeza que não vão me acusar de ser uma sequestradora e chamar a policia. Então conto que ela não é minha filha e pronto. Essa tensão constante vai embora.

   ―Querida. Precisa comer.

   Ela se cala, volta a atenção ao prato. Vittorio tem seus olhos sobre mim. Meu corpo reage a seu olhar, meu coração, tudo. Ele é como um imã a me atrair e confundir.

   ―Vittorio como estão as coisas para a colheita?

   ―Tudo certo, vovó. Já pode começar a organizar a festa.

   ―Vão amar a festa da colheita. – Pietra me promete. – Muita música, dança, comida e bebida, é muito alegre.

   ―Eu adoraria participar. Minha mãe contava sobre isso. Meu pai e ela passaram um outono colhendo uvas quando se casaram e ela achou tudo emocionante. Eles amassaram uvas com os pés.

   ―Não é mais assim que se faz o vinho, não os grandes produtores como nós. – Vittorio conta. – Temos máquinas que fazem isso agora. – Os olhos brilham ao contar. – Mas na festa da colheita colocamos toneis para serem amassados como no passado. Apenas como parte da comemoração.

   ―E vou poder brincar disso também? Se eu estiver aqui? – Seria tão incrível. Vittorio me olha de um modo profundo. Me sinto despida, meu rosto queima, mas não consigo deixar de olhar em seus olhos.

   ―Também quero brincar Vittorio. ― Isabella toca seu ombro e ele desfaz o contato. Parece meio atrapalhado. – Como que brinca disso?

   ―Brincar?

   ―É. Isso que a Gabriela falou. – As vezes ela esquece de me chamar de mãe. Não acho que seja um grande problema. É natural que crianças se confundam um pouco com essa idade. De tanto ouvir adultos chamando os pais pelo nome.

   ―Pode. As duas podem. Eu vou... vocês vão poder amassar uvas é claro. – Isabela tem uma mão no braço dele. Ela gosta de atenção, gosta de carinho, é o que ela oferece as pessoas e exige de volta. Mesmo sem se dar conta.

   ―Vocês vão adorar a festa. Espero por essa festa todo ano. Esse ano todos os meus netos vão estar reunidos. Meu bisnetinho também. Matteo.

   ―Como que ele é vovó? – Isabella pergunta deixando seu lugar na mesa e indo até Pietra.

   ―Vai fazer quatro anos.

   ―Muito pequenininho.

    ―Você me ajuda a cuidar dele? Já que é tão maior.

   ―Claro, eu gosto de crianças, não gosto muito da Gina, por que ela diz umas coisas... minha mãe falou que ela é chata. Chata não é xingar. Só um pouco. Chata é xingar Vittorio? – Agora ela deixa a vovó e olha para Vittorio. Acho graça na expressão dele. Posso até imaginar seus dilemas sobre como responder a isso.

   ―Não tenho certeza Isabella.

   ―Ah tudo bem, depois você aprende isso. Vovó, tem fotos do seu bisnetinho?

   ―Tenho muitas no celular do Vittorio, meu neto guarda para mim. Vittorio é muito gentil. – Ela olha diretamente para mim. Sorrio. – Mas tenho um porta-retratos na minha sala, vamos ver? – Isabella afirma. Oferece a mão a senhora que sorri encantada.

   ―Vamos ver se ele é encantadora também?

   ―Encantador. – Eu e Vittorio corrigimos juntos e nos olhamos. – Ela aprende uma palavra e quer usar, nem sempre acerta. – Eu explico enquanto as duas deixam a mesa e ficamos os dois.

   ―Isso é bom. Ela é esperta. – Ele diz dando um gole na água. Ficamos os dois sozinhos, me sinto estranhamente confusa. Gosto e me sinto constrangida, ao mesmo tempo e isso sempre significa que vou falar demais. – Li sobre o problema dela. Tem botas para isso. Sabia?

   ―Ela tinha. Teve duas já, mas o pé dela não colabora. Insiste em crescer e as botas insistem em não acompanhar. Ficam lá, do mesmo tamanho e logo não serve mais. Não posso comprar. – Suspiro. – Pode dizer que sou uma péssima mãe.

   ―Ter dificuldades financeiras não é vergonha nenhuma.

   ―É mais incompetência mesmo. – Me sinto uma perdedora. Tudo que queria era dar a ela o melhor da vida. – Queria ser melhor para ela. Tem uns modelos lindos. Que a palmilha é alta e por fora nem aparece, mas ela insiste em comer, o locatário insiste em cobrar o aluguel e meu salário insiste em continuar o mesmo. Meu ex salário. Agora nem isso. Eu e meu emprego nos separamos tem um tempo. Ainda não superei, mas ele parece que já até arrumou outra pessoa. Ingrato.

    ―Quer um licor?

   ―Deixa eu adivinhar. De uva? – Ele sorri, ainda bem que não faz muito isso. É de deixar as pernas bambas. Homem bonito esse.

   ―Pode ser, mas temos de outros sabores também. Vamos?

   Se me convidar ao inferno com essa cara linda eu vou. Provavelmente no caminho vou me apavorar, mas num impulso eu vou. Balanço a cabeça concordando e afasto a cadeira.

   ―Acha que recolho a louça?

   ―Tem alguém para fazer isso.

   ―Estranho. – Eu digo enquanto o acompanho. – Eu e Carina brigávamos toda vez para ver quem lavava a louça. Me rendia rápido. Acabava lavando. Ela usava o fato de ser mais velha. – Sinto de novo o nó na garganta. – Ela era incrível.

   Vittorio deixa de servir os copos para me olhar. Sou mesmo muito boba. Não tinha nada que falar dela. É tanta saudade, é tão injusto que ela não esteja aqui.

   ―Era?

   ―Morreu. Éramos como irmãs.

   ―Eu sinto muito. – Ele me diz solene. Balanço a cabeça. Ele sente, dá para ver isso. Suspiro. Tento sorrir. Ele serve o licor. É saboroso, doce e me acalma um pouco. – Isabella já foi a um especialista?

   ―Algumas vezes. Quando começou a andar é que percebemos. Fez exames e explicaram o que ela tinha. Voltamos quando ela fez três anos. Ele receitou as botas e desde então é só essa luta para comprar. Economizo meses e compro, ela usa um pouco e não serve mais. Podemos não falar disso? Me sinto incompetente e triste. Talvez eu chore e não parece boa opção. Esse negócio é bom.

   ―Bom, mas embebeda. – Ele me alerta.

   ―Eu fiquei bêbada uma vez, dancei sobre a mesa. – Os olhos dele se arregalam. – Não se anime. Quando tentei parecer sensual eu caí. Fiquei de castigo um mês. Foi ótimo, eu não tinha mesmo coragem de encarar o resto da humanidade.

    ―Seu pai te colocou de castigo?

   ―Não. Ele morreu quando eu tinha nove anos. Era um amor. Mamãe o amava tanto que mesmo sendo bem jovem ela nunca quis outro. Quando eu tinha vinte ela morreu. Ficou um tempo doente. Ela me educou sozinha. Posso fazer o mesmo agora. Deu certo comigo, vai dar certo com Isabella. Nós duas vamos conseguir.

   ―Tenho certeza que sim. – Eu o abraço. É bom quando alguém acredita em você. É realmente reconfortante ter alguém como ele por perto. Vittorio demora um pouco, mas depois me envolve.

   ―Eu estudei relações públicas, tinha qualquer coisa sobre não invadir o espaço da outra pessoa, fica claro que faltei a essa aula. – Digo com a cabeça em seu peito. Era bom solta-lo. Só que eu não tenho culpa dele ser tão bom nisso de abraçar.

   ―Que abraço bom em mamãe. – Isabella chega e me afasto. – Vittorio eu vi seu sobrinho Matteo e sua irmã e seu irmão.

   ―Vovó estava te mostrando fotos? – Ela afirma.

   ―Podemos ir ao jardim ver aqueles fofinhos? Estou com saudade deles.

   ―Podemos. Obrigada Vittorio. – Digo a ele enquanto seguro a mão de Isabella. – Por... tudo.

   ―Estou no escritório se precisar de alguma coisa. – Ele segue para sua sala e olho para Isabella.

   ―Cachorros mamãe.

   ―Claro. Cachorros, vamos. – Saímos para o dia ensolarado. Os dois animais surgem correndo, me sento sob uma árvore enquanto ela brinca com seus novos amigos. Eu podia ser feliz aqui. – Qualquer um podia Gabriela. – Digo a mim mesma, Isabella me acena sorridente. Meu anjinho está no paraíso.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

BEIJOSSSSSSSSSSSSSS