New York,

May 24, 2018.

Sentados no extenso sofá da sala da nova casa dos Potters, três figuras conversavam, distraídas. Na verdade duas, porque uma não conseguia formular uma frase coerente há vários minutos.

— Ron?

O homem não movera um músculo.

— Ron!

Harry jogou uma almofada na direção do amigo. A peça acertou-lhe em cheio na cabeça.

— O quê?! – o ruivo despertou para realidade.

— Você tá bem, cara? – Harry perguntou.

O aparelho no colo de Ronald vibrou novamente. Hermione lhe mandara outra mensagem. Dessa vez, um vídeo. Ron tocou a tela do iPhone para baixar o arquivo de mídia.

Ginny o chamou, de novo. A ruiva estava estranhamente paciente.

— Ron...?

— Oi, Ginny.

O irmão ergueu uma sobrancelha, sem tirar os olhos do celular.

— Tá tudo bem?

— Tá sim, senhora.

O download do vídeo terminou. A imagem do pequeno Hugo apareceu na tela, em foco. O garoto, agora com quase seis meses de idade, tentava sem sucesso imitar a irmã, que estava sentada ereta ao seu lado.

Apesar da força de vontade, os bracinhos do ruivinho eram curtos e ele não possuía estrutura suficiente para se manter naquela posição, então ele caía sobre o tapete felpudo a todo momento, a fazer caretas engraçadas e dar gritinhos agudos, como se ralhasse com a irmã mais velha por estar zombando dele.

Ronald sentiu uma pontada no estômago ao assistir o vídeo dos seus filhos, o que não era de se estranhar. Ele estava do outro lado do oceano, inerte, sem poder participar da cena. O último mês havia sido um martírio porque, desde quando voltara da Inglaterra, sua vida parecia ter estacionado. Ron não sentia mais nenhum pingo de animação em ter que ir trabalhar, fechar algum negócio, ou mesmo sair com os amigos.

O ruivo não percebera quando o casal que também estava na sala esticou-se na sua direção, pelo sofá, um de cada lado, ambos curiosos para ver o que o ele estava assistindo.

Ao ver os sobrinhos na tela do celular, Ginny franziu a testa. Ela analisou o irmão de rabo de olho, antes de indagar mais uma vez.

— Certeza mesmo que tá tudo bem, Ronald?

Como se fosse uma criança desolada, Ron balançou a cabeça.

— Não. – negou, sincero.

Para piorar o caso, na sequência, Hermione aparecera na gravação. Quando ela sorriu e acenou, Ronald sentiu que a sua ruína por estar longe estava completa. Involuntariamente, ele pausou o vídeo e deslizou o dedo sobre a tela, na direção do rosto da ex-esposa.

Ginny sorriu ao assistir a confusão mental do irmão. Harry também. O amigo o encarou.

— Por que você não conta a verdade a ela?

Ron suspirou.

— Porque isso não é certo.

— O que não é certo?

— Tudo. – ele respondeu frustrado. – Eu que comecei tudo isso. A ideia da separação foi minha. – lamentou. – Eu... eu deveria ter seguido em frente, só que...

— Só que você percebeu que continua apaixonado pela Mione.

A interrupção do cunhado só trouxe verdades inconvenientes. Harry conseguia ser bem direto quando queria.

O ruivo assentiu de maneira triste.

— Até mais do que antes.

Ginny se aproximou do irmão.

— Você tem que contar a Hermione o que você está sentindo.

— Nós assinamos aquela merda daquele divórcio, Ginny. Já era.

— Lógico que não! – ela rebateu. – Aquilo é só um papel, Ron. E papeis são assinados e rasgados todos os dias. Você bem sabe disso.

— A Hermione deve tá melhor agora, sem aquela enrolação toda entre a gente.

— Como você pode ter tanta certeza? – fora Harry que questionara.

— É. – Ginny concordou. – Como você pode afirmar com tanta certeza que ela não sente a sua falta, se você não tem coragem de perguntar?

Era uma pergunta pertinente e Ronald sabia disso. Ainda assim, isso não o impedia de se sentir temeroso em relação aos sentimentos da ex-esposa. Ele não queria ouvir uma negativa. Pelo menos não depois de tanto tempo.

Como se lesse a mente do amigo, Harry deu batidinhas no ombro de Ron.

— Eu sei o que você tá pensando, cara, só que não tem outra solução. – o moreno avisou. – Você vai ter se arriscar.

O ruivo suspirou, frustrado.

— Isso é tão estranho... – assumiu. – Eu me sinto um idiota com dezessete anos de idade outra vez.

— Verdade... – Harry concordou. – A enrolação, por exemplo, continua a mesma.

Ginny riu.

— Pense pelo lado coerente, Ronald. Agora temos certeza que você nunca deixou de ser um idiota ao longo desses anos.

— Obrigado, Ginevra.

— Por nada. – a mulher respondeu, altiva. – Agora levanta essa bunda desse sofá e vá resolver sua vida, antes que eu te mande de volta para a Europa a base de chutes.

Ron sorriu de forma genuína, porém, não pensou nem por um segundo em desobedecer à irmã mais nova.

...

— Papai! – Rose exclamou, sorridente.

— Ei, amor. – Ron respondeu, também com um sorriso.

— Não esperava a sua ligação.

O ruivo reparou que o cenário da vídeo-chamada era bem diferente do que ele estava acostumado.

 – Atrapalho alguma coisa? – perguntou.

— Não, claro que não. – a garota negou de prontidão. – Pode falar.

Ron respirou fundo. Ele levara horas para juntar coragem suficiente para fazer a ligação e ainda assim não parecia o suficiente.

Rose franziu a testa, do outro lado da tela.

— Aconteceu alguma coisa? – inquiriu, levemente preocupada.

— Bom... não... – Ron passou a mão pelo rosto. – Quer dizer, sim... – pigarreou. – Na verdade, Rosie, eu preciso muito da sua ajuda.

— Minha ajuda?

— Sim.

— Para o que exatamente você precisa da minha ajuda, papai?

Antes que Ron respondesse, uma figura loira passou por trás de Rose e se sentou na cama.

Malfoy acenou na direção do ruivo.

— Oi, Mr. Weasley.

— Olá, Scorpius... – o homem o cumprimentou.

O garoto sorriu e voltou a mexer no seu próprio celular, entretido com alguma coisa. Ron permaneceu paralisado, observando a cena e todos os outros detalhes ao seu redor.

A ficha então caiu.

— Você está dormindo na casa do seu namorado.

Rose se encolheu na beirada da cama de Scorpius. Ela e loiro se olharam, temerosos.

— Sim, pai... – a ruiva confirmou com cautela. – Eu estou dormindo na casa do meu namorado.

— Desde quando?

— Essa é a segunda vez, na verdade.

— Segunda vez que o quê?!

— Que eu durmo aqui, ué!

— Ai meu Deus... – o homem passou as duas mãos pelos cabelos vermelhos, exasperado. – Eu não quero nem imaginar o que aconteceu nas outras vezes que você não dormiu...

— Papai!

A vontade de Rose era de se enfiar em um buraco e não sair nunca mais. Conversar sobre isso era uma das ultimas coisas que ela imaginava que teria que falar com o pai.

Ron ergueu as mãos em rendição.

— Ok, ok! – exclamou. – Pelo bem da minha sanidade mental eu não vou falar mais nada!

— Muito obrigada!

— Eu sei que você não é mais uma criança...

— Obviamente.

— De qualquer forma eu preciso de alguns segundos para me recuperar...

Scorpius prendeu um riso na garganta. Ron semicerrou os olhos azuis, desafiador.

— Pode rir, Malfoy. – ele falou baixinho, num tom ameaçador. – Pode rir bastante...

— Jamais, senhor...

— Papai, foco! – Rose reclamou, irritada. – E você pare com isso!

Ela se virou na direção do namorado e o golpeou na perna com um travesseiro.

— Ai! – o garoto reclamou.

— Eu já estou constrangida o suficiente para você piorar a situação!

— Mas eu não fiz nada!

— Não importa!

— Ok, senhora.

A garota cutucou o namorado mais vez, sem piedade, e Ron achou graça da situação. No fim, os três riram. Ao ver que o ruivo estava mais calmo, Scorpius fez sinal para Rose.

Ela encarou o pai novamente.

— Então, papai... o que você quer falar comigo?

— Eu... hum... eu queria que você me ajudasse com a sua... mãe.

— Ajudar com a mamãe...? – a ruiva franziu o cenho. – Por que você precisa de ajuda com a mamãe?

Ron fechou os olhos e suspirou.

— Porque eu amo a sua mãe, Rose, e eu quero a minha família de volta.