Crônicas Mitológicas escrita por Elias Franco de Souza


Capítulo 13
Pirítoo


Notas iniciais do capítulo

Pirítoo está muito preocupado com Electra, que corre risco de vida após ser severamente ferida, e encontra-se pela primeira vez com a suposta reencarnação de Atena.



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Já era noite, e o grupo de Pirítoo havia finalmente contornado o Monte Pélion. Agora que estavam próximos do ponto de encontro combinado com Orfeu, diminuíam a passada para poupar energia. Electra, cujas feridas estavam muito feias, dormia nos braços do cavaleiro, que se perguntava se não deveria ter aceitado a ajuda de Quíron para curá-la; vê-la sofrer partia seu coração. As demais Plêiades, preocupadas com a irmã, acompanhavam de perto. Taigete, que estava carregando a urna sagrada um pouco mais atrás do grupo, aproximou-se.

— Mestre Pirítoo, não se martirize por ter recusado a ajuda do traidor — Taigete era bem observadora. — Você fez o certo em não confiar nele, e quando Electra estiver melhor, nós vamos puni-los com a morte pelo que fizeram a ela.

— Isso mesmo! Terminar com a luta de onde paramos vai ser fácil — concordou Alcíone. — Aquele velho era muito forte, mas nem se comparava ao senhor, mestre.

— Errado. Ele era tão ou mais poderoso do que eu. Eu não sei se eu conseguiria vencê-lo sem usar as minhas armas... Não. Talvez mesmo usando as minhas armas eu ainda não fosse páreo para ele.

— O quê?! Você não pode estar falando sério — questionou Mérope, segurando um sorriso cínico. — Aquele velho nem encostou no senhor, mestre. E você quase o derrotou com um golpe só.

De repente Pirítoo parou de andar, e ficou fitando o solo. As Plêiades o indagaram com o olhar, sem entender o que havia com ele. O cavaleiro pediu que Mérope tomasse Electra nos braços, e solicitou que Taigete colocasse a urna sagrada no chão. A urna se abriu e recebeu as peças da armadura de prata que deixaram o corpo de Pirítoo, fechando-se em seguida. Com o corpo desnudo, as Plêiades puderam ver o que a armadura escondia. Em seu corpo talhado por músculos milimetricamente esculpidos, estavam espalhadas várias queimaduras de primeiro e segundo grau. Embora Pirítoo não houvesse demonstrado durante a batalha, a técnica de Quíron feriu-o bastante. As irmãs ficaram chocadas ao perceber que seu mestre estivesse escondendo a dor daqueles ferimentos esse tempo todo.

— Quando foi que isso aconteceu? — indagou Asterope, preocupada.

— Vocês pensaram que a minha orbe de raios tivesse bloqueado totalmente aquelas chamas, não é? Mas mesmo sem me atingir diretamente, e mesmo com a minha armadura me protegendo, o calor daquele fogo ainda fez isto ao meu corpo. E ele ainda estava se contendo ao invés de me atacar sério... — aquele maldito presunçoso, pensou. Pirítoo imaginava que, enquanto ele havia ficado bastante ferido, seus ataques contra Quíron haviam danificado apenas a armadura de Centauro, mas não o corpo do cavaleiro. — Devo admitir que a força na determinação daquele cavaleiro era impressionante. É difícil de acreditar que alguém como ele iria trair Atena.

— Você não está dizendo que acredita na história dele, está? — perguntou Celeno, que já parecia bem melhor depois de recuperar-se do golpe no estômago.

Pirítoo apenas vestiu sua túnica, que Taigete lhe passou, e não respondeu. Ignorou a pergunta e seguiu adiante, sendo seguido pelas Plêiades. Elas devem ter percebido que ele estava em dúvida sobre Quíron. Se Quíron fosse um inimigo do Santuário, o mais lógico seria entregar Atena para os marinas, mas ele não fez isso. Por que alguém estaria tão determinado em manter a reencarnação de Atena longe do Santuário, porém também protegida e escondida dos atlânticos? O que ele ganhava com isso? Ele não parecia estar agindo em benefício próprio ou de terceiros. A única explicação plausível seria que ele realmente era fiel a Atena. Mas isso implicaria em realmente haver algo de podre no Santuário. Pirítoo não podia admitir que houvesse algo de errado acontecendo bem de baixo de seu nariz e dos de outros cavaleiros. A mera suposição do Grande Mestre ser um traidor era absurda. Talvez Quíron apenas acreditasse estar sendo fiel a Atena, mas estivesse sendo enganado ou manipulado por alguém. Isso explicaria a ausência de intenções malignas em seu cosmo.

— Você demorou bastante — era Orfeu quem o recebia no meio da estrada escura, interrompendo seus pensamentos. Ao seu lado estava uma donzela de cabelos castanhos claros e olhos verdes, a quem Pirítoo assumiu ser a suposta Atena. Com cara de poucos amigos, ela não parecia nem um pouco contente por estar ali.

— É ela? — perguntou, hesitante. Orfeu acenou positivamente. Pirítoo imediatamente se ajoelhou perante a garota, gesto no qual foi acompanhado pelas Plêiades. — A-atena, eu sou o Cavaleiro de Prata de Órion, ao seu dispor! — gaguejou. Embora, nos últimos minutos, Pirítoo já estivesse esperando que esse encontro fosse acontecer, ele nunca imaginou que ficaria tão nervoso ao finalmente conhecê-la. Após crescer acreditando que Atena estivesse morta, o cavaleiro ainda duvidava que essa garota pudesse ser a tão procurada deusa. Mesmo assim, pensando na importância desse primeiro encontro, mal conseguia encará-la nos olhos, e percebeu que a garota também estava embaraçada com a situação.

— Tanto faz. Eu já disse que meu nome é Hele e que não quero me envolver com isso — desdenhou. Embora ela se fizesse de durona, não conseguiu esconder o fato de ficar corada. Era uma garota tímida.

— Me perdoe por constrangê-la — corrigiu-se, levantando-se.

— Não constrangeu — protestou. — Eu já avisei o seu amigo que vocês vão se arrepender de não me deixarem voltar pra casa. O meu irmão é muito forte e vai vir me resgatar — ameaçou.

— Como era de se esperar, após viver quinze anos como uma simples camponesa, ela ainda não aceitou a verdade — explicou Orfeu. — Fique atento, Pirítoo, ela já tentou fugir várias vezes enquanto eu te esperava. Eu tive que ameaçar levá-la amarrada para ela sossegar um pouco — a garota devolvia um olhar de nojo para Orfeu, ao que Pirítoo teve que segurar um riso, lembrando-o dos trejeitos de sua discípula mais nova. Durou pouco, porém, o seu humor, já que logo lembrou-se dos ferimentos de Electra. Com a expressão visivelmente preocupada, Pirítoo fez um gesto para que Mérope trouxesse Electra para perto de Orfeu, deitando-a no chão. Foi só então que o cavaleiro de ouro e Hele perceberam que a amazona estava gravemente ferida.

— Eu não consegui curar essas queimaduras, apesar de eu mesmo ser um especialista na área — explicou Pirítoo. Orfeu se ajoelhou e analisou preocupado os ferimentos. Apesar de estar desacordada, Electra tinha uma expressão de dor. — Também não consegui tirar a febre dela.

— Quem fez isso? Não pode ter sido aquele ancião. Aquele homem era Quíron, o Cavaleiro de Centauro, não era?

— Sim. — Maldito Orfeu, já tinha uma teoria de quem seria o homem que mandou-lhe investigar, mas não dividiu suas informações com ele.

— É, eu já vi esse tipo de ferimento. Ele não é causado por relâmpagos nem por uma chama ordinária. Esse tipo de queimadura que não cicatriza, e que drena a sua energia vital, só pode ter sido causada pelo Fogo Estelar.

— Você está falando da chama das estrelas?

                — Exato. A chama das estrelas, que só pode ser produzida queimando o pó estelar, elemento que somente a extinta Escola de Áries dominava. Ao que parece, eu me enganei a respeito do garoto, não é? Eu senti o cosmo dele daqui quando explodiu.

— Era tão forte quanto o de um cavaleiro de ouro... Ele pode vir a se tornar um problema — Pirítoo cuidava das palavras para não falar demais perto de Hele. Afinal, a garota era irmã de criação de Jasão. Embora ela ainda demonstrasse preocupação com o estado de saúde de Electra, também estava visivelmente ansiosa sobre qualquer informação que pudesse ouvir a respeito do irmão. Sabendo disso, Pirítoo decidiu confortá-la. — Não se preocupe, ele e seu tio estão bem. Nós lutamos, mas estabelecemos uma trégua. Electra foi a única que ficou realmente ferida...

— O-... Obrigada. — A garota pareceu deixar um pouco do desdém de outrora de lado.

— Afinal, Orfeu, você pode curar Electra ou não? Eu não sei quanto tempo ela vai resistir assim.

— Eu não. Mas Atena pode.

— O quê? — exclamou surpresa.

— Você sabe que pode, Atena — insistiu Orfeu. — Faça como eu lhe ensinei antes, e deixe seus instintos guiarem você.

— Por favor, Atena — implorou, Pirítoo, abaixando a cabeça para ela. — Electra é a minha discípula querida. Se ela morrer, não vou me perdoar. Mesmo que você não consiga, eu te imploro que ao menos tente. Hele...

Ser chamada pelo próprio nome pareceu tocar a garota. Olhando para o sofrimento de Pirítoo com compaixão, ela assentiu, e sentou-se próxima de Electra, repousando a cabeça dela em suas pernas. Parecia estar insegura do que fazer, mas ainda assim seguiu adiante. Repousou as mãos sobre o próprio peito, e fechou os olhos. Assim permaneceu por alguns segundos. Pirítoo estava impaciente, a situação de Electra parecia estar deteriorando; a sua respiração estava mais acelerada e curta agora, e o pulso rápido e fraco. A demora já estava fazendo o prateado duvidar da divindade de Hele.

— Orfeu, está óbvio que isso não está funcionando. Por favor, faça alguma coisa — o pedido saiu quase como uma ordem.

— Paciência. Tenha fé em Atena — reiterou.

Não havia Atena alguma ali. Pirítoo revoltou-se, levantou-se e afastou-se. Sofrendo antecipadamente pela morte da discípula, apoiou a testa numa árvore, tentando conter as lágrimas que queriam brotar, no que foi amparado por Mérope, que o abraçou. As outras irmãs permaneciam em volta de Hele e Electra, ainda esperançosas no julgamento de Orfeu a respeito de Atena. Quando Pirítoo já tinha dado a causa como perdida, porém, detectou um cosmo novo no local, um cosmo como nunca havia sentido antes, mais puro, mais humilde e, principalmente, mais generoso do que qualquer outro, e ele vinha do corpo de Hele. Quando virou-se para vê-la, percebeu uma enorme aura dourada a rodeando. Então, a garota tirou de seu peito uma esfera cintilante de luzes coloridas, como se fossem de um intenso arco-íris ou da aurora boreal, e a depositou sobre Electra, cujo corpo a absorveu. Em questão de poucos segundos, todos os ferimentos se regeneraram, e Electra estava salva. Orfeu não estava louco. Após quinze anos desaparecida, aquela garota definitivamente era a reencarnação de Atena.


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Notas finais do capítulo

Eu espero ter transmitido, ainda que sucintamente, os sentimentos de Pirítoo.



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