Black Annis: A Coisa que Nos Uniu escrita por Van Vet


Capítulo 19
Relembrando de Tudo


Notas iniciais do capítulo

Olá, gente!! Tudo bem?

Hoje mais um integrante do antigo Clube dos Perdedores deverá se decidir sobre ir ou não ajudar os amigos adultos e cumprir a promessa. Quem será?

Agradecendo os comentários da outra atualização, gosto muito sempre, e aguardando o feedback de vocês para esse também.

Ótima leitura para todos! o/



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/730293/chapter/19

Na casa dos Longbottom, em Nebraska, tudo ia muito bem. Na propriedade de madeira pintada de verde-oliva de dois andares, Alice e Frank era um casal de aposentados que vivia confortavelmente a melhor fase da vida, a terceira idade, ou assim as pessoas diziam. De fato, para aqueles dois, o dia dia na casa de campo era tranquilo e reconfortante, mas nada os animava mais do que a visita de seu único filho, o talentoso escritor de sucessos de terror, Neville Longbottom.

Do lado de lá, o sentimento era recíproco. Ser paparicado pela mãe fazendo suas comidas prediletas ou ter longas e filosóficas conversas com o pai enquanto embrenhavam-se juntos a procura para gravar o canto dos pássaros no bosque ao redor da casa, o mais novo hobby do inusitado Frank, era como estar em casa outra vez. Não que sua vida com Luna não fosse incrível, porque, verdade seja dita, era. Poucas mulheres tinham a excentricidade e o poder de não fazer um dia parecer igual ao outro como ela, mas retornar ao “berço” de vez em quando era o desejo secreto de qualquer adulto.

Naquele fim de semana em que casal fora visitar os pais de Neville, os ânimos do rapaz não estava dos melhores. Algo profundo acontecera no dia anterior, uma coisa capaz de desnortear a vida normal, mesmo para alguém que quase fora atacado por uma fã maluca dias antes.

Neville acordou de um cochilo no meio da tarde, após o almoço, e uma goma de sonolência persistia em seu corpo. Deixou-se despertar suavemente, deitado na cama do quarto de hóspedes que dividia com a esposa, escutando os sons produzidos na casa e tentando adivinhá-los. No andar debaixo, Alice e Luna conversavam com entusiasmo, certamente deveriam estar na cozinha preparando uma sobremesa gostosa para mais tarde. O burburinho de suas vozes vinham abafados até os ouvidos dele, mas eram acalentadoras independente do significado. As duas se davam muito bem.

Havia outro ruído competindo com a conversa delas e ele precisou de mais um tempo para identificá-lo. Era o barulho da serra de ferro deslizando sobre a madeira. Frank provavelmente estava começando a confecção da sua oitava casinha para pássaros, a que posicionaria na orla oeste do bosque, ou qualquer coisa do gênero.

Os sons corriqueiros das pessoas que ele mais amava no mundo acontecendo quarto afora.

Então, pouco a pouco, outro barulho esgueirou-se ao redor dele e se tornou implacável e ensurdecedor. Este era um que som somente ele escutava, porque era produzido exclusivamente para sua mente. Era o som da verdade. O som do passado e o som do chamado.

Ele mal se lembrava quem era Harry Potter. Para Neville, o nome soou tão diluído quanto um fio de fumaça branca no horizonte claro, até que o homem do outro lado da linha começasse a entrar nos pormenores da infância deles. Ele contou das outras crianças, sobre a cidade de Twinbrook, sobre o verão que surgiu o Clube dos Perdedores e contou sobre uma Coisa maligna que aterrorizava o lugar naquela época…

O Palhaço explodiu em suas recordações a menção da Coisa e todas as memórias ressurgiram como peças de dominó caindo uma sobre a outra em um círculo gigante, cada uma correspondendo a uma lembrança daquele 1996.

Ele sentiu a felicidade de quando fez novos amigos, o cansaço misturado ao pavor de quando teve de correr do espantalho no milharal, a adrenalina de acertar Malfoy e sua gangue com uma chuva de pedras e até o cheiro fétido das entranhas do esgoto da cidade. As recordações voltaram tão intensas que a dor na barriga, onde existia uma cicatriz em forma P, retornou aguda e, junto dela, o rosto do seu agressor numa tarde ensolarada de julho.

Neville finalmente se lembrou de tudo. A promessa que haviam feito de retornarem para matar Black Annis, a principal delas. Aquele nome que eles escolheram com um cuidado quase cirúrgico, também voltou.

Neville desligou o telefone muito atordoado, mas não houve tempo suficiente para processar a ligação. Ele sequer dera uma resposta definitiva a Harry, o garoto magricela de óculos de grau e cabelos arrepiados que começou a se delinear nas lembranças dele.

Luna o esperava dentro do carro e o escritor só teve tempo de guardar o resto das malas e partirem para visitar os pais. Agora, deitado na cama e encarando os últimos raios de sol do dia, ele voltava a absorver sobre o tema.

Estes eram os motivos de seus pesadelos infinitos, concluiu. Poderia muito facilmente ser o motivo do seu dom paranormal de premonição. E, talvez, do seu meteórico sucesso na vida e de todas as coisas boas que nela aconteceram.

Tantas questões tornavam-se claras com isso, contudo, a maior delas continuava incógnita. Por que passou tanto tempo numa espécie de amnésia sobre os eventos de Twinbrook? Não era um bloqueio psicológico por si só, tinha certeza. Existiram coisas boas naquele passado, os melhores amigos que agora voltavam com tudo para a mente, por exemplo. Então o que era tudo aquilo, se não uma força invisível que ele ganhara de algum modo naquela época…

─ Ah, você acordou! ─ Luna entrou sorrateira no quarto encontrando o marido sentado sobre a cama e olhando pela janela.

─ Tá um cheirinho bom pela casa ─ Neville comentou estendendo o braço para abraçar sua esposa.

Luna sentou-se ao seu lado e beijou-lhe no pescoço. Ele teve um leve arrepio, sempre tinha se tratando dela. Casados há anos ou não, ela tinha poderes místicos sobre seu corpo.

─ Estamos fazendo algumas tortas.

─ Algumas tortas? ─ olhou-a com espanto ─ Mas nós somos só quatro! Quem vai comer algumas tortas?

─ Mas que pergunta ─ ela riu ─ Você emagreceu Longbottom, mas a gordice não saiu assim tão fácil.

─ Agora você falou como a minha mãe.

─ Pois foram essas suas exatas palavras quando eu disse que uma torta de morango e outra de chocolate era muita coisa.

─ Ah, mamãe ─ ele suspirou com ar brincalhão ─ Realmente, torta de morango e chocolate não é algo com que eu saiba lidar muito bem. Eu as amo.

─ E eu amo você ─ ela disse apertando as bochechas dele e aplicando um selinho carinhoso na boca ─ E amar significa conhecer cada detalhezinho da outra pessoa, inclusive esse seu comportamento diferente ─ Neville ergueu uma sobrancelha para ela ─ E nem adianta se fingir de desentendido. Sei que isto tem a ver com aquela ligação que recebeu antes de sairmos de casa e não com o que houve com a garota armada do lado de fora da livraria. Dito isso, desembucha: o que está havendo?

Foi muito estranho perceber que assim que Luna terminou com seus argumentos ele já sabia, e isto o deixou mais amargurado do que nunca, qual seria sua decisão acerca da ligação de Harry. Ela notou isto também, sua bela e intuitiva esposa, porque perguntou:

─ Minha nossa, querido! O que está acontecendo? ─ tocou-o no rosto com delicadeza.

─ Lembra quando você ficava me perguntando sobre a origem dessa minha cicatriz na barriga?

─ Hum… sim…

─ Eu me lembrei – concluiu – E me lembrei de porque tenho pesadelos e medo de palhaços, e porque também mudo de calçada ao ver uma entrada de esgoto grande demais.

─ Entendo. Tudo isso você se lembrou com um telefonema apenas?

─ Sim – confirmou e prosseguiu sobre o olhar atento dela – É uma coisa complicada de explicar, mas tudo começa na minha infância. Início da adolescência para ser mais preciso.

No quintal lá  fora, entre uma pausa e outra na conversa, eles puderam escutar Alice dizer que a casinha de passarinho de Frank estava ficando torta. “E eles são engenheiros por um acaso para se importarem?” Frank respondeu atravessado para a esposa lá embaixo, que bufou e disse que não opinava em mais nada. No quarto, o casal riu de leve dos pais dele. Neville continuou.

─ Minha mãe disse várias vezes sobre Twinbrook, aquela cidadezinha no meio do nada em que morávamos e que eles se mudaram devido aos índices atípicos de violência, certo?

─ Sim. Crianças desaparecidas e brigas domésticas fatais a todo o instante ─ ela observou.

─ Exato, mas teve coisas boas lá também. Eu fiz os melhores dos melhores amigos que alguém pode ter, nesse tempo. Só que, por algum motivo, eu não me lembrava deles até o Harry, o que sempre foi o nosso líder natural, me ligar naquele dia.

─ Cascata de lembranças.

─ É, cascata de lembranças.

─ Assim você se lembrou de quem lhe pôs essa cicatriz?

─ Entre outras coisas.

─ Coisas que você não estava se lembrando porque eram dolorosas, suponho…

─ E promessas que eu fiz e prometi cumprir quando chegasse a hora – emendou.

Luna olhou-o com preocupação desta vez. Seus lindos olhos azuis, aqueles azuis que brilharam de emoção quando estavam no altar e ele disse que a amaria para sempre, o perscrutavam com uma apreensão tremenda agora. Com um movimento instintivo, ela levou a mão a barriga em que crescia mais e mais a cada dia, no decorrer do desenvolvimento, o primeiro filho deles.

─ O que esse Harry queria de você, afinal ─ perguntou muito séria.

─ Sabe a minha intuição?

─ Não me venha com isso… - suspirou impaciente entendendo tudo.

─ Vai ser por pouco tempo. Uns dias no máximo, mas preciso ir até aquela cidade novamente. Eles estão me esperando.

─ E eles não conseguem se virarem para o que quer que seja sozinhos? - perguntou inquisitiva.

Neville pegou a mão livre de sua esposa e trouxe para seu rosto, beijando-a delicadamente.

─ Eu admiro tantas coisas em você. Admiro seu amor pelo próximo, sua compaixão pelos animais, sua capacidade de ver bom humor nos piores momentos, na facilidade com que você faz amigos… se existe alguém fácil de se conviver esse alguém é Luna Lovegood Longbottom, é o que penso.

─ Mas essa Luna Lovegood Longbottom pode ter um outro lado caso algo ou alguém queira tirar o pai do filho dela de perto.

─ Ele só precisa cumprir uma promessa e depois voltar correndo para sua família ─ garantiu, ou ao menos esforçou-se para isso.

O Palhaço lhe sorria e acenava em um túnel escuro e insalubre de suas lembranças. Era como se a Coisa soubesse que ele voltaria. Ela era inteligente, maliciosa e assassina e ele entendia, cada vez mais, até enquanto conversava com Luna, que não poderia deixar Harry, Rony, Hermione e Gina acabarem com aquilo sozinhos. Neville tinha um “superpoder” e faria a diferença na segunda vez. Ele sentia.

─ Eu vou com você.

─ Não dá, querida. Preciso estar sozinho nessa.

─ Eu tenho um grande problema de não conseguir dizer “não” para você, Longbottom. E um problema maior ainda em confiar nas suas palavras mesmo elas nunca tendo me decepcionado – disse com lágrimas nos olhos. Ele estava comovido de vê-la sofrendo assim – Vou dizer o que acho disso tudo, tá bem? Eu não sei o que aconteceu, nem quem são essas pessoas que diz serem seus amigos e muito menos os motivos dos seus comportamentos esquisitos. Não preciso saber o que você foi para te amar hoje, acredito que este Harry e não sei mais quem foram especiais para você, e tão pouco me importo em saber de onde veio sua cicatriz ou a origem dos seus pesadelos. Está entendendo?

─ Alto e claro – confirmou estendendo o polegar para secar as lágrimas dela, que recusou a mão dele.

─ Também posso ter pressentimentos e os meus sobre isto que você está me dizendo não são nada, nada bons. Mas vou permitir que vá com a certeza de que te caçarei no inferno caso não volte para mim e para essa criança que colocou na minha barriga! Agora – levantou-se de supetão – esqueça desses monstros do passado que tem de pegar e desça para comer um pedaço de torta. Mude essa cara também que sua mãe está notando que tem algo errado.

Batendo a porta com força, Luna voltou a deixar Neville sozinho no quarto. O escritor ficou encarando a madeira, sentimentos conflitantes se digladiando em seu peito, mas genuinamente agradecido por sua esposa entender a necessidade daquilo. E ela estava certa, sem querer Luna foi bastante específica sobre o que ele faria: perseguiria monstros do passado. Se a Coisa quisesse ter alguma chance sobre eles era bom ir preparada porque Neville não estava minimamente disposto a deixar Luna Lovegood, o Longbottom não tinha a ver com seu gênio, furiosa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Black Annis: A Coisa que Nos Uniu" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.