In this happy, happy day. escrita por aloritsor


Capítulo 1
Capítulo Único.


Notas iniciais do capítulo

Olá Cupcakes!

Eu sinto muito por todos vocês serem submetidos a um casamento CaptainSwan.

Essa oneshot só existe por ter sido um pedido de duas pessoas extremamente especiais.

Isadora, eu amei ver você lendo isso e sentindo cada padacinho de tudo o que estava escrito. Amo você.

Diana, você é, provavelmente, a única pessoa capaz de me fazer sentar e produzir uma história SwanQueen (além das já postadas) quando eu jurei jamais voltar a criar um enrendo nesse ship. Eu amo você.

Sem mais delongas, boa leitura.



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Existem dias que são difíceis demais. Dias em que a sua cama se revela como o único lugar para abrigar a dor inexplicável. Dias em que nem mesmo o mais belo azul celeste é capaz de lhe causar um sorriso. Dias em que qualquer mínimo som se torna incômodo. Dias em que tudo o que você quer é que o tempo passe, que o espaço se desintegre e que acabe logo. Dias em que você fecha os olhos e deseja com toda força a mudança do que é verdade agora e, como uma criança, você os abre com a esperança de que o monstro tenha desaparecido.

Só que desta vez o monstro não sumiu.

Ele continuava ali sobre o criado-mudo, na mesma posição em que o deixei há semanas atrás. Talvez a incredulidade fosse a responsável por me fazer deixá-lo ali, bem a vista, capaz de rasgar a minha alma a cada vez que os meus olhos pousassem em suas letras bem desenhadas.

E a minha alma já estava rasgada demais.

Rasgada como nunca e, vindo de mim, isso é algo relevante.

Mantinha-se ali, uma ferida exposta e dolorosa, que fora feita no instante em que a atual verdade se apresentou. Ele propôs o casamento, ela aceitou. O anel não só representava um novo peso para o seu dedo, mas representava, também, um peso sobre mim. Um peso que me afundava e me sufocava, um peso insustentável. Porém esse rasgo não seria o último, tal como não fora o primeiro. Mais um foi feito, bem em cima daquele que nem ao menos começara a se recuperar. Se eu poderia ser a juíza de seu casamento? Claro, claro, por quê não?

Eu podia engolir a minha dor e celebrar o seu dia feliz? Claro que eu poderia.

Mascare sua dor com um belo sorriso. Esconda suas feridas com ironias. Crie uma casca grossa e impenetrável. Impeça o mundo de ver o que te devora por dentro, mas, inevitavelmente, lide com o fato de que ao prender os seus monstros dentro de si, você se aprisiona junto a eles na jaula em que seu corpo se transforma. Um dia, eles vão te sufocar. Eles me sufocavam hoje. Não me deixavam levantar da cama, ou formular qualquer pensamento coerente. Não me deixavam vislumbrar uma fresta de esperança, ou qualquer luz que representasse uma saída. Eu estou aqui, aprisionada dentro de mim mesma.

Eu tento me lembrar de algum momento em minha vida em que não carreguei pesos demais. Algum momento aonde insustentável fosse a leveza de nada existir além da plenitude do ser. Eu não consigo me lembrar. Talvez quando as minhas preocupações se resumiam em conseguir algumas horas de paz ao lado de Daniel. O seu sorriso enquanto me via cavalgar e gritava palavras de incentivo para que eu fosse cada vez mais rápido. Uma realidade tão distante que em muito se parece com um sonho bom de uma noite bem dormida. Logo os olhos verdes estão ali e seria utopia imaginar que não marcariam sua presença, visto que se tornaram um ponto fixo em minha mente desde o dia em que aquela mulher me devolveu o meu filho. Eu desejei matá-la, eu desejei amá-la. Eu desejei a incoerência de cada momento ao seu lado e a confusão dos sentimentos escondidos. Desejei o seu olhar preocupado, quando o olhar de todos os outros carregava apenas ódio. A sua incansável crença no que já era desacreditado há muito tempo. A sua jaqueta vermelha irritante e o som da sua voz, que por vezes gritou meu nome quando todos queriam esquecê-lo.

É inevitável sorrir ao me lembrar do começo de tudo, ou de todas as vezes que acabamos sendo a salvação uma da outra. Emma veio com o destino de destruir a maldição que fora lançada por mim, mas ela foi muito além. Ela esteve lá quando estabeleceram que meu destino seria a morte, quando já não existiam mais esperanças e quando as trevas escolheram-me para fazer moradia. Por vezes eu me perguntei se o que existia em mim também existia nela. Se os seus olhares também guardavam o que era guardado por mim. A resposta veio em forma de um pedido, um anel, um convite. Ela se casaria com ele e eu permaneceria sozinha. 

Talvez estar sozinha não seja tão ruim quanto parece, não depois de saber que estar com alguém não significa estar feliz. O meu casamento com Leopold foi uma das fases mais dolorosas de toda a minha vida, nem mesmo quando as trevas tomavam-me, dia após dia, e o meu coração tornava-se uma massa negra conseguiram superar os anos que passei ao seu lado. Não há dor maior que se sentir violada e corrompida. Entregue a mercê dos desejos de um homem acostumado a conseguir o que bem entende por meio do poder. Não há nada como se sentir um objeto, valorizado apenas quando exibido aos outros como um troféu.

Os olhos verdes ainda estão aqui, vívidos dentro de mim.

— Mãe? — a voz de Henry me desperta, abafada pela porta bem trancada.

Levanto-me, apenas porque quem me chama é o meu filho. É aquele por quem eu mataria mil homens e venceria mil batalhas e, por ele, eu encontro força.

— Sim, querido? — ele me encara com olhos que analisam demais, mas até mesmo ele, que sempre fora de falar muito em poucos segundos, percebe que hoje o silêncio precisa ter seu espaço.

— Meu avô está lá embaixo, ele quer falar com você.

— Gold? — acredito que o desentendimento tenha se estampado claramente em minha face, pois ele sorri.

— Não, mãe. David.

— Certo, querido, eu já vou descer. — bagunço os seus cabelos, apegando-me a um gesto que me remete boas lembranças.

Lembranças do seu choro insistente, que, mesmo com tom cansado, jamais cessava. Os olhinhos pequenos e cheios de lágrimas, os cabelos ralos e castanhos. A minha esperança confortavelmente embrulhada em mantas quentinhas e vestida com roupas escolhidas com cuidado. Henry. Meu Henry. Meu filho.

Nosso filho.

Tudo seria mais simples se eu ainda sentisse ódio por ela. Sim, claro, talvez ainda exista algum resquício do ódio inicial dentro de mim e, com certa dose de coragem, ele pode ser o bastante para me ajudar a levar isso em frente. Emma Swan. A maldita mulher que quebrou minha maldição e arruinou os meus planos. Aquela que desestruturou tudo o que deveria ser eterno, com sua bravura descabida e sua força. O casamento pode ser um castigo por tudo isso. Estar eternamente entrelaçada a um pirata mal educado e que fede a rum de má qualidade.

Tolice.

O meu peito doía por ela. Quase não é mais possível enxergar, por detrás dos olhos verdes, a bravura que me tirava a paz. Aonde Emma Swan se perdeu? Inevitavelmente, busco pelos momentos em que fui culpada por destruir quem ela era. As trevas deveriam ser minhas, eu deveria estar condenada. De qualquer forma, vê-la se casar é uma condenação. Contudo aquela maldita mulher se meteu em minha frente e roubou o meu destino. Embrenhou-se em meio à negritude do vórtice de magia e poupou a minha felicidade. Eu deveria ter dito, ali naquele momento, que a minha felicidade estava sendo levada junto dela e que tudo o que deixou para trás foi uma adaga entalhada com seu nome.

Eu deveria ter dito que os seus olhos já não mais me causavam ódio e que o seu rosto estava em meus pensamentos durante todos os dias e todas as noites. Deveria ter gritado que não era só por nosso filho que eu estava ali, que era por ela também. Deveria ter confessado, uma vez e quantas fossem necessárias, que aquele homem não era o bastante para ela. Ela merecia mais, sem dúvidas. Merecia alguém que crescesse ao seu lado, mas que jamais a diminuísse. Merecia uma pessoa que acordasse todas as manhãs e se sentisse plena por saber que ela estava ao seu lado. Alguém que repudiasse sua má alimentação, seu gosto por chocolates quentes com canela, seu guarda roupas e sua falta de etiqueta, mas que a amasse como um conjunto de todas essas coisas. Emma merecia alguém que respeitasse a sua força, porque ela é uma mulher forte. E minha dor se alimenta de cada dia que eu a vi perder o seu brilho. Desejei não ter escondido tudo isso por tanto tempo, ainda que tudo sempre tenha sido nítido para bons olhos.

Eu fui ao inferno por ela, mas ela foi até lá por ele.

Eu fui até outro reino para buscá-la, mas ela voltou para os braços dele.

Eu sou a mãe do seu filho, mas, hoje, ela deseja criá-lo com ele.

Hook pode ter me entregado para ser torturada, mas a maior tortura a qual me submete é saber que ele é aquele a quem Emma entregou sua mão e escolheu dividir sua vida.

Emma está se casando com um pirata, mas ela merece uma Rainha.

Desço as escadas de uma mansão que fora construída com o cuidado da escolha de cada detalhe. A minha respiração, outrora pesada demais, controla-se como se o meu mundo não ruísse por dentro. Os sons dos saltos contra o piso de madeira ritmam o meu andar e não demora até que a silhueta daquele que um dia desejei matar se revele.

— David? — ele se vira, com um sorriso no rosto, mas eu só consigo enxergar os traços que também estão presentes no rosto dela, como uma dádiva da genética.

— Mary me pediu para deixar isso com você. — entrega-me um envelope parto e eu me pergunto o porquê de não tê-lo deixado com Henry. Encaro-o. Ele me parece nervoso, ansioso, talvez. Suas mãos estão presas aos bolsos da calça e ele troca o peso nos pés.

— Você quer falar alguma coisa? — sorri fraco e nega com a cabeça, virando-se para porta.

— Na verdade, — cruzo os braços e aguardo, certa de que nada de bom virá dali. — eu sei, Regina. Eu sempre soube e me pergunto como as pessoas conseguem não ver. — o desentendimento se estampa em minha face. — Você sabe do que eu estou falando. — sim, eu sei, penso. Mas eu não quero saber. — Não deixe que isso vá longe o bastante para ser tarde demais, Regina. Não desta vez.

Eu vejo a porta se fechar e a encaro por longos minutos, como se a madeira carregasse detalhes o bastante para prender a minha atenção. Pergunto-me se eu já feri Emma, tal como ela me fere agora. Talvez quando escolhi ir atrás de Robin e a levei comigo, ou talvez seja um preço por tê-lo trazido de volta para cá. Ele fora embora para outro reino e eu permaneço aqui. Desta vez, sem algo que possa me consolar. Acredito que o meu envolvimento com Robin tenha sido isso: uma consolação. A cada segundo que estivesse com ele, eu desejei estar com ela. A cada segundo, eu desejo estar com ela. Não obstante é utópico imaginar a possibilidade disso. Não há como.

***

Respire fundo e mantenha a calma.

Faltam apenas algumas horas para o grande casamento. Eu vejo as ruas movimentadas, cheias de pessoas que me conhecem há anos e, ainda assim, para os quais sou uma completa desconhecida. O que seria do mundo se os olhos fossem capazes de enxergar para além das máscaras que usamos todos os dias?

Será que enxergariam as minhas lágrimas contidas por detrás dos olhos bem maquiados?

Será que enxergariam as cicatrizes que marcam a minha alma e se escondem por baixo do vestido preto bem passado?

Seriam capazes de enxergar que me falta um coração no peito?

Sim, eu vou para lá sem o meu coração. Caminho a passos firmes, certa de que não há alternativa e o que me guie é o indubitável destino. Não há o que fazer, repito. O meu coração está trancado em uma caixa, onde suas batidas se tornam inaudíveis. A outra parte de mim sentiu quando retirei nosso órgão pulsante de meu peito? Quase desejo tê-la de volta. Desejo que apareça e mude o rumo das coisas. Desejo ter o mal dentro de mim mais uma vez, talvez ele fosse capaz de aplacar o sofrimento mórbido que me abate.

Do meu posto, bem no altar, eu vejo as pessoas chegarem, uma de cada vez. Visto preto, em luto por mim mesma. Em luto por Emma, porque eu sei que, hoje, ao se casar com este homem, ela mata uma parte de si e não há nada que eu possa fazer. Não há escolhas e isso me aterroriza. Emma está escolhendo sua destruição e eu não posso impedi-la.

Eu posso matá-lo.

Mas ela me odiaria. Por um segundo, ter o seu ódio dirigido a mim, em consequência de livrá-la desse futuro assustador, me parece um preço baixo a ser pago.

Eu encaro o homem que está em pé ao meu lado. O seu terno bem passado e o cabelo bem penteado não são o bastante para esconder suas falhas. Como Emma pode estar ao seu lado? Como Emma pôde escolhê-lo para passar sua vida? Logo ela, que trazia a bravura junto de si e a força em cada gesto. Por quê se diminuir a isso? Por quê se diminuir a ele?

Mesmo agora, quando o som da marcha nupcial se inicia e o meu peito infla, com a saudade de um órgão que pulsa longe daqui, eu não sou capaz de acreditar. Não sou capaz de acreditar que irei selar os votos da minha ruína.

Eu a vejo logo na entrada. O início de um longo tapete vermelho que marca o caminho ao seu destino. David está ao seu lado e o seu olhar está sobre mim, eu posso sentir, mas o meu olhar está nela, porque a descrença habita em mim.

O vestido branco e as flores no cabelo loiro tornam belo esse momento doloroso. E quem disse que o sofrimento não tem a beleza guardada em si? O sorriso em seus lábios e o hesitar a cada passo, eu sei que ela tem medo de errar. Eu sei, porque há anos observo os seus gestos. Eu observo os seus olhares e cada sinal dado por seu corpo. Eu sei identificar a raiva e a dor, eu sei quando ela está firme e quando está prestes a cair.

Eu estou prestes a cair.

Porque ela caminha para ele, mas eu desejo que caminhe para mim.

Ela sorri para ele, mas sou eu quem observa cada traço dos seus lábios.

Ela segura a mão dele, enquanto eu sempre desejei lhe oferecer a minha.

Ela pretende amá-lo até a morte, mas eu desejo o felizes para sempre.

Ela é uma Princesa e eu sou uma Rainha, talvez a impossibilidade de cada centímetro desse sentimento e a dor por cada batida do meu coração distante me faça imaginar um “e se”.

Eu lançaria uma nova maldição para impedi-la de condenar o seu destino por ele.

Será que ela não percebe que o seu amor doentio destrói cada traço de beleza que a compõe? Que a sua força não pode ser perdida por um homem que costuma ter o que quer?

Será que ela não percebe que eu estou aqui e que estou aqui por ela?

Mas agora, ele segura a sua mão e, agora, eu não tenho escolha.

— Bom dia, — as palavras forçam minha garganta. Elas não podem me faltar agora, elas precisam sair, ainda que eu deseje o silêncio. — estamos aqui hoje para celebrar o casamento de Emma Swan, — os meus olhos se prendem aos dela. Aquele maldito verde penetrante que parece ler o meu desespero. — filha de Mary Margaret e David Nolan. Ou, como preferimos, Branca de Neve e Príncipe Encantado. — eu vejo alguns sorrisos se espalharem pelo público, que nem ao menos sabe estar assistindo a minha destruição. — E o nosso tão querido pirata, Killian Jones. — esforço-me, com a consciência de que o tom me traíra. Eu estava disposta a seguir em frente. Disposta a reproduzir o meu discurso bem decorado, mas eu não posso. Não posso, porque os olhos verdes estão ligados aos meus. — Existe uma lenda sobre cisnes que me fora contada quando era criança, ela falava sobre dor, mas, acima de tudo, sobre o mais verdadeiro amor que eu já ouvi. — em um instante, na medida de um milésimo de segundo, tudo o que nos rodeava desapareceu e os seus olhos se tornaram a minha única verdade. A verdade de agora. — Em uma grande floresta, grande o bastante para jamais ter sido inteiramente vista por olhos humanos, após um longo vale, cuja névoa densa tomava cada canto e protegia cada árvore, um enorme lago abrigava um casal de cisnes, entre outros animais que ali viviam. Nessa época, os cisnes eram seres raros demais, quase mágicos. Acreditava-se que a beleza de um cisne teria o poder de curar qualquer enfermidade, bastava que olhasse para eles e compreendesse o amor que carregavam em seus corações. A grande questão é que os cisnes, por serem tão respeitados, também eram desejados. Desejados por aqueles que eram egoístas demais para enxergar a beleza e força por detrás daquele esplêndido ser. Mil moedas de ouro eram prometidas a caçadores odiosos, que cavalgavam pela floresta em busca de tais criaturas. Felizmente, a maioria deles não teve sucesso. Exceto um deles. Um deles foi capaz de cruzar a floresta e vencer a névoa do vale. Ele encontrou o lago e encontrou os cisnes. Dois deles, um casal. Flutuavam sobre as águas claras com seus pescoços formando um único coração, pois era isso o que eles eram, um só. O caçador não sabia disso e nem ao menos se preocupou em pensar. Ele ignorou a beleza do cisne e sua força, ignorou o amor e a magia que existia ali. Quando aquele caçador preparou sua flecha, ele decidiu que tomaria o cisne para si e, ao fazer isso, ele mataria os dois. Um cisne morreria, pois estaria em suas mãos, e o outro... — a voz me faltou, mas eu via a expectativa em seus olhos. — O outro morreria por estar longe daquele que amava. O caçador atirou e acertou. Uma única flecha atingiu o peito de um dos cisnes. No entanto, quando o homem entrou no lago, pronto para recolher o seu prêmio, um canto se espalhou. O outro cisne, que olhava o seu parceiro morrer sob as águas do lago que um dia fora seu lar, entoou o canto da morte. O último canto de um cisne. A sua dor foi ouvida por todo o vale e por toda a floresta, ela venceu a névoa e chegou aos vilarejos que por ali se espalhavam. O caçador não conseguiu prosseguir e somente quando os dois cisnes afundaram, ambos mortos a sua frente, ele compreendeu o que havia feito, pois quando um cisne escolhe alguém para dividir a sua vida, ele o ama por toda ela. Eles passaram todos os dias juntos, até que a morte os separou e, quando ela o fez, o outro também morreu, para que unir-se àquele que amava, para além desta linha tênue entre vida e morte. — eu vi uma lágrima lhe marcar o rosto, com a consciência de que muitas outras lágrimas marcavam o meu. Eu estava sangrando por dentro e eu via a dor em seu olhar. Sabia que se continuasse com aquilo, eu estava entregando Emma às mãos de Killian. Eu estava entregando o meu cisne às mãos do caçador. — E é por isso que eu peço que você não se case com ele.  

Um murmúrio se espalhou por todos os que estavam sentados. Eu via cochichos serem feitos e olhar de espanto, mas o meu foco estava o rosto dela, na sua descrença. O meu coração pulsou forte, longe dali. Tirá-lo do meu peito em pouco adiantou, porque eu sentia para além. Eu sentia cada batida e o peso de cada sentimento carregado. Emma vestia todas as minhas angustias. Ela vestia branco em seu dia de glória e eu vestia preto, porque tentava, inutilmente, isolar-me em minha própria solidão. Encarar Emma significava encarar o meu maior medo. Não porque ela poderia causar-me algum mal, pois o mal já me é um conhecido antigo, mas por ela ser a minha esperança. Emma me causava medo, porque eu a amava e o amor nunca fora um visitante bem vindo em minha vida. Mais uma vez, e talvez sem ter a exata consciência disso, eu pedia à Emma para ser uma salvadora.

— Regina, o que está acontecendo!? — eu ouvi o chamado de Mary, mas não me virei para vê-la. Não desta vez.

A dor se espalha por todo o meu ser e eu a sinto em cada lágrima que me marca a pele.

Eu estou sangrando.

Eu estou caindo.

Eu estou com medo.

A exposição me apavora, mas, mais do que ela, a ideia de seguir em frente me sufoca e eu não posso.

Eu preciso me agarrar a minha verdade de agora.

A minha verdade são os olhos dela.

— Eu sei que fui a responsável por muitas, muitas coisas ruins que aconteceram com você, Emma. — engoli seco, obrigando as palavras a saírem. Palavras guardadas há tempo demais. Palavras marcadas pela minha angústia. A verbalização da minha dor. — Eu a separei dos seus pais e lancei uma maldição que lhe cobrou mais do que eu posso imaginar. Acredite quando eu digo que sinto muito. Eu sinto muito e eu sempre vou sentir, todos os dias. Eu também sinto muito por não me arrepender de tê-lo feito. Porquê esta maldição me trouxe Henry e, bem, Henry me trouxe você. — caminhei com passos cheios de uma incerteza só minha. Caminhei para perto dela. — Eu a odiei por incontáveis dias e talvez fosse melhor que esse sentimento ainda existisse, pois o que eu sinto agora, vívido e sufocante, é o que me impede de continuar. Posso estar sendo a responsável por, mais uma vez, lhe tirar um momento de alegria, mas eu não poderia seguir com esse teatro bem planejado, Emma. Eu não posso e você não pode. Não pode se casar com um homem que não é capaz de enxergar a metade da mulher que você é.

— Eu exijo que você vá embora. — Jones tomou sua frente, com seu gancho polido apontado para mim. Ele me causava ódio, mas, acima de tudo, pena.

— Quem é você para exigir algo, seu pirata asqueroso? — o meu dedo pousou frente ao seu rosto e precisei de um controle sobre-humano para não roubar-lhe o coração do peito. — Você não é o bastante para ela. Você não a merece e nunca mereceu. Não me importa se jura o seu amor, ou jura ter deixado de ser um vilão por conta dele, isso não me convence, Killian Jones, porque você jamais pensou em alguém além de si mesmo. Quando propôs o casamento à Emma, você desejou apenas o seu final feliz, mas sequer lhe passou pela cabeça que esse pode não ser o final feliz dela? Sequer lhe passou pela cabeça que ela arriscou sua própria vida para ir atrás de você e tudo o que você fez foi ser um enorme ingrato? Isso não é amor, Killian. Isso é obsessão e sempre foi. Foi errado quando você a assediou dia após dia até que ela cedesse a esse seu jeito nojento que ousa pensar ser charme. Você já parou para pensar que Emma pode estar com você por comodidade e não por amor? É claro que não. Você tem o que quer e pouco importa se ela está bem com isso. Tão prepotente ao ponto de nem sequer notar que, a cada dia ao seu lado, ela perde um pouco do brilho que costumava habitar seus olhos.

— Você não tem o direito de fazer isso, Regina. — ele se aproximou o bastante para que o suor em sua face se tornasse claro para mim. Suas bochechas coravam de raiva e eu tive vontade de sorrir.

— Você não tem o direito de dizer o que eu devo, ou não, fazer. Sabe, você devia ter me matado quando teve a oportunidade. Devia ter me feito queimar com aqueles choques e então você seria feliz com ela... Ou será que ela não sabe disso? — o meu interior queimava, como há tempos não fazia. Eu me sentia em chamas e, mais do que nunca, eu sentia a outra parte de mim que não estava aqui.

— Killian! — o tom da voz de Emma me fez virar para ela. Os seus olhos queimavam e ela fuzilava o pirata. — Sobre o que ela está falando?

— Ele não te contou que me entregou para a morte? — o verde estava banhado em lágrimas quentes. — Quais foram as outras coisas que ele não te contou, Emma? Você não merece isso. — a queimação sessou e lá estava ela, a dor. Eu sinto falta do ódio. — Merece alguém que compreenda a dádiva de estar com você todos os dias. Alguém que veja o universo em seus olhos e jamais se canse de encará-los. Alguém que veja o seu pior lado e ainda assim esteja lá por você. Você não merece menos do que toda a felicidade do mundo e é por isso que eu não posso continuar. Eu não posso. Eu vou ir embora e a deixarei em paz para seguir como preferir, mas não me peça para fazer parte disso.

Mal me dei conta do momento em que a névoa roxa me abraçou e levou-me para a minha tão conhecida solidão. O frio que se espalhava pelo mausoléu em nada se comparava com o frio que vivia em mim, com a dor e com a revolta. E o medo. O medo estava aqui. Perder o controle foi um erro grave demais e agora eu podia enxergar. A exposição me sufocava e fazia-me sentir fraca e aberta. A minha alma se esvazia em meio aos cortes feitos, carregando cicatrizes que jamais seriam perdidas. Desejei que a outra parte de mim retornasse e que a minha dor, mais uma vez, se transformasse em fúria. Que o amor fosse vencido pelo ódio e que o meu coração se tornasse negro demais para sentir qualquer resquício de felicidade.

O meu coração, que agora pulsava em minha mão, com uma grande mancha vermelha. O maldito amor. Quisera eu não o sentir, com a ignorância de um leigo que desconhece o seu vazio. Seria mentira dizer que eu não a amei desde o primeiro segundo. Eu a amei desde o momento em que pisou em minha porta, eu só não compreendia o que era amar.

Eu a amei quando desejei matá-la.

Eu a amei quando ela trouxe meu filho de volta.

Eu a amei quando ela quebrou minha maldição.

Eu a amei quando ela se colocou a minha frente e protegeu a minha vida.

Eu a amei quando seu toque fez a mágica correr em meu corpo.

Eu a amei quando vi seus cabelos loiros saírem daquele poço.

Eu a amei quando seus braços me prenderam.

Eu a amei quando a união de nossas forças protegeu Henry.

Eu a amei quando ela não desistiu de mim, mesmo quando todos já haviam o feito.

Eu a amei quando ela acreditou em mim, dia após dia.

Eu a amei quando seguiu ao meu lado.

Eu a amei quando as trevas a dominavam.

Eu a amei quando ela viu o meu pior lado, mas ainda esteve ali.

Eu a amei e a amo agora, porque não existe e nem jamais existirá um reino em que o meu coração não bata por Emma Swan.

Planejo uma fuga com a certeza de que ela não é uma solução. Emma irá aonde eu for, porque ela se mantém vívida em mim. Ela estará lá a cada vez que eu olhar o rosto do meu filho e encontrar, nele, os seus traços.

Mas eu planejo fugir por não ter alternativas.

O meu coração vai se fragmentar a cada vez que eu cruzar a rua e esbarrar em sua felicidade, pois eu sei que ela não estará sendo feliz como deveria. Eu sei que o amor daquele pirata a destruirá e eu não posso impedi-la de escolher a ele.

Quem escolheria uma Rainha dividida em duas partes desiguais?

— Regina.

A sua voz.

Aquela voz.

A voz que carrega o amor e o ódio.

A beleza e a dor.

A voz daquela que eu vou amar durante todos os dias da minha existência.

— O que você está fazendo aqui, Swan? — pergunto, com a descrença de quem não acredita no que os olhos podem ver. Será que ela não está cansada de me ver aos pedaços?

— Quando você foi embora, David me mandou virar para a pessoa com quem eu desejava passar o resto dos meus dias. Para a pessoa que meu coração escolheu. — ela arrancou a flor em seu cabelo e a jogou no canto, deixando que os cachos preenchessem o espaço. — Eu estou aqui.


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