Som das Palavras escrita por Gabriel


Capítulo 4
coração de tinta


Notas iniciais do capítulo

Baseado em Colors, da Halsey.



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everything is blue (…), everything is grey (…), you were red, and you liked me ‘cause i was blue. but you touched me and suddenly i was a lilac sky. then you decided purple just wasn’t for you

(Colors — Halsey)

Com passadas confiantes, ela entrara no quarto branco e observara por um minuto o ambiente: parecia um quarto de malucos, totalmente apático, acolchoado, sem graça.

Ela ajeitou os óculos na face — uma parte da franja ruiva caía charmosamente na frente da lente — e virou o rifle para baixo, acoplando a munição. Puxou um negócio de gás por aqui, destravou o gatilho, enfim. Nada especial.

A vestimenta camuflada pesava um pouco para seu corpo. Pequena, de pele pálida, apenas catorze contas em seu fio da vida; os coturnos, companheiros para toda hora, ficavam razoavelmente largos, mas aumentavam um pouco seu porte. Ao sinal sonoro, colocou os abafadores no ouvido e já mirou aleatoriamente, atirando em uma das paredes laterais.

Dentre tantas possibilidades, azul fora a cor da primeira explosão. Justo a cor dos jeans que ele usava quando se conheceram, em um dia qualquer em que ela ficara até mais tarde no colégio. Eles se sentaram próximos na biblioteca, ele fez uma piada sobre um tema polêmico, ela logo bufou; começou uma rápida discussão, onde os ânimos meio inflamados se tornaram uma amizade de altos e baixos.

Segundo tiro: cinza. Ele tinha uma aura meio cinza, e nem por causa do cigarro, de que incrivelmente nem pegava o cheiro. Ele só era, sabe, meio pessimista, gótico: um exemplo de new emo, como gostavam de se referir ao estilo de ambos.

Depois, em um tiro pro alto, o amarelo; e uma gota da tinta caíra bem em seu capacete. Que droga. Ela odiava amarelo, ele também. Aliás, a ninguém é permitido gostar de amarelo. Cor insuportável.

Do verde, se lembrou do parque em que saíram pela terceira ou quarta vez. Aí, já tinha um certo clima de algo mais, uma sensação estranha, uma comichão no peito, borboletas no estômago. Foi quando ela percebeu todos esses sinais.

Quando atirara rosa, riu. Não, nunca nem tocaram na cor rosa, exceto por algumas piadinhas ocasionais sobre patricinhas, mas… Rosa. A flor, mesmo, não a cor. Ele parecia todo sem jeito com o buquê que comprara para fazer a grande oferta, que ela aceitou prontamente — não sem antes gozar de toda a cena.

Até a droga do quarto branco era irritante. Todos os espaços ainda limpos a recordavam daquele sorriso perfeito, de galã de filme. O idiota tinha um sorriso meio torto bem filho da puta.

Dera um tiro vermelho, com tantos significados: era símbolo do amor, da paixão, da luxúria; de tudo o que foram quando deram certo. A cor do cabelo dela, que ele dizia admirar tanto.

A mistura entre a tinta vermelha e a azul gerou um roxo meio esquisito, roxo de hematoma. Talvez os chupões… Talvez a mistura de dois mundos diferentes… Talvez os machucados não físicos.

Preto era a última das cores: a cor de seus cabelos macios, de seus olhos profundos. A cor de seu coração mentiroso, falso, cafajeste. A cor da podridão que habitava seus sentimentos.

A cor de como o dela ficara depois que ele se fora: odioso.


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