Nunca brinque com magia! escrita por Lyana Lysander


Capítulo 26
Caçada!




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Aragorn estava quase deitado sobre o chão.

—Eles aceleraram o passo. -disse o guardião se virando para nós. -Creio que nos farejaram. -ele se levantou e já se preparava para correr. -Depressa! -gritou.

—Vamos Gimli, Aura. - o elfo a frente já acelerava o passo.

—De quase dois dias e duas noites. Quase sem comida e descanso. E nenhum sinal de nossa presa a não ser o que as pedras nos dizem. -continuamos agora correndo em baixo do sol.

Seguíamos agora os inimigos em plena luz do dia. Parecia que os orcs tinham apertado o passo e estavam na maior velocidade possível. De quando em quando, nós encontrávamos coisas que tinham sido derrubadas ou jogadas fora: sacos de comida, crostas e cascas de pães duros e cinzentos, uma capa preta rasgada, um sapato pesado com pregos de ferro que se arrebentara nas pedras. A trilha nos conduzia para o norte ao longo do topo do penhasco, e finalmente chegamos a uma fenda profunda formada na rocha por uma nascente que descia espirrando com muito barulho. Na garganta estreita uma passagem acidentada descia até a planície como uma escada íngreme.

Na base atingimos, de modo estranho e repentino, o gramado de Rohan.

Crescia como um mar verde subindo até o pé das Emyn Muil. A nascente que caía desapareceu numa vegetação espessa de agriões e plantas aquáticas, e podíamos ouvi-la correndo dentro de túneis verdes, descendo encostas suaves e longas na direção dos pântanos do Vale do Entágua muito além. Parecia que tínhamos deixado o inverno envolvendo as colinas que ficaram para trás. Ali o ar estava mais calmo e quente, com um aroma leve, como se a primavera já se agitasse e a seiva corresse outra vez nas ervas e folhas. 

Quando chegamos ao topo do morro eles pararam e eu me encostei em uma rocha descansando.

—Rohan... Lar dos Senhores dos Cavalos. Há algo estranho acontecendo aqui. Alguma força do mal dá velocidade a essas criaturas. Põe sua vontade contra nós. -comentou Aragorn.

—Saruman... -eu disse cansada e eles se viraram para mim. -Sinto o poder do Mago Branco sobre essas terras.

—Aura.... -começou a dizer o elfo, mas eu o cortei.

—Precisamos continuar. -eu me desencostei e saí em frente.

Eles me seguiram e logo o elfo passou a minha frente, eu sabia bem que ele estava chateado comigo, mas não podíamos nos dar ao luxo de descansar por minha causa.

Legolas respirou fundo, como alguém que sorve um grande gole depois de um longo período de sede em terras desertas.

Eu respirava com dificuldade, e minhas perna já a muito haviam parado de reclamar. Mas aquele novo ar me animara um pouco, era mais fácil respirar ali, e era bem mais fácil correr ali também.

—Ali! O cheiro do verde! -disse Legolas me sorrindo. -É melhor que muito sono. Vamos correr!

—Os pés leves podem correr mais rápido aqui. -comentou Aragorn . -Mais rápido, talvez, do que os orcs com seus calçados de ferro. Agora temos uma oportunidade de diminuir a vantagem deles!

Fomos em fila indiana, correndo como cães que perseguem um cheiro forte, e com uma luz ansiosa nos olhos. Seguimos quase para o oeste, a trilha de destruição dos orcs deixara seu rastro horrível; a grama suave de Rohan fora amassada e enegrecida com sua passagem. Eu estava perdida em meus pensamentos quando Aragorn deu um grito e desviou-se de nós.

—Parem! -gritou ele. -Não me sigam ainda! -correu para a direita, para um ponto fora da trilha principal, pois tinha visto pegadas que iam por ali, separando-se das outras: marcas de pés pequenos e descalços. Estas, entretanto, não iam muito longe até serem atravessadas por pegadas de orcs, também saindo da trilha principal tanto atrás quanto na frente, e então elas faziam uma curva fechada voltando, e se perdiam no meio das outras pegadas. No ponto mais distante, Aragorn se abaixou e apanhou algo da grama; então voltou correndo.

—Sim. -disse ele. -Estão muito nítidas: pegadas de um hobbit. Acho que são de Pippin. Ele é menor que o outro. E olhem isto! -Aragorn ergueu um objeto que brilhou à luz do sol. Parecia uma folha de faia recém-aberta, bela e estranha naquela planície sem árvores. 

—O broche de um manto élfico! -falaram Legolas e Gimli juntos

—As folhas de Lórien não caem à toa. -o guardião havia se abaixado e tinha um de nossos prendedores em suas mão. Um dos pequenos deveria ter jogado para mostrar o caminho para nós. -Isto não caiu por acaso: foi jogado como um sinal para qualquer um que pudesse vir atrás. Acho que Pippin fugiu da trilha com esse propósito.

—Então pelo menos ele estava vivo. -quase chorei aliviada. -E pôde usar de sua esperteza, e de suas pernas também.

—Isso nos anima. Não estamos perseguindo os orcs em vão.-comentou Gimli ao meu lado.

—Vamos esperar que ele não tenha pagado caro demais por sua ousadia. -disse Legolas se apressando a voltar a trilha. -Venham! Vamos continuar! Pensar naquelas pessoas alegres e jovens sendo levadas como gado me deixa furioso.

—Menos de um dia à nossa frente. -disse o guardião voltando a correr também..

—Não sou bom em trilhas. -o Anão se virou me dizendo quando seguimos eles. -Anões são bons em corrida de velocidade. Muito perigosos em curtas distâncias. -eu ri de sua revolta.

O sol subiu até o meio-dia, e depois foi descendo o céu devagar. Leves nuvens subiram do mar no sul distante, e foram levadas pela brisa. O sol afundou. Sombras cresceram atrás e estenderam seus longos braços saindo do leste. 

Não se via mais qualquer sinal deles nas planícies. 

Quando a sombra da noite se fechava a nossa volta, Aragorn parou. Apenas duas vezes na marcha daquele dia tínhamos descansado e foi apenas por um curto período, e doze léguas se estendiam agora entre o ponto onde estávamos e a Muralha leste onde tínhamos parado ao amanhecer.

—Finalmente chegamos ao momento de fazer uma escolha difícil. -Aragorn falou cansado. -Devemos descansar durante a noite, ou prosseguir até esgotar nossa força e nossa disposição?

—A não ser que nossos inimigos também descansem, vão nos deixar muito para trás, se pararmos para dormir. -Legolas disse e se virou para mim, mas parou de falar vendo meu estado. 

Eu era claramente a mais cansada ali.

—Até os orcs fazem pausas durante a marcha, não é? -disse Gimli.

—Eles raramente viajam por lugares abertos sob a luz do sol, mas esses fizeram isso. -Legolas pontuou. -Com certeza não vão descansar à noite.

—Mas se caminharmos durante a noite não poderemos seguir sua trilha. -me pronunciei.

—A trilha é estreita, e não vira nem para a direita nem para a esquerda, até onde minha vista alcança. -Legolas mais uma vez cortou.

—Talvez eu pudesse guiá-los na escuridão adivinhando o caminho, sem perdera trilha. -disse Aragorn por fim. -Mas se nos perdêssemos, ou se eles mudassem de rumo, quando a luz chegasse poderíamos demorar muito até encontrar a trilha outra vez.

—E além disso. -disse Gimli. -Só durante o dia podemos enxergar se alguma pegada que se separa da trilha principal. 

—Isso é verdade. -ponderou Aragorn.

—Ainda assim, nem eu, anão de muitas jornadas, que não sou o menos resistente de meu povo, conseguiria correr todo o caminho até Isengard sem uma parada, se é realmente para lá que vão. -disse Gimli. -Meu coração também me queima, e eu teria partido mais cedo, mas agora preciso descansar um pouco para correr melhor. E se é para descansarmos a noite cega é a hora de fazê-lo.

—Sinto muito, mas mesmo eu não acho que conseguirei seguir muito mais hoje. -eu precisava ser realista, eu estava cansada demais. -E eu não quero ser carregada pelo caminho. -olhei de relance para o elfo que bufou.

—Eu disse que a escolha era difícil. -disse Aragorn. -Como terminamos esta discussão?

—Você é o guia! -afirmou Gimli .-E tem habilidades na caçada. Você deve escolher.

—Meu coração me pede para prosseguir. -disse Legolas. -Mas devemos permanecer juntos. Seguirei seu conselho.

Eu afirmei também, seguiria o conselho de Aragorn.

—Vocês entregam a escolha a alguém que escolhe mal. -disse Aragorn, e eu ri leve. -Desde que passamos pelos Argonath, minhas escolhas deram errado. -ficou em silêncio, olhando durante um longo tempo para o norte e para o oeste, dentro da noite que se formava. -Não vamos caminhar no escuro. -disse ele finalmente. -O perigo deperdermos a trilha ou os sinais de outras idas e vindas parece ser maior. Se a lua nos desse luz suficiente, poderíamos usá-la, mas infelizmente ela se deita cedo, e ainda está nova e pálida.

—E esta noite a lua estará coberta, de qualquer forma. -comentei calma.

—Seria bom que a Senhora nos tivesse dado uma luz, semelhante ao presente que deu a Frodo! -disse Gimli triste.

—A luz será mais necessária para aquele a quem foi concedida. -disse Aragorn. -Com ele está a Demanda verdadeira. O nosso é um problema pequeno entre os grandes feitos desta época. Talvez desde o princípio uma busca em vão, que nenhuma escolha minha possa estragar ou consertar. Bem, já fiz a escolha. Vamos usar o tempo da melhor maneira possível!

Mal terminou de falar e jogou-se no chão e adormeceu imediatamente, pois provavelmente não tinha dormido direito desde anoite que passamos sob a sombra do Tol Brandir.

O Anão fez o mesmo, jogou-se de qualquer forma por ali para dormir.

Eu peguei dois cobertores e forrei um na relva. Olhei par o elfo ainda em pé observando o caminho a frente e mesmo cansada fui até ele.

—Legolas, não vai descansar? -ele negou e se virou para mim calmo.

—Não, mas você precisa descansar. -mordi o lábio inferior negando, e ele suspirou. -Está cansada Aura. Corremos o dia quase todo.

—E você não está? Porque não descansa um pouco? -ele me fitou e se virando aproximou nossos lábios num beijo cálido. 

—Você está diferente. -disse mudando bruscamente de assunto, e me esquadrinhou com seus belos e preocupados olhos, e eu me arrepiei com aquela sua voz aguda. -Desde que começamos essa perseguição que está mais calada, mais distante, se fechando como um animal acuado.

—Desculpe. -pedi num fio de voz. -Eu...

Me senti completamente inútil e magoada naquele momento.

—Porque pedes desculpas melmë? -me chamar de amor carinhosamente me fez ficar envergonhada.

Me aconcheguei nele e este me abraçou firme, e eu me deixei por fim chorar. O que eu tinha feito Frodo passar, o que eu tinha feito Legolas se preocupar, tudo aquilo estava me angustiando.

—Não quero ser um fardo e...

—Por que pensa assim Aura, por que nunca me deixa te ajudar até que seja tarde demais? -brandou mortificado.

—Eu só não quero que me veja como alguém que precisa ser protegida a todo momento Legolas, eu...-tentei lhe explicar.

—Nunca pensei isso sobre você Melmë . Não consigo enxergar mulher mais corajosa e forte que você. Tem mais poder do que qualquer um de nós pode imaginar, mas ainda sim eu a quero proteger. -me segurei firme nele. -Por que a amo. A amo tanto que... -ele negou.

—Entendo, sinto o mesmo por você, por isso não quero sobrecarrega-lo.

—Eu sou um elfo. Posso correr mais rápido, e sou mais forte que os humanos, então mesmo que precisasse carregar você ainda sou mais rápidos que nossos amigos. -ele disse orgulhoso.

—Eu já entendi todo poderoso elfo. -gracejei e ele riu feliz.

—Parem de flertar pombinhos. -disse um Gimli rabugento deitado atrás de nós, o que nos fez rir.

—Venha deite-se e descanse um pouco. -ele me levou até a coberta que eu tinha forrado e pegou a outra forrando para si e se deitando ao meu lado, ficou fazendo carinho em minha cabeça.

—Algo pesa em seu coração. Mas sei que esse não é o momento para conversarmos sobre isso. -ele me fitou compadecido. -Não importa o que seja, eu estarei aqui por você.

Eu sorri agradecida, e um pouco mais calma.

Melinyë tirië hendulyar silina írë lálalyë. -"Eu amo ver seus olhos brilhando enquanto você sorri", disse ele me fazendo ficar completamente fofa com aquela declaração.

Melinyel. -"Eu amo você"

Ma vestuvalyen? -eu o olhei confusa, aquelas palavras eu não entendia. E antes que eu verbalizasse aquilo ele puxou um anel de seu dedo e continuou. -Sei que esse não é o momento certo, nem o mais adequado, mas as estrelas são testemunhas do meu amor por você Aura, e eu não quero que mais um amanhã nasça sem que saiba disso. Quero lhe dizer isso por todos os dias de nossas vidas.

—Legolas eu não...

—Não preciso de uma resposta agora, apenas quero que o use por enquanto, é o costume do meu povo. -ele estendeu a mão e puxou a minha, então ele colocou o anel ali que rapidamente se ajustou ao meu dedo.

Eu pisquei perdida por alguns segundos vendo o anel de prata em meu dedo. Ele era lindo e delicado, com uma flor, e entre suas pétalas, pequenas pedras preciosas.

—Era de minha mãe, e foi confiado a mim para que eu entregasse a pessoa que tomasse meu meu coração. -aquilo era um pedido de casamento? 

Não eu não podia deixar que as coisas seguissem assim ele não sabia nada soobre mim...

—A muita coisa que você não sabe sobre mim e... -ele não me deixou terminar e beijou-me me pedindo passagem, me explorando ali, depois se separou e puxou meu rosto enquanto eu respirava com dificuldade.

—Não importa o que decida, ou o que me diga no futuro, meu amor por você não mudará. Antan órenya tyenna. -"Eu já te dei meu coração". Ele disse calmo encostando nossos narizes. -E nada vai mudar isso melmë.

Antan melmenya tyenna. —"Eu te dou meu amor". -ele sorriu e me puxou para si, voltando a alisar minha cabeça.

—Descanse! -eu afirmei me aninhando em seus braços, envergonhada demais para pensar no que fazer.

Pelo jeito nada do que eu dissesse naquele momento o faria mudar!

Então por fim dormi!

                                                      ***

—O mundo está mudando. Quem agora tem forças para combater os exércitos de Isengard e Mordor? -dizia o magro branco com a mão sobre uma bola de cristal, e dentro dela o olho de fogo perseguia a tudo. -Para fazer frente ao poder de Sauron e Saruman e à união das Duas Torres? Juntos senhor Sauron nós governaremos a Terra-Média. -os exércitos de criaturas da noite marchavam, eram milhares se não milhões, e sobre eles uma torre negra com o olho de fogo se mexia. O mesmo olho que estava dentro do cristal. 

Ele se virou para mim mas antes disso a voz do mago me chamou de volta.

—O velho mundo sucumbirá ao poder da industria. -os monstros destruíam árvores ao redor da torre de Isengard, e as jogava dentro da caverna de fogo enquanto o mago passeava por está a contemplando. -As florestas serão destruídas. Uma nova ordem surgirá. Conduziremos a maquina da guerra com a espada, a lança e os punhos de ferro dos Orcs. -gobelins forjavam armas, e outros retiravam orcs nascidos das profundezas da terra manchada. -Quero eles prontos e armados em duas semanas.

—Mas meu senhor, há muitos! Eles não estarão armados a tempo, não temos recursos. -disse um gobelim ao mago branco.

—Construam uma barragem, obstruam o rio, façam a fornalha funcionar dia e noite. -comandou o mago.

—Não temos combustível o suficiente para manter o fogo. -continuou o gobelim.

—A floresta de Fangorn jás aos seus pés. -disse ele olhando com desejo a floresta a frente. -Queime-na.

—NÃOOOOOO. -eu gritei.

                                       ***

—AURA. -o elfo estava sobre mim me olhando preocupado.

—Legol... -ele me puxou para si me abraçando.

—Graças a Eru. -disse aliviado.

—Aura o que ouve? -perguntou um Aragorn se aproximando preocupado.

—Deve ser o cansaço corremos a dias, e ...

—Não mestre Gimli. -os olhei firme, e lhes contei o que tinha visto.

—O que faremos agora? -perguntou o Anão revoltado.

—Uma coisa por vez, primeiro precisamos recurar nossos amigos, depois... -ele parou olhando a imensidão a frente. -Ao que o destino nos espera.

A aurora mal estava no céu!

—Legolas! O que vêem seus olhos elficos? -Aragorn perguntou ao elfo que me soltou observando a planície a frente.

—Eles estão muito, muito longe. -disse ele com tristeza, voltando-se para Aragorn. -Sei em meu coração que não descansaram esta noite. Só uma águia poderia alcançá-los agora.

—Mesmo assim, ainda vamos segui-los como pudermos. -disse Aragorn. -O rastro está esfriando.

—Mas ainda está escuro. -disse Gimli. -Nem Legolas no topo de uma colina poderia vê-los antes de o sol nascer.

—Receio que tenham saído de meu campo de visão, seja do topo de uma colina ou de uma planície, sob o sol ou sob a lua. -disse Legolas.

—Onde a vista falha, a terra pode trazer alguma informação. -disse Aragorn. -O solo deve gemer sob os pés odiosos dos orcs. -deitou-se sobre o solo, colocando a orelha contra a turfa. Ficou ali parado por tanto tempo que Gimli começou a indagar se ele não tinha desmaiado ou adormecido de novo.

E eu me segurei para não rir de seu mal humor. E o elfo se voltou para mim ainda preocupado e eu sorri para ele dizendo que estava bem, o que pareceu aliviar um pouco sua preocupação.

Quando Aragorn finalmente se levantou, pudemos ver seu rosto: estava pálido e consternado, com o olhar preocupado.

—O ruído da terra é baixo e confuso. -disse ele. -Nada caminha sobre ela por muitas milhas ao nosso redor. Os pés de nossos inimigos estão distantes e são quase inaudíveis. Mas pode-se ouvir com clareza ruídos de cascos de cavalos. Tenho a impressão de tê-los escutado, mesmo enquanto dormia, e eles incomodaram meu sono: cavalos galopando,passando no oeste. Mas agora estão se distanciando de nós ainda mais, indo para o norte. Fico imaginando o que estará acontecendo nesta terra.

—Vamos! — disse Legolas.

Assim começou o terceiro dia de busca. Durante todas as longas horas de nuvem e sol vacilante, nós quase não paramos, algumas horas andando em grandes passadas, outras correndo, como se nenhum cansaço pudesse debelar o fogo que queimava em nossos corações. Raramente falávamos. Atravessamos a ampla solidão e nossos mantos élficos, e estes desapareciam contra o fundo dos campos cinza-esverdeados; mesmo na fria luz do sol do meio-dia, poucos olhos, coma exceção dos élficos, poderiam tê-nos notado, até que estivéssemos bem próximos. Sempre agradeceríamos em nossos corações à Senhora de Lórien pela dádiva do lembas, pois podíamos comê-las e encontrar novas forças até mesmo enquanto corríamos.

Durante todo o dia, a trilha do inimigo conduziu sempre em frente, indo para o noroeste sem interrupção ou curva. Quando outra vez o dia se acabava, chegamos a encostas longas e sem árvores, onde o solo se elevava, crescendo em direção a uma fileira de colinas baixas e corcovadas à frente.

A trilha dos orcs ficou mais fraca, conforme rumava para o norte na direção delas, pois o solo era mais duro e a grama mais curta. Lá adiante, à esquerda, o rio Entágua fazia curvas, um fio prateado no chão verde. Não se via qualquer ser em movimento. Aragorn muito se surpreendia pelo fato de não estarem vendo sinais de animais ou homens. As moradias dos rohirrim ficavam, em sua maioria, muitas léguas ao sul, sob as bordas das Montanhas Brancas, que eram cobertas de florestas, agora escondidas por névoa e nuvem; apesar disso, os Senhores dos Cavalos costumavam anteriormente manter muitos rebanhos e criações de cavalos no Estemnete, região ao leste de seu reino, e ali os pastores costumavam vagar com muita freqüência, vivendo em acampamentos e tendas, mesmo durante o inverno. Nos explicou ele.

Mas agora toda a região estava vazia, e havia um silêncio que não parecia ser a quietude da paz.

Ao crepúsculo paramos novamente. Agora já tínhamos avançado cerca de doze léguas na planície de Rohan, e a muralha das Emyn Muil se perdia nas sombras do leste.

A lua jovem brilhava num céu enevoado, mas emanava pouca luz, e as estrelas estavam veladas.

—Agora sou eu quem sente falta de um tempo para descansar, ou de uma pausa em nossa caçada.  -disse Legolas, e eu me encostei nele procurando descanso. -Os orcs correram na nossa frente como se estivessem sendo perseguidos pelos chicotes de Sauron. Receio que já tenham atingido a floresta e as escuras colinas, e que exatamente agora estejam entrando nas sombras das árvores. 

Gimli rangeu os dentes. -Este é um final triste para toda nossa esperança e nosso esforço! -disse ele.

—Para a esperança talvez, mas não para o esforço. -comentei cansada e Aragorn tentou me sorrir. 

—Não voltaremos daqui. Mas estou cansado. -disse Aragorn, e olhou para trás, na direção do caminho pelo qual tínhamos vindo, na direção da noite que se formava no leste. 

—Existe alguma coisa estranha operando nesta terra. Desconfio do silêncio. Desconfio até dessa lua pálida. -eles me olharam afirmando como se aquele fosse um pensamento em comum.

—As estrelas estão apagadas, e eu estou cansado como raramente estive antes,cansado como um guardião não deveria estar ao seguir uma trilha nítida. Há alguma disposição que empresta velocidade a nossos inimigos e põe diante de nós uma barreira invisível: um cansaço que é mais do coração que das pernas. -Aragorn sentou no chão enquanto falava.

—É verdade! -disse Legolas se sentando também e eu segui ao seu lado. -Isso eu já sei desde que descemos das Emyn Muil. Pois essa disposição não está atrás, mas à nossa frente.

Apontou na distância, sobre a terra de Rohan, para o oeste que escurecia sob alua em forma de foice.

—Saruman, Aura estava certa! -murmurou Aragorn. -Mas isso não deve fazer com que retomemos. Mais uma vez devemos parar, pois, vejam!  Até mesmo a lua está sendo envolvida pelas nuvens que se adensam. Mas ao norte estará nossa estrada, entre colina e pântano, quando o dia retornar.

Por fim decidimos dormir um pouco, pois nossas forças estavam esgotadas.

Como antes, Legolas foi o primeiro a se pôr de pé, se é que de fato tinha dormido.

—Acordem! Acordem! -gritou ele. -A aurora já chegou. Coisas estranhas nos esperam perto das bordas da floresta. Boas ou más, eu não sei; mas estamos sendo chamados. Acordem! -eu me levantei e os outros pularam de pé, e quase imediatamente partimos outra vez. -Nasce um sol vermelho. Sangue foi derramado esta noite. -disse o elfo preocupado.

Seguimos correndo em frente quando Aragorn parou e mexeu no chão, depois se virou olhando firme.

—Eles descansaram um tempo aqui. -disse ele. -Mas mesmo a trilha mais extrema já está velha. Receio que seu coração tenha dito a verdade, Legolas: faz três vezes doze horas, eu acho, que os orcs pisaram aqui onde estamos pisando agora. Se mantiveram o passo,então ao pôr-do-sol de ontem já atingiram as fronteiras de Fangorn.

—Não vejo ao norte e a oeste nada além de capim que desaparece na névoa. -disse Gimli. -Conseguiríamos ver a floresta, se subíssemos nas colinas?

—Bem, vamos indo. -eu chamei e eles afirmaram, mesmo que soubéssemos que aquilo minaria nossa forças. -Vamos subir esta colina verde! 

Cansados, os outros me seguiram, escalando a longa encosta, até que chegamos ao topo. Era uma colina redonda, suave e nua, erguendo-se solitária, a colina que ficava mais ao norte. O sol começou a esquentar mais. 

—Nada se vê aqui que possa nos guiar. -disse Gimli. — Bem, agora devemos parar outra vez e comer algo. Está ficando quente!

—Mas descanse, se precisar. Ainda não joguei toda a esperança fora. Não se sabe o dia de amanhã. O nascer do sol geralmente traz um bom conselho.

—Mais de três sóis já nasceram em nossa busca, e nenhum trouxe bons conselhos. -disse Gimli.

Comemos quietos, mas rápido, e então voltamos a nossa empreitada.

Adiante e na direção do leste, víamos os planaltos do Descampado de Rohan, que já tínhamos avistado do Grande Rio muitos dias atrás. Na direção noroeste assomava a escura floresta de Fangorn; ainda a dez léguas ficavam suas fronteiras sombrias, e suas encostas mais distantes desapareciam num azul distante.

Seguindo com seus olhos argutos a trilha que ia para o rio, e depois do rio de volta à floresta, Aragorn viu uma sombra no verde distante, um borrão escuro que se movia rapidamente. Jogou-se no chão e outra vez escutou com atenção. Mas Legolas ficou de pé ao seu lado, protegendo seus claros olhos élficos com a mão longa e delgada, e não viu uma sombra, nem um borrão, mas as pequenas figuras de cavaleiros, muitos cavaleiros, e a luz da manhã sobre as pontas de suas lanças era como o faiscar de diminutas estrelas além do limite da visão dos mortais. Muito atrás deles, uma fumaça negra subia em fios finos e encaracolados.

Havia um silêncio nos campos vazios, eu podia ouvir o ar se movendo no capim.

—Cavaleiros! -gritou Aragorn, pulando de pé. -Muitos cavaleiros montando cavalos velozes estão vindo em nossa direção!

—Sim. -disse Legolas. -Há cento e cinco deles. Têm os cabelos dourados, e as lanças brilhantes. O líder é muito alto.

Aragorn sorriu. -Agudo é o olhar dos elfos. -disse ele.

—Não! Os cavaleiros estão a pouco mais de cinco léguas de distância. -disse Legolas.

—Cinco léguas ou uma, não podemos escapar deles nesta terra deserta. Vamos esperá-los aqui ou devemos seguir nosso caminho? -perguntei apreensiva, a diferença numérica era gritante.

—Vamos esperar. -disse Aragorn. -Estou cansado, e nossa caçada foi um fracasso. Ou pelo menos outros chegaram na nossa frente, pois esses cavaleiros estão retornando pela trilha dos orcs. Podemos receber notícias deles.

—Ou lanças. -disse Gimli, provavelmente tão preocupado com aqueles Cavaleiros quanto eu.

—Há três selas vazias, mas não vejo hobbits. -disse Legolas.

—Eu não disse que conseguiríamos boas notícias. -falou Aragorn. -Mas, sejam boas ou más, vamos esperar aqui.

Então deixamos o topo da colina, onde poderíamos ser um alvo fácil contra o céu quente, e descemos devagar a encosta norte.

Paramos um pouco acima do pé da colina, e  Legolas se colocou na minha frente e puxou o capuz em minha cabeça me escondendo, no fim todos nos embrulhamos com os mantos élficos e sentamos uns perto dos outros sobre o capim ralo. O tempo passava lento e pesado. O vento era fino e penetrante.

Gimli estava inquieto.

—O que você sabe sobre esses cavaleiros, Aragorn? -perguntou ele. -Estamos aqui sentados esperando morte súbita?

— Já estive entre eles. -disse Aragorn. -São voluntariosos e cheios de orgulho, mas têm o coração sincero, são generosos em pensamentos e ações; destemidos mas não cruéis; sábios mas incultos, não escrevendo nenhum livro mas cantando muitas canções, amaneira dos filhos dos homens antes dos Anos Escuros. Mas não sei o que aconteceu aqui ultimamente, nem com que disposição os rohirrim podem agora estar entre o traidor Saruman e a ameaça de Sauron. Por muito tempo foram amigos do povo de Gondor, embora não sejam parentes deles. Foi nos dias esquecidos de antigamente que Eorl, o Jovem, trouxe-os do norte, e seu parentesco é na verdade com os bardings de Valle, e com os beornings da Floresta, entre os quais ainda se pode ver muitos homens altos e belos, como são os Cavaleiros de Rohan. Pelo menos, é certeza que não morrem de amores pelos orcs.

Depois de um tempo finalmente pude ouvir a batida distante de cascos galopantes. Os cavaleiros, seguindo a trilha, desviaram do rio e se aproximaram das colinas.

Galopavam na velocidade do vento. 

Agora o som de vozes fortes e nítidas vinha ecoando através dos campos.

Os cavalos eram de grande estatura, fortes e com patas bem proporcionadas; as capas cinzentas reluziam, as caudas longas esvoaçavam ao vento, as crinas caíam trançadas sobre os pescoços imponentes. Os homens que os montavam combinavam muito bem com eles: altos e esbeltos; os cabelos claros como palha saíam dos elmos leves e desciam-lhes em longas tranças pelas costas; os rostos eram austeros e argutos. Nas mãos traziam longas lanças de freixo, escudos pintados pendiam-lhes das costas, longas espadas estavam penduradas em seus cintos, as bainhas das vestimentas de malha de metal polido desciam-lhes até os joelhos.

Galopavam em pares, e, embora de quando em quando um deles se erguesse nos estribos e olhasse para os dois lados, eles pareciam não perceber os quatro forasteiros, sentados em silêncio e vigiando-os. 

O exército quase passara por nós quando Aragorn se levantou e chamou em voz alta:

—Cavaleiros de Rohan, que notícias trazem de suas Terras? -gritou Aragorn.

Os cavaleiros deram a volta nos cercando, e apontando suas lanças para nós.

Com velocidade e habilidade assombrosas, eles pararam seus cavalos, viraram e voltaram. Logo nos vimos num círculo de cavaleiros movimentando-se numa roda que não parava, subindo a encosta da colina atrás de nós, e descendo, dando várias voltas ao nosso redor, fechando o cerco cada vez mais. Aragorn permanecia quieto, e os outros dois ficaram sentados sem se mexer, pensando no rumo que as coisas tomariam, mas quando fiz mensão de tirar meu capuz, Légolas segurou minha mão negando.

Sem qualquer palavra ou chamado, de repente, os Cavaleiros pararam. Uma floresta de lanças apontava para nos, e alguns dos cavaleiros tinham nas mãos arcos, com as flechas já ajustadas às cordas. Então um deles avançou, um homem alto, mais alto que os demais; de seu elmo, como uma crista, pendia uma cauda branca de cavalo. Aproximou-se até que a ponta de sua lança ficasse a uns trinta centímetros do peito de Aragorn, que não se mexeu.

—Quem são vocês, e o que fazem nesta terra? -perguntou o Cavaleiro, usando a Língua Geral do Oeste, numa maneira e tom semelhantes aos de Boromir, homem de Gondor. -O que fazem na Terra dos Cavaleiros? -mas então ele parou e apontou sua lança para o meio do circo como se só então tivesse me notado. -E quem se esconde atrás de vocês? Falem já! -disse ele arrogante.

—Chamam-me Passolargo. -respondeu Aragorn. -Venho do norte. Estamos caçando orcs. 

O Cavaleiro saltou do cavalo. Dando a lança a um outro que se aproximou e desceu do cavalo ao lado dele, puxou sua espada e ficou cara a cara com Aragorn, observando-o atentamente, não deixando de demonstrar surpresa. Finalmente, falou outra vez.

—Primeiro pensei que vocês fossem orcs. -disse ele. -Mas agora vejo que não é assim. Na verdade, vocês sabem pouco sobre os orcs, se vão caçando-os assim dessa maneira. Eles eram rápidos e estavam bem armados. E eram muitos. Vocês teriam passado de caçadores a caça, se tivessem alcançado o bando. Mas há algo estranho em você, Passolargo. -deitou os olhos claros e brilhantes outra vez no guardião. -Isso não é nome que se dê a um homem. E estranhas também são suas vestes. Vocês surgiram do capim? Como escaparam de nossa vista? Vocês são do povo dos elfos?

—Não! -disse Aragorn. -Apenas um de nós é um elfo, Legolas do Reino da Floresta, da longínqua Floresta das Trevas. Mas passamos por Lothlórien, e as dádivas e a proteção da Senhora nos acompanham.

O Cavaleiro olhou-nos com surpresa renovada, mas seus olhos endureceram.

—Então existe uma Senhora na Floresta Dourada, como contam as antigas histórias! -disse ele. -Poucos escapam de suas redes, pelo que dizem. Estes são dias estranhos! Mas se vocês têm a proteção dela então também tecem redes e talvez sejam feiticeiros. -De repente lançou para Legolas e Gimli um olhar frio, e por fim parou em mim. -Por que não falam, vocês que estão em silêncio?

Gimli se levantou e plantou os pés afastados no chão: sua mão agarrou firmemente o cabo do machado, e os olhos escuros brilharam.

—Diga seu nome mestre dos cavalos, e eu lhe direi o meu. -falou Gimli serenamente.

—Quanto a isso,  o forasteiro deve se declarar primeiro. Mas meu nome é Éomer, filho de Éomund, e chamam me Terceiro Marechal da Terra dos Cavaleiros. -disse o Cavaleiro, abaixando os olhos na direção do anão.

—Então, Éomer, filho de Éomund, Terceiro Marechal da Terra dos Cavaleiros, deixe que Gimli, o anão, filho de Glóin, faça uma advertência contra suas tolas palavras. Você fala mal do que é belo além do alcance de seu pensamento, e sua única desculpa pode ser a falta de inteligência.

Os olhos de Éomer reluziram, e os homens de Rohan soltaram murmúrios enfurecidos e fecharam mais o círculo, avançando com as lanças. 

—Eu poderia cortar-lhe a cabeça, a barba e o resto, Mestre Anão, se você se erguesse um pouco mais acima do chão. -disse Éomer.

—Morreria antes de desferir o golpe. -Legolas rapidamente puxou uma flecha do arco e mirou no homem.

Éomer ergueu sua espada, e as coisas poderiam ter acabado mal, mas eu saltei rapidamente no meio deles, levantando a mão.

—Parem com isso. -eu disse puxando meu capuz para trás e toquei a lateral de Legolas, o pedindo calma, no mesmo momento Aragorn se pós a sua frente segurando o seu arco.

Os homens inconscientemente se afastaram quando me viram. Tirando suas lanças de mim.

—Aura está certa, vamos ter calma. -ele se virou para o cavaleiro que me olhava embasbacado, e Legolas baixou seu arco. -Peço suas desculpas, Éomer!  Quando souber mais, você poderá entender por que enfureceu meus companheiros. Não temos más intenções para com Rohan, nem para com seu povo, seus homens e seus cavalos. Não poderia ouvir nossa história antes de atacar?

—Está bem! -disse Éomer abaixando sua espada, e me olhando firmemente, me medindo dos pés a cabeça. -Mas os que vagueiam pela Terra dos Cavaleiros seriam mais sábios se fossem menos arrogantes nestes dias duvidosos. Primeiro digam-me seus nomes corretos. -ele mal desviava os olhos de mim.

 -Sou Aragorn filho de Arathorn. Este como ele mesmo já lhe disse é Gimli filho de Glóin, Legolas do Reino da Floresta e Aura...

—Minha noiva. -Legolas me puxou para si, e todos o olhamos perdidos.

 


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