— Quer dizer então que chega na sexta? — indaguei trocando o refil da máquina de café na cozinha do meu apartamento. Dessa vez preferi utilizar a cápsula mais forte, pois haviam tantas coisas a serem feitas e depois de dormir menos de 5 horas essa noite eu sabia que precisaria de algo eficaz para me manter acordada.  

— Sabe como é, Bella. Não podia deixar você com tanta saudade de mim assim, crueldade  — Jacob exclamou do outro lado da linha. 

— Claro, claro. Imagino que tudo isso é porque você não para de pensar em mim — falei sorrindo e voltei a sentar na mesa esperando o café ficar pronto e ao olhar em volta percebi o quanto a cozinha estava uma verdadeira bagunça, assim como todo apartamento, durante a semana fica difícil manter as coisas arrumadas, principalmente, com a rotina pesada da faculdade. 

— Você por acaso andou lendo meus pensamentos, Bell’s? — Jake brincou.  

—  Telepatia de melhor amigo — disse mordendo os lábios — Sempre funciona.

—  Não sabia que podíamos fazer isso. 

— Eu sinto muito, Jake. Esqueci de avisar isso pra você, então aproveitei o nosso poder sozinha durante todos esses anos.

—  Você andou tomando água de chuva, por acaso? Minha mãe sempre disse que isso lhe faria mal.

Sua risada ressoou do outro lado da linha.

— Pelo que eu saiba vem do céu água que eu e você tomamos.  

— De onde você tirou isso? A minha vem de uma garrafinha laranja. Compro todo dia no supermercado.

— Você é maluco, sabia?

— Talvez um pouquinho  — Jake disse sem se importar. 

Consegui ouvir sua respiração forte se acalmar, contudo, o som de algo metálico caindo no chão causou um barulho intenso. Jake pronunciou algo inteligível, ao passo que o barulho diminuiu aos poucos. 

— Está quebrando a casa, Jacob?

— Não. É só que as coisas aqui estão uma bagunça. Meu colega de quarto é um retardado — ele resmungou.

— Pelo que eu lembro você nunca foi  muito... Organizado. — disse debochando.

— Que isso, Bell's. Dá um desconto, eu bagunço por um tempo, mas depois arrumo de novo. Já esse cara, nunca faz isso" 

— Aram. Entendo seu ponto de vista. 

Eu não podia vê-lo, mas consegui visualizá-lo revirando os olhos. 

—  Bella? — Jake chamou. 

— Oi? 

— Eu amo você — Jacob falou devagar. 

Fechei os olhos aproveitando a deliciosa sensação de ouvir meu melhor amigo dizendo aquilo, por mais que ele não soubesse que meus sentimentos por ele tivessem mudado e haviam se tornado algo mais intenso. 

Respirei fundo.

— Eu também te amo, Jacob. Amo muiito — minha voz soou quase como um sussurro.

—  Está bem, Bell’s. Eu preciso desligar agora porque alguém acabou de chegar, mas nos vemos amanhã pela manhã, tudo bem?" 

— Ok. Vou aguardar ansiosamente. 

Quando Jake desligou fiquei fantasiando em milhares de pensamentos relembrando o som de sua voz.

— Com quem você estava falando? — Alice surgiu na cozinha durante o tempo em que eu ainda estava distraída e senti meu corpo tremer com a surpresa. 

— Que susto, Alice! — disse levando a mão ao peito.

Meu celular acabou voando até o chão da cozinha. Bateu na perna da cadeira, indo parar em cima do tapete felpudo, por sorte. Agachei rapidamente para pegá-lo. 

— Está escondendo algum segredo de mim, Isabella? — Alice perguntou extremamente curiosa na mesma proporção que avaliava meu rosto com seus olhos castanhos enormes. Ela entrou na cozinha, ainda de pijama e seguiu em direção a um dos armários para pegar uma caneca. 

— Claro que não sua louca. Era só o Jacob. Ele vai chegar amanhã, lembra?  

— Hmn, então quer dizer que finalmente vou conhecer seu "amigo namorado"? — Alice brincou com suas sobrancelhas as erguendo diversas vezes. Nesse meio tempo ela pegou a chaleira, na louça lavada da pia e encheu de água para preparar seu chá. 

— Ele não é meu namorado, Alice… Ainda.

Não consegui conter o sorriso que surgiu automaticamente nos meus lábios ao dizer essa frase.

— Isso porque você nunca admitiu que gostava dele — Alice declarou vindo se sentar na mesma também. 

— Não é totalmente verdade — gaguejei —  Talvez um pouco... Eu só não encontrei o momento certo para falar. Durante o colégio as coisas eram difíceis e eu só fui me dar conta que gostava dele depois que Jake já tinha ido embora e... 

— Tarde demais, não é? — Alice meio que completou a frase.

— Sim — concordei frustrada — Nós ficamos tanto tempo separados e o fato dele sempre querer contato só aumentou isso e... Jacob é especial, Alice. É muito mais que eu simples amigo pra mim. Sempre foi mais que isso. 

Eu nunca havia escondido a história de Alice, relatando a terrível fase no colégio e o quanto ter Jake como meu melhor amigo me deu forças. Nossos pais eram amigos, tornando nossa amizade ainda mais forte, viajávamos com frequência e eu cheguei a passar um verão inteiro na casa dele e por um longo tempo eu o considerava apenas como um irmão mais velho, um amigo carinhoso, porém as coisas mudaram e eu notei o quanto era apaixonada por ele. A saudade que eu sentia não era como amiga. 

— Isso eu sei, Bella. Ele é um gato também. Quem não se apaixonaria? Você só não pode enrolar ainda mais com essa história. Principalmente com ele dando sopa por Los Angeles. Jacob pode muito bem estar namorando alguém. Você já pensou nisso? — Alice questionou.

— Como é? — ergui as sobrancelhas em indignação —  Claro que não, Alice! Jake não namora há anos. Ele me contaria algo assim. Tenho certeza. 

— Se você acredita nisso, tudo bem. Só não fique enrolando pelo amor de Deus. E, caso isso aconteça, eu arrumo um lugar pra ficar enquanto vocês exploram o amor de vocês por esse apartamento. Só fiquem longe da minha cama, por favor — Alice brincou e levantou, pois a chaleira começou apitar. Envolvida na conversa, acabei esquecendo do café e segui até a máquina, retirando o xicara cheia e fervente de café preto.

— Pode deixar, chefia! Prometo me comportar, amiga — informei olhando fixamente para ela — Agora… Será que você podia me ajudar com essa bagunça? Preciso levar essa TV enorme pro meu quarto antes que Jacob chegue. 

Olhei brevemente para a caixa de papelão gigantesca encostada do lado oposto da cozinha. Ela estava parada ali porque eu fiquei com preguiça de levar para o meu quarto antes e o entregador poderia facilmente ter colocado lá dentro para facilitar minha vida, mas como foi Alice que recebeu a encomenda, ela não soube do que se tratava, deixando que ele colocasse em qualquer canto da casa. 

— Não vai dar não, amiga. Preciso ir correndo para universidade — disse bebericando seu chá.  

— Ainda está muito, Alice! — falei chocada.

— Eu sei, mas a NYADA é minha vida. Eu me inscrevi em diversas atividades, preciso chegar cedo. Já estou atrasada na verdade. Só queria tomar o meu chá mesmo! — Alice falou apressadamente.

Suspirei. 

—Tudo bem.

Alice pegou uma maçã em cima da bancada, então correu em direção ao banheiro. Era engraçado a forma como ela se comportava. Tão dramática. Como eu tinha o dia livre, devido um dos meus professores ter sofrido um acidente, esperei minha amiga sair e sozinha voltei minha concentração no máximo para aquilo que eu estava fazendo. Há tempos não organizava o apartamento de forma tão intensiva, trocando os móveis de lugar, limpando e me livrando de coisas inúteis. Dessa vez, resolvi trocar o papel de parede do quarto, colocando um novinho em formato de tijolos. O rapaz da loja falou que seria de fácil aplicação, facilitando assim meu dia de limpeza. Alice e eu dividimos o apartamento há um ano e meio mais ou menos. Mas, como ambas estávamos totalmente concentradas em nossos cursos, nunca tivemos tempo suficiente para uma organização maior e mais precisa. Como aquela que havíamos feito assim viemos morar juntas. E, como Jacob estava prestes a me visitar pela primeira vez em dois anos, encontrei um tempo para pensar no que fazer e organizar da maneira que eu queria.

Assim que alugamos o apartamento nossa primeira impressão foi que esse lugar podia ser facilmente comparado a um galpão velho e cheio de poeira. Não tinha nada além de um espaço vago, uma pia suja e um banheiro acoplado ao que deveria ser uma cozinha. No entanto, utilizando do bom senso arquitetônico de Alice e minha obsessão por limpeza, esse lugar se tornou um verdadeiro lar e montamos até mesmo as divisões dos quartos com drywall.

Ambas tínhamos vindo de cidades pequenas, sonhos grandes e uma tremenda expectativa para iniciar na Academia de Artes Dramáticas de Nova York e com tantas coisas em comum, ficamos melhores amigas logo de cara, juntando nossa falta de dinheiro com a vontade de morar sozinhas, alugamos o lugar sem hesitar. E em pouco tempo esse apartamento virou nosso refúgio, principalmente, porque antes de virmos para este lugar nós duas estávamos em um alojamento próximo da universidade e o lugar era desagradavel, além de não possuir nenhum tipo de privacidade.

No final do dia contemplei a belíssima organização que eu havia feito. A maior mudança tinha sido no meu quarto, onde encostei a cama de casal contra parede, organizei de uma outra forma a arara de roupas do lado da cama e por fim conectei todos os cabos da TV de tela plana comprada há dois dias, lembrando que Jake era viciado em televisão. Nunca vi muito a necessidade de ter uma, pois a maior parte do tempo que eu passava em casa era dormindo. Já do outro lado da casa eu apenas organizei brevemente a sala de estar, sem mexer na localização dos móveis, mas acabei trocando a mesa de jantar de lugar, pois eu frequentemente esbarrava nela. Alice já havia reclamado também, alegando não haver espaço suficiente para ensaiar seus passos de dança.

Quando a noite chegou eu me sentia extremamente cansada, no entanto, ao pôr a cabeça no travesseiro o sono literalmente foi embora. Talvez fosse a expectativa e alegria de saber que Jacob chegaria pela manhã e eu finalmente lhe contaria a verdade. As palavras pareciam gravadas, porém, eu sabia que com o nervosismo, medo e associando tudo isso ao seu olhar intenso, tão perto de mim, seria um pouco difícil não engasgar ou tropeçar às frases. Ainda assim, estava disposta a contar toda verdade para Jacob. 

***

—Você consegue, Bella. É fácil. Vocês sempre foram amigos — falei olhando diretamente no espelho, para tomar coragem. Agora eu já estava totalmente pronta para sair de casa, completamente preocupada.

Tentando causar uma boa impressão, escolhi uma roupa bem diferente daquilo que Jacob estava acostumado a me ver. Por indicação de Alice, optei por usar um vestido mais justo, verde escuro. As mangas e o colo tinham detalhes em preto. Cortes retos e precisos. Independentemente da ousadia, eu me senti confortável dentro dele.

O cabelo, após lavá-los, preferi deixar secar naturalmente. Visto que apesar de serem extremamente lisos, meus cabelos eram pesados por causa dos fios longos e grossos, formando assim, suaves ondas sem que eu precisasse mexer neles.

A manhã havia sido tranquila. Eu estava sozinha em casa desde às 8:00 da manhã, pois Alice tinha saído de casa bem cedo. Em razão do feriado prolongado, seus amigos planejaram alguns eventos beneficentes de última hora. E junto com seu grupo de dança, ela se apresentaria. 

Mesmo que isso não tivesse em seus planos, Alice aceitou de bom grado, não perdendo nunca uma chance de se apresentar, e querendo felizmente me deixar sozinha em casa. 

Um pouco antes do meio-dia comecei a seguir em direção aeroporto, conhecendo muito bem o trânsito de Nova York. Adiantei os passos chegando ao saguão do aeroporto por volta da uma e meia mais ou menos. Eu estava tão nervosa que as coisas à minha volta pareciam borrões de diversas cores e sem nenhum significado. Meus olhos se concentravam apenas no painel de indicação dos voos. 

Respirei fundo, vendo que o avião de Jacob já havia pousado. 

Se não fosse pela imensa multidão meus pés iriam andar de um lado para o outro. No entanto, as milhares de pessoas impossibilitaram-me de movimentar meu corpo, por alguns centímetros sequer, me forçando a ficar em um lugar só. 

Meus olhos estavam fixos na saída dos passageiros. Enquanto a ansiedade e o nervosismo só aumentava cada vez mais, conforme o tempo. Passaram-se alguns minutos até que Jacob finalmente apareceu.

O reconhecimento foi imediato. Contudo, sua aparência estava completamente diferente daquilo que eu me lembrava. As fotos não fizeram jus a sua mudança. Jacob estava bem mais alto, mais forte e esguio.

Tão imponente e bonito, chamando atenção das pessoas à sua volta. Percebi que algumas mulheres tiveram dificuldade de olhar apenas uma vez, quando ao me reconhecer no meio da multidão, um sorriso lindo tingiu seus lábios. Sua pele em um tom perfeito de cobre entrava em contraste com a cor extremamente escura do seu cabelo curto.

Seus passos foram rápidos, apesar da multidão. E seu sorriso branco, tão perto, me fez perder o ar.

—Bella, sua louca. Que cara de assustada é essa, hein? 

—Err… — eu não conseguia falar, sentindo minha boca completamente seca.

Jacob estava mesmo perto de mim. Tão lindo. Tão maravilhoso. 

Vendo que não teria uma resposta tão imediata assim, ele sorriu ainda mais, fazendo-me perder o fôlego outra vez. E, de repente, seus braços deram a volta no meu corpo. Sufocando-me em um abraço, apertado. 

Não lembrava o quanto era boa a sensação de seu corpo quente, assim tão próximo ao meu. Consegui sentir cada parte do seu corpo, pois não parecia haver espaço entre nós dois, tamanha proximidade. Mesmo assim, agarrei-me ainda mais à ele. Aproveitando com os olhos fechados, a deliciosa sensação de tê-lo. Respirando profundamente diversas vezes para memorizar o cheiro amadeirado do seu perfume.

Agarrei o tecido de sua jaqueta, sem querer largá-lo, e Jacob pareceu não se importar em permanecer nesse abraço. Ele acariciou meus cabelos, enquanto eu ainda me mantinha concentrada em seu perfume, aconchegada em seu peito.

Desejei poder beijá-lo naquele momento. E talvez eu fizesse isso. No entanto, alguém distraído esbarrou em nós, desfazendo o clima agradável. 

Jacob afastou seu corpo, segurando apenas as minhas mãos, olhando ternamente em meus olhos.

—Eu senti tanta saudade, Bella.

Seu sorriso era largo, demonstrando claramente a sua felicidade. 

—Também senti e eu… Eu estou sem palavras. Você está tão diferente, Jacob. Bem mais alto e mais forte.

Ele gargalhou, ao mesmo tempo que eu tocava seus braços, verificando o crescimento tão inesperado deles.

—A última vez que nos vimos foi no ensino médio, lembra? Seria meu óbvio alguma mudança. Aliás, você está muito linda. 

Não foi possível ocultar a pitada de vergonha ao ouvir ele dizer aquilo. Então eu o abracei novamente, tentando esconder meu rosto em seu peito.

—Estou muito feliz em finalmente te ter aqui, Jake. É como estar em casa outra vez.