Minha recuperação da cirurgia foi um verdadeiro sucesso, e naquele resto de férias eu me concentrei em arrumar o restante das minhas coisas para Hogwarts. Josh não sabia que eu era bruxa, mas disse a ele que estudava em um colégio interno e que eu não teria como usar uma academia, então ele me passou uma série de exercícios que eu poderia fazer sem nenhum tipo de equipamento. Minhas notas no sexto ano foram muito melhores do que eu pensava, e a ideia de continuar estudando em casa me parecia extremamente atrativa, mas a vontade que eu tinha de que todos vissem o quanto mudei esse ano era muito maior.

James, Fred II e tio George me ensinaram a fazer alguns feitiços sem utilizar a varinha, e um deles era um que deixava o cabelo da pessoa laranja com algumas mechas rosa berrante, que na minha opinião, seria perfeito para utilizar no Malfoy. Eu também resolvi criar vergonha na minha cara e, finalmente, fazer a hidratação que eu tanto queria em meu cabelo para que ele ficasse do jeito que eu queria, e claro, continuei frequentando a academia normalmente.

Naquela manhã, além de Dylan e Valentina, Victorie também estava me acompanhando nos exercícios. Além de ser modelo, ela se casaria com Teddy no ano seguinte e queria estar impecável em seu casamento. A companhia dela nessas horas seria perfeita, se ignorarmos o fato de que ela , aparentemente, estava querendo que eu fizesse abdominais até morrer. Josh apenas observava de longe, e parecia se divertir com a situação.

— Vai Rose, só faltam sete pra você acabar ! – Vic me disse, enquanto segurava minhas pernas para o alto. Eu estava deitada em um dos colchonetes, completamente suada, descabelada e ofegante. – Para de ser mole, nem adianta fazer essa cara – Continuou, ao ver a minha cara de “ pelo amor de deus, pare”. Vendo que não tinha jeito e que ela estava determinada a me torturar, eu respirei fundo e me forcei a impulsionar meu tronco para cima mais algumas vezes - ...quatro, cinco, seis, sete ! – Vic contou e soltou minhas pernas, enquanto eu me esparramava no colchonete, completamente exausta.

— Mérlin Vic, como você é malvada..- Eu disse ainda ofegante, sem a menor vontade de me levantar de lá.

— Ela não é malvada, você que é muito mole – Dylan zombou, dando um leve chute em meus pés. Eu o olhei ameaçadoramente e mostrei minha língua, em um gesto extremamente infantil. Ele gargalhou, antes de voltar para os pesos que estava levantando. Fiquei ali deitada e enrolando por mais alguns segundos, até que finalmente me levantei e fui em direção a esteira. Eu e Dylan tínhamos um tipo de amizade colorida , e após uma noite de bebedeira, quase acabamos transando também. James não tinha ficado muito feliz com isso, mas como ele fez a mesma coisa com uma menina que tinha conhecido na mesma balada em que estávamos, não lhe dei o direito de reclamar.

— Prima, tenho uma proposta para te fazer – Vic disse, acomodando-se na esteira ao lado da minha. Olhei para ela curiosa, em um incentivo mudo para que continuasse – Eu mostrei algumas fotos suas para o meu agente e ele se encantou com você e com a sua história. Disse que iria adorar te fotografar e entrevistar, já que você passou por algo que muitos jovens ainda passam hoje em dia e não tem apoio nenhum..já pensou em quantas pessoas você pode ajudar com a sua experiência ? – Ela disse, e eu deveria estar encarando-a de um jeito muito engraçado, pois ela riu da minha expressão – Você não precisa me responder agora, mas..pense a respeito !

Eu desviei meu olhar para a esteira a minha frente, achando os botões dela extremamente interessantes naquele momento. As palavras de Victorie martelavam em minha cabeça, enquanto eu começava a correr. A exposição sempre foi algo que me incomodou bastante e eu poderia dizer que era um fator ainda mais prejudicial para mim, afinal, além de ter pais famosos no mundo bruxo, eu era a “ decepção” de todos, por não ser tão bonita e inteligente quanto todos achavam, e principalmente, por ser obesa.

Sim, a mídia e a exposição podiam ser extremamente cruéis e eu era testemunha viva disso...e eu nunca tinha parado para pensar que poderiam ter pessoas com o mesmo problema que o meu por ai, bruxas ou não. Sim, isso foi bem egoísta da minha parte, eu assumo. Nunca tinha parado para pensar também, que diante de todo esse cenário, ter decidido parar de me cortar e cuidar da minha saúde sabendo que não teria o apoio de ninguém, e sabendo que toda a minha família me considerava um erro, foi uma verdadeira exceção.

Afastei aqueles pensamentos de minha mente, decidida a pensar nisso apenas mais tarde. Meu foco e energia estavam destinados totalmente em estar me sentindo bem e bonita no dia primeiro de setembro, no embarque de volta a Hogwarts, para o meu sétimo e último ano. Corri por vinte minutos, e após um banho relaxante, eu voltei para casa, já que minha mãe queria me levar a Madame Malkin para comprar camisetas e saias novas, já que agora, as minhas antigas estavam enormes em mim.

Eu estava acostumada a comprar sempre os maiores manequins que a loja tinha disponível, então mal consegui conter minha emoção quando um dos menores ficou perfeito em mim. Aproveitei que estava lá e comprei mais pergaminho e tinta, além de todos os livros e itens necessários para o sétimo ano, pois não adiantaria nada eu voltar linda fisicamente e minhas notas caírem. Quando chegamos em casa, já comecei a arrumar minha mala para não correr o risco de esquecer nada, e assim os últimos dias de agosto foram se passando rapidamente, e quando me dei conta, já estava no carro com Hugo e meus pais, a caminho da estação de King’s Cross.

Era uma quinta feira extremamente ensolarada e atípica para o mês de setembro, então me vesti do jeito que sempre quis: coloquei um vestido branco com estampas floridas que James havia me dado a uns meses atrás, juntamente com uma sapatilha vermelha. Eu estava extremamente nervosa e ansiosa O vestido marcava bem a minha cintura, agora bem mais definida e evidente por conta dos exercícios físicos, e deixei meus cabelos ruivos soltos, formando cachinhos perfeitos nas pontas. Passei uma maquiagem bem leve, mas como eu não costumava fazer grandes produções para a volta as aulas, aquilo já era um grande avanço. Meu pai estacionou o carro e nós descemos, enquanto ele pegava minha mala e a de Hugo. Não demorou muito para que os Potter chegassem. Após os cumprimentos, atravessamos a estação e atravessamos a barreira entre as plataformas 9 e 10.

— Como eu quero ver a cara de todos aqueles babacas quando te verem – Alvo disse, depois de me dar um abraço esmagador, e eu gargalhei, tentando mascarar meu nervosismo.  James não tinha conseguido vir , pois tinha uma prova logo cedo, então nos despedimos no dia anterior. Nós estávamos cada vez mais próximos, e um pouco antes da minha cirurgia, eu tive minha primeira vez com ele. Apesar de toda nossa intimidade, eu ainda tinha a sensação de que ele queria me falar algo, mas não era do meu feitio forçar as pessoas, então simplesmente resolvi esperar que ele falasse quando quisesse.

  Enquanto eu, Alvo e Lily nos aproximávamos mais do Expresso de Hogwarts, notei que muitos me olhavam completamente chocados, sem acreditar que realmente poderia ser eu. Nesse momento meu nervosismo foi embora, sendo substituído por uma vontade imensa de gargalhar. Mérlin, quem me olhasse nesse momento me acharia uma verdadeira maluca ! Preciso aprender a me controlar, urgentemente.

Nos despedimos e entramos no trem. Alvo e Lily acabaram ficando para trás, muito provavelmente conversando com alguém, então eu comecei a procurar por uma cabine, e milagrosamente achei uma ainda vazia. Me sentei, abri minha bolsa e seguei um pergaminho, pena e tinta, enquanto pensava se deveria ou não aceitar a proposta que Victorie havia me feito a algumas semanas atrás.  Eu estava com uma tendência muito forte a aceitar a proposta, e essa certeza só aumentou depois que cheguei aqui na estação. Eu demorei muito para conseguir enfrentar meus medos e decidir me cuidar, mas não precisava ser necessariamente assim.  As coisas poderiam ter sido um pouco menos dolorosas, difíceis e solitárias se eu tivesse apoio de alguém que já passou por isso, alguém que tinha conhecimento de como eu me sentia, e das dificuldades que eram .

Eu gostaria de ter tido esse apoio, então eu decidi que queria ser esse apoio para alguém. Além de dar essa esperança, eu queria mostrar para o maior número de pessoas possíveis o quão dolorosos são certos comentários, e foi exatamente isso que comecei a escrever em minha carta.

— Com licença – Ouvi uma voz, e eu engoli em seco antes de levantar meu rosto.  Reconheceria aquela voz rouca em qualquer lugar – Posso me sentar aqui ? Meus amigos estão extremamente chatos..

— Tem certeza ? -  Eu respondi, voltando meu olhar para o pergaminho. Não queria demonstrar nada diante do Malfoy, pois sabia que ele usaria isso contra mim. Continuei escrevendo a carta, estanhando o silêncio que havia se instalado ali.

— Weasley ? – A voz dele saiu tão carregada de surpresa e choque, que eu precisei me controlar muito para não gargalhar e revirar os olhos.

— Surpreso ? – Perguntei sem olha-lo, enquanto lacrava minha carta e guardava-a em minha bolsa, na intenção de envia-la na manhã seguinte. Voltei meu olhar para Scorpius pela primeira vez. Ele estava exatamente igual a última vez que o vi, com exceção de que o olhar sempre esnobe que ele me lançava, agora era de pura surpresa. Cruzei minhas pernas, me divertindo imensamente com a situação.

— Retiraram todo o seu estômago ? Porque só assim pra você ficar menos horrorosa – Ele disse desdenhoso – Não se sinta a última bolacha do pacote Weasley, certas coisas só se melhoram nascendo de novo..

— Sabe, você disse uma coisa interessante Malfoy – Eu me levantei, e ele me fuzilou com o olhar, como se quisesse me agredir por tê-lo interrompido – Sabe, algumas mudanças de hábito resolveram boa parte do meu problema ,e eu estou extremamente satisfeita, não preciso nascer de novo..- Me aproximei mais dele e ele ficou me encarando – Aliás, não sou a única satisfeita, porque o seu primo comeu e não reclamou – Finalizei em um tom petulante , e voltei a me sentar.

Scorpius me encarava completamente perplexo, enquanto eu me perguntava mentalmente do porque tem falado da minha noite com Dylan, já que aquilo foi um acidente ( maravilhoso, por sinal).

— Perdei alguma coisa aqui Malfoy ? – Alvo chegou alguns segundos depois, olhando o loiro com a sobrancelha arqueada. Scorpius me lançou um olhar fuzilante e depois olhou para Alvo novamente, antes de se afastar. Alvo olhou em minha direção, como se pedisse explicações e eu comecei a gargalhar.