Waves escrita por march dammes


Capítulo 18
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Notas iniciais do capítulo

alô, leitores!
demorei um mês, que é de praxe, mas vou ver se uso meus últimos diazinhos de folga pra agendar alguns capítulos antes que a sétima temporada de voltron chegue na netflix~
esse capítulo aqui tem um pov do pidgee um pouco do keith sendo um SPICY angsty boi. e ah, alias: se vocês acham que descobriram a história por trás do medo de oceano do nosso protagonista, ainda não viram nada. :)
bora ler?



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Em uma hora, há 60 minutos.

Em um dia, há 24 horas, o que equivale a 1.440 minutos por dia.

Em um mês, há cerca de 30 dias, o que equivale a 720 horas por mês e 43.200 minutos por mês.

Se fossem levadas em conta todas as variáveis e todas as horas que passam voando quando se maratona uma série e te fazem esquecer-se dos efeitos relativos do Tempo durante seu dia, isso significaria que Pidge esperaria mais ou menos sessenta dias, ou mil quatrocentos e quarenta horas, ou oitenta e seis mil e quatrocentos minutos até que recebesse o resultado de sua prova de admissão na Garrison.

Normalmente, agiria de acordo com a forma que foi programado pela Força Maior que se chamava Vida e já teria ataques de pânico com boa antecedência. No entanto, não era sua situação naquele momento.

Na verdade, por mais improvável que parecesse, havia levado seus dias e minutos e segundos tão tranquilamente que mal apercebera-se do quão próximo estava da data até ela chegar.

E o que, afinal, o tranquilizara tanto ao ponto de mantê-lo longe de sua paranoia durante dois meses inteiros?

A resposta tinha quatro letras e quase cem quilos de puro carinho: Hunk.

O mais velho havia sido seu tutor designado no dia em que fizera a prova, mas mantiveram contato após o evento e terminaram por desenvolver uma relação tão próxima que Pidge podia até categorizá-lo como um bom amigo.

Hunk checava seu estado diariamente, perguntava como estava, como ia a vida, se já havia conseguido desenvolver por completo o Malware auto destrutivo que estava em processo desde o começo do ano.

Ao contrário da forma que agia e brincava com situações sérias, que o faziam parecer não querer nada com uma vida profissional, Hunk era muito inteligente. Não, ele era absurdamente inteligente. Pidge por vezes se via surpreso com sua rapidez em resolver algorítimos que para ele mesmo pareciam ser impossíveis de decifrar – e o trunfo da idade não poderia ser usado nessa situação, uma vez que Pidge não era apenas um auto-proclamado gênio mirim, como também havia sido provado pela psicologia que tinha um raciocínio anormalmente veloz para sua faixa etária.

Hunk e Pidge combinavam mais do que era aparente aos olhos. Sua conexão talvez não tenha sido imediata, mas com certeza foi profunda: mais do que parceiros de trabalho, tornaram-se logo colegas, amigos e confidentes.

Além de que Hunk mostrara-se um excelente companheiro de RPG.

O ruivo encontrava-se justamente trocando mensagens com o mais velho quando ouviu a campainha tocar, e chamou pela mãe, não vendo necessidade de se levantar do sofá ou sequer erguer os olhos do aparelho em suas mãos para ver o que havia.

—Mãe! -chamou, ao que a campainha voltou a tocar, insistente- Tem alguém na porta!

—Aya! -surgiu a mãe da porta da cozinha, a vassoura na mão direita e a outra na cintura, o sotaque italiano forte em sua interjeição- Por que não se levanta um pouco desse sofá e atende você mesma? Deve ser il postino, com a carta de admissão que você esperava tanto até um tempo atrás.

O coração de Pidge Holt de repente disparou.

Deixou o celular de lado e levantou-se em um pulo do sofá, ajeitando os óculos redondos no rosto e atrapalhando-se para calçar os chinelos, internamente arrependendo-se de não ter se vestido um pouco melhor naquela manhã.

Puxou o ferrolho e destrancou a porta, abrindo uma fresta antes mesmo de checar o rosto do visitante pelo olho-mágico.

O carteiro lhe recebeu com um sorriso morno, estendendo uma lista de entrega com espaços em branco e um envelope escrito em letras de máquina douradas.

—Bom dia. Entrega para a srta. Katie Holt?

—Sou eu.

Respondeu com amargura, um sutil atraso, as palavras se embolaram em sua garganta e se recusaram a sair por alguns breves segundos.

Desrespeitar a si mesmo sempre o atingia como uma micro auto-agressão diária.

Assinou seu nome morto na lista com uma caneta que lhe fora emprestada e trocou-as pelo envelope com as mãos trêmulas. Forçou um sorriso anfitrião, em resposta ao que era lançado a si, e esperou que o trabalhador lhe desse as costas e voltasse a montar sua bicicleta para fechar a porta da frente.

Como um gato, sua atenção imediatamente se converteu ao papel que trazia nas mãos. Ignorando por uns segundos as indagações da mãe sobre quem estivera à porta, cruzou a sala muito distraído e sentou-se novamente ao sofá, curvado sobre si mesmo e as duas mãos segurando o envelope em frente ao rosto.

Galaxy Garrison

Academia Militar & Escola Técnica de Ensino Superior

Deserto de Sonora, Arizona

EUA

Traçou as letras impressas com as pontas dos dedos diversas vezes, como se a lesse e relesse em um braile inexistente. Tão imerso estava naquele transe expectante que sequer percebeu quando a mãe se sentou ao seu lado, e veio a certificar-se de sua presença quando esta pousou a mão em seu ombro.

Colleen Holt era uma mãe tanto trabalhadora quanto o era carinhosa. Não só como dona de casa, mas de fato como uma técnica de informática e programação habilidosa, talento que lhe permitira conhecer e sequencialmente se apaixonar por seu atual marido e pai de Pidge. Tinha os cabelos curtos e o rosto pouco afetado por seus anos de permanência nesta Terra – contudo, seus olhos castanhos traziam uma sabedoria e uma calma milenares, e suas palavras sempre pareciam saber acalmar os filhos nos momentos em que precisavam dela.

E esse era um desses momentos.

—Abra -incentivou, a voz baixa e tenra- Vamos ver o que eles têm pra você.

Mesmo tendo estado calmo quanto à sua performance durante o exame que prestara, sua tranquilidade vinha principalmente do fato de que não pensara nele. Agora que tinha seu futuro inteiro e todas as expectativas para sua vida profissional literalmente nas palmas das mãos, não sabia o que esperar – e o fato de não ter controle sobre o que estaria impresso nas páginas dentro daquele envelope era justamente o que lhe embrulhava o estômago com ansiedade.

Mesmo assim, apoiou-se nas palavras da mãe e rasgou um dos lados da carta, tirando de dentro duas folhas grampeadas, que desdobrou com cuidado.

Sentia o som de seu coração ecoar nos ouvidos enquanto os olhos corriam ligeiros pelas linhas da correspondência, murmurando baixinho alguns trechos, mesmo que a mãe pudesse ler ao mesmo tempo da posição em que estava.

Caro Aspirante a Aluno...hum hum...Em vista suas habilidades evidenciadas pelos seus resultados na prova aplicada...é...mútipla escolha e discursiva...humm...É de nosso próprio júbilo, a coordenação da academia, que...

Não continuou a ler por uma ausência de sua própria cara, que naquele momento se encontrava no chão.

A mãe logo alcançou sua leitura e arrancou a carta das mãos do filho, deixando escapar uma exclamação animada que traduzia todo o choque de Pidge, ainda na mesma posição, a boca levemente aberta, tamanha era sua surpresa.

Passerotto mio! -o chamou por seu apelido de infância pela primeira vez em anos, visivelmente eufórica- Você passou! Passou, sim!

Pidge só reagiu quando a matriarca lhe agarrou por um dos ombros e o chacoalhou – o pequeno pôs a mão sobre a sua e se virou, parecendo recém-desperto do choque.

—Não passei, não -corrigiu- Eu só passei da primeira fase. Ainda tenho mais duas provas eliminatórias para ser aceit...

—Ah, pare! -a mãe interrompeu, o soltando e gesticulando largamente, abanando a mão em frente ao rosto como quem afasta um cheiro desagradável- Não diminua seus sucessos -apontou para ele um dedo em riste- Você está mais perto do que nunca de ser admitido na melhor academia do país para geniozinhos como você, e é isso que importa. -sorriu.

Foi difícil para Pidge reprimir o sorriso que queria dar em resposta. Passado o primeiro susto e a primeira dúvida, agora sentia-se reenergizado e pronto para outra – sim, estava mais próximo do que nunca. Quem lhe impediria de ingressar na Garrison agora? Ninguém além dele mesmo e talvez suas dúvidas em física quântica básica.

Seu riso foi crescendo e crescendo, até que enfim a mãe o puxou para um abraço quente de congratulação. Pidge deixou-se ser engolido pelo peito confortável da progenitora, mal se fazendo ciente das lágrimas que começavam a se acumular no canto dos olhos.

—Vamos jantar fora hoje à noite -a mãe acariciava seus cabelos, contente- Vamos chamar seu pai. Vai ser uma grande comemoração.

Pidge enlaçou os braços em volta da cintura de Colleen, afundando o rosto no tecido de seu vestido de verão.

O pai estava sempre fora, trabalhando em dois, por vezes três turnos como instrutor na Garrison e veterano de missões extra-atmosféricas patrocinadas pela academia. E naquela noite, Pidge iria vê-lo, com um sorriso no rosto e orgulho no olhar.

Estava tão feliz que poderia chorar. Não sentia aquele tipo de orgulho há muito tempo.

E, naquele momento, podia até mesmo embriagar-se nele.

X

Keith passara os últimos dias sem muitas notícias de Pidge.

Na verdade, estava tão distraído com seu trabalho e as mensagens de Lance tomando seu tempo livre que não se permitira sentir tanta falta das conversas do mais novo ao ponto de ficar carente – mas, de qualquer forma, fora uma feliz surpresa quando o celular vibrou com uma mensagem do mesmo.

Nerd Authority [10:21]: KITE

Nerd Authority [10:21]: KIFO

S4D_B0Y_2001 [10:26]: Eu sinto que algum dia você vai ter distorcido tanto a escrita do meu nome que eu vou acabar sendo chamado de Karen.

Nerd Authority [10:26]: cala a boca karen

S4D_B0Y_2001 [10:26]: Ok.

Nerd Authority [10:27]: adivinha

Nerd Authority [10:27]: quem

Nerd Authority [10:27]: está a duas provinhas de ser admitido na garrison

Pidge só dividia suas mensagens por tempo de pausa quando estava muito animado. E naquele dia em especial ele parecia estar muito animado.

S4D_B0Y_2001 [10:28]: Não sei. A Lana Del Rey?

Nerd Authority [10:28]: ha ha

Nerd Authority [10:28]: muito engraçado

S4D_B0Y_2001 [10:28]: Eu tento.

Nerd Authority [10:28]: desde quando você sabe alguma coisa de cultura pop?

S4D_B0Y_2001 [10:28]: A Lana não é pop, ela é indie grunge.

Nerd Authority [10:29]: tanto faz

Relevando o desrespeito com a srta. Del Rey, tudo bem. Keith revirou os olhos e esperou que o mais novo terminasse de digitar.

Nerd Authority [10:29]: sou eu!!!!!!

S4D_B0Y_2001 [10:29]: Parabéns. Sabia que conseguiria.

Nerd Authority [10:30]: que comemoração mais seca. fique feliz comigo!!!!!!

S4D_B0Y_2001 [10:31]: aaaaa!!!!!!

Nerd Authority [10:31]: aaaaaaaaa!!!!!!!!!

Keith riu internamente, externamente apenas deixando escapar um sorriso de canto. Apoiou-se na bancada, jogando o trapo de pano sujo sobre o ombro.

Conversou com Pidge durante alguns minutos de pausa em seu trabalho, os quais o menor ocupou com uma descrição detalhada e dramática sobre a forma que recebera as notícias da manhã.

Não podia esconder: estava orgulhoso dele. De verdade. Presenciara seu nervosismo de perto, mesmo que não se conhecessem pessoalmente, e sentia que o entendia quando ele desabafava sobre sua ansiedade.

Via Pidge começar a voar com suas próprias asas diante de seus olhos, se sentindo, de certa forma, como um pai coruja assistindo seu filhote deixar o ninho.

Ah. Agora entendia como Shiro se sentia.

A conversa dos dois só foi interrompida pelo estrondo da porta dos fundos se fechando, e foi quando Keith percebeu que deveria voltar ao trabalho caso não estivesse disposto a ser repreendido. Se despediu de Pidge digitando rapidamente, meteu o celular no bolso e voltou a se ajoelhar diante da carcaça de um automóvel que já não andava e tinha como destino o ferro-velho. Terminou de desemperrar as peças que deveriam ser retiradas e poderiam ser reaproveitadas, meneando com a cabeça em direção a seu chefe quando este passou por perto, o parabenizando pelo bom trabalho.

E o coreano suspirou, sentindo o celular vibrar insistentemente no bolso de trás da calça.

X

Chegou em casa um pouco mais tarde do que o normal devido ao trânsito. Jogando os sapatos na entrada e as chaves sobre a bancada da cozinha, sentou-se no sofá e desbloqueou a tela do celular, os olhos escuros perdidos sobre a paisagem na janela (que era mais uma porta de vidro do que qualquer outra coisa) – prédios, luzes acesas, algumas poucas casas aqui e ali, lojas e cafés ainda de portas abertas que traziam conforto aos transeuntes naquele fim de tarde inesperadamente frio.

Voltou os olhos para sua caixa de mensagens e sorriu ao ver o nome de Lance.

Mais cedo, o latino o havia convidado para novamente outro encontro. Estes já haviam deixado de se tornar um fator surpresa para Keith, embora ainda acelerassem seus batimentos cardíacos – na verdade, ultimamente estavam mais comuns do que nunca. Mesmo que fosse mais habitual que falassem sobre encontros do que realmente marcassem data e hora para que estes acontecessem, Keith não sentia mais aquela vontade irresistível de cavar um buraco na terra para que pudesse enfiar a cabeça toda vez que Lance dizia estar sentindo falta de sua voz.

E, desta vez, Kogane podia até mesmo admitir que estava se sentindo seguro sobre seu próximo fim de semana com o latino.

Captain Frijoles [18:34]: Dessa vez a gente pode inventar algo que vc goste, pra mudar um pouco as coisas

Captain Frijoles [18:34]: Tipo, sla, karaoke

Captain Frijoles [18:34]: E ai, o q me diz?

S4D_B0Y_2001 [18:34]: É um encontro.

Captain Frijoles [18:35]: :)

Cruzou as pernas, digitando, subliminarmente sentindo falta do miado manhoso de Andrômeda e os arranhões na barra de seus jeans – seu próprio jeitinho de verbalizar que havia sentido sua falta.

Distraiu-se da saudade de sua companheira (Amiga? Rival?) felina ao relatar para Lance a surpresa que tivera mais cedo ao saber sobre a admissão de Pidge. Lance, assim como ele, já “adotara” o mais novo e ficava tão feliz com suas realizações quanto um irmão mais velho ficaria. E nunca havia sequer conversado com o pequeno.

Keith às vezes se surpreendia com o nível de empatia que o outro possuía.

S4D_B0Y_2001 [18:41]: E ele estava, tipo. TÃO animado.

S4D_B0Y_2001 [18:41]: Eu quase gaitei por ele.

Captain Frijoles [18:42]: gAITEI KKJSKSKJSKKK

S4D_B0Y_2001 [18:42]: *Gritei.

S4D_B0Y_2001 [18:42]: Merda.

Keith sorriu discreta e convencidamente para si mesmo. O erro de ortografia não havia sido acidental, e sim de propósito – era uma das estratégias mais efetivas que Keith colecionara ao longo das semanas de contato com Lance para fazê-lo rir. Sabia que quando o mais novo se deparava com algo daquele tipo, repetia a palavra em voz alta mesmo que estivesse em público, e sua própria estupidez lhe arrancava riso. Keith sentia-se orgulhoso de ser tão observador e ter tirado uma conclusão inteligente como a de errar a escrita de suas palavras de propósito para que Lance o achasse mais engraçado.

Recostou a cabeça no acolchoado do sofá de couro e suspirou, ignorando o celular momentaneamente e mais uma vez se deixando distrair-se com o céu que abandonava o azul-claro e abraçava seu anil, as estrelas embaçadas pela presença de nuvens pesadas que muito provavelmente previam chuva.

Keith viu-se entrar em um café ou lanchonete com Lance, rindo-se e dividindo uma bebida gelada, viu-se cortando o trânsito abaixo com sua motocicleta, levando o latino na garupa. Viu-se em sua própria varanda, debruçado sobre o parapeito, um dos braços de Lance enlaçando sua cintura e o puxando para perto.

Mordeu o lábio inferior, escapando dos próprios devaneios.

Com Lance sentia-se livre, livre. Não que já não se sentisse liberto antes, mas por muito tempo sentiu-se um tipo de livre que mais tendia ao solitário – com Lance, pelo contrário, se via livre e acompanhado, confortável com um companheiro com quem poderia contar por muito tempo.

Será que estavam mesmo destinados a estar juntos?

Por muito tempo Keith tentou negar a existência de algo que se assemelhasse a destino. Por essas e outras se sentia tolo ao apoiar-se na ideia de que o destino ditaria se ele e Lance deveriam dar certo ou não.

—Que se dane isso -murmurou, para ninguém em especial, mas esperou que o Universo o estivesse ouvindo- Eu traço meu próprio destino.

Decidiu que viveria sob essa moral.

Da mesma forma que acabara de decidir que ele e Lance deveriam, sim, ficar juntos.

Só porque ele queria.


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Notas finais do capítulo

até logo~



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