As Ironias de um Clichê escrita por LizAAguiar


Capítulo 1
Capítulo 01


Notas iniciais do capítulo

Tenham uma boa leitura ^^



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/707787/chapter/1

"Você é a pessoa mais azarada que existe."

— Tabatha... — Sussurrou dando um passo para trás, nervosa pela situação em que acabara por se envolver. — Você está brincando. — A menor também estava nervosa, parecia lutar para não sair correndo daquela sala, mas não pode deixar de levar outra possibilidade em consideração, mesmo sabendo que a chance era mínima, foi o simples e puro desespero que a fez se agarrar a ela. — Não é?

A castanha engoliu em seco e fitou as mãos entrelaçadas a sua frente, viu-a negar com um aceno de cabeça, o pequeno gesto fez suas pernas vacilarem sobre o próprio peso, deu mais um passo para trás, chocando as costas na parede de madeira para não cair no chão.

— Não, eu nunca brincaria com uma coisa dessas, Bia. — Ela também sussurrou, era possível ver a vermelhidão em seu rosto mesmo com as tentativas para esconde-lo. — Eu gosto de você.

Respirou fundo, — mais de uma vez, — sem realmente ter uma resposta descente que não fosse um resmungo sem sentido e demorado.

"Isso é brincadeira sim! Não tem como ficar pior."

— Tabatha! — As duas deram um pulo quando a voz as pegou no recinto, alguns míseros segundos depois a porta do dojo se abriu. — O que está fazendo aqui? — Apenas então ele pareceu nota-la. — Bianca, achei que já tinha ido embora.

— Eu fui, mas esqueci a minha mochila, sensei. — Apressou-se a dizer, fazendo com que o pai de Tabatha risse.

— Esqueceria a própria cabeça se não estivesse grudada, não sei como aprendeu os katas com tanta facilidade. — Ainda divertido com suas desgraças, o senhor Kazehaya não percebeu o clima estranho do local.

"E nisso é que eu tenho sorte. Mas que porcaria!"

— Já está meio tarde, quer ficar para jantar? Depois eu levo você para casa. — A indagação foi tão normal e corriqueira que a princípio seu cérebro arquitetou uma resposta positiva, não seria a primeira vez que a proposta era feita e a comida do professor de karatê era ótima, mas conseguiu frear a língua a tempo.

— Não precisa, eu realmente tenho que ir para casa. — Se ele notou o alarme em sua voz não fez questão de comentar, com sua visão periférica espiou a outra garota no dojo, ela apenas encarava o chão, alheia a conversa dos dois, ou tentado se manter assim ao menos, pôs a mochila nas costas e caminhou rapidamente para a porta. — Tchau.

— Tchau, até semana que vem, apressadinha. — Normalmente teria ralhado com mestre, mas no momento não teve cabeça para tal, preocupada demais em tentar se lembrar quando havia jogado pedra na cruz para que tamanha maldição caísse sobre sua pessoa.

" Obrigada Tabatha, agora eu quero que você me dê um jeito de resolver isso tudo sem magoar o meu melhor amigo!"

***

— Você está ficando roxo. — Tentou não deixar sua irritação transparecer, mas pelo modo como Matheus intensificou a risada deixou muito claro que não havia conseguido tal façanha. — Pare com isso! É sério.

Bia virou o corpo para olhar para a porta da sala de aula tento total certeza que apenas os dois estavam lá, o professor fizera o imenso prazer de terminar a aula de português mais cedo fazendo com que todos os outros estudando fossem para o pátio, o amigo também teria ido, se não tivesse o puxado, precisava de conselhos.

— O que você quer que eu faça? Isso é hilário. — Ele passou a mão pelo cabelo azulado para tira-lo do rosto enquanto fitava o teto com uma expressão pensativa. — Coitadinho do Alex, vai ter o olho furado pela melhor amiga.

— Mas que saco, eu não deveria ter contado nada! — Bufou com indignação, tentado esconder o pesar que as palavras do amigo lhe causavam.

— Também não é assim. — Ele cruzou as pernas e batucou com as canetas no caderno, gesto que sempre fazia quando queria pensar.

"Odeio sentar na sua frente em provas, como se eu não odiasse português o bastante."

— Você só precisa ficar na sua, não fale ou dê bandeira, as coisas vão se resolver. — Sua boca abriu, tamanha a surpresa com o conselho absurdamente simples.

— Você está brincando, não é? — Quando ele balançou a cabeça de forma negativa e, como se não fosse o bastante, sorrisse divertido com o seu arfar de pura ofensa, cruzou os braços, já completamente irritada. — Como eu vou fazer isso? Meu melhor amigo está apaixonado pela filha do nosso sensei e ela disse com todas as letras que gosta de mim. — Mesmo com tom exasperado persistindo, sua voz foi tomando tons mais baixos, olhou outra vez para a porta, mais ninguém poderia saber daquela história.

— Calma, não é o fim do mundo. — Abriu a boca para reclamar, mas o azulado fez questão de cobri-la com a mão. — Deixa eu terminar, dona Bianca. — Afastou o rosto para trás livrando-se da censura, mas nada disse, ele sorriu agradecido. — Eu não conheço essa Tabatha que o nosso querido Alex fala tanto, mas pelo que parece ela é tímida demais para investir dando a cara a tapa.

"Isso é verdade."

A garota estudava em uma daquelas escolas só para meninas, — Bia só soubera que haviam escolas assim na cidade quando começara a ter aulas de karatê a dois anos atrás, — não sabia ao certo se era isso ou da própria personalidade dela, mas a descendente nipônica era muito reservada, demorara para realmente tem uma conversa com ela, todas as primeiras vezes que havia puxado assunto tinha respostas monossilábicas, a ponto de achar que deveria parar de tentar, não que tivesse alguma intensão de ter alguma intimidade, mas não fazia seu tipo simplesmente deixar de interagir por timidez dos outros, a mãe costumava dizer que Bianca Marinho não conhecia a timidez.

"Você deveria ter me visto sexta, dona Renata. Nunca me senti tão deslocada e com vontade de sumir, nem quando os meus primos gênios ou o idiota do tio Jorge vem para o natal."

— É só você não dizer nada, ignore. Ela vai entender o recado. — Fazia sentido, mas tinha um detalhe que não deixou de passar desapercebido.

— E deixar ela sem resposta? Isso é tão babaca. — Ele suspirou enquanto ela crispava os lábios.

— Esse seu senso de cavaleiro da Távola Redonda um dia vai matá-la. — Resmungou para a parede antes de encara-la. — E o que você quer fazer? "Olha Tabatha, eu sou hétero e, não diga isso para ninguém, porque o meu melhor amigo está apaixonado por você e se ele descobrir eu estou ferrada." Acha isso melhor?

— Não... — O tom infantil que ela odiava tanto tomou posse de sua resposta, a morena olhou para o tigre branco na capa do caderno do amigo, mesmo com o suspiro dele seus olhos continuaram presos na foto.

— Eu sei que não parece certo, mas assim vai fazer menos sujeira, ela vai se magoar de qualquer forma, você falando ou não. — Sentiu os dedos dele empurrarem uma mecha de seu cabelo para trás da orelha, o gesto fez com que o encarasse, o sorriso ameno e compreensivo no rosto de Matheus a acalmou.

— Por que essas coisas acontecem comigo? — Não poderia deixar de reclamar, ele apenas riu.

— Já ouviu falar de magia negra? Jogaram alguma coisa em você, Jesus! Olha onde se meteu sem nem notar.

— Não fui eu que me meti. — Defendeu-se vendo o amigo se levantar. — Me meteram no meio.

— Quem meteu quem no meio do que? — O grito saiu sem que tivesse o menor controle, o coração disparou e Bia pode jurar que sentiu algo gelado no estômago.

— Que isso, Bianca?! Minha voz nem é tão horrível assim. — Alex estava na porta da sala prensando a palma da mão em uma das orelhas. — Que gritinho agudo, parece a minha irmã.

— Cala essa boca, Alexandre! — Levantou-se irritada, tanto pelo susto quanto pela comparação, ela não tinha a voz de uma peste de oito anos! — Você é que entra de mansinho na sala dos outros. — Os olhos escuros a fitaram sem entender, o que era compreensível, já que ele esperava a ela e o azulado na sala todos os dias antes do intervalo, mas não deu valor aquilo, estava pressionada demais no momento.

— Vamos, parem de demonstrar tanto amor um pelo outro. — O olhar mortífero que Matheus recebeu dos dois o fez sorrir. — Eu estou com fome, vamos para a cantina antes que eu me torne um canibal.

***

— Por que você não foi no treino ontem?

"Toca, sirene maldita!"

— Bom-dia para você também, Alex. — Ele assoviou e não ficou para trás quando ela apertou seu passo.

— Nossa! Acordou com o pé esquerdo foi? — Conseguia sentir os olhos dele em seu rosto, mas continuou trocando olhares com o chão.

— Minha mãe achou meu boletim e está me obrigando a estudar. — Era mentira? Sim, mas não uma novidade.

Lembrava-se da última vez que contestara aquela decisão.

"Português não entra na minha cabeça, fazendo isso só vai fazer você gastar dinheiro nas mensalidades do karatê sem que eu use."

Aquela simples frase a deixou de castigo por quinze dias.

— Que bom, por um segundo achei que você estava naqueles dias. — A felicidade na voz do moreno deu o impulso necessário para que sua bolsa atingisse o braço dele.

— Imbecil! Quando é que vai parar com essa fixação com o meu ciclo menstrual? — Abaixou a voz o máximo possível, não queria uma frase como aquela circulando pelo pátio cheio de adolescentes, era vergonhoso demais.

"Seu esquisito."

— Não é fixação, só quero evitar minha morte ficando quietinho nesses períodos. — Mesmo que o moreno não tivesse reclamando sabia que havia doído pelo modo como ele alisava o braço. — Mas ainda não consegui descobrir esse algoritmo.

— Nem nunca vai descobrir. — O tom aborrecido que usou pareceu divertido para Alex, pois uma risada pode ser ouvida. — Idiota. — Sibilou encarando-o com escárnio, teve como resposta apenas um suspiro.

— Quer ajuda com o português? Ao menos eu posso dizer por onde você deveria começar. — Os dois pararam de andar quando alcançaram a entrada do corredor das salas.

— Não precisa, eu me viro, não vou confinar você no meu quarto a essa tortura a tarde toda. — O desânimo em sua voz não era fingido, teria que achar uma desculpa para não ir ao dojo novamente.

"Ontem eu falei que bati a perna e estava com dor, a minha mãe não vai acreditar nisso de novo. Trabalho de escolar talvez?"

Bianca tinha a pequena impressão de que se continuasse mentindo para todo mundo acabaria em uma teia e sem saída.

"Se eu não for amanhã vou ter que inventar alguma coisa para o sensei também..."

Suspirou, ela odiava seu azar.

— Bia. — O chamado a fez voltar a prestar atenção, Alex estava encostado na parede olhando para a quadra poliesportiva alguns metros à frente, a morena conhecia aquela expressão idiota. Maldição! — Você acha que a Tabatha gosta de poesia?

— Sei lá, como é que eu vou saber? — Cruzou os braços em um gesto se proteção e se pôs a olhar para o corredor deserto.

"Quando eu quero que esse sinal barulhento toque não acontece nada...Que horas são?!"

— Você consegue conversar com ela mais do que eu, achei que saberia de algo assim. — Olhou para cada indivíduo que passava por sua vista, onde diabos estava Matheus?! — Você é a minha referência feminina, para quem mais vou perguntar? — A indagação fez com que fitasse-o.

— Por que homem tem essa ideia ridícula de que mulher sabe tudo uma da outra? Não é tudo a mesma coisa. — Seu tom foi mais mordaz do que a própria gostaria, estava sofrendo de stress no momento, era impossível ser amável ou até mesmo legal.

— Ok. — Alex a encarou por alguns segundos antes de sacar o celular e começa e a digitar. — Que dia é hoje? — A casualidade a deixou desconfiada.

— Por que? — Teve receio da resposta, mas não poderia ignora-la, ele apenas deu de ombros.

— Então hoje você também não vai treinar? — Devolveu o aparelho ao bolso e a encarou, esperando uma resposta.

— Não, talvez amanhã. — Deixou aquela escapar, o amigo não estava merecendo que pegasse no pé dele no momento.

"Mas não vai achando que eu não sei que isso é para tentar achar a minha TPM, seu idiota."

O dia transcorreu como um sucesso, — o que era muito estranho se tratando do que acontecia com sua vida atualmente, — passou a tarde toda jogando GTA ao invés de gastar o tempo estudando, ela não tinha nervos no momento, precisava de algo violento e que não a fizesse pensar, mas quando pôs a cabeça no travesseiro não conseguiu ignorar os acontecimentos recentes.

"Como isso tudo foi acontecer? O que eu fiz para você do nada passar a gostar de mim?"

Suspirou cansada, seu anel passou a bater na parte metálica da cama, o código Morse aparecia praticamente por obrigação quando estava preocupada.

(Que saco, eu não entendo.)

Sabia que Matheus tinha razão no que dizia, mas jamais conseguiria se ver simplesmente não fazendo nada, por mais que a declaração fosse repentina e não muito bem-vinda, fora sincera e inocente, perguntava-se a quanto tempo Tabatha estava se sentindo daquela forma.

(Isso não faz sentido.)

E quanta coragem havia tirado de si mesma para puxar a manga de sua blusa e mostrar seus sentimentos de forma tão explícita, em um lugar em que por poucos segundos de diferença foram responsáveis pelo próprio pai não ouvir, pensando do momento, o time era tão perfeito que se mudado poderia ter deixado tudo pior. Será que o professor de karatê sabia dos gostos da filha? E se não soubesse?

(Que saco.)

Suspirou, remexendo-se inquieta entre os lençóis, não poderia ficar isenta, isso era um fato, não fazia parte da sua personalidade, principalmente quando seu melhor amigo, a arte marcial que havia conseguido deixá-la menos hiperativa, — para a alegria da mãe, — e...

"Tabatha não é exatamente uma grande amiga, mas isso não importa."

Mas Matheus continuava certo, tinha que se lembrar disso.

(Por que eu?)

(Fique quieta.)

— Mãe? — Gritou, surpresa e duvidosa.

— Pare de fazer barulho, já é mais de meia-noite! — Ficou tentada a responder a voz mal-humorada e sonolenta novamente com o anel, mas desistiu, sabendo que sua progenitora não deixaria a brincadeira por ela mesma.

— Boa noite, Renata. — Ela não respondeu, o que a fez suprimir a risada.

***

— O que aconteceu com o Alex? — Sussurrou para o garoto ao seu lado.

— Não sei, achei que você soubesse. — Matheus a empurrou para poder olhar pela pequena fresta formada pela ausência de um punhado de livros na estante da biblioteca da escola.

— Eu não, ele chegou e já veio para cá, não sei de nada. — Não era estranho que o amigo passasse algum tempo no local, mas sem nem ao menos falar com eles? Muito esquisito.

— Que livro ele pegou? — Foi a vez dela empurra-lo para ter visão, Alex estava sentado na mesa mais afastada no local lendo um livro grosso de capa azul que Bianca não conseguia ver o título, vez ou outra ele pegava o celular da mesa, digitava e lia também.

— É uma pesquisa com toda a certeza. — Concluiu por fim, fitando o azulado.

— Mas sobre o que? — Matheus também a encarou, ambos pensativos e cheios de dúvidas. — E por que desse jeito tão urgente?

— Será que vai ter algum debate na sala dele? — Especulou.

— Ou talvez já tenha tido e perdeu. — Eles arfaram ao mesmo tempo, convencidos que a hipótese pudesse se mostrar real.

— Erraram. — A fala cantarolada fez com que os dois dessem um pulinho e olhassem para o outro lado da estante: Alex se aproximava. — Vocês são espiões horríveis, esse lugar é silencioso, todo mundo consegue ouvir quando alguém fala. — Matheus engoliu em seco e riu sem graça, diferente da amiga, que não conseguiu segurar a curiosidade.

— O que deu em você? — O moreno guardou o livro que tinha em posse sem lhe dar atenção, a irritação que sentia ao não conseguir sanar suas curiosidades era agoniante. — Fala logo!

— Shh. Não grite aqui. — Ele sussurrou com uma expressão tão irritada quanto a sua, Bia arfou de indignação, pronta para responder mais alto, entretanto Matheus conseguiu se meter a tempo de impedi-la.

— Chega os dois, vamos conversar lá fora. — Ele a empurrou levemente para que começasse a andar, foi o que fez, mas não antes de cruzar os braços e soltar um som de desdém.

"Idiota, cretino, dissimulado, idiota..."

Parou na porta do recinto e sua raiva só fez aumentar quando viu que eles não tinham se mexido, apenas olhavam para ela com certo grau de dúvida e estranhamento, o moreno sussurrou algo para o outro, seu pé começou a bater rapidamente contra o chão sem que notasse.

"Se você está falando do que eu acho que está falando: juro que hoje volta com um olho roxo para casa, Alexandre Figueiredo!"

Vendo que sua paciência estava bem próxima do fim, os dois garotos andaram até ela, mas sua irritação não dissipou, pois o barulho estridente do sinal se fez ouvir, conteve o rosnado com muita dificuldade.

"É brincadeira, claro que é...Mas que inferno! Sirene maldita!"

— Tem problema se você não for para a aula? — Alex fixou seu olhar no dela, sua boca se abriu em pura descrença, não imaginava que um dia ouvira aquelas palavras saindo da boca do amigo, apontou para ele debilmente.

— Você quer matar aula?

"Meu amigo nerd certinho quer matar aula."

— Não tem não, ela pode ir. — Novamente o azulado a empurrou.

— O que? Mas... — Ela não iria sem ao menos uma explicação.

— Andem, eu juro que se alguém notar eu tento disfarçar.

***

— Alex... — Ele apenas continuou a andar pelo parquinho onde meia dúzia de crianças estavam brincando.

A primeira tentativa de chamar a atenção foi aos berros, o que diabos ele estava pensado?

"Eu tinha aula de português!"

Odiava gramática, mas isso não a deixava menos importante no final das contas.

A segunda foi mais amena e séria, porém não sem uma cobrança no tom, novamente fora respondida com o silêncio, deixou que os minutos passassem para que ele próprio esfriasse a cabeça, o que não pareceu dar resultado.

— Por que está me dando um gelo? — Indagou realmente preocupada com o modo que o amigo estava agindo, ele apenas riu e sentou-se no balanço vermelho, deixando-a mais confusa.

— Sente, temos que conversar. — Mesmo que o humor dele não parecesse ruim, o tom melancólico não pode ser disfarçado.

"Perigo! Perigo! Abandonar o navio!"

Era o que queria fazer, sair correndo e fingir que nada tinha acontecido, quase como um reflexo de proteção, mas conseguiu conte-lo, sentou-se devagar no balanço ao lado.

— So-sobre o que? — Fez a tão importante e temerosa pergunta, o suspense estava sendo pior que o instinto de sobrevivência, passou a balançar no mesmo compasso suave do amigo e olhar para a grama rala amarelada abaixo deles.

— Eu falei com a Tabatha ontem. — Seus pés pararam de exercer força sobre o chão, as mãos se prenderam a corrente fria com força em um gesto reflexo, a voz dele continuava serena. — Nunca achei que um toco poderia ser tão estranho.

— Que...Que... — Até o seu cérebro parecia estar congelado, engoliu o medo, querendo que o crocodilo remexendo em seu estomago o devorasse. — Como assim? Você disse que gostava dela? — Sua mente alterada achou que cinco segundos fossem o suficiente para ter uma resposta. — Nossa! Ainda bem que não fui, com toda certeza eu teria vomi...

— Bianca. — O tom sério a calou, mesmo sabendo que os olhos dele estavam sobre si não pode encara-lo, fechou os próprios com força.

— Desculpa. — O pesar em sua voz era evidente.

— Mas não é culpa sua. — A voz de Alex parecia sincera e até meio surpresa, sorriu, ele era um cara incrível.

— Eu sei. — Levou os olhos verdes até o castanho dos dele. — Mas isso é tão injusto! — A raiva tomou-lhe antes que notasse, começou a chutar o chão de forma completamente aleatória, tentado dar vazão a todos os sentimentos que estavam tão sufocados dentro de si. — Você é romântico, inteligente, gentil, mais velho, gosta de coisas japonesas e não é tão feio, como é que ela foi olhar para mim?! — A morena não teria gostado da gargalhada do amigo a suas custas, mas no momento a relevou, um sorrio singelo cruzou seu rosto ao ver que ele realmente não estava com raiva.

— Não sabia que você achava isso tudo de mim. — Ele passou a mão no cabelo tentando imitar a terceira parte do trio, mas sem todo o estilo e beleza do outro, ficava realmente ridículo.

— Eu falo: é grudento, nerd, fresco, e se um dia as espinhas pararem de nascer você pode ser normal. — Cruzou as pernas e passou a balançar o pé, não conseguindo dar fim a agitação.

— Então tudo isso eram elogios? — A surpresa fingida a fez rir também. — Vou começar a prestar atenção neles daqui para frente. — Ele passou a dar mais impulso no balanço. — Lembra quando nos conhecemos? — Seu riso morreu.

— Claro que...

— Não. Eu sei, só perguntei porque queria entrar no assunto e não sabia como. — Alex parou novamente de balançar, sorrindo para ela, um absurdamente convencido.

— Tsc, idiota. — Dessa vez o sorriso tomou um tom mais divertido depois de um suspiro.

— Foi aqui, quando tínhamos oito anos. Estávamos com mais algumas crianças e brigamos por um motivo idiota, você me empurrou e eu disse que não quebrava a sua cara porque era uma menina. — Em um movimento os olhos de Bianca buscaram a caixa de areia a alguns metros de onde estavam, haviam duas crianças fazendo castelos cheias de baldes, pás e uma mulher sentada no bando ao lado olhando para elas.

— Eu disse que você estava com medo de mim... — Todo o momento clareou em sua cabeça, sorriu.

"Você era uma peste de garota."

— E eu respondi que o meu pai dizia que não se batia em mulher... — Ele riu e rolou os olhos.

— E eu disse que o seu pai era uma bicha medrosa por falar algo assim e...

— Nós rolamos pela caixa de areia até alguém chamar as nossas mães. Achei que você tivesse quebrado o meu nariz, ele sangrou bastante. — O modo como Alex cutucou o próprio nariz a fez rir.

— Eu perdi meus sapatos, um tufo de cabelo e duas semanas presa dentro de casa, para você foi leve, sua mãe é legal. — O bufo que ele deu lhe trouxe um sorrio a face, sabia muito bem que o riso estava sendo suprimido.

— É engraçado o modo como nos conhecemos, era para sermos inimigos mortais, mas aqui estamos: amigos a oito anos. — Seu bom humor evaporou.

— Nossa! Não vai começar com isso, né? — Rolou os olhos, odiava aquele papo sentimental.

— E depois teve o Matheus quando estávamos na sexta série, ele chegou todo emo sentando no canto da sala, parecia uma alma penada com aquele moletom preto e cabelo branco. — Suspirou e acenou de maneira positiva.

— Verdade, só começamos a falar com ele por causa daquele trabalho de história. — Foi bem estranho notar que o garoto dorminhoco da sala sabia tanto sobre cruzadas.

— Lembra daqueles boatos? — O tom sério voltou a fala do amigo, não estava entendendo nada, mas não questionou.

— Sobre ele ter sido expulso de outra escola por tocar fogo na cantina? Lembro. — Também foi estranho, mas bom, saber que aquilo era apenas um boato idiota, o ruim mesmo foi descobrir o motivo real. — Onde você está querendo chegar?

— O Matheus não teve muita ajuda quando estava se descobrindo. — Ele deu uma pausa, parecendo realmente nervoso, o gesto característico de coçar a cabeça com vigor lhe deu a certeza.

— Alex... — Encolheu o corpo no balanço sentindo-se acuada, ele iria pedir alguma coisa, alguma coisa difícil.

— Você poderia falar com a Tabatha? — A fala do moreno foi tão rápida que Bianca teve que passa-la novamente na cabeça para poder se assustar.

"Ai meu Deus..."


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Crítica ou sugestões, estamos sempre abertos u.u
A continuação será postada dentro de uma semana.
Até o/



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "As Ironias de um Clichê" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.