A Assassina e o Alquimista escrita por Lilás


Capítulo 19
Dez quatrilhões de tentativas


Notas iniciais do capítulo

Olá. Hoje eu voltei mais tarde do que eu costumo. Desculpe, estou mesmo sem tempo. Estava fazendo um trabalho e acabei quase neste instante. Infelizmente, não tive muito tempo para pensar sobre esse capítulo e ele não está muito elaborado como os outros. Espero ter mais tempo a partir de agora para escrever os próximos.



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Alphonse precisou voltar à enfermaria depois da hora do jantar. É verdade que o médico de Briggs, May e Lan Fan haviam feito um trabalho impecável com o seu ferimento na barriga, mas ele precisava ficar de repouso depois da cirurgia do dia anterior. Ao invés disso, Alphonse ainda resolveu brigar com o Wave e a ferida, inevitavelmente, acabou reabrindo e ele precisou fazer um novo curativo no lugar. Aproveitou para visitar Akame e Wave também. A enfermeira-chefe McGory achou melhor que os dois estrangeiros ficassem em observação naquela noite. Edward e Alphonse dormiriam em um dos alojamentos comuns do quartel. Mustang deu alguns dias para todos se recuperarem antes de partir para frente de batalha. Nesse meio tempo, Edward resolveu ligar para Winry e pedir para que ela viesse no dia seguinte para o Quartel-General Central encontrar com ele e Alphonse. Só após disso, eles iriam até Resembool para se despedir da vovó Pinako e, depois, reencontrariam com Mustang e o resto da tropa na Cidade do Leste.

Alphonse conversou bastante com os dois acamados e, quando McGory não estava vendo, ele entregou um saco de doces para Akame.

— Sei que isso não faz parte da dieta da enfermaria – ele sorriu para ela.

— Onde conseguiu isso? – Akame perguntou.

— Tenho meus truques – respondeu, enigmático – Trouxe para você também, Wave – sorrindo, atirou outro saquinho na direção do marinheiro – Aliás, desculpe de novo pela confusão.

— Tudo bem – Wave encheu a boca com os doces – Sua dívida comigo acaba de ser paga.

Depois de conversarem mais um pouco, Alphonse deu um beijo na testa de Akame, apertou efusivamente a mão de Wave e se despediu, sempre com um sorriso no rosto.

— Ele é um cara legal – Wave comentou, minutos antes da enfermeira correr as cortinas ao redor de sua cama – Eu gostei dele.

No dia seguinte, bem cedo, Winry apareceu no Quartel-General Central. Parecia muito preocupada e abraçou Edward assim que o viu.

— O que aconteceu? – Winry perguntava muito nervosamente, sem dar espaço para Edward responder. Se ele realmente quisesse responder – Que confusão toda foi essa? Pensei que vocês estivessem em Briggs quando você me ligou ontem. Por que tiveram de sair de lá, Ed?

— Calma. Eu vou explicar tudo – Edward fez um sinal para que ela sentasse.

Edward precisou explicar toda a verdade para Winry. Quer dizer, a meia verdade. Explicou que o exército estava novamente fazendo experiências ilegais com Alquimia, que ele e Alphonse resgataram Akame mas foram perseguidos até Briggs e, agora, a divisão da general Armstrong estava precisando de reforços e ele e Alphonse haviam sido convocados para auxiliar no hospital do exército.

— Eu também vou com vocês – Winry disse, confiante, ao final do relato.

— Você não entendeu, Winry. Estamos indo para o meio de uma guerra – ele a interrompeu – É muito perigoso. Eu não sei o que faria se algo acontecesse a você.

— Ora essa. É perigoso para você também – ela cruzou os braços – Eu fiz um juramento, esqueceu? Até que a morte os separe.

— Eu sei disso – Edward deu um longo suspiro – Mas no quê você seria útil para o exército? O que uma mecânica de automails faria na guerra? Você sabe que eles só vão deixar você ir se for para ajudar em algo no exército.

— Esqueceu que os meus pais também foram médicos? – Winry enrugou a testa – Eu não sou uma especialista, mas sei muitas coisas de medicina. E também sei que muitos soldados de Amestris usam automails. Além disso, eu entendo muito de mecânica e eletrônica. Consertaria facilmente um carro de guerra. Tenho certeza que, se eu falar com o general Roy, ele me aceitaria imediatamente como membro da sua tropa.

Edward fez uma careta de raiva, não se sabe se era por causa da insistência de Winry ou por causa daquela intimidade de chamar Mustang pelo primeiro nome.

Ele não conseguiu convencê-la nem mesmo durante o caminho da Cidade Central até Resembool. Ele e Winry voltaram para casa na companhia de Alphonse, Akame, Lan Fan e May, sendo recebidos por uma contente vovó Pinako. Provavelmente, ela havia se esquecido do episódio dos guardas procurando pelos irmãos Elric há algumas semanas atrás.

Pelo menos, eles tiveram um pouco de sossego pelo resto do dia. E, à noite, Akame saiu furtivamente quando todos ainda estavam arrumando suas coisas para ir dormir. Precisava pensar um pouco sozinha. Ela sentou nos degraus da varanda de casa e ficou observando as estrelas por um breve e silencioso tempo.

— Tentando contar todas as estrelas que existem?

Akame não desviou os olhos do céu. Sabia quem era que havia acabado de sentar ao seu lado.

— Isso é impossível – ela respondeu para Alphonse.

— Eu conseguiria – ele falou em um tom brincalhão – Quer ver? – e apertou os olhos para o céu como se tentasse se concentrar – Deixa eu ver... Talvez... talvez, uns dez quatrilhões de estrelas!

— Nem sei se esse número existe – Akame fez uma cara de descrença.

— Claro que existe – Alphonse encolheu os ombros – Só não consigo contar até ele.

— Tem certeza que é esse o número de estrelas? – ela perguntou, desconfiada.

— Não. Apenas falei o maior número que consegui pensar.

Os dois ficaram alguns minutos calados, olhando para o alto.

— Pensei que você tivesse... – Akame sussurrou, quebrando o silêncio – Tivesse morrido.

— Ah, não. Não vai ser tão fácil para você se livrar de mim – ele abriu um largo sorriso.

— Isso não será necessário – ela suspirou, depois de um breve silêncio – Eu não quero me livrar de você – Akame deu um fraco sorriso e olhou para Alphonse – Antes de conhecer você, eu era muito sozinha.

— Eu também me sentia sozinho – Alphonse encolheu os ombros – Antes de conhecer você.

— Mas você não tem uma família e amigos? – ela o encarou com um olhar curioso.

— Às vezes, a gente também se sente sozinho entre as pessoas – Alphonse acrescentou, com um pouco de tristeza.

Akame o olhou por um longo tempo, sem demonstrar nenhum sentimento.

— Não sei o que você pensa de mim – ela disse em voz baixa – Mas, eu não sou a pessoa que você acha que sou – e completa quase em um sussurro – Eu não sou uma boa pessoa.

— Não existe isso de pessoas boas ou más – Alphonse deu um meio sorriso – Dentro de cada pessoa há um Universo e o Universo só existe porque há um precário equilíbrio entre as forças do bem e do mal.

— Você não deve ir – Akame abanou a cabeça como se não tivesse ouvido nem uma única palavra de Alphonse.

— Como é? – ele enrugou a testa.

— A guerra – ela explicou – Você sabe que não deve ir. Não é lugar para você.

— Eu vou estar bem – Alphonse encurvou-se – Não é lugar para qualquer um de nós, afinal. Nem mesmo você.

— Eu tenho a Murasame – Akame disse, sem emoção.

— E eu a Alquimia – Alphonse rebateu – Você acha mesmo que eu ficaria tranquilo se eu ficasse aqui em segurança enquanto você estivesse lá? Nem continue, Akame – ele mostrou a palma das mãos ao vê-la tomar fôlego para falar – Eu sei que você não gostou dessa ideia. Eu vi a cara que você fez quando eu disse que iria. Eu vou e nada que você disser vai me convencer do contrário.

— Seu irmão tem razão – ela disse em voz baixa – Você não deveria se preocupar tanto comigo.

— Eu sempre vou te ajudar – Alphonse confirmou com a cabeça – Eu quero te ajudar – e inclinou-se um pouco na direção da garota – Me deixe te ajudar.

Akame cerrou os dentes, desviando os olhos de Alphonse. Ele se aproximou mais, afastou os cabelos de Akame para o lado e depositou um beijo inocente na bochecha da garota. Akame respondeu, batendo com a mão fechada no topo da cabeça do rapaz.

— Eu já não te disse que isto dói? – Alphonse massageou o local atingido com uma careta.

— E eu já não disse que essa sua mania de ser sempre gentil é muito irritante? – Akame disse em um fiapo de voz, encarando os próprios sapatos.

— Umas dez quatrilhões de vezes – Alphonse deu uma sonora gargalhada antes de responder.

— Eu aprendi que ser gentil demais só faz você ser um alvo fácil – ela disse em um tom sombrio – Ser bom demais serve apenas para antecipar a sua morte.

O sorriso sumiu do rosto de Alphonse e ele deu um longo suspiro antes de prosseguir.

— Não há mal algum em ser bom – Alphonse abaixou os olhos – Se as outras pessoas não são boas comigo, o problema não sou eu.

— Mesmo para quem não merece sua gentileza – Akame o olhou – E eu? Quantas vezes você vai continuar insistindo em ser gentil comigo? – perguntou, com um leve tom de descrença na voz.

— A quantidade de estrelas no céu – Alphonse apontou para cima, com um sorriso.

Akame não pôde deixar de devolver um sorriso discreto.

***************************

Atravessar o deserto de carro poupava mais tempo do que no lombo de camelos. Usando vários carros militares, Mustang e seus homens não demoraram mais que alguns dias para ultrapassar o limite mais remoto de Amestris no meio do grande deserto e entrar nos domínios da nação de Xing. Os dois países haviam dividido o deserto entre eles e ambos se comprometeram a proteger as rotas das caravanas de comerciantes que faziam a comunicação entre os países do oeste com o extremo Oriente.

Mustang conseguiu reunir mais de trinta e cinco mil soldados – bem mais do que os vinte e sete mil sob as ordens da generala Armstrong nas trincheiras – e, apesar do tamanho da tropa, eles conseguiam deslocar-se velozmente através do deserto.

Em poucos dias, eles chegaram ao acampamento militar da generala Armstrong, apenas alguns poucos quilômetros de distância das trincheiras e das imediações da capital de Xing.

— É um pouco... diferente do que eu pensava – Winry comentou com uma careta de repulsa ao ver a confusão de sacos de areia do deserto amontoados em meio às armas e equipamentos e os soldados andando rápido de um lado para o outro no meio da sujeira.

Edward nem respondeu porque, até agora, estava tentando descobrir em qual momento Winry conseguiu convencê-lo de sua presença no campo de batalha. Ele não sabia como ela imaginava ser o acampamento militar, mas sabia que ela estava assustada com tudo aquilo. O que ela esperava? Que tudo estivesse limpinho e bem organizado como no Quartel-General Central?

Assim que chegaram, Mustang rapidamente se dirigiu ao alojamento da general Armstrong, acompanhado dos capitães Riza Hawkeye e Vato Falman  e do major Alex Louis Armstrong.

— A quem devo a honra da visita? – a general Armstrong disse, ironicamente – Muita cara de pau a sua, Mustang. Aproveitou que eu não poderia estar na Cidade Central durante a votação do afastamento do Führer para tomar o meu lugar – ela parou na frente de Mustang em uma pose intimidadora – Mas pode ter certeza que, quando eu voltar, vou fazer de tudo para pegar o meu lugar de direito. Eu tenho muito mais competência para ser o Führer do que você!

— É o que vamos ver – Mustang não se abalou – Mas viemos aqui por outra coisa. Trouxemos reforços para a luta contra os rebeldes.

— Viemos apenas para ajudá-la, minha irmã – o major Armstrong reforçou.

— Poupe-me de seu sentimentalismo barato, Alex – a general cortou, rispidamente – Eu sei muito bem que um covardão como Mustang veio aqui apenas para se apropriar da minha vitória – ela deu meia volta e sentou em sua cadeira, atrás de uma grande mesa – Mesmo em menor número, meus subordinados estão dando conta porque são bem treinados e temos armas melhores. Mas, precisamos de uma decisão definitiva. Não estamos lidando com simples bandidos.

— Recebemos o relatório dos seus subordinados, general – Riza começou, muito respeitosamente – Mas precisamos de informações mais detalhadas do inimigo.

— Os rebeldes estão tomando uma área – a generala desenrolou um mapa e o estendeu sobre a mesa – de aproximadamente quarenta mil quilômetros quadrados. Mas, eles estão reclamando por uma área de mais de duzentos mil quilômetros quadrados – e indicou os pontos no mapa – É mais ou menos toda essa região, incluindo as áreas do deserto.

— Mas essa parte de cá pertence à Amestris – Mustang retrucou.

— Diga isso para eles – a generala devolveu, com ironia – Aproveita e grita isso na frente da artilharia inimiga.

— Quem são esses rebeldes, general Armstrong? – Falman perguntou com um pouco de receio.

— São membros de alguns dos vários clãs de Xing – a general respondeu – Não é segredo para ninguém que alguns clãs não reconheceram a autoridade do rei de Xing, mesmo que ele tenha o segredo da imortalidade – ela suspirou – O líder de uma das tribos nômades, o nome dele é Kalin Weng, se juntou com outras tribos que também não concordavam com a nomeação do rei Ling e se autoproclamaram Estado Independente do Reino de Xing. Eles são uns bárbaros. Simplesmente não fazem prisioneiros. Apenas trucidam todos os pobres coitados que têm a infeliz sorte de cair nas mãos deles.

— E eles são quantos? – o major Armstrong perguntou.

— Você quer saber segundo os números fantasiosos do governo central de Amestris ou segundo os matematicamente incapazes ministros do Reino de Xing? – a generala ergueu uma sobrancelha – Os primeiros dizem que são aproximadamente trinta e dois mil militantes atuantes no exército rebelde e os segundos dizem que esse número não passa de vinte e cinco mil.

— E segundo você e seus subordinados? – Mustang diz.

— Eu diria que são mais de oitenta e sete mil soldados – Olivier coçou o queixo.

— Nem se juntarmos todos os soldados que eu trouxe com os seus, vai dar esse número! – Mustang se assustou.

— Parabéns, Mustang – a general disse, com desdém – Felizmente, sabe fazer contas.

— Mas, com um exército tão grande quanto esse – Falman continuou – como eles conseguem financiamento e armas?

— Ah, de várias formas – a general abanou uma mão – soube que recebem apoio financeiro de alguns nobres de Xing. E também conseguem muito dinheiro saqueando cidades, roubando e sequestrando viajantes ou com contrabando.

— E agora estão ameaçando tomar a capital de Xing – Riza acenou.

— Exatamente – a general concordou – E estabelecer um novo governo.

— Isso não pode acontecer – Mustang reclamou – Se eles tomarem o governo de Xing, vamos perder nosso maior aliado.

— Nosso único aliado, você quer dizer – a generala o corrigiu – Ainda não resolvemos muito bem nossa relação com os drachmanianos, o povo de Creta finge que não existimos e a população de Aerugo quer nos ver pelas costas.

— Falei com o rei Ling sobre a situação e ele prometeu enviar reforços o quanto antes – Mustang suspirou – Tudo bem. Vamos reorganizar o exército e preparar uma estratégia.

— Quem diz isso sou eu, Mustang. As suas habilidades e as do Alex seriam úteis aqui – Olivier Armstrong indicou o irmão com a cabeça – Pena que o grande poder de fogo de um Alquimista Federal só é eficaz em uma curta distância. Vocês precisariam chegar perto demais para serem realmente úteis e eu acredito que levariam uma bala na testa antes disso. Mesmo assim, espero que você tenha trazido mais Alquimistas Federais com você.

— Trouxe seu Alquimista Federal favorito – Mustang deu um sorrisinho debochado – Edward Elric e seu irmão Alphonse irão ficar no hospital de campanha, auxiliando o doutor Marcoh.

— Aqueles dois garotos, Mustang? – Olivier bufou de contrariedade – Você quer transformar meu batalhão em uma sala do jardim de infância?

— Eles já estão crescidos, general – Mustang disse, tranquilamente – Também trouxe mais outros dois novos recrutas que a deixarão impressionada.

— Saiba que eu não me impressiono fácil – ela deu de ombros.

— Nem se eu disser que, um deles – Mustang provocou – é aquele rapaz que vocês capturaram?

— Eu só prendi aquele rapaz por causa de uma denúncia e ele nem ofereceu resistência – Olivier enrugou a testa – Não acreditei que aquele rapaz fosse um foragido, mas ordens são ordens...

— Tenho certeza que você terá uma opinião totalmente diferente depois de conhecê-los – Mustang completou e Olivier lançou-lhe um olhar irritado contudo, ao mesmo tempo, curioso.

***************************

Alphonse vestiu o jaleco branco por cima do uniforme militar. Quer dizer, aquele jaleco era branco em alguma vida passada porque, agora, ostentava um leve tom amarelado. Enquanto ele e Edward visitavam as precárias instalações do hospital de campanha, eles observavam o quanto a situação dos soldados feridos era crítica.

— Eu acho que eu vi um rato – Edward apontava, alarmado, para o amontoado de camas e lençóis sujos em um canto da enfermaria.

— Não, senhor – o enfermeiro do lugar respondeu com a maior tranquilidade do mundo – O senhor certamente viu um gato.

— Eu sei o que eu vi – Edward rebateu, irritado – E era um rato.

— É de estimação – o enfermeiro insistiu.

— Vocês tem um rato de estimação na enfermaria?!! – Edward gritou.

— Bom – o enfermeiro indicou o ambiente com as mãos – Se eles convivem entre nós e ninguém consegue tirá-los daqui, então é de estimação.

— Bom, já vi que teremos muito trabalho – Edward saiu dando ordens aos enfermeiros – Limpem tudo! Matem todos os ratos! Esterilizem os instrumentos! Troquem os lençóis!

E todos precisavam obedecer as suas ordens, mesmo se fosse a contragosto. Afinal, Edward voltou para o exército e recuperou sua antiga patente de major, apesar dele não ser mais alquimista. É que, no Exército Amestrino, ninguém que voltava à ativa poderia regressar em uma patente mais baixa do que a patente anterior ao afastamento. Alphonse ficou com a patente de capitão porque era a patente mínima para os médicos, apesar de ele ser um alquimista. Mas Alphonse não havia feito os testes para admissão no grupo dos Alquimistas Federais, principalmente por causa da falta de tempo. E também ele não estava preocupado com isso.

Alphonse se sentiu um pouco sufocado com aquele ambiente mórbido do hospital e resolveu dar um pequeno passeio para respirar ar puro. Encontrou Wave na entrada do alojamento, carregando suas coisas em uma pesada mochila.

— Alphonse Elric – o marinheiro sorriu e deslizou a mochila no chão para poder apertar a mão do colega – Acho que ficaremos em um alojamento próximo.

— Por alguns dias – Alphonse completou – Não sei como ficará quando formos para as trincheiras da linha de frente.

— Já estou acostumado com essas coisas – ele entortou as costas para ajeitar a coluna – Sempre fui um soldado e um bom soldado cumpre com sua obrigação de defender os mais fracos.

— Tem razão – Alphonse respondeu, vagamente – Ah, Wave. Tem uma coisa que eu queria te perguntar dias atrás.

— Pode perguntar, Alphonse Elric – Wave remexeu na mochila jogada no chão.

— Naquela vez da invasão do Quartel-General Central – ele começou, cautelosamente – Quando encontramos Akame, ela estava com umas marcas estranhas pelo corpo. Ela não disse nada sobre isso, nem para mim. Você sabe o que era aquilo?

— Tenho uma ideia do que seja – Wave respondeu, pensativo – Mas não tenho certeza.

— E o que vocês dois faziam no Quartel-General Central naquele dia? – Alphonse continuou – Vocês estavam fazendo testes lá? Eu achava que o exército só fazia isso nos laboratórios.

— Não. Eu encontrei com a Akame quando estava na Prisão Central – Wave balançou a cabeça – Nós fugimos de lá e pegamos nossas Teigus. Mas, antes de irmos embora, Akame disse que tinha um assunto pessoal para resolver e, por isso, fomos para lá.

— Que assunto pessoal ela poderia ter no Quartel-General Central? – Alphonse enrugou a testa.

— Quando alguém da Night Raid fala isso – Wave tinha um risinho mal disfarçado no rosto – é certo que se trata de um assassinato.

— Um assassinato? – Alphonse enrugou a testa – Mas quem...? O coronel! O coronel Panzer! Akame foi lá para matá-lo!! Mas por que...? – e parou de súbito ao se lembrar de algo – Ela achou que eu tivesse morrido – disse para si mesmo – Akame foi lá para se vingar!

— É bem típico da Night Raid – Wave sorriu enviesado.

— Mas ela havia me prometido que não faria mais nada desse tipo – Alphonse suspirou, decepcionado – Prometeu que só agiria em legítima defesa.

— Que diferença faz matar por vingança ou para se defender? – Wave levantou uma sobrancelha.

— Ela disse que estava cansada da vida antiga – Alphonse amarrou a cara – Mas, assim que chegou a Amestris, se alistou no exército sem dar explicações. E, agora, age dessa maneira por pura vingança. Mesmo tendo prometido que não faria mais isso.

— Se ela achava que você estava morto – Wave encolheu os ombros – a promessa estava desfeita.

— A promessa era além de mim – Alphonse suspirou de novo – Não importava se eu estivesse vivo ou não. Acho que o Ed tem razão. Ela não pode mudar depois de tudo que aconteceu.

— Não sei em qual mundo você vive – Wave o encarou – Mas, no nosso mundo, decidir matar ou não vai além de uma discussão sobre ética. É uma questão de sobrevivência. É também ter de escolher entre matar alguns milhares para salvar alguns milhões. Olhe em volta! É esse mundo em que eu e Akame vivemos.

Alphonse olhou com tristeza para os soldados arrumando os equipamentos em seus alojamentos. Ele se sentiu mais triste.

— Você nunca teve que matar uma pessoa na vida, não é? – Wave perguntou.

— Não – Alphonse respondeu em um fiapo de voz.

— Você tem sorte – ele suspirou – Sinto um pouco de inveja de você.

— Mas, sempre há uma maneira – Alphonse falou, um pouco hesitante – Uma maneira de resolver as coisas sem derramamento de sangue. Vocês poderiam ao menos tentar. Como vocês podem aceitar tudo isso passivamente?

— Tenho muita consideração por você, Alphonse – Wave abanou a cabeça em desaprovação – Mas você não tem nenhum direito de julgar nossas ações. Não é só você que sabe a importância de uma vida. Aliás, apenas aqueles que já tomaram uma vida, sabem o peso dela.

Alphonse entendia o ponto de vista de Wave. Realmente, não era fácil depois de tudo que passaram. Mas, isso não mudava o fato de que Akame havia mentido para ele. Ele deveria continuar com suas tentativas em transformá-la em uma nova pessoa? Será que ela realmente poderia superar tudo que passou e viver uma nova vida?

— Você disse que tinha uma ideia do que poderiam ser as marcas – Alphonse recomeçou, vacilando nas palavras.

— Acho que sim. Mas só Akame para confirmar isso. Posso perguntar para ela – ele assentiu.

— Se puder fazer isso por mim, obrigado – depois de falar isso, Alphonse continuou parado no mesmo lugar, enquanto pensava.

— Você não deveria estar agora no hospital? – Wave o despertou do seu transe – Olha que, pelo pouco que eu conheço do seu irmão, é bem capaz dele virar esse acampamento de ponta-cabeça atrás de você.


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Notas finais do capítulo

Não tenho nenhum motivo especial para esse título, apenas porque eu fiquei com esse número na cabeça por alguns dias. Dez quatrilhões é um seguido de quinze zeros ou 10 elevado a quinze. Também é a quantidade de códigos possíveis que a Enigma, uma máquina de criptografia inventada pelos alemães, se eu não me engano, na Primeira Guerra, era capaz de fazer. Apesar de ser um número grande, provavelmente, o universo tem mais do que dez quatrilhões de estrelas porque só a Via Láctea tem cerca de 200 a 400 bilhões de estrelas... Está bem. Vou parar de falar de números. Até a próxima.
ERRATA: Dez quatrilhões têm dezesseis zeros, e não quinze como foi afirmado anteriormente.



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