Momentos escrita por tsukuiyomi


Capítulo 4
Magnus, o Afastado.


Notas iniciais do capítulo

Oi, primeiro gostaria de me desculpar pela demora, eu não fazia ideia do que escrever... Segundo, vocês devem ter percebido que a fic foi alterada para +16, isso porque o lemon do capítulo 1 foi excluído; fiz isso porque achei melhor apagar algo do qual não gostei, quem quiser ver como ficou... mas não houve grandes outras alterações. Terceiro, obrigada Denise Miranda pelo favorito e pelos comentários; FaFa, Ravena Krane, LilaCalado e Snow Queen, obrigada pelos comentários no capítulo passado, eu amei ♥

Têm 46 pessoas lendo a fic, o que os fantasminhas acham de aparecer?

Boa leitura!



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Alec estava cansado. Não havia outra palavra para definir o que sentia no momento. Tinha acabado de encerrar um dia exaustivo no trabalho e sentia preguiça até mesmo de levantar-se da cadeira para sair do escritório e ir embora. Ele amava o que fazia, mas estava começando a entender o que Magnus queria dizer quando falava que ele trabalhava e se preocupava demais. O fato era que aquele era o ramo da família, e ele queria fazer com que eles tivessem orgulho dele, embora se recusasse a admitir aquilo em voz alta.

Os Lightwood tinham escritórios de Advocacia espalhados em toda cidade. A família era conhecida por ter ótimos profissionais no ramo. Alec tinha terminado a faculdade um ano atrás, e após muito esforço conseguira abrir o próprio escritório. Ele sabia que o sobrenome Lightwood estampado na placa dourada, bem na entrada, chamava a atenção dos clientes, mas se esforçava para provar a si mesmo que fazia um bom atendimento por si próprio, e que não precisava do renome da família para isso.

De qualquer modo, aos vinte e quatro anos, ele começava a sentir o peso da vida adulta de maneira mais intensa, já que agora sua vida girava ainda mais em torno de trabalho, trabalho e mais trabalho. Embora tivesse feito estágios, turnos de meio-período, na faculdade, aquilo era muito diferente. Ele estava se esforçando. Às vezes Isabelle aparecia ali, pedindo dicas de como guiar a carreira, ou simplesmente trabalhando junto com ele. Estavam pensando em levar o escritório juntos. Ela estava no último ano da faculdade.

Era o que acontecia naquele dia, já que Isabelle fechou o notebook que estava em seu colo e apoiou a cabeça no encosto do sofá em que estava sentada, suspirando. Alguns papéis estavam espalhados ao seu redor.

— Eu preciso de uma mesa. — Pontuou.

Alec riu, entendendo as implicâncias da frase dela. Isabelle relutava em trabalhar junto com ele, porque ela gostava de trabalhar sozinha, falemos a verdade.

Ela levantou-se, ajeitando a saia lápis cinza-chumbo que usava e soltando os cabelos que antes estiveram presos em um coque. Analisou o que Alec fazia, e ao concluir que não era nada, puxou-o para fora, trancando tudo e adotando uma expressão de “missão cumprida” quando estava do lado de fora do estabelecimento.

O dia não estava tão frio, mas o sol não aparecera. A noite começava a dar seus primeiros sinais. Alec afrouxou a gravata azul que usava enquanto se dirigiam até o seu carro. Carro aquele que era o que ganhara de presente aos dezoito. Sua mãe tinha insistido para que o pegasse de volta, após abandoná-lo quando saiu de casa para morar com Magnus, e ele o fez. Ele estava fazendo planos de trocar o modelo, mas não sabia se Maryse ficaria magoada. O carro tinha valor sentimental, Isabelle uma vez dissera que era porque “representava a boa convivência da família e a aceitação de Alec totalmente, sem reservas”. Ele riu ao lembrar daquilo.

— Está rindo do quê? — perguntou a irmã quando eles já estavam a caminho da casa dela. Mexeu no rádio, deixando em uma estação que tocava uma música pop horrorosa da qual gostava.

— De nada.

Ela fez careta para ele, amaldiçoando-se por ser tão insensível e não divertido. Talvez ela tenha dito algo que envolvesse não saber como Magnus, sendo tão amável e engraçado, suportava-o, mas Alec fingiu não ouvir, concentrado no tráfego.

 Isabelle tentou durante vários minutos irritar Alec, fazê-lo xingá-la ou até mesmo esboçar qualquer reação, mas o irmão estava achando muito divertido encarar pelo canto do olho a expressão frustrada dela por não conseguir. Isabelle, com seus vinte e três anos, por vezes parecia uma criança mimada que não ganhara chocolates na Páscoa.

Mas ela era uma Lightwood, e não desistia do que queria tão fácil. Mesmo que talvez aquilo lhe causasse problemas mais tarde, ela acabaria com a indiferença de Alec a qualquer custo.

— Jace pediu a Clary em casamento.

Bingo. Alec quase bateu no carro que estava atrás dele ao frear bruscamente e encarar Isabelle com uma expressão de incredulidade. Ela sorriu vitoriosa. 

**

Se havia uma coisa pela qual Magnus seria capaz de morrer, era fazer com que Catarina calasse a boca.

Não que ele não achasse lindas as iniciativas dela de ajudar pessoas carentes, oferecendo seus serviços como enfermeira de graça, ou organizando eventos beneficentes. Longe disso, Magnus sentia muito orgulho dela por isso, e ficava feliz por ter uma amiga tão bondosa. Contudo, Catarina parecia especialmente falante naquele dia, já que há uma hora iniciara um monólogo sobre preços de remédios. E Magnus tivera um dia cheio de trabalho, lotado de clientes exigentes e tudo o que ele queria era, surpreendentemente, um pouco de silêncio.

As falas da mulher foram interrompidas pelo barulho da porta, e Magnus amou Alec ainda mais por ter a capacidade de silenciá-la, mesmo que por um único minuto.

— Ei, Magnus. Oi, Catarina. — O Lightwood entrou na sala e cumprimentou-a assim que fechou a porta. Ela se levantou do sofá para abraçá-lo.

— Faz tempo que não te vejo, sempre que venho está no período de trabalho.

Alec murmurou um pedido de desculpas enquanto se afastava, retirando o paletó e indo em direção ao corredor, desaparecendo na porta do quarto que ele dividia com o marido. Este, a propósito, estava com uma expressão cômica que mesclava descrença com uma fúria crescente. Catarina, prendendo os cabelos descoloridos em um rabo de cavalo, olhou para ele como se o visse pela primeira vez.

— Que cara é essa?

— Você viu? Não ganhei nem um beijo.

Catarina abriu os braços e dobrou as mãos na pose típica que dizia “E daí?”. Até ela sabia que Alec não gostava muito de demonstrações de afeto na frente dos outros. Para ela, não havia nada demais na situação, já que Alec entrara na casa com uma expressão de cansaço enorme, como se tivesse descoberto coisas que sequer imaginara. Não era de surpreender que ele não estivesse com cabeça para cumprimentar Magnus da forma que o Bane achava adequada.

Porém, os pensamentos de Magnus pareciam estar seguindo por outra linha. Quando o barulho do chuveiro foi ouvido no quarto, ele externou-os.

— Você acha que o Alec pode estar me traindo?

E a pobre Catarina tropeçou no caminho que fazia até a cozinha.

Ela recuperou-se no quase tombo, sentindo vontade de olhar para Magnus como quem diz “O que você bebeu?”, mas se controlou. Continuou andando em direção a cozinha, abrindo a geladeira sem cerimônias e a analisando em busca de algo para comer. Encontrou uma torta de chocolate pela metade, e colocou um pedaço em um prato.

— Por que você está me perguntando isso? — ela indagou, voltando para a sala com um garfo apontado para Magnus.

Não entendia de onde vinham as preocupações de Magnus. Alec ficava das 10h00 até as 18h00 no escritório em que trabalhava, não saía para outros lugares em dias de trabalho, e quando saía no fim de semana, geralmente Magnus ia junto.

— Não sei. Na verdade acabei de pensar nisso. — Confessou Magnus, descruzando as pernas e estendendo os braços no apoio do sofá. Quando Catarina sentou ao seu lado, ele roubou o pedaço de torta e começou a comer.

— Você pensa cada besteira. — Protestou, indignada ao ver sua preciosa torta sumir de suas mãos. Roubou-a de volta, se afastando antes que Magnus tivesse oportunidade de recuperá-la.

— Talvez. — Riu ele, sentindo-se bobo. — Mas estamos muito distantes. Talvez por causa do trabalho. Talvez ele tenha perdido o interesse.

— Talvez. Talvez. — Debochou Catarina.

­— Mas você viu hoje. Alec estava estranho.

Catarina revirou os olhos, comendo um pedaço de torta para evitar ter que responder. Magnus era seguro, experiente, e seus ciúmes não chegavam nem aos pés do que Alec tinha. Às vezes ele dizia que sua filosofia de vida era “Eu confio no meu taco”. Mas, quando botava algo na cabeça, tornava-se um verdadeiro irritante sem noção. Catarina riu, deixando-o confuso. Olhou para o relógio e, sobressaltada, despediu-se dele dizendo que tinha um gato para salvar. Estaria Catarina tendo um novo romance?

**

 Alec saiu do banheiro com uma nuvem de vapor nas costas e esfregando uma toalha no cabelo molhado. Ele se sentia muito melhor agora, a água quente tinha ajudado a relaxá-lo. Vestiu apenas uma calça de moletom e uma camisa de malha, ambas as peças pretas.

Acabou sentando na cama, olhando pro chão em um silêncio reflexivo enquanto pensava no dia que teve. Após ficar ali por alguns minutos, ele estranhou o silêncio em que a casa estava, nenhum som vinha da sala. Levantou-se, e ao chegar lá foi incapaz de esconder a surpresa.

— Catarina já foi embora?

Magnus estava jogado no sofá, com a luz apagada. Ele virou-se levemente para olhar para Alec, o rosto inexpressivo sendo iluminado pela luz que a TV lançava, estava assistindo a um documentário.

— Sim. Ela disse que tinha que ver um gato, ou algo assim.

Alec estava estranhando o tom pouco emotivo do companheiro. Arqueou as sobrancelhas, caminhando até a beira do sofá para poder olhá-lo de cima.

— Aconteceu algo...?

Magnus negou, lançando-lhe um sorriso sem dentes antes de voltar a prestar atenção na televisão. As sobrancelhas de Alec se arquearam ainda mais. Ele considerou o que dizer por um momento, antes de relaxar a expressão. Se Magnus estava com algum problema, ele descobriria.

— O que você acha de irmos jantar fora?

O pescoço de Magnus virou bruscamente quando ele voltou a encarar Alec, o olhar de surpresa era mesclado de dor, enquanto ele acariciava a nuca, arrependido do movimento brusco. Eles se encararam por um segundo, e Magnus enxergou toda a confusão que Alec estava sentindo estampada bem na sua cara. Sentiu vontade de jogar o vaso de flores, que decorava a mesinha ao lado do sofá, na cabeça dele, mas se conteve. Como ele podia agir de forma tão inocente? Como se não soubesse qual era o problema.

— Não precisa, você parece cansado.

Alec apoiou os cotovelos no sofá ao ouvir a resposta, inclinando o corpo e desviando o olhar do outro homem para o documentário com um suspiro pensativo.

— Estou, mas já faz tempo que não fazemos algo juntos.

Magnus sentiu-se amolecer um pouco com aquela declaração, mas tomou cuidado para não demonstrar. Era verdade, os dois andavam ocupados demais com o trabalho e não saíam juntos em um simples programa de casal há tempos. Esquecendo-se de seu pequeno e inexplicado rancor, levantou-se e deu a volta no sofá, caminhando em direção ao quarto, dizendo que teriam de se arrumar logo ou seria muito tarde para sair. Assim, não pode ver o suave sorriso que o de olhos azuis dava atrás de si.

Vinte minutos depois, eles já estavam no elevador. Magnus tinha vestido uma calça jeans preta e um grosso sobretudo de lã roxa, já Alec trajava um sobretudo caramelo. Magnus estivera tão apressado para saírem de casa que nem tinha feito o costumeiro penteado com gel. Seus cabelos caíam em uma cascata escura, e quando Alec estava quase estendendo a mão para acariciá-los, o elevador se abriu e eles saíram para o estacionamento.

O trânsito estava leve naquele dia, então chegaram ao restaurante em pouco tempo, não era um ambiente opulento, porque nenhum dos dois gostava daquele tipo de lugar, mas era aconchegante, com boa iluminação e ligeiramente vazio. Sentaram-se em uma boa mesa, e logo o garçom veio anotar seus pedidos.

— Como foi seu dia?

Enquanto esperavam, Alec lançou a pergunta, os cotovelos sobre a mesa e o queixo apoiado nas mãos. Sempre olhava para Magnus como se ele fosse a coisa mais interessante do mundo, coisa que fazia o Bane se sentir levemente perdido. Ele passou a vida inteira recebendo olhares e estava acostumado com isso, mas era diferente, porque aquele par de jóias azuis o observava com carinho e curiosidade. Alec sempre fazia aquela pergunta, e Magnus se sentia feliz por ter alguém tão interessado no que ele fazia. Sabia que Alec odiava decorações, mas mesmo assim, se Magnus quisesse falar sobre o assunto, ele ouvia.

E ele falou. Falou do cliente irritante que pedira para ele mudar todo um projeto de uma hora para outra, falou de como o dia fora estressante e de como Catarina o ajudara a finalmente concluir o trabalho. Alec prestava atenção, embora vez ou outra fizesse uma cara de confusão para as coisas que ele dizia.

— E o seu dia, como foi?

Magnus observou Alec com cautela, fazendo notas mentais do modo como ele desviou os olhos ao receber a pergunta. Quando ele abriu a boca para responder, o garçom veio trazer seus pedidos. Colocou-os na mesa e se retirou rápido, antes que Alec tivesse oportunidade de agradecer. Ele voltou-se para o companheiro, ligeiramente perdido, para depois se ajeitar na cadeira. Os dois começaram a comer as massas que tinham pedido. Entre uma garfada e outra, Alec respondeu:

— Cansativo —, resumiu, fazendo com que Magnus revirasse os olhos para a resposta. Alec sorriu, já prevendo os pensamentos dele, antes de continuar. — Mas você precisa saber de uma coisa.

Magnus fez esforço para não cuspir o suco de laranja que tomava. Pousou o copo na mesa, e olhou para Alec com a face de indiferença cuidadosamente construída. 

— E o que é?

Agora várias possibilidades estavam rondando a cabeça de Magnus. Talvez Alec fosse revelar seu amor por outra pessoa? Iria confessar que estava traindo Magnus? O que ele precisava saber? Foi difícil manter a expressão composta quando cogitou a possibilidade do fim do relacionamento. Afinal, sabia que não aceitaria aquilo de jeito nenhum.

— Alexander. ­— Magnus estava começando a ficar irritado, porque Alec não disse nada por um tempo, não disse o que Magnus tanto precisava saber. — Sugiro que sejamos totalmente sinceros um com o outro.

Alec ergueu o rosto, surpreso. Ele esteve encarando a jarra cheia de flores que decorava a mesa por um longo tempo, e mal havia notado as perguntas que rondavam a mente de Magnus. Não entendia o objetivo daquela pergunta, porque eles vinham prezando a sinceridade em todos os quase seis anos de relacionamento, não era necessário que aquele tipo de sugestão fosse feita.

— O que quer dizer com isso?

Aquela maneira com que Alec tombava levemente o pescoço quanto não compreendia algo sempre fora considerado algo fofo por Magnus, e naquele momento não foi diferente. Mas também foi somado a um ínfimo sentimento de raiva. Por que Alec simplesmente não entendia? Sempre considerou ele e Alec diferentes, um casal desligado de todas essas “regras” da sociedade em que as pessoas perdiam o interesse ao longo dos anos. Porém, após um lento processo de afastamento entre eles, que tinha começado, talvez, há cinco meses, Magnus começava a achar que tinha sido só mais um tolo.

Eram coisas pequenas. Ele e Alec não saíam mais todo o fim de semana juntos, como costumavam fazer, estavam sempre envoltos na correria do trabalho — o de Alec parecia particularmente absurdo nas últimas semanas —, não conversavam com a mesma frequência e tinham muitas brigas pequenas causadas por um inexplicável ambiente de irritação.

Ele ficou sem responder a pergunta por um longo tempo, e quando finalmente resolveu se pronunciar, já tinham acabado de comer e fechado a conta. Sinceramente, a noite parecia andar de mal a pior. Magnus considerou algumas possibilidades do que dizer, e ele sabia que não tinha muita certeza do que escolheu falar, mas decidiu ser direto, como sempre fora.

— Estou querendo dizer que, se você está me traindo, é melhor dizer logo.

Magnus deixou a voz cuidadosamente neutra enquanto se levantava da cadeira e voltava a vestir o sobretudo, que antes estivera pendurado em seu encosto. Catarina iria, sem dúvidas, matá-lo por dizer tal coisa, sendo que pensara na hipótese no mesmo dia. Ele não tinha fundamentos, não tinha provas, não tinha nenhum motivo concreto para sua desconfiança do companheiro. Mas ele sabia que eles precisavam conversar, e se fosse para resolverem aquilo ou não, que eliminasse de vez as suas dúvidas.

Alec nunca fora daquele jeito, sempre gostou que fizessem programas juntos, de dividir as coisas, ou de mexer no cabelo de Magnus até que ele dormisse. Quando aquilo tinha mudado? Quando tinha perdido a... Magia?

Alec parecia ter perdido o controle sobre sua boca, porque nenhuma palavra saía dela. Ele tinha a resposta perfeita bem em mente “Magnus, eu nunca trairia você!”, mas nada conseguia sair de seus lábios. Ele estava tão perdido, tão confuso com seus próprios pensamentos sobre eles dois, que somente seguiu Magnus pela porta do restaurante, sem dizer uma única palavra. Eles entraram no carro em um silêncio tenso, e Alec odiou cada momento da viagem, porque era como se eles fossem completos estranhos sem nenhum assunto em comum, e Alec tinha tanto, mas tanto para dizer a Magnus...

Felizmente Magnus resolveu assumir o volante, porque Alec duvidava que fosse capaz de prestar atenção no trânsito naquele momento. Ele estava ocupado demais refletindo. Ele tivera um dia estressante no trabalho, mas todo o cansaço sumira para dar lugar a uma desconfortável sensação de alerta. Ele sabia que tinha que fazer alguma coisa, mas que os anjos o ajudassem, ele precisava de pelo menos alguns minutos para entender o que estava acontecendo.

Isabelle tinha jogada uma notícia bombástica para cima dele quando sua mente já estava sobrecarregada, e ele ficara muitíssimo encabulado com a situação toda para ser totalmente atento a tudo. Ele devia ter percebido que Magnus estava muito estranho quando o chamou para vir jantar. Magnus era a personificação da animação, quando as pessoas estavam para baixo, ele vinha conversar com elas. Mesmo que nem sempre desse certo por seu humor sarcástico, que algumas vezes ofendia pessoas mais sensíveis. De qualquer modo, ele devia ter percebido que Magnus não demonstrara a empolgação habitual.

Só que ele nunca, em hipótese alguma, achava que Magnus iria cogitar uma traição.

Alec sempre esteve acostumado a se sentir o ciumento, paranóico e inseguro da relação. Ele simplesmente não estava esperando por uma coisa daquelas. Agora que parava para pensar — no silêncio sepulcral do carro ­—, percebia o afastamento que ele e Magnus tiveram nos últimos meses. Ele encarava aquilo apenas como falta de tempo, mas talvez Magnus que sempre gostava de agitação e emoção tivesse encarado tal distância como falta de interesse.

E isso fazia Alec querer rir, porque ele nunca perderia o interesse em Magnus.

Quando Alec já tinha tido tempo o bastante para pensar, eles entraram no estacionamento do prédio em que moravam. Ficou surpreso, a viagem correra rápida. Quando saíram do carro, Magnus começou a andar antes que tivesse a chance de piscar, e por pouco não largou Alec para trás no elevador.

— Magnus?

Ele chamou, da forma mais cautelosa possível. Não recebeu resposta, somente um olhar do outro para indicar que estava ouvindo. Eles chegaram ao andar certo, saíram e Magnus já abrira a porta do apartamento quando Alec completou:

— Por que você acha que eu estou te traindo?

Ah, Magnus poderia muito bem ter atirado Alec do sétimo andar naquele momento — não, não poderia, mas isso é apenas um detalhe. Como ele odiava aquele dom que Alec tinha de fazer perguntas difíceis! Era sempre assim: quando discutiam, ele aparecia com mil argumentos que deixavam Magnus perdido e irritado. Ele ficava tão louco, que acabava esquecendo o motivo inicial da discussão, perdia a paciência e fazia Alec calar aquela maldita boca. Como? Com sexo. Pois é, julguem Magnus à vontade. Ele não se importava.

— Alexander, há realmente necessidade disso?

Ele estava na cozinha, abrindo a geladeira em busca de água. Colocou-a em um copo e bebeu, tentando se manter calmo e analisando o copo par se distrair. Era um copo bonito, com detalhes em vermelho. Sem dúvidas muito mais seguro de se olhar do que a expressão de pensador que Alec com certeza fazia no momento. Alec já estava lá, é claro, tendo trancado a porta para depois seguir Magnus com afinco até que ele se cansasse de fugir e decidisse ter uma conversa que fizesse sentido.

— É claro que há! Você não pode me dizer uma coisa como essa e esperar que eu simplesmente não queira conversar sobre. — Alec cruzou os braços.

Por um momento Magnus divagou sobre como adorava quando Alec ficava irritado ­— ele achava uma mistura de sexy e gracinha —, com os olhos faiscando, mas ignorou o pensamento para suspirar antes de imitar o gesto. Ficou imaginando se pareceriam muito ridículos a alguém que visse a cena de fora, dois adultos emburrados como crianças do primário discutindo por um brinquedo.

— Tudo bem, eu serei sincero. — Prometeu o Bane, forçando-se a descruzar os braços enquanto colocava o copo vermelho e usado na pia. — Você está diferente comigo e por isso eu pensei nessa possibilidade mais cedo.

Alec resmungou alguma coisa baixinho antes de ficar calado, cogitando o que responder.

— Não acho que esteja tão diferente com você, só temos andado ocupados.

Magnus franziu a testa, desgostoso. Lá vinha ele com aquela conversa fiada de que não havia problemas no mundo e tudo podia ser resolvido com meras palavras. Está certo, Alec não estava sendo agressivo com o que dizia e não parecia irritado por ter sido acusado de traição — Magnus admitia que ficou, nas dúzias de vezes que Alec fez isso com ele, em momentos que ficava corroído de ciúmes. Tampouco parecia culpado, então Magnus resolveu tentar ouvir o que ele falava.

­— Sei que estamos trabalhando muito, Alec, mas estamos tão distantes mesmo com essa explicação... Fico me perguntando se o relacionamento se tornou desgastado.

 — Desgastado? Magnus, nós estamos juntos há quase seis anos, é claro que passamos e passaremos por crises!

Seguiu-se uma discussão cheia de frases rápidas em que ambos manifestavam sua teimosia e contrariedade ao que o outro dizia. Pois é, eles eram muito diferentes, não se entendiam sempre. Não tinham a mesma cor preferida e não gostavam do mesmo tipo de programa de TV. Não acredite em tudo que assiste em filmes de romance. Discutiam mesmo, pelas coisas mais bobas. Mas eles nunca tinham ficado inclinados a sair pela porta e nunca mais voltar. Seis anos passam rápido, mas nenhum dos dois tinha arrependimentos quanto àquele casamento.

— Magnus ­­­—, chamou Alec naquele tom resoluto de quem exigia que prestassem atenção. — Olha só. Não estou te traindo e nem nunca estarei. Eu sei que estou sendo uma péssima companhia, então por que você não me diz no que eu preciso melhorar?!

Aquilo deixou Magnus estupefato. Alec parecia meio irritado, meio confuso, meio cansado. Ele sabia tanto quanto Magnus que não chegariam a nada se continuassem a discutir coisas inúteis. O problema de discutir racionalmente era que Magnus não tinha muito o que dizer e ele odiava aquela sensação de causa perdida. Numa última tentativa, falou:

— Não sei. Veja, por exemplo, quando você chegou hoje e nem me deu um beijo... Isso não foi agradável, acho que devíamos ter mais cuidado com esse ti...

— Pelo amor de Deus! — Alec interrompeu, arregalando os olhos como se tivesse acabado de descobrir que ETs existem. — Você está me dizendo que isso tudo foi por que eu não beijei você quando cheguei?

— Claro que não! — Era sim. — Não é tudo resumido a is...

Certo. Daquela vez era Alec que parecia irritado com os argumentos de Magnus, porque o fez parar rapidinho. Ele deu-lhe aquele tipo de beijo brusco, de quando as pessoas estão meio irritadas umas com as outras e não estão muito para carinho. Não que Magnus estivesse reclamando, porque ele também estava irritado. Foi um bom meio de descontar um pouco de toda aquela tensão.

— Isabelle me disse que Jace pediu a Clary em casamento.

Alec contou quando se afastaram, fazendo Magnus ficar meio perdido com o rumo da conversa. Antes que pudesse se manifestar, o Lightwood continuou:

— Eu fiquei muito chateado porque o Jace não me disse, ele foi a primeira pessoa para que contei quando você pediu pra casar comigo. Izzy disse que ele pediu ontem e não teve tempo, e que ela só soube porque ficou mexendo no celular da Clary. Eu já estava estressado do trabalho, e isso só piorou. Era isso que eu ia te contar no restaurante.

Magnus inclinou a cabeça para o lado, pensando. Ele já estava acostumado ao quanto Alec e Jace eram próximos — no começo se sentia meio incomodado ­—, e sabia que ele considerava importante ser informado sobre esse tipo de coisa. Ele também teria ficado chateado no lugar de Alec, não poderia culpá-lo para não ter cabeça para cumprimentos ou não-ser-um-maldito-insensível. Antes que pudesse perceber, Alec estava perdoado. Perdoado por terem se afastado, por estarem brigando muito, pela acusação sem sentido que fez. E ele soube, ao olhar nos olhos azuis, que estava perdoado também.

Eles falaram sobre o assunto por alguns minutos, dizendo que já estavam esperando por algo do tipo, já que Clary e Jace estavam juntos há muito tempo e já até moravam juntos. Conversaram como não conversavam há meses, dividindo coisas e rindo de vez em quando.

 Magnus sempre soube que relacionamentos eram complexos, até porque antes de conhecer Alec tinha pânico de se envolver muito com alguém. Ele sempre soube que não seria tudo perfeito, que haveria dificuldades. Mas ao passar do tempo, ele descobriu que valia muito a pena, com as pequenas atitudes, com o sentimento de sempre ter alguém com quem contar, com o companheirismo. Naquele momento ele decidiu que, se um dia achassem que estava faltando magia, ele daria um jeito. Ele se esforçaria para não deixar acabar, honrando a promessa que fizeram de estar sempre juntos.

— De qualquer jeito, eu já superei isso. Vou dar uma bronca em Jace depois. Agora tenho que me desculpar com você por cometer o imperdoável crime de não te encher de beijos.

Ninguém poderia negar que Alexander Lightwood era um homem honrado que cumpria com sua palavra. Quem disse que sexo de reconciliação era o melhor, sem dúvidas foi um gênio. Naquela noite, Magnus dormiria satisfeito, com Alec acariciando seus cabelos como sempre fizera até que pegasse no sono.

Ele deixaria para ficar curioso sobre esse tal de gato de Catarina no dia seguinte. Também para resolver os assuntos do trabalho... Para perguntar a Clary se podia ajudar na organização do casamento... Para brigar com Jace por deixar Alec chateado...

— Boa noite, Magnus.

Alec depositou um suave beijo em seus cabelos, sem parar de acariciá-los. Magnus já estava imerso demais em sonolência para responder. Apenas deixou-se levar, embalado nos braços do homem que escolhera para dividir uma vida.


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Notas finais do capítulo

Erros? Avisem.

Pesquisei sobre Advocacia, mas não achei nada útil, então perdão se houver algo errado no pouco que falei sobre a profissão do Alec. Se algo na cronologia não estiver correto, me avisem, porque como eu mudei muito isso enquanto ia escrevendo o capítulo, algumas informações podem não bater, como: idades, términos de faculdades, etc.
Esse capítulo foi mais pra mostrar que na convivência de anos nem tudo são flores, e eu achei que os Malec ficaram um pouco fora de suas personalidades, mas escrever sobre sentimentos masculinos ainda é difícil para mim, ainda mais quando envolve um relacionamento tão longo. Acho que dei uma enrolada e ficou desnecessariamente grande, mas no geral eu gostei.

Beijos e até mais ♥