Angelina & Lúcifer escrita por brunna


Capítulo 3
Maldição II




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Lúcifer desatou o nó que prendia a corda ao pescoço da menina. Ela estava com o rosto sujo e sua blusa se camuflava no chão encardido
Ele a ergueu pelos braços e a sentou em um amontoado de caixas vazias
— Está tudo bem?
A menina tossiu e limpou a garganta. Ela parecia péssima, bem diferente de como Lúcifer a havia conhecido.
— Você me seguiu? — perguntou com dificuldade.
— Sério? — Lúcifer a olhou incrédulo.— Você estava caída embaixo de caixas sujas presa com uma corda velha e tudo o que diz é isso?
— Isso não tem nada a ver com você.
— Você tem razão, vou chamar a polícia.— Lúcifer retirou o celular do bolso.
— Não! — A garota olhou diretamente nos olhos claros de Lúcifer.— Por favor, não faça isso.
— Por quê? — Ele guardou o celular na mochila.
— É uma longa história... — Lina tossiu violentamente.
— Você precisa de ajuda?
— Eu não preciso — sussurrou a garota.— Quem fez isso não fez por mal.
— Ele é seu namorado?
— Namorado? — Ela sorriu depois voltou a tossir.
— Você precisa de ajuda.
— Não, eu estou bem — disse.— Preciso ir para casa antes que minha avó perceba...
— Vai contar para ela, não?
— Ela é quem menos deve saber — disse Angelina.
— Não vai dar para disfarçar bem.— Lúcifer olhou para a blusa completamente manchada da garota.
— Ah, meu Deus…
Lúcifer estremeceu ao escutar essas palavras. Em sua casa, Deus nunca era citado. Nunca.
Sua mente trabalhava de um modo estranho. Ele parecia querer ajudar a garota.
— Eu posso ajudar — disse Lúcifer.— Eu tenho um moletom, se você quiser usar…
— Ah, graças a Deus!
— Graças a mim — corrigiu Lúcifer estendendo a peça de roupa.
— Você entendeu o que eu quis dizer.
A garota vestiu facilmente o moletom, que ficou absurdamente grande. O calor seria mil vezes pior para ela. Mas, claramente, essa não era sua preocupação.
— Seu cabelo está um pouquinho sujo— disse Lúcifer.
Ela passou a mão pelos cachos. A camada de poeira prendeu-se nos dedos magros da menina enquanto o cabelo estava agora visualmente limpo.
— Eu devolvo seu moletom amanhã, tudo bem?
— Pode devolver quando puder — disse Lúcifer educadamente.
— Obrigada… Eu nem sei o seu nome.
— Não gostaria de saber.
— Bem, você deveria saber o meu.— A garota estendeu a mão. — Angelina, mas pode me chamar de Lina. Meu nome é grande demais para alguém tão pequeno então...
— Eu acho que seu nome é pequeno demais para alguém tão… teimoso— disse Lúcifer.— Mas também acho que você deveria contar para alguém. Isso não pode continuar para sempre. Você já imaginou o que aconteceria se ninguém a encontrasse? Você estaria amarrada embaixo de caixas... servindo de banheiro para os ratos.—Ele torceu o nariz.— Eu sei que eu deveria contar, mas você não entende… E Deus vai sempre me proteger.— Um pingo de suor descia a testa de Angelina. Moletom preto não é bem uma boa opção para um dia de calor.
— Me dê seu celular — pediu Lúcifer.
Angelina o fez.
— Aqui está meu número, com meu nome. Só veja quando chegar em casa e se ainda quiser falar comigo depois disso, eu gostaria de ser seu amigo.
Angelina sorriu.
— Claro que eu vou querer falar com você — disse Angelina. — Eu prometo…
— Não prometa — falou Lúcifer.— Enfim, vá logo antes que você derreta de tanto suar.
— É...bem...eu já vou — falou Angelina.— Obrigada por tudo.
— Até mais ver — falou Lúcifer.
— Se Deus quiser.
E, de fato, Deus não queria.

Quando Angelina chegou em casa, sua avó estava na cozinha. Ela foi diretamente para o banheiro e tomou um banho e lavou o cabelo.
Já estava no quarto quando decidiu ligar para o garoto.
Ela o achara lindo. Tinha olhos acinzentados, cabelos louros e um sorriso maravilhoso. Angelina não conseguia tirar da cabeça que ele a salvara e fora educado com ela.
Todos os garotos da igreja eram machistas. Aliás, a bíblia prega o machismo. Não algo que Angelina aceitava e ela lutava contra esse pensamento pecaminoso todo o santo dia.
Mas não podia esconder para si mesma que estava dolorida. Pedro havia desferido um murro em sua barriga. Não foi muito forte, ele nunca foi forte. Ela podia bater nele se quisesse...

Massageando a barriga com a mão esquerda, procurou um contato novo no celular. Avistou o nome.
Ela não havia pensado em supostos motivos para aquele garoto não desejar ter o nome revelado. Passou por sua mente ele ser o anjo da guarda dela.
Mas depois de achar o novo número registrado no celular, esse pensamento foi por água abaixo.
Lúcifer.
Claro que ela sabia quem ele era. Uma pessoa com esse nome evidentemente não passa despercebida. Ele era o Lúcifer que a cidade tanto temia. Filho dos fundadores da Casa de Adoração ao Satanás.
Angelina quis vomitar. Ela quase prometera que iria falar com ele novamente. Mas agora ela não queria.
A dor na sua barria foi maior e ela só teve uns segundos para vomitar na lata de lixo.
— Deus, eu sei que mereço castigo — murmurou Angelina. — Mas me perdoe…
Angelina deitou-se sobre a cama. Tinha de tomar uma decisão. Ela sabia que não há nada de errado em andar entre os pecadores, pois foi o que Jesus fez. Mas sabia também que más companhias estragam hábitos úteis.
E Jesus consertava quem um dia foi mau...O que ela podia fazer com relação a quem servia ao Satanás?

Lúcifer sabia que seu celular não ia tocar. Ele errou. Errou em dizer seu nome. Ele só queria ter a oportunidade de mostrar quem era.
Angelina era quem ocupava seus pensamentos. Se eles se esbarrassem, será que ela o ignoraria?
Isso não o incomodava...talvez. Ele podia só esquecer tudo. Afinal, nunca gostou daquele agasalho mesmo.
Tentou dormi. Realmente tentou. Mas seu inconsciente não havia desistido. Ele ainda esperava a ligação.
E ela chegou.
Mas não era a Angelina.
Por que seria?
Ele nem mesmo atendeu.
Quando a noite chegou, seus pais saíram. Ele resolveu sair só também e acabou voltando para o lugar onde conheceu Lina. Será que voltaria a vê-la?

Ficou lá durante horas, apenas olhando para o céu com poucas estrelas e escutando o murmúrio do vento e das poucas pessoas a perambular.
— Angelina, viemos te buscar, meu amor.
A voz nojenta e sarcástica ecoou onde o escuro dominava. Lúcifer conseguiu distinguir dois garotos que uma vez vira de terno e gravata.
— Vocês só iriam desamarrar ela agora? — perguntou Lúcifer.
— Quem está aí? —perguntou um dos meninos.
— Não importa! — respondeu Lúcifer.— Eu vi o que fizeram com a garota.
— Ninguém se importa — cuspiu um dos meninos. — A gente faz o que quiser com ela.
Lúcifer ignorou.
— Espere só amanhã... Ela vai se dar mal. Vai querer bancar o herói de novo?
E então, ambos correram.
Já era madrugada quando Lúcifer voltou para casa.
Nenhuma ligação.
Desapontado, tomou um banho e arriscou comer alguma coisa. Nada que o fizesse melhor.
Ele queria poder defender Angelina uma segunda vez, mas era só vontade de vê-la.
Vontade que vinha de onde? Isso ele não sabia.
Depois de almoçar, resolveu dar uma saída. Comprou um sorvete de chocolate e seguiu para o mesmo lugar onde conheceu Angelina. Esperou lá como se ela fosse aparecer.
Mas nada dela vir.
Então ele foi para casa, comeu e dormiu.
Ele nunca gostou daquele moletom mesmo.
Até que seu celular tocou. Ele acordou assustado colocando o aparelho no ouvido.
— Lúcifer?


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