Kage no Hikari escrita por M san


Capítulo 1
A menina de cabelos vermelhos


Notas iniciais do capítulo

Hatake Kakashi
12 anos
Terceira Grande Guerra Ninja



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Guerras são sempre políticas. Tudo é sempre política. Se um Estado é definido por povo, território e soberania, a guerra é vista, em uma frequência maior do que a desejada, como o único meio para manter esses três aspectos protegidos. Outras vezes, o conflito é encarado como vital em uma necessidade, justificada ou não, de expansão territorial. Oficialmente, argumentar-se-ia uma ameaça à população, uma batalha por um bem maior. Na prática, animais lutam por território. Humanos são animais. Silogismo básico. E foi assim que se construiu o motivo que seria listado nos livros de história como o causador da Terceira Guerra Ninja: a expansão territorial.

Para Kakashi, entretanto, o que levara à guerra era o menos importante naquele momento. Ir à batalha era quase um cano de escape se comparado à sua realidade fora dela. A adrenalina de correr em direção a uma possível morte colocava sua vida em perspectiva e dava ao garoto a razão que ele repetia a si mesmo, toda manhã, para continuar vivendo – proteger a vila. Lutar por Konoha era lutar por seus amigos. Seus poucos amigos. A qualquer outra pessoa, shinobi ou não, ouvir de uma criança de doze anos tanta amargura e desilusão em relação à própria vida poderia soar pesado e desolador. Mas para o menino era a verdade sem disfarces. Ele aprendera a conviver com ela. Mais que isso: sobreviver a ela.

O jovem ninja fitou as costas do sensei à sua frente e manteve o passo. Olhou por cima do ombro e viu que Rin e Obito o acompanhavam atentos. A missão daquele dia era simples se comparada a outras que já tivera, mas não menos arriscada. Deveriam reabastecer belicamente as forças de Konoha no campo de batalha. Os inimigos poderiam se sentir tentados a atacá-los, numa tentativa de não apenas enfraquecer o poder bélico das tropas da Vila da Folha, mas também de aumentar o próprio. Assim, a atenção, essencial em qualquer missão ninja, assumira um papel ainda mais fundamental naquela. Não houvera espaço para conversar ou fazer uma pausa para descanso desde que deixaram a aldeia há horas, algo que para Kakashi seria até bem-vindo, caso Rin não estivesse com eles. Às vezes preocupava-se que ela se cansasse mais do que o necessário. Era uma médica-nin, afinal, e não uma soldado.

Contudo, não cabia a ele decidir se parariam ou não. Não era o capitão ali. Minato-sensei o era. E sua confiança no homem era maior do que a que tinha nele mesmo. Ele não os colocaria em uma situação de risco desnecessário, o que para Kakashi era o mesmo que Rin não estaria numa situação de risco. Confiava no sensei, não havia motivos para se preocupar.

Os quatro continuaram a viagem por mais algumas horas até alcançarem as tropas além da fronteira noroeste, já no território inimigo. Deveriam ir em encontro à centena de soldados enviados dois dias antes para impedir o avanço de Iwagakure e o consequente recuo de Konoha. Mas um baque atingiu o estômago de Kakashi antes que seu cérebro pudesse, de fato, entender o que acontecera ali. Parecia um campo de terra arrasada. As cabanas montadas que serviriam de abrigo aos ninjas e de hospital de campanha jaziam em cinzas pela extensão do vale que se abria diante dos olhos do garoto. O cheiro de carne queimada invadia suas narinas misturando-se ao odor de ferro e, principalmente, morte. Corpos espalhavam-se cobertos por lençóis sujos em fileiras cuidadosamente montadas afastadas do acampamento. Já neste, dezenas de feridos eram atendidos às pressas por médicos-nin exaustos. Somados, os sobreviventes não chegavam a trinta. Kakashi travou a mandíbula à medida que compreensão o alcançava. Konoha estava perdendo a guerra.

— O que aconteceu aqui, Minato-sensei? – Kakashi ouviu Obito perguntar ao mestre, a voz falhando. Era meio óbvio o que acontecera. Pergunta desnecessária, pensou o Hatake nervoso, mas não verbalizou. Não fazia ideia do que fazer, ou do que falar.

— Vamos – ordenou Minato, sem responder à pergunta do aluno. Kakashi, Rin e Obito o seguiram, entrando no que só poderia ser descrito como pesadelo. Agora em meio ao caos que era o acampamento, Kakashi percebeu que a visão que tivera de cima era uma maquiagem da realidade. A dor ali era mortalmente mais profunda.

O garoto sentiu Rin mover-se ao seu lado e, por instinto, impediu seu caminho. Atrás dela, Obito fez o mesmo, mantendo-a entre os dois. Ela cuidava deles e eles dela. Raciocínio fácil, simples, quase infantil. Não a permitiria se afastar deles em meio a uma guerra, num campo de batalha. E se houvesse um ataque surpresa? Como teria certeza de sua segurança? Ficariam próximos e a tiraria dali assim que cumprissem a missão e reabastecessem belicamente o que restou da tropa. Era essa a única intenção de Kakashi naquele momento e, olhando para Obito, ele viu, estampado no rosto do companheiro, que, como em raras vezes, os dois concordavam.

— Você fica perto da gente, Rin – falou Obito, forçando um sorriso e segurando a mão da garota.

— Eu fiz um juramento, Obito – respondeu a menina, pousando a mão livre sobre a do companheiro que a segurava, a voz meiga de sempre decorando a teimosia de quem, desta vez, agiria por conta própria – tudo bem. Não precisa se preocupar...

— Pode haver outro ataque, é melhor você ficar com a gente – argumentou Kakashi, sério. Não tinham tempo para discutir – Minato-sensei...

— Faça seu trabalho, Rin – apoiou Minato, chocando Kakashi, mas, mais ainda, Obito – Pode ir – ele permitiu, ordenando em um aceno que Obito soltasse a menina.

— Minato-sensei! – exclamou o Uchiha, desesperado – Você ...

— Vá com ela, Obito – ordenou Minato – Se começar um ataque, leve-a para longe e nos espere. Você sabe, ninjas médicos não lutam... Então, ajude os outros a se afastarem também.

Kakashi queria argumentar contra. Obito era um completo incompetente, era imprudente confiar a ele a vida de Rin. Contudo, quando abriu a boca para fazê-lo, os dois companheiros já estavam longe, percorrendo o labirinto de destruição do que sobrou do acampamento. Ele voltou-se ao sensei, as sobrancelhas franzidas em desaprovação, esperando uma justificativa para tamanha irresponsabilidade. Mas não recebeu. Em seu lugar, viu apenas o mestre suspirar desolado e voltar-se ao caminho que percorriam minutos antes, a tristeza aumentando em seus olhos azuis a cada centímetro de destruição que encarava.

— Você também já percebeu, né, Kakashi? – perguntou Minato, sem desviar o olhar do caos ao seu redor – Que estamos perdendo a guerra?

— Hum... – confirmou Kakashi, sentindo o peso do que aquilo significava atingi-lo ao exteriorizá-lo.

— Mandar esse batalhão pra cá foi imprudente... Estamos longe da vila, num território que eles têm a vantagem, sem possibilidade de mandar apoio a tempo de, de fato, ajudar, caso seja preciso.

— Então, por quê? – perguntou Kakashi, olhando o sensei de lado. Poucas vezes o vira tão profundamente triste.

— É, né? – suspirou Minato, enquanto indicava uma das poucas cabanas ainda de pé ao aluno – Por quê?

Kakashi engoliu em seco e controlou-se. Queria insistir que o sensei lhe desse uma resposta válida. Ele sabia que Minato a tinha. Mas não o fez. Deveria respeitar a hierarquia. Se Minato não queria lhe contar, então era porque não precisava saber. O garoto seguiu o sensei até a cabana indicada e, após vê-lo entrar, imitou-o. Encontrou lá dentro o que já esperava encontrar. Nada. Havia apenas um jonin com faixas ensanguentadas envolvendo o lado esquerdo de seu rosto sentado sobre os pés, riscando um pergaminho velho apoiado sobre um caixote. O homem levantou o rosto assim que percebeu a chegada dos visitantes e, na parte que ainda era possível de se ver de sua face, exibiu um sorriso. Kakashi percebeu que nos olhos verdes, destacados da pele morena e machucada, havia um certo alívio em vê-los. Ou melhor, em ver o Raio Dourado de Konoha.

— Minato-san! – exclamou o homem, secando o suor da careca reluzente com um lenço sujo, a voz rouca e grave preenchendo a cabana – Que bom vê-lo bem...

— Shuuji-san – cumprimentou Minato, curvando-se levemente – Trouxe o carregamento de armas solicitado...

— Ah, obrigado – agradeceu Shuuji, acenando – Sente-se, sente-se. Esse é um de seus discípulos, suponho? Deixe-me adivinhar... Com esse cabelo, deve ser o filho do velho Sakumo! Acertei?

Kakashi não confirmou ou negou. Sentia vergonha ao ser associado ao pai. Além disso, não sabia se gostava ou não do homem à sua frente. Parecia animado demais e anfitrião demais, mesmo que dezenas de corpos jazessem do lado de fora da cabana. Que tipo de líder esquece tão rapidamente a dor de perder dois terços de seus companheiros em uma batalha? Concordava que a missão era mais importante, mas isso não tirava a necessidade de luto e respeito a quem morre tentando cumpri-la.

— Hatake Kakashi – respondeu Minato pelo garoto, que fez uma leve reverência, mantendo-se de pé enquanto o sensei sentava – Quando aconteceu o ataque?

— Ontem à noite... – respondeu o homem, assumindo o tom sério que a situação pedia. Kakashi sentiu-se mais aliviado diante da nova postura de Shuuji – Um massacre. Fomos pegos de surpresa, centenas de flechas com pergaminhos explosivos nas pontas. No primeiro ataque, já perdemos dezenas de homens. Não os vimos se aproximarem... Estaríamos todos mortos se não fosse por Sumire-san e a neta dela.

— Sumire-san foi tirada da aposentadoria? – perguntou Minato, surpreso. Kakashi não pode se dizer surpreso. Teria que saber quem era Sumire-san para ficar surpreso.

— Sim, há meses. Depois que o genro morreu em batalha, ela assumiu o posto dele. Aquela velha ainda dá mais trabalho do que metade desses moleques da Anbu... – riu-se Shuuji, tomando um gole do cantil antes preso à cintura – Deve ter causado aos de lá tanta perda quanto eles causaram a nós.

— Estamos esperando outro ataque? – quis saber Minato, sem a disposição do capitão à sua frente em relaxar.

— Ah, mas é claro – disse o homem, enfatizando a resposta com um aceno – Já enviei ao Sandaime um pedido por reforços. O pássaro deve ter passado por cima de vocês enquanto vinham. O problema é se eles atacarem antes do reforço chegar.

— Não há ninjas em Konoha para serem enviados, Shuuji-san – informou o sensei, sério – Temos na vila apenas o suficiente para a segurança dela mesma. Tsunade-sama e Orochimaru-sama partiram ontem em missão. Jiraya-sensei está infiltrado. Não podemos sacar um shinobi sequer.

Shuuji não respondeu. Kakashi o viu fitar Minato à sua frente por alguns segundos, como se precisasse daquele tempo para compreender a situação. O homem ergueu novamente o cantil e o virou de gole. Ele deu um suspiro longo após terminar a bebida e, baseado no cheiro que invadiu o lugar, o garoto desconfiou que não havia água dentro do recipiente. Pelo menos aquilo explicava a postura do homem, apesar de torná-lo ainda mais irresponsável aos olhos do Hatake. Então, o menino decidiu: não gostava do capitão.

— Vocês voltarão de imediato à vila? – perguntou Shuuji à Minato, enquanto fechava o cantil distraidamente e voltava a prendê-lo em sua cintura.

— Ah, não. Vamos pernoitar aqui...  – respondeu Minato, observando o homem com a desconfiança que um capitão bêbado merece – Amanhã meus alunos voltarão. Eu ficarei até Konoha ser capaz de enviar reforços.

Houve um instante de silêncio. Shuuji, que se concentrava em amarrar seu cantil de volta ao cinto, levantou os olhos surpreso. O próprio Kakashi o imitou ao encarar o sensei. Como assim Minato ficaria e eles voltariam? O time tinha outras missões a realizar e, mesmo sendo chunnin, Kakashi não poderia liderá-los nas que fossem rank A ou B. Se não dava para ganhar, o correto seria recuar, e não ficar lá para morrer junto. A missão do sensei não era aquela.

— Minato-sensei... – começou Kakashi, mas Minato o interrompeu:

— Kakashi, você liderará o time de volta à Konoha. Conte ao Sandaime a situação desse batalhão. Não volte sem reforços, ouviu?

Kakashi travou. Queria argumentar ao sensei que deveriam recuar, estavam em território inimigo, o próprio Minato era contra aquilo. Não fazia sentido em manter uma missão suicida. Mas não conseguiu. Ninja que era, só coube a ele concordar.          

 

 

Não sendo médico, havia muito pouco que Kakashi pudesse fazer ao acampamento. Ajudara a reerguer uma dúzia de cabanas e organizara, em um trabalho que teria sido algumas dezenas de vezes mais fácil sem a ajuda de Obito, a distribuição das armas que o time Minato trouxera para a tropa. Sentira algo estranho na barriga enquanto dividia as kunais e shurikens entre os ninjas sobreviventes. Era muita arma para pouco shinobi. Um indício triste do massacre que ocorrera ali.

Outro sinal angustiante da matança da noite anterior era o temor crescente na atmosfera do lugar, cuja concentração apenas aumentava à medida que o breu noturno vencia a luz do Sol. Até a Lua resolvera atrapalhar, sendo minguante quando todos desejavam-na cheia. Kakashi não estranharia caso o local amanhecesse entregue às moscas, consequência de uma deserção em massa. A cada face que encarava, cada olhar que cruzava com o seu, aumentava sua certeza de que aqueles ninjas cogitavam a humilhação de serem presos e taxados por covardes como uma saída válida à morte quase certa. Não verbalizava, sequer demonstrava facialmente, treinado que fora para não o fazer, mas os culpava intimamente. A missão era o mais importante. Mesmo uma missão sem sentido, como aquela, ainda importava mais do que os medos pessoais. No jogo de xadrez que era uma guerra, cada movimento que o enxadrista - ou Hokage - fazia tinha papel fundamental, mesmo que os peões - ou shinobis - não entendessem. Ande uma casa à frente e ofereça sua cabeça ao bispo adversário. Feito!

Por isso, ficar em meio aos sobreviventes provou-se um tipo de tortura psicológica a Kakashi. Vê-los tremerem era como um bilhete pregado em sua testa, pronto para lhe lembrar da covardia de seu pai. A cada flash de medo que transpassava o olhar de um daqueles ninjas, o garoto se lembrava da fraqueza de Sakumo ao tirar sua própria vida para não mais encarar os efeitos de suas decisões. E, então, o garoto sentia-se mal. Envergonhado. Pegava-se ainda mais solitário, encarando a realidade de que na noite anterior, ali mesmo, sobre aquela grama queimada em que pisava, muitos pais fizeram de suas crianças em Konoha órfãs. Da mesma forma que um dia seu pai fizera dele. E, com uma amargura que em nada combinava a um menino de doze anos, ele tentava, inutilmente, afastar o pensamento que mais lhe doía. O de que pelo menos aquelas crianças sentiriam orgulho de seus pais.

Kakashi levantou o rosto ao céu já em completo breu e permitiu-se observar as estrelas por um momento. Não estava de fato interessado naqueles pontinhos de luz e nas formas esquisitas que eles poderiam desenhar. Queria apenas uma distração. Manteve os olhos fixos no universo que a ele se abria por longos minutos, contando as luzinhas, tentando manter sua cabeça vazia. Perdera as contas e recomeçara do zero algumas vezes antes de ouvir passos estabanados se aproximarem dele numa discrição completamente oposta a qual um shinobi deveria assumir. Não precisou olhar para saber quem era.

— Por que você aqui? - ele ouviu Obito perguntar impaciente, enquanto se sentava ao seu lado - A Rin tava doida querendo saber onde você tava, seu panaca!

— Era só ter perguntado ao Minato-sensei. Eu avisei que ficaria de guarda por aqui - respondeu Kakashi, mal-humorado. Inventara de ficar de guarda justamente para ficar sozinho por um tempo e agora teria que aturar a tagarelice de Obito

— Eu não nem aí pra onde você tá… Só vim porque a Rin tava preocupada - desdenhou Obito. Kakashi deixou o assunto morrer. Quem sabe, pensou ele pouco esperançoso, se não desse margem a uma conversa, o companheiro iria embora, deixando-o sozinho novamente? Mesmo se essa hipótese se mostrasse errada, o máximo que poderia acontecer era Obito permanecer ali. Não custava tentar. Até porque Kakashi não tinha vontade alguma de manter uma conversa.

Contudo, esperar que o Uchiha ficasse quieto por mais de cinco minutos era o mesmo que esperar que uma explosão solar destruísse a terra: poderia acontecer, apostas eram feitas nisso, mas não nessa vida. Assim, findados cinco minutos cravados de silêncio, Obito voltou a falar:

— Não é estranho que um batalhão tenha sido derrotado tão facilmente? - indagou o garoto, ajeitando os óculos sobre o nariz - Quero dizer, como dois terços de uma tropa morrem em uma noite? São ninjas de Konoha no fi…

— Foram pegos de surpresa - interrompeu Kakashi, achando que dar logo a resposta ao amigo era mais fácil do que deixá-lo viajar em suposições - Flechas com selos explosivos nas pontas.

— Como cem ninjas são pegos de surpresa? Ninguém viu os caras se aproximando? - rebateu Obito, incrédulo. Kakashi suspirou. Talvez tê-lo deixado viajando tivesse sido a melhor opção.

— Estamos no território deles… Quero dizer, o País da Grama não é deles, mas ele o conhecem melhor. E ainda armamos acampamento no pior lugar possível, com essas colinas à frente para escondê-los… Desde o início, observando as condições da tropa, um massacre sempre foi o mais provável…

— Então por que ficaram? - exasperou-se Obito, virando-se para encarar Kakashi - Pra que ficar aqui, esperando a própria morte, a de seus companheiros? Por que não mudaram o plano…?

— Porque o Hokage deu essa missão. A missão é o mais importante - respondeu Kakashi, já sabendo que o amigo iria discordar - É como no shogi¹... Cada movimento tem sua importância. Se um movimento não é feito, você arrisca perder. A diferença é que no shogi você não coloca a vida de uma vila inteira em perigo. Aqui sim…

Kakashi viu Obito abrir a boca para argumentar e, em seguida, fechá-la sem emitir som algum. O Hatake voltou os olhos ao céu acima de si e, disposto a limpar sua mente, tornou a contar estrelas. Não havia nada que pudesse fazer sobre a guerra, ou sobre todas aquelas mortes justificadas por argumentos tão fracos. Proteger a vila. Os shinobis que morriam todo dia também eram de Konoha! Quem protegia eles?

— Guerra estúpida... - xingou Obito, depois de minutos em silêncio, trazendo Kakashi de volta das estrelas - Eu nem lembro mais como é viver sem guerra.

Nem eu, Kakashi quis responder, mas não o fez. Manteve-se calado, o olhar fixo em algum ponto perdido na escuridão à sua frente. Ele mesmo estava perdido de si. Talvez, pensou ele melancólico, se procurasse em pontos perdidos, pudesse se encontrar. Obviamente, procurar na guerra, como fizera ultimamente, não estava sendo uma boa alternativa.

As horas avançaram lentamente pela noite até atingirem a madrugada sem alarde algum. Obito, que interrompera o silêncio de minutos em minutos comentando inutilezas como o formato da grama ou a brisa fria, desistira há tempos de interagir com Kakashi e entregara-se, sem culpa, ao sono. Dormia como deveria um inocente - algo que, de fato, ele era. Calmo, profundo, tranquilo. Kakashi o invejava. Não sabia o que era dormir daquele jeito.

O Hatake, por sua vez, mantinha os olhos presos ao horizonte. Estava de guarda afinal. Por mais que quisesse se entregar ao sono, ou contar estrelas e esvaziar sua mente, não podia. Sentia-se levemente culpado por sua desatenção horas atrás, durante os momentos que dedicara a si mesmo e não ao trabalho. E se, enquanto pensava na vida, deixasse passar algum perigo ao acampamento? Não se perdoaria. Por isso, agora, mantinha cem por cento de sua atenção na vigília.

Kakashi estava sentado, com as pernas cruzadas uma sobre a outra, atento a qualquer ruído, qualquer movimento, quando seu coração acelerou. De trás da colina que margeava o acampamento, o garoto viu um grupo de pássaros levantar voo de supetão, em desordem, como se fugissem de algo. Poderia ser um predador, ele sabia. Mas não queria arriscar. Discretamente, o menino cutucou o amigo que dormia ao seu lado, acordando-o ao mesmo tempo em que tapava sua boca com a mão. Conhecia Obito. Acordá-lo era pedir por um palavrão. O Hatake viu os olhos do amigo se esbugalharem em dúvida e, o mais disfarçadamente que pode, indicou que deveriam voltar às tendas. Para seu alívio, o Uchiha o compreendeu.

Os dois levantaram-se como se estivessem, apenas, findando um turno e, calmamente, caminharam de volta ao acampamento. Já haviam cruzado as primeiras barracas quando aceleraram o passo e, correndo, foram até as tendas médicas, onde encontrariam Minato guardando os médicos-nin. A vantagem de ter o Relâmpago Dourado de Konoha como sensei era, justamente, o dourado. Encontrá-lo dentre outros shinobis era fácil, uma vez que seus cabelos amarelos se destacavam em meio a qualquer grupo da vila. Assim, mal adentraram a seção médica, os dois visualizaram o sensei ajudando Rin a colocar um ferido sentado sobre um tapete, a fim de liberar a maca.

— Você foi procurar o Kakashi e ao invés de voltar e me dizer se ele tava bem, ficou por lá pra aumentar minha preocupação, né, Obito? - ralhou Rin, meio brava, meio rindo, quando os dois a alcançaram - Se não fosse o Minato-sensei, ainda acharia que vocês es…

— Desculpa, Rin - pediu Kakashi, apressado - Não temos tempo. Sensei, acho que tem alguma coisa se aproximando.

Minato parou na metade de seu movimento em sentar o paciente e fitou Kakashi, surpreso. Por um segundo, o sensei deixou seu olhar vagar pelos rostos de seus dois pupilos parados ofegantes à sua frente, mas se recompôs. Rapidamente, terminou de acomodar o homem sobre o tapete e deixou a tenda, seguido pelo seu time.

— O que você viu, Kakashi? - perguntou Minato, quase correndo até a barraca do capitão da tropa.

— Um bando de pássaros voando desordenados à oeste… - respondeu o menino que, ao verbalizar, achou seu motivo muito fraco. Deveria ter verificado antes.

— Só isso? - reclamou Obito, escandaloso - Você chamou o sensei por causa de passarinhos?

— Eles voaram por um motivo! - defendeu-se Kakashi, achando-se ainda mais idiota uma vez que até Obito o achava.

— Você fez bem, Kakashi - elogiou Minato, sério - Qualquer vantagem…

— Minato-san! Minato-san!

O time Minato virou-se de imediato à origem do grito. Kakashi reconheceu a voz. Assim, não se surpreendeu ao ver o capitão careca correndo em urgência até o sensei, as rugas de preocupação marcando profundamente sua testa. O coração do garoto acelerou. Não se enganara.

— Um grupo está se aproximando - começou Shuuji, o timbre grosso dando à notícia um tom estranhamente fúnebre - Vamos recuar a tropa. Não temos condições de nos defender…

— Deveria ter feito isso pela manhã… - criticou Minato. Kakashi mirou o sensei ao ouvi-lo - estranhou o tom crítico e seco na voz do homem - e viu uma gota de suor escorrer da têmpora do mestre. Aquilo dava ao garoto as dimensões da situação. O pensamento de que talvez não saísse vivo dali atravessou sua mente e ele, rapidamente, o afastou. Não tinha tempo para medo agora.

— Eu sei… Fiquei me debatendo para tomar essa decisão e, agora, temo tê-la tomado tarde demais - respondeu o capitão, tentando esconder a tensão e se entregando ao morder o lábio inferior.

— Como fará? - perguntou o sensei, seguindo Shuuji quando esse girou nos calcanhares e pôs-se a andar por entre as tendas. Kakashi, Obito e Rin o acompanharam - Dependendo do jeito que recuarmos, seremos atacados pelas costas.

— É, sei disso… - concordou o capitão, apressando o passo – Vamos segurá-los, aqui, por um tempo. Quando conseguirem avançar, já estaremos de volta ao nosso território. Não nos atacarão lá… Ali.

Shuuji-taichou apontou para uma cabana iluminada, um pouco afastada das outras, e liderou-os até lá. Kakashi atrasou o passo e se colocou atrás de Rin, enquanto Obito manteve-se a frene da garota. Os dois discordavam em quase tudo, mas eram quase um no que tangia proteger a companheira. E, geralmente, concordavam quanto aos momentos de perigo, mesmo sem conversarem. Aquela, por exemplo, era uma dessas situações, onde ambos sentiam uma coceira na cabeça indicando que Rin deveria ser protegida. Assim, o fizeram.

— Entrem, por favor - convidou o capitão quando, poucos passos depois, alcançaram a cabana indicada. O homem entrou primeiro e Minato o imitou, seguido, na ordem, por Obito e Rin. Kakashi foi o último a fazê-lo.

Ao contrário daquela manhã, quando adivinhara o que encontraria dentro da barraca, o Hatake foi surpreendido. Ao invés do grupo de shinobis que imaginara os esperar ali, prontos para definir a estratégia de defesa, havia apenas duas kunoichis os aguardando, sentadas uma ao lado da outra, em seiza² perfeita. Kakashi não pode deixar de notar o paradoxal contraste na semelhança das duas. A da esquerda era uma senhora de cabelos já completamente grisalhos, repicados curtos, alguns fios da franja saltando soltos da bandana amarrada na testa. Mesmo sentada, aparentava ser baixa, e as rugas nos cantos dos olhos lhe entregavam a idade. Havia certa beleza desgastada pelo tempo na mulher, assim como um perigo quase sólido exalado pelos olhos escuros dela. Mesmo velha, o garoto duvidou seriamente que alguém a desafiaria. Fez uma anotação mental que, o que quer que ela ordenasse, ele faria.

A segunda, à direita, não deveria sequer estar ali, pensou Kakashi, fitando-a discretamente. Era menor que o garoto e, muito provavelmente, algo em torno de dois anos mais jovem. Tinha os cabelos vermelhos presos em um coque por dois kanzashi no alto da cabeça e usava a bandana da vila amarrada ao braço esquerdo. Contrastava em idade e tamanho e em relação à mulher ao lado. Mas assemelhava-se em todo o resto. Seus olhos amarelos, tão perigosos quanto os da velha, nada combinavam com o rosto infantil, quase angelical. Trajavam a mesma roupa, uma blusa vermelha de mangas cumpridas e folgadas no estilo yukata sob um longo colete preto, e mantinham, as duas, empunhadas e apoiadas sobre o colo uma espada longa e de lâmina fina. Ambas encaravam Shuuji fixamente, os olhos apertados como se o desafiassem a ousar abrir a boca. O Hatake pensou que, caso fosse ele o encarado, pensaria seriamente na possibilidade de simplesmente fazer o caminho de volta para fora da tenda.

— Sumire-sama – cumprimentou Shuuji, cerimonialmente, curvando-se noventa graus à mulher à esquerda, que nada fez em sinal de reconhecimento ao homem. Apenas adicionou certo nojo ao olhar que o lançava – Nana-sama – ele acrescentou à menina.

— Você não pode falando sério! – exclamou Minato, indignado. Kakashi, que desde que entrara não conseguira tirar os olhos das kunoichis à frente, voltou-se ao sensei. Era incomum ver o ninja alterar a voz, ou demonstrar algum tipo de raiva. A calma e o controle de Minato eram muito próximos ao inabalável. Por isso, o garoto, assim como seus companheiros, virou-se assustado ao ouvir o sensei aumentar o tom.

— Ele não está, Minato-san – respondeu a senhora, a voz forte e rouca, os olhos ainda fixos sobre o capitão – Mas, mesmo assim, quero ouvi-lo falar. Quero ver até onde vai sua covardia, ou coragem, Shuugi.

— Sumire-sama... – começou o capitão, como quem pondera, as mãos trêmulas por medo ou, pensou Kakashi, abstinência – Não façamos disso uma...

— Minato-san, - cortou Sumire, desviando os olhos, pela primeira vez desde que recebera a visita do grupo, de Shuugi e pousando-os sobre o sensei – Eu poderia pedir que, por favor, seus pupilos nos esperassem lá fora? Apesar de serem soldados, ainda são crianças e, uma velha como eu deve poupar a nova geração de traumas desnecessários.

— Como assim traumas? – perguntou Obito engolindo em seco, mas Minato não respondeu. Com um aceno, ordenou que os três esperassem do lado de fora da cabana. Kakashi levantou o pano cortado que servia como porta à tenda e esperou Rin e Obito passarem. Quando já se preparava para imitá-los, ouviu a senhora continuar:

— Nana...

— Sim, obaa-san – a voz fina da menina de cabelos vermelhos respondeu.

— Vá com eles – ordenou a senhora. Kakashi, que parado estava em meio a seu movimento de sair da cabana, voltou o rosto à menina a fim de observar sua reação. Viu-a abrir a boca, o rosto transfigurado em indignação, e, diante do olhar cortante da vó, selar os lábios em silêncio, demonstrando a raiva que sentia ao levantar-se violentamente e sair da tenda tão brusca que o Hatake deu um passo para trás, evitando um choque. O garoto franziu as sobrancelhas. Não via motivos para demonstrar tanta ira diante de uma ordem tão simples.

Kakashi saiu da cabana deixando o pano cair atrás de si. Ele observou a movimentação confusa dos shinobis entre as tendas por um minuto, evitando imaginar o que aconteceria quando, a qualquer momento, o ataque começasse. A cada rosto perdido que fitava, o repúdio pelo capitão dentro da barraca aumentava. Não sabia qual era o plano do homem, mas duvidava que concordasse. O sensei não concordara, pelo menos. Nem a velha, que encarara Shuugi com tanto nojo que poderia ter vomitado. A imagem da kunoichi lembrou a Kakashi a neta dela, fazendo-o procurá-la. Encontrou-a em pé, ereta como um guarda, a espada agora embainhada às costas. Era menor do que Kakashi imaginara, o colete preto, que descia até a metade das coxas da menina, fundindo-se com a calça escura e o breu noturno. Estando ela de costas para Kakashi, o garoto só era capaz de distinguir com clareza os cabelos cor de fogo e os kanzashi dourados que os prendiam.

— Ela é do clã Hikari – a voz de Obito entoou, destacando-se entre o som da movimentação dos shinobis entre as tendas. Kakashi assustou-se. De tão distraído, não ouvira o amigo aproximar-se. Intimamente, ralhou consigo mesmo pela falta de cautela – Ela e a avó são as duas últimas integrantes do clã. Todos os outros morreram na guerra.

— Como você sabe? – Rin perguntou, poupando Kakashi de fazê-lo.

— Ouvi um primo do meu pai, Fugaku, contar. Ele disse que as duas deveriam permanecer em Konoha, para evitar a extinção do clã – respondeu Obito a uma Rin extremamente interessada – Mas a kekkei genkai delas é impressionante, então não tem como manter as duas longe das batalhas.

— Mais impressionante que o sharingan? – perguntou Rin, provocando.

— Nada é maior que o sharingan, Rin! – revoltou-se Obito, mas Kakashi não prestava mais atenção. Tinha os olhos fixos na menina de cabelos vermelhos que, parada, olhava para o céu. Ele ouviu Rin e Obito brigarem/brincarem ao seu lado e, apesar de querer discutir sobre o que estava acontecendo ali, decidiu não os interromper. Era a forma que tinham de se concentrar. Além do mais, provavelmente seria mais instrutivo conversar com a Hikari. Caminhou até ela, passos apressados e firmes, parando somente quando a alcançou. Ela ainda fitava o céu. E ele, involuntariamente, imitou-a.

— O que você quer? – perguntou a garota, a voz fina contrastando com o tom autoritário e forte. Kakashi jamais admitiria, mas parecia com o que ele mesmo costumava usar.

— Qual é o plano do taichou? – ele perguntou, direto.

Ela não respondeu de imediato. Desviou os olhos do céu, pousou no Hatake que, novamente, a imitou. Viu-a analisá-lo por um instante, os olhos amarelos o percorrendo como se decidisse se ele era digno ou não de uma resposta. Provavelmente, julgou que sim, uma vez que tornou a falar:

— Aquele bêbado não tem plano algum. Só quer que minha obaa-san e eu seguremos os inimigos aqui tempo o suficiente pra ele vazar...

— Você duas? Contra um exército inteiro? – desdenhou Kakashi involuntariamente. Os olhos dela se esbugalharam em raiva e o Hatake quase se arrependeu do comentário. Mas, não vendo como uma criança e uma velha segurariam uma tropa, não pediu desculpas.

— Nós fizemos ontem, podemos fazer novamente – ela rebateu, irada.

— Não fizeram muito bem, não sobraram nem três dúzias de ninjas...

A menina levou a mão às costas, segurando o punho da espada, e Kakashi, por instinto, fez o mesmo. Não era, obviamente, a melhor hora para começar uma briga, mas já o fizera. Deveria ter apenas iniciado uma conversa e não provocado. Estava se tornando tão imprudente quanto Obito, ele pensou enquanto era atravessado pelos olhos da garota. Precisava melhorar o autocontrole.

— Eu não vou cortar sua cabeça hoje porque minha obaa-san, ao que parece, vai com a cara do seu sensei. Mas na próxima vez que você falar merda, te faço eunuco!

— Você não é muito nova? – Kakashi perguntou, soltando o punho da espada ao vê-la fazer o mesmo – Pra falar assim? Pra numa tropa avançada?

— Tenho a sua idade, Hatake – a garota respondeu, mal-humorada, voltando a encarar o céu.

— Tem? – o garoto se surpreendeu – Pera aí, você me conhece?

— Todo mundo te conhece. Deve ser por isso que você é tão metido assim...

— Você é metida e eu...

Mas Kakashi não completou. Uma mão espalmada a centímetros de seu rosto o fez parar na metade da frase, e seu cenho franziu tentando compreender o significado daquilo. Ele fitou os olhos da menina à sua frente e sentiu-se engraçado. Estranho. Era como se eles lhe tivessem sugado por um instante. Os olhos do Hatake, então, foram conduzidos pelos amarelos da garota, forçados a acompanhá-los até a origem do que a forçou a cortá-lo: um bando de pássaros fugindo da mata fechada no alto do vale. Era a deixa. Era o início do ataque.

Nana deu meia volta e Kakashi foi liberto dos olhos dela. Ainda estava meio tonto entre a sensação de ser puxado por um vortex e a realidade de que seriam atacados a qualquer instante quando viu, entre Rin e Obito, que vinham correndo em sua direção, a Hikari desembainhar a espada, acelerando o passo até a cabana onde a vó estava. Ele a seguiu, mas, mal alcançara seus companheiros de time, viu o pano rasgado da barraca ser erguido e atravessado por seu sensei.

— Vocês três, ajudem a evacuação! Vamos recuar! - ordenou Minato, apontando para o próprio time - Obito e Rin, sirvam de guias, levem os sobreviventes para a floresta em direção à Konoha. Kakashi, acompanhe-os na retaguarda.

— HAI! - gritaram Rin e Obito imediatamente.

— O senhor vai segurá-los aqui, sensei? - quis saber o Kakashi, avançando em direção ao professor.

— Shuuji-taichou se juntará a você na retaguarda, Kakashi - continuou Minato, ignorando o aluno, a voz disfarçando mal o tom de rancor e reprovação ao falar o nome do capitão.

— Nana também - acrescentou uma voz rouca atrás do sensei. O coração do Hatake, na iminência de batalha, estava acelerado, descompassado até. Mas, por um segundo, parou ao ouvir a voz. Era como se até mesmo a bomba em seu peito quisesse prestar reverência à dona daquele tom rasgado e perigoso.

— Obaa-san! - revoltou-se a menina, caminhando até a velha. Kakashi não reparara de primeira, mas a espada da senhora também estava em punho, fazendo seu coração estancar por mais um segundo. Não era capaz de recordar a última vez que se sentira intimidado assim - Eu vou…

— Me obedeça, criança! - ralhou Sumire-san, fazendo a neta calar-se instantaneamente. A menina, contudo, mesmo calada, continuou a encarar a vó, numa profundidade que tornara o ar do lugar rarefeito. Kakashi viu o sensei sinalizar que deveriam partir e, imitando Rin e Obito em uma reverência, o obedeceu, ordenando que todos no caminho os seguissem.

Não eram muitos, afinal. A maior parte estava no hospital de campanha improvisado que fizeram. Eles seguiram até lá, Rin e Obito à frente, Kakashi e Shuugi-taichou, a quem o Hatake desprezava mais a cada segundo, atrás. Que tipo de comandante foge e deixa outros lutarem por ele? Covarde, bêbado, desonrado. Kakashi o xingava mentalmente, toda vez que inalava, sem querer, o cheiro de álcool que o irresponsável ao seu lado exalava.

— Aqueles que podem andar, por favor, ajudem os que não conseguem! - gritou Rin, ao entrar no hospital de campanha. Nenhum ali podia correr, agoniou-se Kakashi avaliando a situação. Alguns conseguiam se mover ainda, andando com dificuldade. Muitos pereciam em suas macas, certamente não aguentariam a viagem. Mas, uma vez que a ordem era levar a todos, Kakashi e Obito começaram a agir, formando duplas entre os mais e os menos debilitados.

Haviam alguma ordem em meio a tudo aquilo, para alívio do Hatake. As pessoas mantinham o mínimo de calma necessário para se conduzir a recuada racionalmente. Obedeciam às ordens, de dois em dois deixavam a cabana numa fila quase indiana em direção à floresta, de volta à Konoha. Contudo, toda essa pseudo-calma mostrou sua verdadeira forma quando o assovio das flechas em chamas cortou o ar pela primeira vez, numa quase saudação inimiga. Para contribuir com o pânico, já estavam todos tendo por teto o céu quando o fogo o cortou. Não se ouviu gritos. Não se sentiu coisa alguma. Apenas o trauma tornando ninjas... estátuas.

— Andem! - a voz de Obito soou, meio afobada, meio assustada, em meio ao silêncio fúnebre. Um a um, despertaram do transe, os shinobis moveram-se. E, então, andaram. E correram. Num completo caos.

— Em ordem, em ordem! - gritava o taichou ao lado de Kakashi, que se mantinha de costas para o grupo recuando, a fim de garantir que nada os atingisse. Da primeira rodada de flechas, restava as chamas altas devorando as barracas agora inúteis. Pelo menos, pensou o garoto, labaredas daquela altura também dificultavam a visão do outro lado.

Kakashi dava passos de costas, sentindo o chão sob seus pés esquentar, queimar, enquanto o ar ficava seco, adequado a tudo menos a respirar. Os feridos atrás dele se moviam lentamente, cada passo sendo vencido em várias vezes pelo avanço do fogo. Mas como tudo que está ruim tende a piorar, o céu mais uma vez se encheu de traços e pontos em chamas, o assobio das flechas cortando o ar se misturando ao som dos passos, empurrões e gritos dos ninjas em fuga. O jovem shinobi pensou no que fazer e, lembrando-se apenas de um único jutsu de água, torceu para ser minimamente suficiente. Correu alguns passos para mais perto das flechas, firmou a própria base, garantindo equilíbrio, e, as mãos à frente do corpo, realizou os selos do ninjutsu. Contudo, não o liberou. No instante antes de fazê-lo, viu uma figura estranha subir aos céus, o fogo das setas subitamente cessar, deixando-as caírem como galhos secos inofensivos sobre o acampamento. As chamas das barracas ao chão também se extinguiram, e a noite, antes vermelha, tornou-se escura, tensa, silenciosa, a respiração ofegante do batalhão ferido atrás de Kakashi servindo como agouro ao que viria. Por um momento, apenas.

Algo que só poderia ser descrito como um furacão rasgou o céu, vindo de onde a figura que Kakashi vira subir estava. Tendo como alvo as tropas inimigas, o jovem não pode deixar de pensar que, pelo menos, quem quer que fosse, era aliado. Ele percebeu a movimentação às suas costas e voltou ao próprio posto, seguindo os sobreviventes, como guarda-costas, tarefa que se tornara bem mais complicada com os ventos expelidos pelo aliado no alto. Por mais que fossem direcionados à margem superior do vale onde estavam, era impossível contê-los totalmente, e de repente Kakashi se viu correndo de um lado para o outro, evitando que pedaços de barracas atingissem os já debilitados fugitivos.

— Cuidado! – o menino ouviu, um tronco de que se livrara segundos antes voltando como um bumerangue para atingi-lo. Ele o chutou novamente para longe, como uma bola de futebol, e pousou procurando a origem do aviso. Não demorou para achá-la.

— Junte-se aos outros, guie-os para a floresta! – Kakashi ordenou a garota ruiva de antes, que vinha correndo por entre os esqueletos de tendas ao seu encontro.

— Eles têm que subir logo! – Nana exclamou, ignorando-o enquanto tentava sobrepor sua voz ao uivo estrondoso do vento – Obaa-san não vai conseguir segurar por muito mais tempo!

— Aquela... Aquela é sua avó? – admirou-se.

— Eu não cem por cento... – a garota continuou, ignorando-o mais uma vez – Mas se eu tiver alguma fonte, posso tentar subir todos de uma vez...

— Do que tá falando? – gritou Kakashi, reparando que, estranhamente, os destroços do acampamento pareciam ir apenas para o outro lado – Fonte do que? E você é muito pequena, não vai conseguir...

— Você pode fazer uma bola de fogo? Preciso de energia!

Kakashi piscou. Um raio dourado iluminou a noite por um instante, mas o jovem não deu a ele a devida atenção. Encarava a menina como se jamais tivesse visto algo tão absolutamente estúpido na vida.

— TEM UM FURACÃO AQUI E VOCÊ QUER FOGO? QUER MATAR TODO MUNDO, GAROTA? – ele esgoelou, empurrando Nana e dando meia volta, decidido a desprezá-la. Não tinha tempo algum para idiotices. Mas Kakashi não deu mais que dois passos. Um forte baque lhe atingiu as costas e ele caiu, de joelhos, a dor irradiando por todo o corpo. Sentiu algo lhe apertar a gola e viu-se ser puxado para cima, como um moleque, olhos absolutamente furiosos lhe perfurando como agulhas. Com a raiva crescente dentro dele, imaginava que retribuía àquelas íris o mesmo olhar.

— ELES NÃO VÃO CONSEGUIR IR LONGE SE GASTAREM TUDO O QUE TÊM SUBINDO, SEU PANACA! EU POSSO AJUDAR, MAS NÃO TENHO CHAKRA SUFICIENTE PRA MANIPULAR, PRA LEVANTAR TODO MUNDO! SÓ PRECISO DE UMA FONTE, DÁ PRA ENTENDER? MIRA EM MIM, PENSA QUE SE DER ERRADO, PELO MENOS VOCÊ SE LIVRA DE MIM!

— O QUE VAI ADIANTAR UMA BOLA DE FOGO? – perguntou o Hatake, empurrando a jovem novamente – O VENTO VAI ESPALHAR...

— EU ABSORVO ENERGIA – ela respondeu, dando alguns passos para trás e abrindo os braços, posando de mira – COMO A OBAA-SAN! DEPOIS TE EXPLICO, NÃO TEM TEMPO! ANDA!

Kakashi observou Nana por um instante, tentando decidir o que fazer. A velha absorver energia explicava o fogo cessar de repente, a rajada de vento sem fim, ela voar... Mas a menina conseguiria também? O Hatake ponderou as consequências, considerou o vento levando as chamas para todos os lados, mais shinobis feridos – incluindo a garota. E virou-se, para encarar a situação. Concluiu que ela tinha razão. Vendo o esforço que o batalhão fazia para subir o paredão de quase vinte metros, Kakashi encontrou-se sem muitas escolhas.

— SE EU VER QUE VOCÊ NÃO VAI CONSEGUIR, VOU PARAR! – informou, fazendo os selos.

— MANDA UMA GRANDE, KAKASHI-CHAN!— ela provocou, um sorriso travesso brincando em seus lábios.

O jovem inspirou profundamente, o máximo que pode. Não era um especialista em katon, mas apenas uma bola de fogo ele poderia fazer. Percebeu o vento diminuir a intensidade e, ainda desconfiado, considerou novamente que, talvez, Nana estivesse certa. Sua vó não aguentaria muito. Assim, resolveu apressar-se. E soprou.

Seu hálito ficou quente de imediato, como se tivesse acabado de engolir um bom gole de chá. À sua frente, uma enorme esfera de chamas surgiu, alimentada por seu chakra, percorrendo rapidamente o caminho que o separava de Nana, que agora nada mais era que uma silhueta estranha ao Hatake. Por um segundo, pareceu que a coisa toda daria errado. Ele continuava a aumentar a bola, a força-la para frente, e essa mantinha-se crescendo e crescendo. Nada estava sendo absorvido, o jutsu atingiria em cheio a menina, carbonizando-a. Entretanto, no segundo que Kakashi decidira abortar o plano, o fogo apagou. Ele sentiu como se algo fosse puxado de sua boca e teve desse equilibrar para evitar a queda. Ofegante, ergueu os olhos para onde antes estava a Hikari, mas viu apenas a paisagem devastada, os redemoinhos de destroços que o vento provocava, a batalha entre seu sensei, a velha Sumire e as tropas inimigas. Nada de Nana.

Um barulho o fez girar nos calcanhares, pronto para enfrentar o que quer que fosse. Mas, por mais que tivesse entendido o plano, até aquele momento, não visualizara sua grandeza. As dezenas de sobreviventes flutuavam metros acima do chão, enquanto uma Nana aparentemente frágil demais para a proeza segurava-os do chão. Kakashi correu até ela, imaginando que a qualquer momento ela soltaria a todos e torcendo para estar errado. Com o coração apertado, ele observou um a um os grupos de ninjas serem aterrizados na orla da floresta, até que nada mais voava sobre o vale, além de Sumire, um tanto longe dali. O Hatake sequer sentiu-se estranho ao concluir como Nana era incrível.

— A gente tem que continuar o caminho – disse a garota ao alcança-la. Ela estava curvada, as mãos apoiadas nos joelhos, a respiração ofegante como se tivesse concluído uma maratona.

— Eu vou precisar dormir uma semana quando isso acabar... – ela brincou. Kakashi riu de leve por baixo da máscara. Não a imaginara fazendo piadas.

— Precisa de ajuda? – ofereceu, uma vez que ela não voltara a respirar normalmente, mas a ruiva negou em um aceno, pondo-se de novo ereta a fim de provar que estava tudo bem – Vai na frente, eu vou ficar na primeira linha de defesa...

— Não seja estúpido! – Nana interrompeu, voltando ao seu esquentado estado natural – Se alguém tem alguma chance de conter alguma coisa...

Mas a jovem kunoichi não chegou a informar quem tinha chances ou não. Um estrondo tremeu o chão e o vento cessou instantaneamente. Kakashi e Nana voltaram-se de imediato ao local da batalha, o breu da noite quebrado apenas pela fraca luz da lua impedindo-os de verem os detalhes do que acontecera. O que, momentos depois, provou-se ser desnecessário.

A figura de Sumire-sama começou a descer, vagarosa e descontinuamente, como se essa ainda tentasse se manter ao alto. Kakashi sentiu Nana se mexer ao seu lado e, por instinto, a segurou, puxando-a para trás, impedindo-a de avançar. Ele gritava que ela só iria atrapalhar, mas a menina continuava a se debater, tentando desvencilhar-se. Era uma vantagem o rapaz ser mais alto e forte que ela.

Centenas de flechas em chamas tornaram a ser apontadas, mas agora miravam a líder do clã Hikari, que ainda flutuava debilmente a duas dezenas de metros. As setas foram atiradas e, enquanto Kakashi as via percorrerem todo o caminho até a velha, perguntando-se, agoniado, onde estaria o sensei, um raio dourado cruzou sua frente e ele sentiu uma mão segurá-lo pela barriga e tirá-lo dali. Em meio ao ouro de Minato e ao vermelho das chamas, distorcidos pela velocidade, o garoto só compreendeu a dimensão do que acontecia quando, uma fração de segundos mais tarde, os pés já apoiados no alto do paredão, à orla da floresta, ele viu o quadro inteiro. As flechas atingiam Sumire-sama e essa, num último ato, lançava-as de volta aos inimigos, causando entre eles o máximo de destruição que podia. Kakashi duvidava que, após um furacão e o último ataque da matriarca, sobreviveriam inimigos o suficiente para segui-los. Como na noite anterior, a velha assegurara a segurança dos companheiros. Mas então, ela finalmente despencou, em queda livre, o corpo sem vida para continuar.

Kakashi viu o sensei se posicionar para correr em direção à Hikari e preparou-se para ver o corpo dela bater ao chão. Entretanto, nada disso aconteceu. O corpo da senhora flutuou metros acima das tendas, como uma marionete, e seu sensei, assim como ele próprio, não o observavam mais. Ao invés disso, olhavam hipnotizados para o lado, abismados demais para agir.

O rapaz jamais tivera visão equivalente em toda a vida. Dos cabelos vermelhos às botas escuras, Nana estava por inteira coberta em vermelho, chakra ou outro tipo de energia, Kakashi não saberia dizer, emanando dela como calor do aço quente. Se antes os olhos perigosos da menina contrastavam com seu rosto de criança, agora pareciam combinar perfeitamente com toda ela. Ela respirava ofegante, alto, rápido, e o menino percebeu todos os ninjas, que ainda estavam próximos à orla da floresta, darem sucessivos passos para trás, como quem se distanciava de uma fera.

— Você fez isso... – ela começou, o timbre infantil soando como um rosnado em meio ao compasso da respiração – Você a usou como escudo... Você a sacrificou para poupar essa sua VIDA DESPREZÍVEL!

— NANA! – Minato gritou, mas era tarde. Os cabelos de fogo da menina caíram até a metade de suas costas, quando os kanzashis que os seguravam se desprenderam, lançados como kunais até a garganta do taichou, atravessando-a. Kakashi ouviu o som surdo do corpo de Shuuji batendo contra o chão, mas não se virou. Não tirou os olhos dela.

Mais uma vez, Minato fez menção de se mover. Mais uma vez, não o fez. Antes que pudesse, Nana iniciou seu voo, como um fantasma, lenta e continuamente, até o corpo suspenso da avó. Ninguém piscava, ninguém falava. Até a floresta não emitia som algum. A kunoichi pousou ao lado da mulher e, depois do que pareceram anos daquela cena, tudo mudou. Um grito choroso e agudo quebrou o silêncio em algo que lembrava vagamente um uivo. A menina caiu de joelhos, as mãos no rosto, o corpo tremendo. Mais um grito. O chão tremeu. Rachou.

Nana fora o epicentro de um fluxo de energia tão escarlate quando o que a circundava. Esse reduziu a farpas tudo o que encontrou, da jovem até os paredões, onde bateu e ricocheteou. Kakashi percebeu o sensei correr para a orla, afastando os sobreviventes da borda do penhasco para o mais longe possível, e o imitou. Por sorte. O impacto provocou um desmoronamento do precipício, quebrando tudo quinze metros a dentro. A poeira subiu alta, em enormes e densas nuvens cor de tijolo, minando ainda mais a visibilidade no breu noturno. Rin correu até ele, acompanhada por Obito, e quis saber se estava bem, ao que o Hatake respondeu com um taciturno aceno positivo. Assim como seu sensei e seu companheiro de time, o rapaz mirava, esperando a poeira abaixar, o exato local onde Nana estava antes. Até que momentos mais tarde a viram, por trás das nuvens, ainda envolta em seu manto vermelho, caída ao lado da vó.

 

 

 

 

—...mas eu muito aliviada que você está bem, Nana-san! Fiquei realmente assustada quando te socorri no vale! Você tava pegando fogo!

Kakashi ouviu a voz de Rin soar genuinamente aliviada por trás da parede em que se apoiava e pegou-se, pela milésima vez, pensando em como a companheira era especial. Havia nela uma compaixão que, definitivamente, não havia nele. Talvez fosse essa a razão pela qual a menina não se importava em visitar uma quase completa estranha num hospital, enquanto ele se contentava em permanecer do lado de fora da janela, escondido por quinze centímetros de tijolos e cimento.

Passara-se quase dez dias desde que retornaram à Konoha após o massacre no vale do País da Grama, mas somente no dia anterior Nana acordara do coma. Naquela manhã, Minato informara a Kakashi e seus companheiros que a menina retomara a consciência, mas continuaria internada por mais tempo indeterminado. O Hatake não dava a mínima àquilo. Concordava que a Hikari fora impressionante, mas não via porque postergar sua convivência com ela além da batalha já findada. Rin, porém, discordava. Convencera o sensei a cancelar o treinamento do dia e, sem cerimônia alguma, tentara arrastar os dois amigos para uma visita. Obteve sucesso apenas com Obito, que também curtira a ideia de encontrar a ruiva. Kakashi resmungou, mas sequer tentou argumentar, ciente de que era uma batalha perdida. Girou nos calcanhares e partiu, pensando em, talvez, treinar com Gai. Porém, durante caminho aos campos de treinamento, sua cabeça permanecia na manta vermelha que ainda contornava Nana quando eles a trouxeram e volta. Os médicos-nin pareciam não ter ideia de como proceder diante da kunoichi. Como será que ela estaria? Foi, então, vencido pela curiosidade. Mas, não sendo adepto a cenas, e detestando dar o braço a torcer, o Hatake optara por uma visita mais discreta, do tipo que ninguém sabe que ocorreu. E isso explicava o porquê de estar do lado de fora da janela.

— Obrigada pelas frutas... – a voz de Nana chegou aos ouvidos de Kakashi, o tom misto em desconfiança e hesitação. Estava, certamente, pouco à vontade. Provavelmente, agora com toda a família morta, não tinha ninguém para visitá-la, ou qualquer um que se importasse com ela. Kakashi sentiu empatia.

— Nah, que isso! – riu-se Obito, escandaloso demais para um hospital – Você sabe quanto tempo vai ficar aqui ainda, Nana-chan?

— Ah... Não.

— Nem ideia? – Obito indagou novamente. Houve silêncio. Kakashi supôs que Nana respondeu em um aceno, pois o Uchiha continuou em seguida – Ah... Bem, quando sair, temos que marcar alguma coisa!

— Sim! – concordou Rin, animada – Vamos sair pra comer! E dessa vez o Kakashi vai com a gente!

— Pra quê? Ele só vai nos atrasar, com aquele mal humor constante dele! – reclamou Obito, mostrando ele mesmo o próprio mal humor – Parece que sempre de caganeira, nunca de boa! Acho melhor irmos só nós três...

— A gente chama o Kakashi e deixa ele decidir – propôs Rin, diplomática. Kakashi decidiu ali mesmo que não iria – Mas agora acho melhor deixarmos a Nana-san descansar... E, de qualquer maneira, a enfermeira nos deu só cinco minutos.

Tá, mas a gente vem te ver depois, Nana-chan! – avisou Obito, abrindo a porta de correr. O Hatake sentiu pena da Hikari  - Vamos trazer mais frutas!

— Ah... não precisa, já tem muitas...

— Coma todas, Nana-san! Vai te ajudar na recuperação! – aconselhou Rin – Tchau, Nana-san! Fica boa logo!

Kakashi ouviu a porta ser fechada e decidiu que era sua deixa. Contudo, antes que pudesse saltar, um pigarro chamou sua atenção no quarto. Estaria mais alguém com Nana?

— Você pretende ficar aí até quando? – a voz de Nana perguntou. O Hatake se surpreendeu, mas não se moveu. Não sabia se ela falava com ele ou não – Estou falando com você, Kakashi.

Ele fechou os olhos e respirou fundo. Deveria ter considerado que Nana era melhor ninja que seus companheiros e disfarçado melhor sua presença. Subestimou-a estupidamente. Passou a perna para o outro lado da janela e saltou para dentro do quarto. Suspirou, entediado.

— O que você quer? – a garota perguntou, direta. Reparou na menina sentada na cama, as costas apoiadas na cabeceira inclinável, e não soube o que queria. Fora ali apenas por curiosidade e a sanou. Nana não estava mais no meio de um manto escarlate, nem parecia uma fera. Mantinha os olhos perigosos, entretanto. Mas agora, um pouco mais escondidos atrás da palidez e da fragilidade apresentadas.

— Nada – respondeu, sincero – Ver se você legal...

— Hum...

— Você legal? – perguntou, mais para cortar o silêncio constrangedor do que pela resposta.

— Vou ficar ok.

— Se precisar de alguma coisa... – ofereceu, por educação.

— Não vou pedir a você, relaxa.

Silêncio constrangedor. Se arrependera de ter ido ali. Poderia ter perguntado à Rin no outro dia. Não precisava mesmo ter ido ali.

— Seu sensei veio aqui.

— Hum... Ele tem um bom coração, deve preocupado.

— É... – concordou Nana, sem tirar os olhos de Kakashi, que também não desviava os seus. Era quase como um jogo.

Continuaram se encarando. Mais uma vez, o Hatake pensou em como os olhos dela eram estranhos. Como o sugava. Era quase hipnose.

— Ah, vou indo – ele comunicou, desviando o olhar para o próprio bem – A gente se vê por aí.

— Ok... – ela disse, sem energia. Kakashi já subira a mureta da janela quando a ouviu falar novamente – Vou ter alta amanhã...

— Ãhn? – espantou-se Kakashi, virando o rosto para fita-la – Mas você disse...

— Você tem sorte. Seus companheiros de time são legais – a menina elogiou, uma leve ponta de inveja temperando a voz – Peça desculpas a eles por mim. Acho que o lanche não vai rolar...

O ninja acenou positivo e, por mais alguns segundos, mirou-a. A jovem desinclinou a cabeceira da cama e deitou reta, virada para o lado da porta. Sentiu, mais uma vez, empatia por ela. Então, virou-se mais uma vez e, saltando, deixou-a para trás.

           

 


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Notas finais do capítulo

Olá, mina-san! Cá estou eu mais uma vez contando historinhas de Kakashi-sensei. M-san, você só gosta/sabe escrever sobre Kakashi? Eh... non. Mas eu fiz as duas histórias ("Kage no Hikari" e "Golpe de Estado") juntas. Kage no Hikari era o background (mto chique, eu) dos meus personagens originais. A biografia, pra não confundir, não dar ruim, sabe? E também era a base do Kakashi que eu interpretei lendo e vendo Narutin.
Dito isso, por favor, comentem, si? Um "olá, tô lendo" já vai fazer meu coração bater feliz quando ler. Onegai, é um incentivo danado, acreditem-me!Espero que gostem. Os capítulos serão longos, leiam no tempo de vocês e, principalmente, divirtam-se!

Só mais uma coisinha:um dia, num futuro tão tão distante (ou não, sei lá), escreverei umas das mil histórias originais que brincam na minha cabeça. Então, dicas sobre minha escrita, como ficaria melhor, o que eu faço que vocês não gostam e talz, são muitíssimo bem vindas! Assim, me enviem o que incomoda o coraçãozinho de vocês enquanto leem!

Muito obrigada por dedicarem preciosos minutos as histórias da minha cabeça maluca!

Arigatou, mina-san!
Kissu, Kissu!



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