Shattered escrita por Nash


Capítulo 6
Why my heart is so broken




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Os pontos na cabeça de Sherlock doíam. Ele olhava pelas janelas do apartamento, mas o que lhe vinha à mente eram apenas os momentos dos últimos dias que tinha vivido com John. O peito se contorcia dentro dele e juntamente com isso a mandíbula travada na sua boca davam a ele a plena certeza que o que estava planejando não seria nada fácil.

— Você tem certeza disso? Depois de toda uma privacidade que você abdicou para ajudar a criar a filha dele. E John, ele não vai nada gostar disso...

Mycroft perguntou atrás de si. O irmão estava sentado na poltrona de John com uma cara de pesar. Sherlock engoliu em seco, o plano que havia concebido com o Holmes mais velho era perfeito para o propósito que queria, mas ele iria desencadear reações negativas de John, tinha certeza disso. O médico provavelmente não o perdoaria pelo o que ele estava planejando fazer, mas o que Morgan havia dito quando se encontraram em Bristol não saía da sua mente por nada. Ela tinha ameaçado a vida do Watson e da filha sem nem ao menos piscar os olhos.

— Nada disso foi concebido com a preocupação que ele vá gostar, Mycroft. Meu objetivo é outro.

E mesmo que a mulher não tivesse dito nada, mesmo que ela tivesse calada e só tivesse dado a ele o olhar insano que ela lhe dera, ainda haveria as marcas do acontecimento. Pattie havia sido posta em risco apenas por causa dele. O detetive fez uma careta. Haviam tido noites que ele mal conseguia dormir, pensando que quase o pior havia acontecido e seria tudo culpa dele. O corte na testa tinha sido um pagamento pequeno que ele dera em troca a John por ter posto a menina a filha dele em risco. Ele teria dado a própria vida se fosse o caso. Mas, como ele poderia olhar para o Watson se algo acontecesse com Patricia? A filha era a base da vida de John e qualquer um podia ver o quanto ele era louco pela menina, se Morgan quisesse poderia fazer mal a ela antes que eles pudessem dizer “não”. E seria culpa dele por ter interferido nos negócios criminosos da mulher loura.

— Você sabe que ele provavelmente nunca mais iria querer ter contato com você, Sherlock?

A testa doía e fazia com que ele não esquecesse da promessa que havia feito. Quando ela ameaçava parar ele ia e esfregava os dedos na ferida para que não esquecesse. Sempre estaria lá para proteger John e Mary ele havia dito uma vez, e, agora, também Patricia. Por horas a fio ele tinha pensado na possibilidade de nunca mais investigar, mas, aquilo lhe tirava do sério. Não podia conceber um mundo com tanta coisa errada acontecendo como o que viviam e que ele não pudesse fazer nada em troca para melhorar. Obviamente ele poderia ficar longe dos casos chamativos e se concentrar nos mais sutis, mas se Morgan tinha herdado de alguma forma o que seria o império de Moriarty os tipos de casos que estariam ligados a ela não seriam previsíveis. E qualquer coisa poderia por Pattie em risco novamente. Um desaparecimento, qualquer tipo de homicídio, um roubo, qualquer coisa...

— Com certeza eu sei disso, irmão. Eu que concebi o plano em questão, estou ciente de todos os desdobramentos que possam surgir dele – Sherlock se virou enquanto falava. Mycroft fitava o chão enquanto segurava o guarda-chuva. Seu rosto parecia tenso, mas o detetive não lhe disse nada. – Vou precisar que esteja tudo pronto até próxima terça-feira. Posso realmente contar com você?

— Claro. Mas, você sabe que... – Mycroft foi interrompido pelo barulho da porta abrindo, John saiu por ela carregando a filha em um carrinho. A menina balbuciava algo animada enquanto brincava distraída com a boneca que tinha ganhado de Lestrade. O Holmes mais velho então olhou para Sherlock em um relance e descontinuou o assunto. – Você sabe que eu detesto trabalho mal feito, então espero compromisso da sua parte, sim?

— Claro. – Sherlock concordou. Seguiu o irmão com o olhar enquanto ele saia do apartamento e então se virou para John – Como foi a ida ao parque?

— Bem – John respondeu. O detetive observou-o pegar a filha nos braços e ir com ela até a cozinha. – O que Mycroft queria? Algum novo caso de importância nacional?

— Não. Nada disso. – Sherlock desconversou.

— O que era então?

O Holmes observou o amigo se acomodar na poltrona dele, dava uma mamadeira para Patricia e ela bebia distraída. Ele pegou um livro qualquer na mesa próxima com o objetivo que John não insistisse na conversa, mas o amigo era mais teimoso que isso.

— Sherlock, o que seu irmão queria?

— Nada – ele revirou os olhos enquanto respondia. – É apenas um caso envolvendo a família real, algum deles tem fotos íntimas que não podem ir para a internet ou algo assim. Não me importa.

— Ha. – John tinha no rosto um sorriso debochado. – Provavelmente, já é um caso perdido. Duas coisas que reagem bem são adolescentes e internet, quase impossível medir a amplitude que algo assim pode atingir.

Sherlock não respondeu. Ele não queria conversar com John, não naquele momento, não depois de tudo que tinha conversado com o irmão alguns momentos antes. De alguma forma, ele tinha medo que o amigo pudesse ver a mentira escondida nos seus olhos. Amigo. Aquela palavra ressoou na sua mente. Ele tinha se convencionado a chama-lo assim, mas, sabia que fazia tempo que o médico significava mais que isso. Porém, só tinha conseguido entender o que John era realmente para ele depois que havia voltado dos dois anos se fingindo de morto e o viu pedir Mary em casamento. O Holmes tinha plena consciência que não tinha nenhuma autoridade de frustrar os planos do amigo, então o apoiou instantaneamente, mesmo que isso significasse uma dor terrível para ele.

— Vou dar banho em Pattie e coloca-la para dormir. Depois podemos ir atrás de algo para comer, o que acha?

— Ok. – Foi a única coisa que Sherlock conseguiu responder, ainda não havia levantado o rosto do livro até John se distanciar. Ele engoliu em seco, sabia que era algum tipo terrível de monstro por fazer o que iria fazer tão perto do aniversário de morte de Mary, mas o detetive não tinha escolha, se ele adiasse por mais algum tempo iria acabar desistindo e não queria pensar nas consequências disso. Seguindo o que tinha em mente havia a grande chance do Watson nunca mais querer entrar em contato com ele, mas ele preferia viver com isso a viver com o peso que algo de mal aconteceria a ele ou a Patricia. Ele nunca se perdoaria por nenhum mísero instante. John tinha aprendido seguir em frente quando achava que ele tinha morrido, mas Sherlock sabia que nunca seria capaz de tal coisa se os papéis fossem invertidos.

~

John ficou sentado do lado do berço da filha esperando que ela pegasse no sono. Estava tão perdido em seus pensamentos que não sabia quanto tempo havia passado enquanto estava sentado ali, uma ideia tinha lhe entrado na cabeça enquanto estava no passeio com Patricia e agora fazia tanto barulho dentro da cabeça que tudo rodava a sua volta.

Depois de tudo o que havia acontecido – a filha ter sido levada de repente e Sherlock a ter resgatado – ele havia percebido que não conseguiria ficar calado por muito mais tempo. Quase sentira o coração explodir quando tinha achado que algo tinha acontecido com Sherlock e a filha. E a perspectiva de nunca poder falar o que queria falar para ele foi tão terrível que ele não sabia se queria viver outro momento se enganando, outro momento calado.

Enquanto Patricia estivera fora do seu alcance ele não havia pensando em outra coisa que não fosse ela, mas, quando o detetive tinha aparecido na sua frente com ela escondida dentro do seu casaco, ele tinha entendido a magnitude do que significavam para ele. Principalmente Sherlock. As pessoas costumam sempre dizer que você só dá valor ao que perde e por algo que haviam sido segundos, ele soube que era verdade, a absoluta verdade.

Os sentimentos dentro dele ainda estavam conturbados. Uma parte dele dizia que aquilo era estranho, não era o seu normal, mas seu outro lado – outro lado muito maior por sinal – dizia que a única coisa que deveria ter importância era o que ele sentia por Sherlock Holmes. E mesmo que fosse algo muito diferente do seu habitual, ele sentia de alguma forma que era o caminho certo para seguir.

John se debruçou sobre o berço da filha para verificar se ela estava dormindo tranquila e lhe pousou um beijo na cabeça. Ele respirou fundo, o nervosismo fez o estômago se revirar, mas ele já estava decidido. Se seu histórico mostrava que ele era um homem honesto com o que sentia e que gostava de pôr o “preto no branco”, ele seria mais uma vez, nem que fosse a última vez.

Quando entrou na sala Sherlock não lia mais. O detetive fitava o nada com os olhos turvos, uma das mãos estava em frente os lábios e a outra apertava o braço da poltrona com força.

— Sherlock – John o chamou.

— Hm?

— Sherlock – o médico repetiu para chamar a atenção do amigo. Os olhos tão claros de Sherlock o fitaram e ele soube que estavam atentos ao que iria dizer. – Tenho algo que preciso conversar com você.

O silêncio pairou a volta deles. Era quase palpável. John quase sentia que se estendesse um braço poderia pegar um pedaço e molda-lo com as mãos. Percebeu que Sherlock torcia os lábios. Já ia voltar a falar quando o outro disse de repente ao se levantar da poltrona:

— Preciso de chá, você quer?

— Não, obrigado. Sherlock, eu... – Ele iria dizer que precisava conversar com ele, que precisava da sua atenção, que queria ficar um tempo que fosse junto a ele, mas resolveu ficar calado em relação a isso. Se o cérebro do Holmes fosse entender o que ele tinha a dizer, ele entenderia em qualquer lugar, a sala ou a cozinha não faria diferença. – Eu tenho pensado em algo importante.

— Quão importante? Da última vez que me disse algo do tipo era apenas se deveria adquirir um vestuário diferente. Mas, como te disse o que você usa já é prático e cai bem em você. Você não precisa de...

— Sherlock! – John chamou. Ele deu um sorriso de lado, era impressionante como a mente do detetive tinha a habilidade de enveredar por caminhos tortuosos. Durante os casos essa habilidade era extremamente útil, mas no cotidiano deixava qualquer um desesperado. – Não é sobre isso que quero falar.... É, é outra coisa;

— Sobre qual assunto então?

— Você. – John respondeu de supetão. A voz saiu nervosa e seca. Ele percebeu que Sherlock tinha parado no meio da cozinha com a xícara na mão. – É você, Sherlock.

— Eu? – Ele perguntou rouco. Seus olhos exprimiam a confusão que sentiam.

— Eu tenho pensado em várias coisas nos últimos tempos. A data de Mary está próxima e vem querendo me engolir faz dias, Patricia a cada dia cresce melhor e eu sou grato por isso, serei eternamente grato por você ter a resgatado daquela explosão. – Sherlock sacudiu a cabeça e ele respondeu – Sim, eu sou, você não tem noção do tamanho do susto que eu tive. Quando achei que a tinha perdido. – Ele fez uma pausa antes de continuar – E perdido você.

O Holmes o encarava e mesmo com a distância John conseguiu se ver refletido nos olhos dele. Sherlock estava quieto e estático como quando ele tinha lhe dito que era seu padrinho e melhor amigo – e, também, quando tinha revelado que gostaria que ele fosse o padrinho de Pattie.

— Eu imagino. Depois do incidente do prédio você provavelmente ficaria receoso de algum outro incidente. Mas você deveria confiar mais em mim, eu disse que levaria sua filha de volta para você.

— Claro – John riu. – Nunca duvidei disso. Mas, a questão não é essa, a questão é você, Sherlock. Você. Eu já perdi você uma vez e foi uma das piores coisas da minha vida, foi pior do que ir para a guerra, você entende?

— Você me deu uma cabeçada por isso, eu entendi, não foi minha intenção te preocupar outra vez.

Eu sei. Sherlock, eu sei que é difícil, mas tente prestar atenção por um minuto de boca fechada, sim? – John esperou uma confirmação do detetive e apenas quando ele balançou a cabeça foi que ele continuou – Eu achei que tinha perdido você uma vez. Meu melhor amigo. E o incidente em Bristol me fez perceber o quanto seria doloroso perder você outra vez. Doloroso demais. Eu iria perder você outra vez e nunca iria poder te dizer.

— Dizer o quê?

— O quanto você é importante. Importante demais. Eu sei que você não compreende isso direito. – John parou para respirar, a voz ameaçava embargar e ele não queria passar a imagem de fraqueza naquele momento. – Às vezes, eu acho que já isso a tempo demais e eu não conseguia e nem queria compreender. Outras vezes, que só agora. Mas, mesmo que seja só agora... O fato é... Que ver você com Patricia me fez perceber o quanto sou grato por ter você comigo e o quanto eu, eu, eu... – A boca tinha travado naquela parte e John não conseguia seguir em frente. Seus olhos se abriram em agonia, sentia-se desesperado com o peso na garganta e queria se livrar dele. Respirou fundo para se acalmar e quando conseguiu um alivio, retomou – E o quanto eu

— Te amo.

Sherlock tinha completado a frase para ele, por um momento John não entendeu o que aquilo significava, mas viu que o detetive o olhava ansioso e então o respondeu concordando com a cabeça – Isso.

John esperava passar por um momento estranho, esperava que o detetive começasse a falar quinhentas coisas ao mesmo tempo explicando sobre a futilidade do amor e de outros sentimentos e de como eram inúteis e o quanto o que ele estava falando era um monte de besteira. Mas, a única reação de Sherlock foi se pôr de costas para ele.  Ele aguentou o silêncio por alguns instantes e quando resolveu que iria quebrar o silêncio dizendo qualquer coisa, o moreno socou a mesa próxima a ele. Uma das mãos foi até seu cabelo e o bagunçou por um instante a mais.

 – Sherlock, esquece, eu... – As palavras saíram da sua boca, perdidas sem saber que frase deveriam formar para consertar a situação. John queria dizer que sentia muito, que era tudo uma piada terrível, que ele não deveria se preocupar, que deviam fingir que aquilo não tinha acontecido. Sentiu um aperto no peito acreditando que tinha estragado tudo, deveria ter ficado de boca fechada, ele sabia, ficar de boca fechada nunca tinha prejudicado ninguém.

O Holmes então se virou, ainda estava calado e nada dizia quando ia se aproximando aos poucos do médico. Os passos eram leves, mas cada um tinha um peso enorme, John sabia disso pois via na sua face enquanto o encarava. Então, ele ficou tão próximo que John pôde ver as lágrimas contidas nos olhos do moreno. O que eu fiz?

Sherlock então o puxou para próximo dele e John experimentou naquele momento a sensação mais diferente de todas. Era uma enorme mistura de estranheza, felicidade, incerteza, carinho, alívio e paz interior. Algo tinha se completado dentro dele. O beijo de Sherlock era calmo e doce, acomodava os lábios com cuidado contra os seus como se tivesse medo de machuca-lo. O cheiro de madeira do perfume do detetive o invadiu, era como se algo o abraçasse e o levasse para um caminho sem volta. – Sherlock... – ele gemeu.

O puxou para mais próximo de si, queria poder sentir a pele do moreno contra a sua, queria sentir a explosão do contato dos dois. Seu corpo fervilhava inteiro com a excitação do momento e queria dividir isso com ele. Queria perguntar se ele sentia a mesma coisa. Se não fosse feito de algo tão sólido quanto carne, John Watson tinha certeza que já teria derretido.

Sherlock se soltou do beijo e ele pôde ver o quanto seus olhos estavam assustados e não paravam quietos o vasculhando. Ele abriu a boca, mas nada disse. Virou o rosto para o lado e respirou fundo buscando ar com força. – Eu sinto muito, John. Eu não posso. Eu não... Isso não pode acontecer. Não pode.

E antes que John pudesse falar qualquer coisa Sherlock já tinha buscado seu casaco e saído porta afora. O que diabos tinha acontecido ali? Respirou fundo buscando ar se sentindo atordoado, ele ainda não conseguia acreditar que tinha se declarado para o amigo. Ele não era gay. Mas, o que sentia por Sherlock não podia ser outra coisa que não fosse paixão. Ele tinha certeza. Teve certeza quando o viu após a explosão, e, quando o ouviu completando o que queria dizer e não conseguia. As palavras na boca dele apenas confirmaram o que estava passando dentro de si. Tinha tomado elas como sinal de que não era o único que sentia algo diferente, mas

Mas, Sherlock afinal tinha dito: Isso não pode acontecer.

John se sentia culpado, ele tinha forçado Sherlock para um extremo que duvidava que o detetive compreendesse e provavelmente tinha o assustado e ele estava confuso. Confuso, mas, se tinha uma coisa que John entendia em Sherlock era em como ele era convicto  de suas ações e palavras. Isso não pode acontecer. A última frase repetia dentro de sua cabeça, latejava entre seus olhos e era horrível. Aquilo tinha dado um fim a tudo? Seria assim? Apenas aquilo? Se fosse, John respeitaria o espaço dele e procuraria outro lugar para que pudesse viver com a filha. A filha, oh céus, até mesmo Patricia já havia aderido Sherlock como alguém essencial na sua vida e sabia que ela iria sentir falta dele.

O médico respirou fundo tentando por a mente em ordem e foi para seu quarto. Ele tinha tido uma escolha. Poderia ter ficado calado para sempre. Porém, o que tinha escolhido era falar a verdade e agora teria que arcar com os desdobramentos disso. Uma lágrima escorreu do seu rosto e John Watson sabia que o coração nunca estivera tão quebrado antes na vida. Nem mesmo quando Mary havia ido.

Se sentia destruído.

Mas, por Deus, ele aguentaria, engoliria a merda do que tinha feito. E faria tudo para que não tivesse que topar com o Holmes outra vez para não deixa-lo desconfortável. O coração doía quando ele se deitou na cama.

Seria difícil dormir naquela noite. Tinha muito no que pensar.


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