Paixões Gregas - Opostos(Em Degustação) escrita por moni


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas. Espero que gostem. Chegamos a história de July, depois dos quatro irmãos e de Josh e Lizzie, agora vamos ver acompanhar July.
Ela pode ser lida sem ser acompanhada das outras histórias, todas as histórias são independentes, mas acompanhar as outras ajuda a compreender melhor os personagens e como chegaram a esse ponto.
Obrigada!!!!!!



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Pov – July

  Um arrepio percorre meu corpo quando sento na beira da piscina depois de deixar a água morna. Torço os cabelos longos. Logo o sol escaldante da pequena ilha de Kirus aquece a pele.

   É um lindo dia. Todos os dias são lindos na Grécia. Minha prima Alana me imita se sentando ao meu lado. Não temos o mesmo sangue. Fui adotada aos quatro anos, eu e meu irmão Josh na época com doze anos. Até o dia que vi meus pais pela primeira vez tudo que eu tinha na vida era ele.

   Agora é diferente. Treze anos depois eu tenho uma imensa família, amorosa e unida. A fortuna dos quatro irmãos Stefanos é conhecida mundialmente. Meu pai é o caçula dos irmãos. Cresci em meio ao luxo, ao mesmo tempo cercada de simplicidade. As pessoas as vezes não compreendem isso. Olham para mim como uma mimada e bonita adolescente, tive que me acostumar com o preconceito.

   Meu pai e minha mãe tiveram uma infância tão difícil que criaram os três filhos, eu, Josh e Ryan meu irmão mais novo e filho biológico com toda simplicidade.

   ─Me conta como está indo a faculdade! – Peço a ela que dá de ombros. Alana e Luka, seu irmão gêmeo, estão no primeiro ano e agora passam a semana em Atenas onde estudam. Vamos nos ver bem menos e falar pouco também agora que eles estão em outro momento da vida.

   ─É legal, estranho também. Me sinto meio sozinha. Antes eu tinha o Luka por perto o tempo todo, mas não nos vemos mais o dia todo. Me acostumei com meu irmão por perto.

   ─Gêmeos é mesmo diferente. São ligados de um jeito diferente.

   ─Somos.

   ─E esse negócio de morarem sozinhos em Atenas durante a semana? – Ela ri da ideia.

   ─July acha mesmo que ficamos sozinhos? Toda segunda de manhã quando o helicóptero pousa aqui na ilha para nos buscar a vovó ou o vovô estão prontos para nos acompanhar, tem sempre um dos dois passando a semana com a gente. Isso quando o papai e a mamãe não vão também. – Rimos as duas.

   ─Esses Stefanos não mudam nunca! – Meu pai ainda me trata como seu bebê, minha mãe então nem se fala.

   ─Tia Annie trata o Josh como bebê e ele está prestes a casar. Foi tudo tão lindo com eles. – Ela me lembra e suspiro. Meu irmão e minha prima Lizzie vivem mesmo uma linda e emocionante história de amor.

   ─Meu irmão é um príncipe! – Digo secando o rosto com a mão.

   ─O meu é um sapo! – Ela me faz rir. Luka nos lembra tio Ulisses, é sempre irreverente, leve e despreocupado. – Toda semana está enrolado com uma garota nova.

   ─E o Saulo? É esse o nome né? – Alana sorri. Os olhos até brilham um pouco.

   ─Ele é tão bonito. Gentil, mas não sei, nos conhecemos há três semanas, acho que não quero me apaixonar por ele. Quero estudar, estou amando o curso de Biologia.

   ─Bióloga marinha. Com toda essa água que te cerca é boa ideia. Sua cara. Nunca vi ninguém gostar tanto de água como você. – Alana concorda balançando os pés na água.

   ─Estou feliz, acho que me encontrei. E você dona July, ainda em dúvida?

   ─Completamente. – Os garotos jogando bola me chamam atenção. Me viro para olhar a brincadeira no gramado, os cachorros correndo com eles. Potter e Luna. Amo animais, mas por conta da asma nunca pude tê-los. – Irônico eu não poder nem sonhar em fazer veterinária. ─ Suspiro. Não se pode ter tudo. Tenho ainda seis meses, papai também me deu mais seis meses para pensar em tudo. Viajar quem sabe. Tenho um ano para me decidir.

   ─Tio Nick faz tudo que você quer. – Alana me obriga a sorrir. Só de lembrar do carinho dele já me deixa feliz. – É a menininha do papai e dos irmãos. Quero ver como vai ser quando resolver namorar.

   ─Tenho a mamãe para me proteger. – Nós duas rimos. – Acontece que o tal príncipe encantado nunca chega! – Reclamo.

   ─July, você tem dezessete anos. Ainda é cedo.

   ─Por que? Todos os Stefanos casaram cedo. Os quatro irmãos já tinham filhos perto dos trinta.

   Alana tem uma crise de riso, fico sem entender. Olhando para ela que tenta falar e não consegue.

   ─Trinta July! Não dezessete. É uma diferença incrível!

   ─Não é nada! Já viu meu pai e minha mãe juntos? Tem coisa mais linda? Ele chama ela de gatinha, ela o chama de príncipe. Eu sou romântica. Quero um amor assim. Perfeito!

   ─Meus pais também se amam. São carinhosos, melosos até. Nem por isso estou com pressa.

   ─Acha que ele existe? – Ela enruga a testa.

   ─Quem?

   ─O cara perfeito! – Que pergunta.

   ─Como ele é? – Já disse mil vezes. Penso um momento. Como descrever o que para mim parece tão metafísico?

   ─Tem um coração puro. É gentil, educado, carinhoso, inteligente. Bonito por que ninguém é de ferro. – Ela balança a cabeça em concordância.

   ─Muito bom.

   ─Precisa gostar das mesmas coisas que eu. Animais, pessoas.

   ─Velhinhos! – Alana brinca. – É igual sua mãe, se pudesse passaria o dia na associação com os idosos ou naquela sua amiga que abriga cães.

   ─Viu? Ele precisa ser assim.

   ─Acho que devia bastar ele te amar. Fazer seu coração disparar e te deixar de pernas bambas.

   ─Já se sentiu assim? Isso é confuso. Quando beijou pela primeira vez foi assim perfeito?

   ─Não. Só foi assim um pouco especial com o Saulo. Da primeira vez eu só estava numa bobagem de querer ser como todas as garotas.

   Isso não serve para mim. De jeito nenhum. Quero tudo, quero o príncipe e quero que ele faça meu coração disparar só de vê-lo.

   ─July! – A voz da minha mãe me desperta vinda da grande varanda. – O helicóptero já está a caminho. Vem se aprontar.

   ─Estou indo! – Grito de volta, encaro Alana. – Só vou beijar alguém quando estiver apaixonada. Só sei disso.

   ─Boa sorte então. – Alana ri.

   ─Agora é voltar para casa. Fim de férias no paraíso. Nova York me espera. Cinza como sempre.

   ─E adora. – Ela me lembra e concordo. Vou para meu quarto me vestir.

   A mansão dos Stefanos na ilha de Kirus é um pouco a casa de todos nós. Apenas o mais velho. Tio Leon reside na ilha. Os outros todos, Meu pai, tio Ulisses e Tio Heitor em Nova York com suas famílias.

   Somos tantos e estamos sempre tão perto, eu tive tanta sorte. Não tenho muitas memórias da primeira infância. Mas me lembro perfeitamente de sentir medo e solidão. De não ter brinquedos, amigos, carinho além dos que Josh tentava me oferecer com sua pouca idade.

   Acho que isso, essa pouca memória, mas ainda assim profunda e marcante me tornou alguém completamente empática. Tudo que me lembra abandono me comove. Idosos, crianças, animais.

   Subo as escadas em direção ao meu quarto. Depois de um banho coloco um vestido leve. Vai estar frio em Nova York. Penso encarando o closet. Meu pai vai me ver e a primeira coisa que vai comentar é isso. Sorrio com a ideia. Pego um jeans e um casaco e coloco na mochila. Posso me trocar no avião.

   ─July vai estar menos de dez graus quando chegarmos. – Meu pai me diz assim que chego a sala, eu o abraço. Ele beija o topo da minha cabeça. Não me considero uma garota muito alta. Já meu pai é um homem alto e lindo. Todas as minhas amigas acham. Fico até com ciúme quando elas começam a elogiar sua beleza.

   ─estou levando roupa papai. – Aviso antes de começarmos as despedidas.

   ─Já ligou para Giovanna Ulisses? – Meu pai questiona o irmão, sobre minha prima que está viajando sozinha aos quatorze anos por que tio Ulisses é ótimo e vive a vida como se não houvesse amanhã.

   ─Sim.

   ─Como ela está? O que está fazendo?

   ─Nick a Gigi está bem e você não quer realmente saber o que ela está fazendo. Acredite. – Meu tio Ulisses, tia Sophi e a filha tem um jeito diferente de viver, adoram se enfiar em aventuras radicais e minha sortuda prima deve estar fazendo algo assim.

   A viagem de volta é sempre divertida. Parte da familia dormindo e a outra parte brincando. O jato particular tem uma sala com sofá e mesa onde quase sempre ficamos jogando.

   ─July você está roubando? -  Ryan reclama quando distraída ando mais casas no tabuleiro do que devia.

   ─Desculpa. Me esqueci mesmo. Estava pensando em outra coisa. É sua vez. – Ryan joga os dados, ele tem uma sorte no jogo que sempre me deixa brava. Faço bico quando ele ganha a quarta rodada.

   ─Nunca ganho! – Desisto do tabuleiro. Lizzie me sorri.

   ─Também não July, esses dois irmãos Stefanos são mesmo bons nisso.

   Os dois apetam as mãos, num cumprimento de irmãos que inventaram há muito tempo, me arrumo num dos acentos e acabo por pegar no sono. Acordo com o aviso do piloto para apertar o cinto e me ajeito. Penso na agenda da manhã seguinte.

   Ir ao abrigo pela manhã e aula de ballet no fim da tarde, ainda tenho três dias de férias antes de retomar as aulas.  É tarde quando chegamos em casa, não tenho uma gota de sono. Dormi quase toda viagem.

   ─Mamãe eu posso ir ficar na casa do tio Heitor amanhã? – Ryan pede a ela.

   ─Se o papai te levar pode. Vou passar o dia na associação.

   ─Vou com você mamãe.

   ─O motorista fica com vocês então e eu levo e busco o Ryan no Heitor.

   Tudo decidido me despeço de todos com um beijo e sigo para o quarto. Assim que entro me jogo na cama. Dou um longo suspiro. Fecho os olhos pensando na vida. Nunca sei direito o que vou fazer quando for uma adulta independente.

   É estranho pensar nisso. Josh e Lizzie tinham tanta certeza. Sempre os vi trilhando seu caminho firmes e decididos. Luka e Alana também já escolheram. Eu devia ter mais certeza, mas não. Até os menores estão mais decididos que eu.

   ─Oi. – Meu pai entra em meu quarto depois de uma leve batida. Se senta na beira da cama. – Mamãe está chamando para jantar.

   ─Essa hora? – Olho o celular. Uma da manhã. – Ela que fez?

   ─Hoje era o dia dela.

   ─Devíamos ter jantado no avião. – Meu pai ri.

   ─Vai ser o de sempre. Sanduiche de tudo que tem na geladeira.

   ─Vou descer então. Papai e se eu não achar nada para fazer da vida?

   ─Vai achar July. É tolice ter tanto medo.

   ─Tenho medo de te decepcionar. É duro ser irmã do Josh. Ele se formou em Harvard que nem você. Primeiro da classe.

   ─E acha que é isso que espero de você? Que isso importa? – Eu suspiro confirmando. – July eu tenho a melhor filha que poderia querer. Tem um coração puro. É generosa. Amo você e suas escolhas, vai ser sempre perfeita para mim.

   ─Tomara papai. – Eu o abraço. – Agora vamos lá para os sanduiches da mamãe.

   ─Ela se esforça.

   ─Minha mãe não leva jeito, nunca consegue preparar uma refeição. – Assim que fico de pé ele me abraça. – Papai príncipe.

   ─Hum, papai príncipe é por que está precisando de alguma coisa.

   ─Não tenho mais nem um centavo na vida papai. Minhas aulas vão começar e vou morrer de fome.

   ─Como consegue a proeza de gastar tudo? É uma boa mesada.

   ─Eu tenho compromissos papai. – Ele vai seguindo em direção a cozinha e vou seguindo seus passos no trabalho comum de convence-lo. – Eu precisei do dinheiro.

   ─Sei. Não vou te deixar passar fome na escola, mas não vai ter luxos além do dinheiro necessário. – Faço careta e então estamos na cozinha. Ryan encostado no balcão comendo um super sanduiche de tudo que ele mais gosta. – July está sem dinheiro de novo gatinha.

   ─Não estou devendo a ninguém mamãe. – Aviso me enfiando na geladeira para olhar o que tem de bom. – Nós podíamos ser um pouco mais saudáveis. Vou acabar gorda.

   ─Amanhã é seu dia de cozinhar e faz o seu prato preferido.

   ─Eu prefiro mil vezes os dias da mamãe cozinhar. – Ryan comunica contente.

   ─Claro né? Come só o que quer no dia dela.

   Ficamos ali pela cozinha, comendo e tomando suco, brincando e rindo a uma da manhã. O bom de ter pais jovens é essa ligação que temos com eles. Dormimos muito tarde, quando acordo tem um bilhete ao lado da cama.

   Sorrio com as palavras carinhosas de minha mãe avisando que me deixou dormir por que eu parecia cansada. Depois de me arrumar para encontrá-la na associação tomo um copo de leite olhando as mensagens no celular.

   Dulce me deixou um recado pedindo que ligasse. Mais uma animal em situação de risco aposto. Dulce é uma velha amiga de infância. Mora no Harlem onde papai mantem uma associação para ajudar pessoas carentes. É dois anos mais nova. Está agora com quinze anos. Ela e a mãe abrigam animais carentes, sua casa é pequena e seus recursos escassos, por isso eu sempre a ajudo com tudo que posso.

   Nem telefono, sigo direto para sua casa. Pego um taxi na porta do edifício que pertence ao meu pai, onde meus tios mantem apartamentos e meu irmão mora com Lizzie.

   Assim que entramos no bairro as diferenças começam a surgir. Está em tudo, na música que toca nos rádios dos carros, nas roupas das pessoas, nos edifícios e casas. Eu moro na parte nobre da cidade, com vista para o Central Parque.

   Depois de pagar a corrido com o dinheiro que estava junto com o bilhete da minha mãe toco a campainha de Dulce. Ela me recebe com um bebê no colo.

   ─Oi July. Podia ter ligado. – Ela me dá espaço para entrar depois de passar pelo portão eu encaro a criança adormecida em seus braços.

   ─Que coisinha mais linda Dulce. Quem é?

   ─Essa é a Barbara, ela é minha vizinha. Estou cuidando dela um pouco. Vamos entrar. – Assim que chegamos a sala. Quatro cães me cercam, me ajoelho para brincar com todos. – Que bom que veio. Preciso de ajuda July.

  ─O que? Pode falar.

   ─É sobre a Barbara. – Ela me mostra a garotinha. – A mãe dela morreu faz uns dias, agora só resta a avó e o irmão.

   ─Que triste. O irmão é pequeno. Onde está? – Me afasto dos cachorros e me aproximo da pequena. ─ A respiração já começa a ser mais pesada. Maldita asma. ─Posso pega-la?

   Pego a garotinha no colo. É um lindo bebê. Quando abre os olhinhos escuros fica ainda mais linda.

   ─Oi coisinha fofa. Você é linda. Me conta. O que precisa.

   ─Então. Ela tem dez meses. O irmão vai fazer dezoito em uns meses. Tyler quer ficar com ela e a avó. Dona Manoela está muito idosa para assumir a pequena. Quero ajudar, mas preciso me concentrar nos estudos, desde que seu pai começou a pagar meus estudos eu tenho dobrado meus esforços.

   ─Podemos pedir ao papai, eles podem quem sabe encontrar ajuda na associação.

   ─Tyler é bem difícil. Ele não quer nada com a associação. No momento ele está bem rebelde. A mãe dele andava tendo um caso com o Raul, sabe quem é?

   ─Aquele que é líder entre os hispânicos?

   ─Isso. Barbara era filha dele. Raul e ela morreram numa confusão qualquer com a polícia e outras gangues.

   ─Nossa! – A garotinha se esforça para se sentar agora mais desperta. Eu a ajudo. Ela esfrega os olhos. – O que podemos fazer?

   ─Prometi, na verdade eu e minha mãe prometemos ajudar dona Manoela. Ela não dá conta de tudo sozinha. Então eu preciso ficar com a Barbara.

   ─Posso te ajudar Dulce. Vir te dar algumas aulas particulares, ajudar com ela. Venho depois do colégio. O que acha?

   ─Pode ser. Quer dizer. Se sua família permitir.

   ─Bom... Eles não precisam saber. – Dulce me olha preocupada. – Não se preocupa, não vai sobrar para você.  – A garotinha é muito graciosa. Brinca com meu colar interessada. Baba um pouco por que os dentinhos estão nascendo. Adoro crianças, levo jeito com elas. Sempre cuido de algumas na associação.

   ─Se acha isso. Preciso mesmo de ajuda nos estudos, perto da antiga escola essa é muito forte e estou com dificuldade de acompanhar.

   ─Vamos lá. Pegue seus livros, não sou nenhum gênio como meu irmão, mas sempre me viro bem no colégio.

   Passamos a manhã estudando juntas com a pequena garotinha brincando no tapete. Na hora do almoço minha respiração já está bem alterada. Essa será a parte chata. Muito tempo cercada de cães.

   Pego o inalador na bolsa e aspiro uma vez. Depois fechamos os livros. Barbara come uma papinha industrializada. Bom seria se pudesse comer algo mais fresco. Quem sabe trago de casa? É boa ideia. Estou sempre doando comida, meus pais nem vão perceber.

   Vou ter que fingir que estou no ballet, mas que jeito? Se contar talvez eu só piore tudo. Se o irmão quer cuidar então é com ele que o bebê deve ficar. Sei como é isso. Josh nunca se separou de mim. Jamais ficamos longe e ele teve que se esforçar muito para me proteger.

   ─Vamos leva-la para casa? Agora ela passa a tarde com a avó. – Dulce fica de pé. Eu a imito erguendo a pequena nos braços. – Você não largou a Barbara desde que chegou. – Dulce sorri.

   ─Amo crianças Dulce, sabe disso. Meu sonho era ter uma irmãzinha. Não aconteceu. Adoraria uma garotinha para arrumar os cabelos, vestir de rosa.

   ─Eu gosto de ser filha única, ser apenas eu e a mamãe é bom, nos torna unidas. – Saímos pelo portão, Barbara balbucia apontando os carros na rua. Beijo a bochechinha rosada.

   Duas casas depois ela abre um portão velho e enferrujado que range, passamos por um pequeno corredor com algumas portas, depois viramos a esquerda e subimos uma escada, no segundo piso mais portas, na terceira ela abre sem bater.

   A casa está com as janelas fechadas, tem alguma umidade no ar, meus pulmões reclamam imediatamente. É apenas uma sala e cozinha, além disso vejo uma porta fechada que deve ser o quarto. Tem um fogão, uma pia, a geladeira e uma mesa de dois lugares apenas, as cadeiras são diferentes.

   O ambiente é tão triste. Abraço a garotinha um pouco mais pensando na minha infância. Meu coração aperta um pouco.

   ─Senhora Manoela! – Dulce chama antes de abrir a porta do quarto, eu a sigo. Uma senhora de cabelos brancos e rosto enrugado nos encara com um sorriso fraco. Está sentada em uma poltrona diante de uma televisão antiga. Além do aparelho e da poltrona apenas duas camas. As paredes estão descascando e por baixo da tinta verde surgem manchas de uma outra tinta alaranjada e suja.

   ─Dulce. Trouxe minha netinha. – Ele ergue os braços. Levo a garotinha para ela. – E quem é essa beleza de menina?

   ─Sou July. Como vai dona Manoela?

   ─Bem. Ainda mais com essa pequena nos braços. Já viu coisa mais linda?

   ─É mesmo uma princesinha. – Puxo a bombinha da bolsa mais uma vez. Assim que uso ela me olha atenta.

   ─Asma?

   ─Sim senhora.

   ─É toda pequenininha. Muito linda. – Acho que já me apaixonei por ela. – Quantos anos tem?

   ─Dezessete.

   ─Eu me lembro pouco dos meus dezessete. Foi há muito tempo. – Me sento na beira da cama a seu lado. Barbara se encosta na avó sonolenta. Sorrio com a bela imagem. – Tenho oitenta anos. Muito bem vividos. – Ela abre um largo sorriso, cansado, mas cheio de boas lembranças. – Os últimos foram mais duros.

   Ela dá um suspiro cansado. Sinto pena. Olho para ela com vontade de abraça-la. Me contenho. Eu gosto de abraços, sou e sempre vou ser carinhosa.

   ─A senhora consegue ficar sozinha com a Barbara? – Me preocupo com a possibilidade das duas sozinhas naquele lugar.

   ─Ela é um anjinho. Logo meu neto chega e cuida da irmã. Não se preocupe. – Ela olha para Barbara. – Dulce pode coloca-la na cama?

   Dulce obedece. Pega a garotinha no colo. Leva até uma das camas e ajeita a pequena. A menina começa a reclamar, não quer ficar ali. Choraminga.

   ─Acho que uma mamadeira ajuda a acalma-la. – Penso na pequena sem a mãe. Tão novinha. – Eu posso fazer. – Me ofereço.

   ─Está tudo no armário sobre a pia. – Dulce me avisa. – Eu fico aqui com ela.

   ─Já venho. – Deixo o quarto enquanto Dulce balança a garotinho agora em seu colo.

   Abro o armário. Não tem muita coisa, mas não é difícil achar a mamadeira e a lata de leite. Ao lado uma panelinha que pego para aquecer o leite.

   O trabalho não dura nem cinco minutos. Pego a mamadeira e viro uma gota na mão para sentir a temperatura. A porta de entrada se abre de modo brusco. Dou um salto de susto.

   Meu coração acelera quando vejo o rapaz bonito e um tanto perplexo de pé com a mão na maçaneta me olhando cheio de raiva. Engulo em seco.

   ─Posso saber o que a patricinha mimada faz na minha casa? – Seu tom me assusta. Não sei quem ele é e nem por que me chama assim. Não me lembro de já tê-lo visto antes. – Perdeu a língua?

   Adoraria manda-lo para o inferno, mas ele tem todo direito de saber já que estou em sua casa.

   ─Eu vim com Dulce. – balbucio um tanto tremula.

   ─Não é lugar para você. Vá embora. – O tom rude é tão inesperado que não sei como reagir. Ele pega a mamadeira de minhas mãos. Nossos dedos se tocam. Meus olhos encontram os dele. Olhos escuros, cabelos castanhos, alto, bonito, muito bonito, mas vejo a revolta estampada em seu semblante e não sei por que me odeia tanto. – O papai vai ficar bravo com a patricinha mimada no lado podre da cidade. Vá embora e não volte.

   ─Conhece meu pai? O que eu fiz? Eu não...

   ─Uma Stefanos enfiada na minha casa? O que pensa que está fazendo? Acha que não tenho problemas o bastante? – O tom é tão rancoroso, não quero parecer uma boba, mas sinto vontade de chorar com o tratamento, não me lembro de já ter sido tratada assim antes.

   ─Eu só vim ajudar a Dulce, eu não...

   Um lampejo de imagem vem a minha mente. Eu já o vi antes, há alguns anos talvez, não sei quando, mas me lembro desse olhar feroz na sala do meu pai na associação.

   ─Me lembro de você.

   ─Dane-se menina. Só vá embora!

   Ele segue em direção ao quarto. Fico parada no meio do pequeno cômodo me sentindo ridícula, pequena e magoada. Ele não pode me chamar de patricinha mimada. Não me conhece, não sabe nada de mim, é um mal-educado, mas não vou ficar aqui chorando feito um bebê.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Estou ansiosa para contar sobre eles. Estava com saudade, estive relendo a série para poder acertar alguns detalhes aqui. Comentem.
BEIJOSSSSSSSSSSSS