A Lagarta escrita por Vatrushka


Capítulo 13
Casamento Vermelho


Notas iniciais do capítulo

Sim, o título é uma referência a Game of Thrones huehuehue



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Era o dia do casamento. A elite estava entusiasmada com o acontecimento - ainda que bastante receosa. Muitos seguiram a lógica e chegaram à conclusão de que Viktor bolara tudo para executar o Rei e assumir o trono. O que não sabiam é o que aconteceria depois que ele conseguisse...  A Rainha permitiria que o Rei voltasse a ter algum poder político? Ela parecia bem apaixonada... Será que, por o acaso, logo após a cerimônia, Victoria morreria de causas misteriosas?

Quem sairia ganhando, quem sairia perdendo? Impossível de se dizer. Mas fascinante de se assistir…

E o povo também aguardava os resultados, temeroso. Ninguém tinha lá muita esperança de que Viktor fosse um Rei benevolente.

O caminho para o palácio estava radiante. Os jardins estavam mais bem tratados do que nunca. Sedas impecáveis enfeitavam a entrada e centenas de músicos animavam a recepção.

A Duquesa queria que Ghunter e seus amigos pudessem assistir, ao menos, a fachada. Mas como estavam escondidos dentro de armários, não conseguiam enxergar nada que não fosse a cara uns dos outros.

Antes que a carruagem de Denise entrasse na fila dos convidados, passou pelos fundos do palácio. Esperou que os criados soltassem a carga e a guiassem para o porão antes de murmurar um silencioso "boa sorte".

Entretanto, a Duquesa não podia se dar ao luxo de ser uma dama supersticiosa. Sabia que a própria sorte era a que se fazia. Assim que concordou em ajudar o Gato e sua trupe, tratou de logo de entrar em contato com um servo do Palácio - amigo seu de muitos anos - que ajudasse o Gato e seus amigos a entrarem sem grandes surpresas.

Ela sabia que, se fossem descobertos, sua própria cabeça também não seria poupada.

De dentro da carga, todos aguardavam silenciosamente o momento ideal para sair.

Quando os passos dos criados se afastaram, julgaram já estar na hora de começarem a se mover. Lana materializou todos para fora.

O porão tinha o tamanho de quatro ginásios juntos. E estava escuro, o que facilitava a locomoção do grupo sem chamar muita atenção. Como plumas, caminharam em direção do corredor.

Esconderam-se dos criados, atrás da parede.

“Lana, por que não usa um feitiço de invisibilidade em todos nós?” Sussurrou o Arganaz. “Sabe? O mesmo que o Gato usa!”

A Lagarta respondeu-lhe: “É muito arriscado cobrir mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Já vou ocupar meus esforços distraindo os sensores, então…”

Ghunter bufou. “Arriscado? Só se for pra você, Lagarta. Aprendi os meus truques enquanto viajava.” Se vangloriou o rapaz, girando os dedos com sua magia.

Lana agarrou seu pulso. “Não ouse. Se quer usar magia bárbara no próprio corpo, o problema é seu. Não vai enfiar outras pessoas nisto.”

“Conservadora como sempre.” Murmurou o Gato, de irritação. “Só chama a magia que vem de fora da Floresta de ‘bárbara’ porque não a conhece!”

Todos calaram-se quando um Carta se aproximou, desconfiado de ter ouvido sussurros.

Mostrem-se!” Ordenou o Carta, com uma voz grave.

Ninguém se mexeu, ou sequer respirou.

“Não vão me obrigar a-” Ouviram o som de algo quebrando na cabeça do guarda. Logo em seguida o som de seu corpo caindo no chão.

Arregalaram os olhos. O que estava…?

Viram a sombra do sujeito que quebrara um aparente jarro de vidro na cabeça do Carta; era um homem.

Ainda sim, Lana não se mexeu até ouvir o tique-taque do relógio de bolso deste.

Ryan…?” Sussurrou, abismada. Havia esquecido completamente dele! Ryan, o Coelho Branco, mensageiro da Corte!

Lana? A Duquesa me chamou para ajudar vocês!” Sussurrou o homem, falando apressadamente. “Venham, eu descobri onde Luce está!”

Lana, Alan, Carl e Giullian saíram do esconderijo, aliviados. Trocaram saudações com o velho amigo, muito mais animados.

“Não vamos precisar de perder tempo procurando!” Vangloriou o Arganaz, dando graças aos céus.

Ryan, um homem alto e magro de 40 anos, sorriu - mostrando seus dois dentes da frente mais avantajados. Ele parecia ansioso.

Apenas Ghunter não pareceu muito receptivo. Não o conhecia pessoalmente até então, mas já ouvira falar a respeito de Ryan. Ele havia servido ao Rei Zeno, da Dinastia Branca, antes de Francisco ter tomado o poder.

Era, provavelmente, o servente mais antigo do Palácio. E, curiosamente, fora um dos poucos servos brancos que foram poupados com a nova Dinastia.

Por mais que Ryan ainda defendesse a Dinastia Branca silenciosamente - afinal, era o Coelho Branco - Ghunter desconfiava pelo fato de o tal ter se curvado ao Rei Francisco e sua filha com tanta facilidade. O discurso de Ryan era o de que “alguém precisa ter informações confidenciais para detê-los”, mas o Gato não conseguia deixar de achar suspeito.

Ainda mais porque Ryan era amigo da Duquesa. Os amigos da Duquesa definitivamente não são confiáveis. Afinal, o Gato era um deles!

Mas nada disse, cruzando os braços. Podia ser só uma teoria.

O Coelho começou, dizendo:

“Os seguidores de Alice trancafiaram Luce em uma cela especial. Esta fica longe das masmorras. Na verdade, fica exatamente em cima da Sala do Trono.”

“Que conveniente.” Comentou Giullian. “Alice quer um show.”

Ghunter ergueu a sobrancelha. “Espera… Você sabe que Alice e seus operantes se infiltraram aqui, dentro do Palácio? Está do lado deles, não fez nada para ajudar Luce?”

“E o que eu poderia fazer?!” Exclamou Ryan. “A cela é coberta pelos lados por espessas camadas de tijolos! Só se entra lá com magia! Se eu avisasse à Rainha que eles estavam aqui, ela decapitaria Luce; não pude avisar ninguém porque Victoria decretou que qualquer um no Reino que falasse de algo que não fosse seu casamento seria decapitado! Tive de fingir que não vi nada!”

Ghunter bufou. Fazia sentido.

“Calma, deixa eu ver se entendi.” Disse Lana, confusa. “Alice pôs Luce em uma cela em cima da Sala do Trono, que coincidentemente é onde o casamento vai acontecer… Provavelmente pretende, talvez no meio da cerimônia, disparar o teto de explosivos, fazer Luce despencar, ser culpada pelo acidente e ser decapitada… Assim, estaria eliminando uma herdeira verdadeira ao trono sem ao menos que Victoria soubesse.”

“Um plano revolucionário genial…” Admitiu Giullian. “Afinal, os outros dois príncipes brancos também estão aqui. Provavelmente ela conta com que a gente tente resgatar Luce… Deve ter mandado colocar algum contrafeitiço ao redor da cela, para que de alguma forma pudesse nos evidenciar… E fazer com que Victoria nos decapitasse…”

Sempre deixando o trabalho sujo para Victoria.” Suspirou Lana. “Para depois poder posar de revolucionária justa.”

“O que fazemos, então?” Perguntou Carl. “Nos infiltramos na festa e esperamos?”

Carl o disse com ironia, mas todos se encararam. Era uma ideia.

“Devem estar mais loucos do que eu…” Respondeu o Chapeleiro.

“Não vai ser tão difícil, uma vez que todos ali exageram na maquiagem.” Sugeriu Alan. “Ryan consegue as roupas para a gente, não consegue?”

“Claro que consigo!” Exclamou o Coelho. “Será perfeito!”

Todos logo se aprontaram. Ghunter coçou a testa. Algo lhe dizia que não daria certo…

A festa estava, naturalmente, impecável. Tudo estava tão bem iluminado que até o chão brilhava… Todos haviam se esforçado ao máximo para vestir as melhores roupas. Os noivos não haviam chegado, mas todos estavam ocupados demais com a deliciosa comida.

Diga-se de passagem que, dentre os convidados, cinco jovens atacavam os assados e as carnes com maior voracidade.

“Droga,” murmurou Giullian. “a asa de frango está deliciosa!”

“Isso porque ainda não comeu o lombo…”

Até Ghunter, que gostava de ser do contra, não resistiu. Carl e Alan também comiam bastante, mais por neurose do que pelo gosto.

Por isso, não viram o tempo passar. Sabiam que Ryan avisaria quando fosse a melhor hora para agir.

“Vamos jogar o jogo deles.” Sugerira Lana. “Antes que Alice exploda o teto ou de alguma forma faça Luce cair grandiosamente, eu o farei. Farei o teto desfragmentar e a tirarei da cela. Criamos uma confusão e fugimos.”

“Para onde?” Perguntou Ryan, preocupado.

Lana teria respondido “Para os Grandes Salões”, mas Ghunter a interrompeu. “Acho melhor que não saiba. Podem tentar invadir sua mente depois para descobrir, não?”

Todos assentiram com o silêncio, ainda que estivessem cientes da implicância de Ghunter com Ryan.

Por isso que o Gato havia formulado um plano B. Não iria depender dos esforços do Coelho Branco. Havia estudado contrafeitiços á fio, pensou que se tentasse chegar à cela de Luce antes…

E foi assim que o Gato sumiu durante a refeição. Foi para o andar acima, analisar a presença de algum cômodo escondido.

O extenso corredor estava silencioso e escuro. Ghunter atentou todos os seus sentidos, cada vez mais alerta. Claro que todos os criados estavam ocupados demais no andar debaixo.

Andando, o Gato reparou que estava sentindo sua magia se esvair. Alguma coisa naquelas paredes a sugava…

Ficou mais atento ainda. Talvez precisasse se virar sem ela.

Reparou que, de longe, uma parede parecia ter um reflexo de vidro. Ghunter correu para ela. Encarou-a por um tempo: era de concreto.

Entretanto, quanto a encostou, a parede tornou-se transparente e o rapaz pôde visualizar: Luce, uma garota de 16 anos com cabelos loiros, longos e lisos, estava ajoelhada e sem esperanças.

Haviam a trancafiado em uma gaiola, presa ao teto por uma corrente.

A suposição de Lana estava, por parte, correta. Em algum momento os Verdes desceriam aquela corrente e Luce seria mostrada a todos durante o casamento, dependurada como um candelabro.

Ghunter bateu na parede. “Luce!” Berrava. “Luce!”

A garota parecia absorta demais em seus pensamentos para lhe dar atenção.

Lebre!”

O olhar dela, enfim, voltou à sanidade. Ela virou a cabeça em direção de Ghunter.

Gato?” Repondeu, primeiramente confusa. Mas logo se animou, afinal, estava ali para salvá-la de todo jeito. Ela correu até a extremidade da jaula, sorrindo.

“Onde estão meus irmãos?” Ouviu ela dizer, ainda que sua voz estivesse um pouco abafada.

Ghunter abriu a boca para responder, mas foi bruscamente jogado para trás por quatro mãos de brutamontes.

Gato!” Exclamou Luce, desesperada. Com a visão ainda embaçada, Ghunter viu três seguidores da Alice avançarem em sua direção.

Ele riu, cospindo sangue e se levantando. Oh, como havia sentido falta de um combate corpo-a-corpo. “É tudo o que têm?”

Os noivos já estavam no altar, para começar a cerimônia. Todas as atenções estavam pregadas neles. O vestido escalarte e o cabelo de Vitoria estavam mais bufantes do que nunca.

Lana começou a ficar inquieta. Ora, aquele era o momento perfeito. Todos estariam tão ansiosos que entrariam em choque se libertassem Luce na hora… E maior seriam as chances de conseguir fugir.

Lana varreu o Salão com os olhos, procurando pela presença de Ryan em algum canto.

Sentiu uma mão em seu braço, e um homem sussurrou em seu ouvido: “Fuja.”

A Lagarta se virou para quem lhe falava. Era Pan.

Ele não estava bem. Suas olheiras estavam profundas e ele apresentava um tique nervoso. Seus olhos estavam arregalados e vidrados… Como se ele estivesse lutando contra alguma coisa dentro de si…

Por favor.” Ele sussurrou. “Antes que seja tarde.”

A moça ficou sem reação. E não queria ter reação, não naquela multidão e não naquele momento.

“Eu nunca quis que chegasse a esse ponto. Desculpe.”

Seus olhos lacrimejantes falavam a verdade. Estaria enlouquecendo…?

E Pan foi embora de forma brusca e corrida. Teve o impulso de ir atrás dele. Giullian e Carl, que avistavam a situação de longe, seguiram Lana no intuito de impedi-la.

Mas os dois não foram necessários para interrompê-la. Lana mesma cessou a perseguição quando avistou Ryan próximo de uma pilastra.

Algemas voaram em direção das mãos e dos pés de Giullian e Carl. Os dois caíram no chão.

A multidão se afastou, deixando ambos os rapazes expostos.

Mas a Lagarta não se moveu, nem olhou para trás. Em choque, ainda observava o Coelho.

Ryan a encarava com um olhar sinistro e um sorriso macabro. Segurava uma corrente em sua mão. Olhando para cima, Lana viu que o fim desta corrente pendia no teto.

Os pensamentos foram se organizando em sua mente. Voltou seu olhar para Ryan.

Oh, Lagarta, não entende?” Leu os lábios do Coelho. “É tarde, é tarde, é tarde!”


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