Sobre Príncipes e Princesas escrita por Hanna Martins


Capítulo 29
Passado e Futuro


Notas iniciais do capítulo

Minhas reações ao escrever esse capítulo:
Vixi!
awwww
Eita!

E vamos descobrir alguns segredos da realeza...



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A rainha, como um pássaro impaciente, nos observa. Ela ainda está impecável em seu vestido verde que realça a cor dos penetrantes olhos, porém, a irritação está muito bem estampada em seu semblante. Sem nenhum disfarce. Nunca a vi neste estado, isso é inquietante, no mínimo.  

— Emma, eu não lhe avisei sobre os boatos? — a voz pode parecer serena se você a escutar sem prestar muita atenção, mas irá notar o tom impaciente caso ouça com mais cautela. — Não lhe alertei para ser cuidadosa? Não lhe disse que todos os olhos da nação estavam postos sobre você?  

Não ouso contestá-la. Aliás, desde que ela entrou no palácio de verão sem ser anunciada previamente, denotando uma quebra de etiqueta (um crime que é considerado gravíssimo por ela), não pronunciei uma só palavra.  

Com o canto dos olhos vejo que Leon se mantém quieto, alheio, diria até, à bronca da rainha. Não faço a mínima ideia no que ele está pensando. Sua máscara de impassível é mais temível do que qualquer outra coisa.  

O que ele está pensando sobre aquelas fotos, sobre aquelas matérias sugestivas? Será que ele está zangado comigo porque não lhe contei sobre os boatos que circularam entre mim e seu primo? Ele estava tão ocupado e os rumores eram tão idiotas, sem sentido, que acreditei que não valia a pena falar sobre eles, apenas lhe traria uma preocupação desnecessária a mais. Não ter noção algumas sobre seus pensamentos me deixa muito impaciente, mais do que escutar o sermão da rainha.  

— Por enquanto, vamos tentar contornar essa situação. Tenho uma reunião daqui a meia hora com o Departamento de Diplomacia e Imprensa, vamos decidir como lidaremos com esse problema — enfatiza, como se estivéssemos diante de uma verdadeira crise mundial. —  Até lá, todos os compromissos de vocês serão cancelados. E vocês estão terminantemente proibidos de deixar o palácio de verão até segunda ordem.  

Meu ânimo só piora. Com toda essa crise da realeza provavelmente terei que dizer adeus aos dias que passaria com minha família. Aliás, por que ainda tenho esperanças? Está claríssimo que preciso me despedir das minhas férias.  

— Com sua licença, Vossa Majestade — diz Leon, se retirando.  

A rainha apenas assente com uma leve inclinação de cabeça. Aproveito a deixa para também escapulir da presença real de minha sogra.  

Tudo o que aconteceu foi tão repentino que nem deu tempo para digerir. Não sei o que pensar. A única coisa que sei é que preciso ver Leon.  

Vou até seu quarto, mas ele não está. Procuro-o na sala de música, também sem melhores resultados. Pergunto para os funcionários do palácio sobre seu paradeiro, mas ninguém consegue me informar sobre a localização do príncipe. Quando ele quer desaparecer é ótimo nisso. E o palácio, que mais parece um labirinto, colabora com seu plano de fuga.  

Já estou cansada de o procurar e pensando que seria mais fácil simplesmente desistir, quando ouço uma melodia agitada que vem de uma saleta quase obscura no terceiro andar. Me encaminho para lá rapidamente. A porta está fechada, hesito em abri-la. Não faço a mínima ideia de como irie encontrar o humor de Leon. Inspiro profundamente e abro-a. 

O som vem de uma antiga vitrola. Há muito tempo não vejo uma destas. Minha avó tinha uma, mas ela quebrou e ninguém a consertou. Por um segundo, penso que fui enganada pela música, no entanto, volto meus olhos para um dos cantos da saleta e localizo Leon, quase escondido pela cortina, olhando por uma das janelas. Com passos receosos me aproximo. Não sei se ele notou minha presença. 

Ele olha com os olhos de quem não vê o que tem diante de si. Seu perfil, alto e belo contra a luz, o faz parecer uma figura quase irreal.  

— Mark Dameron — fala subitamente, me pegando desprevenida.  

— Mark Dameron? — repito, tentando averiguar se esse nome me traz alguma recordação. Entretendo, o nome não me é familiar.  

— Lembra quando você me perguntou se eu tinha um herói? Eu não te respondi naquela ocasião... Mark Dameron é o que posso classificar como uma espécie de herói para mim. Ele me apresentou ao mundo da música. Eu tinha cinco anos quando o vi tocando pela primeira vez e foi uma revelação, era a coisa mais maravilhosa que eu já tinha presenciado. Você já sentiu que faz parte de algo maior? Foi assim que a música de Mark Dameron me fez sentir. Desde aquele momento, eu sabia que a música era meu destino... Loucura, não?  

— Não, não é — afirmo. —  É ele quem está tocando? 

— Sim — confirma, voltando-se para mim. —  Ele é um compositor e pianista incrível. Um dos melhores do mundo. E só aceita um número restrito de pupilos, quando os aceita, diz que quando ensina gosta de dar tudo de si, por isso o número pequeno de alunos. Ele escolhe apenas os melhores, aqueles que realmente têm algo de especial — há um certo entusiasmo em seu tom ao falar do músico e da música. —  Não há ninguém como Mark Dameron no campo da música. A maneira que ele enxerga a música é fascinante. Ele a vê como algo que não apenas pode transmitir sentimentos, mas também ser o próprio sentimento, entende? Algo vivo. A música que ele produz é orgânica. Ouça-a! — Toca o ouvido e depois o coração. — Você precisa usar todos os sentidos para realmente escutá-la.  

Fecho meus olhos, e mesmo não entendendo muito de música, posso senti-la pulsando, vibrando, em meu ser.  

— Ela é maravilhosa... Gostaria de ouvi-lo pessoalmente um dia. Ele parece ser alguém muito interessante e talentoso.  

— Ele é. — Sorri como alguém que se lembra de algo nostálgico.  

Leon me olha por alguns segundos silenciosamente.  

— Sabe por que estou te contando isso agora? Respondendo a uma pergunta que você me perguntou tanto tempo atrás...  

Ele aproxima-se de mim e me conduz até o pequeno divã que fica próximo a uma janela.   

— Porque eu desejo que não escondamos coisas um do outro, Emma. 

— Leon, me desculpe por não ter te contado sobre os boatos, mas eles eram tão idiotas e você tem tantos problemas para resolver, não queria te aborrecer com mais uma coisa sem sentido.  

—  Eu sei... — Leva a mão até meu rosto e o acaricia suavemente. —  Sei que eram rumores idiotas, sem fundamento algum, mas esse não é um motivo para ignorá-los. A rainha até te chamou para conversar sobre eles, e quando ela fala sobre algo é uma boa razão para se pôr em alerta.  

— Acho que aprendi minha lição ... — Retenho sua mão em meu rosto.  

— Somos parceiros, Emma. Estamos nessa, juntos. Não há motivos para escondermos coisas um do outro, certo? 

Assinto.   

— Vamos prometer uma coisa, a partir de agora não vamos esconder coisas um do outro, tudo bem? 

— Não esconder nada? 

— Nada. Emma, não quero que existam segredos entre nós. Não quero que se crie um muro intransponível construído a base de segredos. Um muro que não podemos destruir... 

A mão de Leon é quente e carinhosa. Seus olhos são límpidos, não há nenhuma sombra de dúvida neles.  

— Tudo bem — assinto. — Tenho algumas perguntas, você as responderá para mim? — indago, apertando sua mão com certa força.  

Como resposta, ele deposita um doce beijo em meus lábios. 

— Responderei tudo o que você me perguntar — afirma com convicção e seriedade. 

— Por mais que elas sejam difíceis? 

— Sim, por mais que elas sejam difíceis, eu ainda assim as responderei da forma mais honesta possível.  

Respiro fundo. Existem muitas perguntas que pairam em minha mente há um certo tempo. Tenho receio das respostas, mas não posso viver mais com essas dúvidas. Preciso aprender a lidar com a realidade por mais difícil que ela seja. 

— Por que a família real iria aceitar uma plebeia? Sei que há aquela história da promessa entre nossos avôs, mas não sou tão ingênua em acreditar que apenas esse foi o motivo... 

Leon escuta a minha pergunta atentamente. 

— Como prometi, vou ser o mais honesto possível em minha resposta. Não vou omitir de você as coisas que sei... — Respira fortemente. — O rei sempre foi alguém... que faz coisas que não deveria. E a rainha é a responsável por limpar a bagunça, varrê-la para baixo do tapete, escondê-la nos cofres do palácio. Ela é quem mantém a imagem de família impecável que todos conhecem. Um trabalho realmente fantástico, considerando o absurdo número de coisas que precisa ocultar... Mas, acontece que dessa vez, o rei foi longe demais, até mesmo para seus próprios padrões. Você conhece Mia Coulter, não é? 

Claro que conheço. Aliás, quem não conhece Mia Coulter? Absurdamente famosa, odiada e amada com a mesma intensidade. O país poderia ser facilmente dividido entre os fãs e os odiadores de Mia. Toda vez que ela faz algo é motivo para notícias. Se ela quebrar uma unha, por exemplo, teremos material jornalístico por dias ou semanas, dependendo do tamanho da unha quebrada.  

— Lembro que ela estava naquela competição de hipismo em que boa parte da família real assistiu. — Esse foi um dos primeiros eventos oficiais que a família real compareceu após a morte dos príncipes herdeiros. Fui até apresentada a Mia Coulter nesse dia.    

— E ela tinha seus motivos para estar lá — prossegue ele. — Provavelmente, provocação. Mia Coulter foi desde os 19 anos a amante do rei.  

A celebridade mais polêmica da nação, amante do rei Carlos IV? A realeza realmente tem seus podres e precisa de um bom alvejante.  

— Por algum motivo, ela acreditou que se tornaria a rainha. O rei prometeu isso a ela, que se divorciaria da rainha e a colocaria no trono ao seu lado. Mas o que ela não sabia é que não era a primeira e nem a última a ouvir essa promessa... E por causa dela, o rei fez muitas coisas, não me pergunte quais, porque não sei de toda a sujeira, apenas sei que... foram coisas muito problemáticas. Porém, um belo dia, ele se cansou dela, como sempre se cansa, e procurou por outra. O que ele não contava era com Mia prometendo aos sete cantos que iria revelar todos os segredos do rei e da família real para a mídia. O rei foi tolo em acreditar que se envolver com alguém como Mia, que tem muito poder, afinal ela é conhecida por todo o país, é até mais famosa que a própria família real, não lhe traia nenhuma consequência. 

— E onde o casamento entra nessa história? 

— A rainha estava tentando limpar mais essa grande bagunça do rei. Porém, desta vez nem mesmo a inteligente rainha com todo o seu poder e influência poderia menosprezar Mia. Ela precisava utilizar as suas melhores armas. Mas, estava sem munição. E para complicar havia velhos boatos aparecendo, boatos que há muito tempo a família real acreditava estarem extintos. — Suspira. — Alguém estava espalhando que o título de governante estava nas mãos incorretas, a governante legítima deveria ser Sylvia, a irmã gêmea do rei. Há uma teoria que foi alimentada quando os dois eram adolescentes, acredito que boa parte se devia a suspeita de que o príncipe herdeiro seria um péssimo rei.  

“Enquanto o príncipe herdeiro era imaturo e vivia fazendo bobagens, a princesa Sylvia era o exemplo do que um governante deveria ser, inteligente, sensata, uma líder nata. E acima de tudo era carismática. O povo amava a princesa, as famílias tradicionais a viam com bons olhos. Foi então que começou a circular uma estranha teoria, cochichada de orelha em orelha, o melhor modo de espalhar uma ideia, de que o príncipe herdeiro não era legítimo, mas sim sua irmã gêmea. Segundo esse rumor, foi a princesa Sylvia que nasceu primeiro... 

“Com o casamento do príncipe herdeiro com uma moça de família nobre, conhecida e amada por muitos de nosso país, que tinha todas as qualidades que pareciam faltar no príncipe herdeiro, em seguida o nascimento de um príncipe, Francis, e o mais importante, o casamento de Sylvia com um milionário italiano, os boatos acabaram morrendo. Porém, eles ressurgiram muitos anos depois. 

“A princesa Sylvia estava de volta ao país. Boa parte da nobreza viu o amor pela princesa renascer, se é que algum dia ele morreu. O amor pela princesa ressurgindo ainda com mais força, boatos se espalhando como fogo, e o rei cometendo bobagens. Não havia cenário pior para a família real. Mas, a rainha é astuta, sabe jogar o jogo dos tronos.  

“Lorde Farber, um dos nobres mais influente, era uma das raras pessoas que conhecia a promessa do antigo rei Tomás, o casamento de um dos príncipes com a neta de seu amigo, um ex-guarda do palácio. A rainha viu aí uma grande oportunidade. Ter Lorde Farber como aliado seria uma grande conquista. Com toda a sua influência, ele poderia facilmente fazer de seu aliado alguém muito forte. Para conquistá-lo, bastava agradá-lo, e qual seria a melhor maneira se não fazer aquilo que ele mais preza? Respeitar a tradição, em que a palavra de um rei anterior era lei, quase sagrada. E ele já vinha pressionando há algum tempo a família real para que fosse cumprida a promessa feita pelo rei Tomás.  

“E assim a rainha resolveu cumprir a promessa. Trazendo desse modo Lorde Faber para seu lado e também conquistando aliados entre o povo, que se encantou com toda a história de uma princesa plebeia.” 

Leon termina de contar a história de como eu vim parar no meio de toda essa loucura chamada realeza. 

— Bom, as coisas fazem mais sentido agora. — Suspiro. — É com certeza muita coisa para se pensar... 

— Assim é este insano mundo da família real. — Seus lábios se levantam em um simulacro de sorriso. — Cheio de intrigas, manipulação e mentiras.     

Ele pega as minhas mãos e as acaricia delicadamente. Parece cansado. Mas, eu preciso continuar. Se eu não fizer essas perguntas agora temo que possa perder a coragem.  

— Por que você aceitou esse casamento? 

Leon aperta minhas mãos.  

— Sabia que essa seria uma de suas primeiras perguntas, mesmo desejando que não fosse... Mas, eu prometi que seria honesto com você e que diria toda a verdade e vou cumprir minha promessa.  

O olho, temendo pela resposta. Mas, sei que preciso ouvi-la.  

— Foi uma troca. Eu me casaria com você e eles... bem, eles dariam um jeito de arquivar o processo contra o pai de Lyane que estava preso.  

De certa forma, eu sabia disso, as peças que juntei anteriormente me levavam a essa conclusão, apenas não quis juntá-las corretamente.  

— Você ama Lyane tanto assim ao ponto de sacrificar seu futuro? — a pergunta sai de meu peito repleta de dor, mais uma pergunta dolorosa que preciso fazer.  

— Emma, eu amava Lyane... Mas eu sentia, acima de tudo, que tinha uma dívida com ela. Ela foi alguém muito importante para mim, esteve comigo em diversas situações. Ela e eu nos compreendíamos. Nosso amor pela música, o fato de termos crescidos em famílias extremamente estranhas... 

Ouvi-lo falar de sua relação com Lyane provoca em meu coração batidas fortes. Os dois têm uma história. E posso vê-lo ao lado dela. Ela é alguém que o complementaria melhor do que ninguém, melhor do que eu certamente.  

— Mas, isso está no passado. Bem no passado. Quando eu aceitei me casar, já tinha ficado claro que eu e Lyane jamais teríamos um futuro juntos. Lyane é meu passado. Não posso apagá-lo, mas irei deixá-lo lá, no passado. — Acaricia minhas mãos. — Prometo que farei de tudo para que meu passado não te assombre. Só peço que você faça parte do meu futuro. Você aceita? 

— Eu quero ser seu futuro.  

Beijo-o. Beijo-o experimentando seu gosto de hortelã e me perdendo nele por um longo tempo.  

Ele sorri deixando meus lábios. 

— Obrigado, Emma! — Deposita um carinhoso beijo em minha face.  

Encosto minha cabeça em seu peito, posso ouvir seu coração. Ele bate forte. Leon me envolve em um abraço forte e quente.  

Ficamos assim por um tempo. Há muita coisa para se pensar. Há muita coisa para se sentir. Só nos separamos quando um dos empregados vem nos avisar que estamos sendo esperados pela rainha.   

— Chegou o momento — diz Leon, me estendo a mão. — Queria te prometer que tudo vai ficar bem... Mas... 

— Sei que não é possível. — Sorrio, o tranquilizando.  

— Estarei ao seu lado. 

— E eu, do seu — prometo, envolvendo a minha mão na sua.  

Com as mãos entrelaçadas vamos de encontro a rainha, sem trocar nenhuma palavra. Com as mãos juntas entramos na sala em que ela nos aguarda.  

A rainha Felipa parece um tanto abatida, o que é algo realmente inusitado. Hoje vi diversas facetas dela que nem imaginava que existiam.  

— Sentem-se. — Indica as cadeiras em frente.  

Leon apenas a analisa, como se estivesse a estudando. Possivelmente, ele está mesmo a estudando.  

— Após conversamos, eu e o Departamento de Diplomacia vamos tomar algumas medidas para amenizar essa crise. Também chegamos à conclusão que uma criança precisa nascer. Chegou a hora dos príncipes herdeiros darem um bebê à nação. 

O que acabou de acontecer aqui? Eu devo estar interpretando as palavras de uma maneira incorreta, não estou? Ela não acaba de pedir para que eu e Leon tenhamos um filho, não é? Definitivamente, devo ter escutado errado. 


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Notas finais do capítulo

O que acharam? A realeza e seus segredos obscuros e agora a rainha me solta uma bomba dessa no colo da Emma... O que será que vem por aí?



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