O Curioso Caso de Daniel Boone escrita por Lola Cricket, Heitor Lobo


Capítulo 12
Jar of Hearts


Notas iniciais do capítulo

Bom... quem nos acompanha no Twitter e no Facebook ficou sabendo do porquê de não termos atualizado a fic semana passada, então não é preciso explicar outra vez. Só um resumo: demos um Sermão da Montanha sobre leitores e reconhecimento e trabalho e coisas assim.
MAS VOLTAMOS!
Vocês vão notar que "Jar of Hearts" é um capítulo mais curto que os que eu normalmente faço, e ele nem apresenta muita coisa nova: o prólogo inteiro está contido dentro das pouco mais de 2 mil palavras... e a razão é simples: VAMOS VOLTAR À NOITE DA FACADA! Vamos descobrir um pouco mais do que aconteceu naquele momento onde Daniel pode ou não ter morrido, ou seja, o que houve segundos antes e segundos depois do crime. Vai ser épico e vocês vão ficar mais curiosos ainda pra saber o que tanto rolou em 16 de abril de 2016 *u*
Música-tema: "Jar Of Hearts", de Christina Perri. Sofram e boa leitura!



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Washington, D.C.

16 de Abril de 2016

A noite da facada que pode ou não ter me matado

— Daniel, espere!

Sinto um gélido vento ricochetear em minhas costas após ouvir aquela voz. Resolvo não me virar para ver quem era porque já sei o que vou encontrar caso me vire. Pelo contrário, continuo seguindo meu caminho para a entrada do condomínio, na qual meu pai Aaron já me espera para voltarmos ao apartamento de meu tio Andy. Mas antes que eu dê o terceiro de quase cinquenta passos — o salão de festas é relativamente perto da entrada — uma mão forte me segura no braço esquerdo e me faz virar a fim de encarar o rosto suado de Shawn Hans.

— Precisamos conversar — ele diz, e seu tom de voz parece urgente.

Mas eu não vou ceder tão fácil assim.

— Não temos nada para conversar, Shawn — tento me desvencilhar de sua mão, mas o esforço é em vão, já que ele criou músculos de uma forma que com certeza não foi academia (eu saberia se fosse assim) e com isso não me soltava de jeito nenhum.

— Olha, me desculpa pelo que houve lá dentro, tá? — Ih, vai começar o draminha — Eu posso até ter bebido todas, mas ainda estou sóbrio o suficiente pra entender agora que eu fiz merdas muito grandes contigo. Desculpa… por favor, eu ficaria muito mal se você não me perdoasse.

— O que te faz pensar que eu te perdoaria agora, Hans? — Finalmente decido falar poucas e boas — Já aguentei dois anos aqui. Desde 2014 que eu venho lidando com essa barra que é gostar de um canalha e passador de rodo chamado Shawn Hans, e o que você fez pra melhorar a si mesmo nesse tempo todo? O que você fez?

— Você não tem ideia, não é?

— Do quê?

— Do quanto eu mudei nesse tempo.

— Ah, tá… na verdade, eu até que tenho uma ideia do quanto você mudou nesses anos, Shawn — ele finalmente solta meu braço — antes de eu ter certeza de que gostava de você, eu não fazia ideia de como você era. Só via seus amigos com ego inflado pra cima de você, só via aquelas garotas praticamente esfregando os lábios delas nos seus, só via um cara que reprovou duas vezes por motivos que eu preferi não saber pra não afetar o que sentia — o moreno à minha frente franze as sobrancelhas — no ano seguinte, teve aquela coincidência de trocarmos de escola e de transporte de novo. Aí eu pude te conhecer mais…

— E o que você viu em mim? — Pergunta, mas sei que ele não está me notando tanto pelo fato de que deve haver algo atrás de mim e ele prefere encarar isso a encarar a mim e minhas palavras.

— O mesmo que eu vejo agora — digo, em tom de desprezo — um canalha, que quando não consegue o que quer, desconta essa raiva em bebidas e garotas à parte. Um cara que dá valor à família, mas não valoriza as outras pessoas que se importam contigo — faço uma breve pausa quando noto que ele estava prestando atenção em mim — Shawn, eu sempre estive lá pra você e por você. Tipo, o tempo todo. Você me menosprezava na frente das pessoas, mas no dia seguinte lá estava eu de volta aos seus braços e procurando por mais demonstrações de afeto como aquelas que você fazia quando bem entendia. Eu sempre estive lá e você nunca notou isso.

— Eu notei, está bem? — Ele reage, e seu rosto começa a ficar vermelho muito provavelmente por conta da raiva que causei — Eu sempre via o brilho nos seus olhos quando a gente se encontrava, Daniel — eita, porra, ele não me chamou de Danico e isso significa que o jogo vai ficar sério daqui em diante — mesmo antes de você me mandar aquela mensagem, eu já sabia que você sentia algo por mim. Até porque estava meio na cara só pelo jeito que você me olhava e tentava conversar comigo. Você não sabe disfarçar nada.

Percebo que sua raiva repentinamente passou e ela dá lugar a um sorriso de lado. Daqueles que sempre me fizeram procurar por um hospital onde eu pudesse me colocar em coma. Vai por mim, os sorrisos de lado dados por Shawn Hans são destruidores a esse ponto.

— Se você notou tão cedo, por que não me disse antes? — Me surpreendo com minhas próprias palavras… mas logo em seguida noto que eu preciso soltar o que está preso em minha garganta — Poderia ter me poupado anos de sofrimento, sabia? Por três vezes, eu tentei esquecer o que sentia por você, Shawn. Nessas três vezes eu aprendi a viver só com a metade que pertencia a mim, e quando eu te via de novo, quando você vinha pedir por mais afetos de novo… todo o trabalho que eu tinha pra te esquecer ia direto pro lixo.

Sua boca abre e fecha a toda hora, como se ele quisesse dizer alguma coisa, mas não conseguisse encontrar as palavras certas para dizer. Meus punhos já estão cerrados, e não sei o porquê disso. Mas eu crio coragem para levantar a última questão.

— Quem você pensa que é, andando por aí, deixando cicatrizes, colecionando um jarro de corações e despedaçando o amor afora? — Ponho as mãos nos bolsos, pra não deixar claro que eu estava quase dando um soco nele por todos os anos de negligência — Onde você esteve quando eu mais precisei do seu apoio? Por que você não veio atrás de mim deixar claro que ao menos sabia que eu gostava de você, Shawn? Você por acaso tem ideia do quanto eu sofri por te amar em segredo?

— V-você me ama?

Puta merda. Porra. Caralho. Filha da putisse, a minha! Não devia ter dito isso.

Mas agora preciso arcar com as consequências. Falei, tá falado.

— Mais uma coisa que você não notou em mim — lágrimas insistem em sair de meus olhos. A emoção era demais, eu não ia aguentar tanto tempo em pé — eu gosto de você a ponto de te amar, Shawn Hans. E eu não mereço passar por isso.

E começo a andar para trás, fazendo menção de ir embora e deixá-lo ali pensando em toda essa discussão. Mas antes que eu me vire, o cara de elfo grita:

— Eu gosto de você, porra! Eu realmente gosto, tá?

Senti meu rosto congelar diante do que acabara de ouvir. Então isso é real? Por favor, alguém me dá um tapa bem na cara e destrua meu óculos emo gótico depressivo, porque eu preciso de um tapa mesmo. Não consegui mover um músculo sequer. Shawn também não. Na verdade, ficamos absolutamente parados por intermináveis segundos, pensando no que fazer agora que nossas dúvidas foram – cruelmente – sanadas e não há nada que nos impeça de cometer uma atitude que outrora seria uma total loucura.

Fechei os olhos, contei até dez mentalmente e respirei fundo. Era uma mania minha; se eu não fizesse isso, já teria surtado, xingado Deus e o mundo e provavelmente meus pais estariam ligando para uma clínica psiquiátrica. Ou não, minha mãe ao menos não liga pra minha existência desde que a verdade sobre mim fora revelada a ela. E meu pai e tio Andy seriam os únicos que poderiam ligar pra um hospício. Mas eles se importam demais comigo para tal, então esquece.

Meus pensamentos foram interrompidos pela voz dele.

— Eu sei que vou me arrepender bastante disso depois, porque as pessoas vão falar disso eu vou negar porque essa é a natureza de um enrustido. Mas neste momento aqui, eu estou pouco me lixando pra essas pessoas e apenas sinto que preciso fazer isso.

Normalmente, quando esse tipo de coisa é dita, logo pensamos que vai rolar um beijo apaixonado pra depois ambos fugirem da própria responsabilidade de assumirem os sentimentos de uma vez por todas... certo? É o que todos pensam, e foi o que eu também pensei. Mas a vida tem essa Lei Oculta das Decepções: nada, absolutamente nada – nem mesmo os mais perfeitos sonhos sendo realizados – acontece como queremos que aconteça.

E algo que eu nunca pensei que veria tão cedo acabou ocorrendo diante de meus olhos. Shawn Hans, o segundo cara mais durão que eu já conheci – porque ninguém supera meu pai – começou a chorar. Vi uma lágrima teimosa sair de seu olho esquerdo, e não muito tempo depois ele pusera o rosto escondido entre suas mãos unidas, como se tentasse impedir que eu o visse daquela maneira.

— Não precisa esconder seu rosto. Todos choram. — Finalmente tive a coragem de dizer algo.

— Acredite, não é o que você está pensando — ergueu a cabeça para me encarar — não estou chorando por toda essa história... mas por algo que vai acontecer.

— Do que você está falando?

E no segundo seguinte, senti uma pontada forte invadir minhas costas e causar uma dor tão terrível quanto a de ter seu coração quebrado por alguém que não parecia te amar. Mas essa pontada era diferente... não parecia interna.

Só tive tempo de ver uma figura masculina se formar à minha esquerda... e essa figura segurava uma faca ensanguentada numa das mãos.

Aquele sangue era meu.

E aquela dor era resultado de uma facada brutal em mim.

A princípio apenas caio de joelhos no chão, urrando de dor — obviamente, seria estranho se eu não gritasse com o impacto daquela facada — e sinto que a mesma faca que entrou em minhas costas acaba de sair na mesma direção. Ainda ajoelhado, consigo erguer a cabeça para encarar Shawn, que apresenta uma expressão meio indecifrável em seu rosto. Ele parecia chocado, mas não tanto quanto poderia estar. Era como se…

— Sabia que isso ia acontecer? — De repente pergunto, com o pouco de forças que me restam.

A brutalidade da dor me atinge de uma vez por todas e caio para meu lado direito. A fraqueza insiste em tomar conta do meu ser e meus olhos começam uma dura batalha contra a vontade de dormir e não acordar mais. Não saber mais o que está havendo. Não lembrar que fui traído pelo crush e que eu já deveria saber que uma hora isso aconteceria, desde a primeira vez que o conheci. Porra, como eu pude ser tão estúpido a esse ponto?

— Eu te odeio! — Ouço o moreno gritar.

Por um instante até penso que é comigo que ele diz isso, mas logo vejo a mesma figura masculina da faca ensanguentada tomar meu campo de visão.

— Você sabe muito bem por que eu fiz isso, então não discuta!

— Quantas vezes vou ter que dizer que jamais concordei com essa história? Você simplesmente não tinha esse direito! Só espero que esse gelo dentro de seu coração te dê um resfriado. Agora corra antes que eu mesmo faça justiça com minhas mãos e te mate sem dó nem piedade — Shawn saca um celular de seu bolso esquerdo, enquanto caminha até mim e segura minha cabeça com um de seus braços — vai ficar tudo bem, Danico, vai ficar tudo bem… — sua voz ecoa em meus ouvidos, e logo depois o ouço ligar para uma ambulância.

E por mais que eu não tenha mais forças nem mesmo para pronunciar uma única palavra, tenho mil pensamentos que eu poderia muito bem transformar em um discurso dito em voz alta. E para não focar no sangue que agora escorre não só na faca como também em minhas mãos, me desligo completamente do mundo externo, fecho os olhos e me imagino voltando à cena antes de cair de joelhos no chão… e completo tudo o que sempre quis dizer. Mentalmente.

Olhe em volta. Está vendo isso? Está vendo esse sangue escorrendo entre meus dedos? Está vendo o quanto é duro amar alguém que não foi feito para você? Está vendo o que amor pode nos causar?

O amor errado... Este amor nos causa problemas. Este simples sentimento que se aloja em um pequeno espaço vazio de nosso coração e quando menos nos damos conta, tomou conta de tudo. De cada célula. De cada pensamento. De cada pedacinho daquele seu coração que já estava repleto de algo que você nem fazia ideia do que era.

Olhe, garoto, olhe como o amor nos causa problemas.

Olhe ao redor e perceba como você é um problema.

Olhe ao redor e perceba que nem mesmo nós meros seres humanos somos capazes de nos manter imunes ao amor.

Ao amor errado. Este amor nos causa problemas. Este amor está consumindo meu coração, minha alma e logo irá possuí-lo também. Não tem saída. Não tem porta dos fundos para correr. Não tem cobertor para se esconder.

Não tem nenhuma forma de se proteger.

Quando o amor errado bate na sua porta você atende, sabe por quê?

Porque ele se chama Shawn Hans.

Meu amor errado se chama Shawn Hans. E meu nome é Daniel Boone. Eu sou o problema. Eu sou o coração cheio de vários nadas. E Shawn é o errado.

O que todo mundo deveria manter – pelo menos uma vez na vida – distância.


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Notas finais do capítulo

Deixo as notas finais apenas com duas informações:
1. O próximo capítulo será escrito por mim e sai em duas semanas, normalmente.
2. Sigam-nos nas redes sociais para ficar por dentro de todas as novidades de OCDB!
Acho que Jar Of Hearts foi bombástico demais pra eu falar alguma coisa aqui, né? COMENTEM E DEIXEM SUAS REAÇÕES PORQUE TÁ TODO MUNDO SURTANDO NESSA JOÇA *O*



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