All you need is love escrita por Aline


Capítulo 1
Sim


Notas iniciais do capítulo

Tá bunitim



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–Eu e Bratt vamos casar!- A mais velha disse, um pouco tímida, agarrando o braço do namorado, enquanto ambos sorriam para a filha/enteada. Beck abraçou a garota ao seu lado com mais força, para que ela não corresse e estrangulasse o casalzinho feliz. Os olhos dela faiscavam, o rosto adquiria um rubor doentio a cada risadinha da mãe. As outras pessoas da família levantavam-se do sofá para felicitar os noivos, enquanto Jade mirava a mulher com ódio e repulsa. Seu irmão permaneceu sentado, com o queixo encostado na mão do braço inclinado, seu rosto indicando um alto desapontamento.

Jade andou dois passos até a mãe, e sentiu vontade de cuspir em sua cara. Queria arrancar seus olhos, pinicar suas sardas em um hambúrguer de cebola e cortar seus seios com alguma tesoura não especial. Queria correr e socá-la, dizer o quanto a odiava por aquilo, queria matá-la. Queria morrer, queria chorar, mas não queria fazer nada disso só por ela. Não correu. Apenas caminhou apressadamente, subindo as escadas até o quarto. Seu irmão, Lennin, olhou para Beck e fez-lhe um sinal para que subisse também. O moreno concordou, chegando lá em poucos segundos.

–Jade, ela...- Pretendia começar um discurso de consolo, mas percebera que a namorada não estava em seu quarto.- Jade?- Virou o pescoço para o outro lado e notou que ela estava no quarto da mãe, jogando os álbuns de fotografia pela janela.- Jade... Não!

–Ela tem que morrer. Desgraçada, vagabunda, mentirosa!- Engoliu de volta umas lágrimas nojentas e teimosas que queriam escorrer.

–Amor, deixa isso. Calma... Jade... Jade.- Tentou abraçá-la, mas ela o ignorou.

–Vai embora, Beck... Você nem tinha que tá aqui vendo essa velha babando no namorado cretino. Ela me dá nojo!

–Não dá não. Eu sei, você...

–Não sabe... Cala a boca! Você não sabe, vai embora, Beck!- Insistiu, querendo mesmo pedir para que ele ficasse a vida toda. Ele passou a mão pelo cabelo, pensando em como faria para não brigar com Jade novamente.

–Okay, eu vou pra casa. Você... me liga quando quiser falar. Ou me chama no chat.- Disse, um pouco triste e aborrecido, beijando o rosto dela.

Ela o viu se afastar sem pressa. Não queria perder seu pai, mas ele foi embora, com uma senhorita jovem e gentil, bem diferente dela. Não queria perder sua mãe, mas agora ela passava quase todas as noites com Bratt, eles saíam sempre, deixando Lennin, o único e mais novo irmão de Jade, de nove anos, com uma babá porque consideravam Jade perigosa e imprestável. Não queria perder Beck, mas estava o mandando embora de sua casa, estava fazendo isso com frequência, não queria que ele visse o quanto sua mãe era horrível, não queria sua piedade, não queria seu consolo, só queria sua presença.

–Beck.- Cerrou os punhos, garantindo a força suficiente pra não cair nos braços dele, molhando sua jaqueta de lágrimas estúpidas e desnecessárias como as garotinhas fazem nos pelos dos unicórnios.- Fica aqui.- Disse, mirando o teto para não falar como uma boboca pidona. Ele estendeu o braço em sua direção, para segurar sua mão. Os dois caminharam para o quarto dela, trancando-se lá durante alguns infinitos bem pouquinhos.

***

Era dia 29. De um junho horrível. Verão, calor feio, cheio de pessoas suadas, com rostos cobertos de protetor solar grudento. As garotas todas fazendo cortes bem modernos em estilo chanel, a molecada implorando por um sorvete depois da escola, um monte de gente nas praias, fazendo carinho em golfinhos... Urgh! Golfinhos...

A mãe de Jade já se apressava para ir ao salão, conversando com as amigas ao telefone, contando sobre o quanto seu vestido era incrivelmente longo e largo e bonito. E branco. Fútil, Jade pensou. Pensou também que era a última chance que teria para impedir sua mãe antes de se aprontar para o casamento. A cerimônia iria ocorrer às 17h. Só eram 9h. E a noiva já corria pela casa, buscando as chaves do carro, vestindo um sorriso repugnante de alegria. Beck havia dormido com Jade na última noite, só para garantir que ela não tentaria asfixiar sua mãe, incendiando o quarto dela ou algo assim. O moreno acordara e fora para o banheiro ao lado, deixando a porta entreaberta, o que fez com que Jade ouvisse toda a lábia ensaiada para Lennin. A mulher havia se ajoelhado ao lado dele, afastando seus cachinhos castanhos e lhe prometendo que Jadelyn e ele nunca estariam sozinhos. Que nada iria mudar. Que eles iriam se mudar para a casa do jovem e atraente engenheiro Bratt apenas para que a mamãe pudesse ser feliz novamente, e para que Jadelyn e ele pudessem ser mais felizes numa família nova também. Lennin estava convencido. Sua mãe era bonita e nunca mentia, ela tinha aqueles olhos raramente contentes da Jadelyn quando compra uma tesoura. A mais velha se despediu, mandando beijinhos no ar para os filhos e o genro.

–Nos vemos lá na igreja!- Disse, batendo a porta em seguida.

Igreja! Pra quê igreja? Eles nem tinham religião! Só porque Bratt era católico...

–A sua mãe já saiu.- Beck anunciou, entrando no quarto da namorada, guardando sua escova de dentes na mochila que trouxera na noite anterior. Ele havia perguntado se Jade preferia que ele passasse a noite seguinte novamente com ela em sua casa, já que Bratt e a mãe estariam em lua de mel durante uma semana, mas ela disse que detestava a babá de Lennin... E o próprio Lennin também, por isso não queria ficar em casa. Então os dois iriam para o RV do Beck, onde não havia cheiro de mãe falsa, padrasto novo, irmão chorão nem babá oferecida. Onde talvez, mas só talvez, ela diria que não consegue odiar sua mãe, só sentir raiva. E um pouco de medo. E mais raiva!

–Eu ouvi.- Falou, enquanto encaracolava as mechas coloridas nos dedos. Estava deitada do lado oposto ao espelho da cama, e virou de bruços para encarar Beck enquanto lhe respondia.- Me ajuda a arrumar a mochila, agora.

–Vai levar pro casamento? A gente pode arrumar depois de chegar.- Sugeriu, caminhando até sua cama, se jogando em cima dela, encostando o rosto ao da namorada. Ela negou com a cabeça, fazendo com que seus narizes se movessem de forma engraçada. Eles riram, fechando os olhos e juntando os lábios.

–Eu não vou voltar pra cá.- Sussurrou.- Só pra levar tudo embora pra casa do Bratt...- Disse, revirando os olhos, e pronunciando o nome do padrasto com repulsa. Beck riu, tirando um cílio da bochecha dela.

–Mas lá tem um monte de flores... Pra você destruir!

–É. E criados. Você acredita que ele tem criados?!

–Sua parte favorita dessa história toda, né?- Ele perguntou, percebendo a indignação de Jade.- Brincadeira... Desculpe.

–Claro que não! A melhor parte vai ser quando eles caírem do avião, depois dos explosivos que eu coloquei lá dentro.- Argumentou, sorrindo.

–Jade, seu pai casou. Sua mãe pode fazer isso também...

–É. Essa é a pior parte. Ele também já foi embora.- Ela disse, juntando sua mão à dele, enquanto mirava os lençóis pretos que cobriam seu colchão. Beck ficou calado, os dois sabiam que isso era uma droga, mas sabiam a hora de não falar nada.- E nem funcionou... Aquelas pimentas que eu coloquei no bolo do casamento. O bolo era de outro casamento...- Relembrou, revirando os olhos. Eles voltaram a rir, beijando-se até Lennin bater na porta, avisando que já era hora de pegar as roupas para se arrumarem pro casamento.

***

A única pessoa de preto. Na verdade, a única mulher vestida com preto, já que a maioria do público masculino trajava essa cor de terno. A única mulher com mechas roxas muito evidentes, vestido preto e maquiagem escura. Seria o modelito adequado para um velório, não fosse o seu "penteado digno" de filha da noiva, e o namorado bem apessoado ao seu lado.

Jade mordia as bochechas para não interromper aquele padre. Não fazia ideia do porquê havia aceitado estar ali! Era o pior momento de todos, era... Ah sim, Beck a convencera. Ele havia dito que era importante que ela fosse ao casamento para mostrar a mãe o quanto já era madura para entender suas escolhas, mesmo desejando a morte dos noivos. A cerimônia durou... Bom, Jade não estava prestando atenção, então só concluiu que era tempo demais! Ela estava ocupada, apertando a mão de Beck para não ter nada com o que cobrir o rosto. Queria muito chorar, mas não queria fazer isso só por ela...

Quando foram para o salão de festas, e o bolo foi servido, Lennin notou que a irmã e o cunhado não estavam por lá. Ele lembrou que Jade não era só a garota que se trancava no banheiro para atormentá-lo, ou usava-o como a criança assustada em um de seus curtas de terror. Ele lembrou que Jade era só a Jadelyn de sempre, que não queria que ninguém fosse embora pra valer. E que apenas ele, como irmão e aturador de sua convivência diária, e Beck, um namorado que estranhamente parecia amá-la mais do que o possível, conheciam essa figura da jovem.

Beck já havia visto Jade chorar. Com certeza. Porque ela também já havia visto ele chorando. Muitas vezes. Eram anos! Anos! Não só de namoro, era vivência, era mais que o “conhecer” básico entre pares. Assim como ela sabia que o namorado nunca conseguiria cortar o cabelo mais do que apará-lo, e não conseguiria voltar para a casa dos pais pela opressão da “ditadura" deles, ele sabia que Jade não abriria mão de suas tesouras por absolutamente nada, que mesmo sendo fria ela não iria matar ninguém (a menos em um caso extremo), e que ela estava cansada de ser trocada. Beck a ouvia falando de ser trocada pelo irmão, trocada pela madrasta, trocada pelo padrasto, trocada por garotas hollywoodianas bem mais atraentes que ela... De forma que se sentiu no momento certo para reafirmar:

–Eu não vou te trocar por ninguém.- Os dois haviam meio que fugido, meio que só sumido... Estavam no mesmo local alugado pelo mais novo “casal oficial”, porém fora de onde a maioria dos convidados estavam. Jade odiava aquela parte da família. Aliás, odiava a família toda, principalmente a parte que ainda tentava acreditar que não odiava... Então, eles foram para algum lugar onde as tias não os interromperiam, citando “Nossa, vocês ainda estão juntos! Vão casar quando?”, “Não acredito que aquela menina ainda tá com ele”, “Ele deve tá com ela por medo”.

Era a parte feia do local de festas. Só havia duas ou três crianças de rua procurando latas e brincando de pega-pega. Um bocado de plantas mortas, chão sujo e riscado, um poço seco e entupido de lodo, um celeiro vazio do outro lado, com madeira apodrecendo.

Era o cenário mais incrivelmente desagradável para qualquer um. Podia até ser para eles também, mas só naqueles minutos de mini fuga parecia diversamente frio e bonito. O som de The Beatles ainda podia ser ouvido daquele compartimento, bastante abafado. Jade e Beck estavam em cima de um retângulo maior do chão, que imitava um coreto, abraçados. Não estavam dançando nem nada demais, só abraçados.

–Não vai embora não, tá? Nem se eu pedir... Não vai não.- Ela disse, o que parecia mais uma ordem do que um pedido doce, devido ao tom de voz autoritário.

–Sim. Só... se você tiver segurando uma tesoura.- O moreno ponderou, acariciando os cabelos dela. O vento leve dava uns arrepios passageiros. Ela segurou em seus ombros, roçando os lábios rapidamente. Com uma quase pressa, as mãos só do abraço passaram a puxar os quadris dela, com força, enquanto eles molhavam a boca um do outro, movendo o pescoço para os dois sentidos, afundando o beijo numa pegação mais demorada. Após algumas apalpadas e puxões, Jade se inclinou para trás, afastando a franja.

–Ainda assim eu vou conseguir jogar a tesoura em você.

–Eu sei. É porque você me ama.- Ele disse, voltando a abraçá-la.

–Amo. Só não espalha.

–Já sabem.- Riu, passando os dedos por suas costas descobertas.- Sabem que eu amo você também.

–Eu não quero que ela vá, Beck...- Ela murmurou, observando a sombra de sua mãe na cortina beijando Bratt.

–Ela vai voltar. Elas sempre voltam, não é?! Pra atrapalhar a gente.- Falou, lembrando-se de quando sua mãe adoecera e fora realizar uma operação em outro Estado. Jade havia dito a mesma coisa, que “as mães sempre voltam pra atrapalhar a gente”, enquanto passava aqueles dias tristes com ele. –Mas sabe quem nunca vai embora?

–Hum?- Questionou, e viu o namorado apontar para si mesmo.- Ah, mas você vai...- Argumentou, revirando os olhos.- Tá sempre indo pro Canadá.

–Não vou deixar a sua vida, porque você não vai embora de mim.

Por isso eles sorriram, e permaneceram abraçados. Porque sabiam que tudo que precisavam já estava bem ali.


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Notas finais do capítulo

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