Minha História no Mundo Olimpiano escrita por Vencedora de Lesmas


Capítulo 20
Nada é Nada




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/66782/chapter/20

 Certo, vamos recapitular: Eu estava atrás da espada. Depois uns lestrigões atacaram. Beleza. E um deles, humilhantemente, me acertou na cabeça e eu desmaiei. Confere. Depois os semideuses problemáticos apareceram. Meu vô desgraçado apareceu também. Confere e confere. O velho maluco mandou os semideuses sabe-se-lá-onde. Ok, acho que vocês já pegaram o espírito da coisa.

  Mas, infelizmente, tudo realmente começou a piorar quando eu “aterrissei” em Memphis. Por que Hades eu estava lá?

  Grunhi de leve, fitando o céu azul. Passar tão pouco tempo uma caverna escura sem circulação de ar soa tão ruim quanto estar nesta situação, fazendo a imensidão do reino de Zeus ser a maior benção. Seria muito estranho se a filha do cara que passa horas trancado no quarto brincando com engrenagens tivesse claustrofobia? Pois é, difícil me comparar ao papai. Talvez o mau humor ajude. Ou quem sabe a dificuldade para me relacionar com formas orgânicas de vida, com exceção de uma criatura mitológica de 3000 anos? Tanto faz.

  Não sei se o Todo Poderoso Que Não é O Jim Carrey poderia ler pensamentos, mas um raio amigável cruzou os céus. Isto é; se um raio pode parecer amigável ou passar em pleno terreno aéreo sem nuvens ou qualquer coisa que possa causar a eletricidade. Nunca entendi ciências direito, de qualquer maneira.

  Voltando a história: Odisseu conversava com um babuíno. Algo de estranho nisso? Nada, ao menos que era um babuíno! UM BABUÍNO! Se fosse uma águia, tudo bem. Uma coruja, por que não? Até uma lontra, mas por que raios um babuíno?!

  Hey baby, respondeu meu caro amigo meio gatinho, meio galinha, tudo ok contigo? You can drive my car?

  - Claro, Paul McCartney – resmunguei – E o certo não seria Can you... ?

  Seu humor é maravilhoso, rosnou ele. Adoro te ver acordada. Nosso amiguinho quer falar com você.

  - O macaco? – rosnei de volta.

  - Não, eu. – respondeu uma voz que não era estridente ou astuta, porém muito, mas muito.... seria errado dizer sexy?

  Levantei os olhos para uma sombra que se extinguia acima de mim. Ainda estava deitada, claro. Levantar parecia pior do que lutar contra Ares em um mano-a-mano.  Não que ele seja forte, mas não gosto de ser atropelada por uma Harley. Acreditem, isso não é nada legal. Enfim, a sombra deixou a escuridão e tomou forma de um cientista louco. Mas o “louco” transformou-se em um cara alto, atlético, porém não daqueles que tomam bomba ou hormônio pra cavalo, com uma jaleco cheio de hieróglifos –seria o alfabeto egípcio mesmo? -, a camiseta coberta por molho de churrasco e sorriso simpático desenhado no rosto, adornado por seus cabelos claros. Não vi que de cor eram seus olhos, mas imaginei que um azul bem opaco cairia perfeitamente bem no meu Eistein sedução.

  - Ã... oi? – consegui dizer. Algo nele era muito familiar.

  Odisseu estava rindo por dentre seu bico. Nota mental: testar martelos na parte de pássaro do meu grifo. O homem me estendeu a mão. Segurei-a com minha direita, pois a esquerda estava praticamente dilacerada. Me levantei, conforme ele me puxava, sentindo-me meio sem graça, mas um lado de minha mente continuava a cortar; Não, Andressa. Pense em Hermes, porra!.

  - Eu sou Tot – ele sorriu mais, como se isso fosse possível. Me senti atraída por esse sorriso. No exato momento em que percebi isso, mordi o interior de minha bochecha. Não, não, não! Hermes, caralho!

  - Tot... – o nome ecoou, como se eu tivesse que me lembra de algo muito importante – Andressa. Bronze.

  - Bronze? – Tot me estudou de cima a baixo, o que me deixou com vergonha e trouxe mais cor ao meu rosto que provavelmente estivera pálido – Você não parece feita de Bronze...

  O babuíno bateu com a mão na testa enquanto Odisseu gargalhava mais. Admito que concordei com o gesto do primata.

  O cara pareceu notar o meu braço. Me perguntei como ele não havia notado tamanho ferimento logo de cara. Era como normalmente as pessoas falavam comigo, “Olá, bem-vinda ao Café Saint Louis e... Meu Deus! Você está tendo uma hemorragia!”. Tipico.

  - Você precisa de cuidados... – comentou ele, mordendo o lábio inferior – Sim, muito cuidados. (Nome do babuíno que eu não consegui entender aqui), vem cá, leve nossa convidada para dentro.

  - Oh, espere! – disse, sentindo minhas costas arderem em brasa e meu braço pinicar com a intensidade de milhares de abelhas – Não sei quem você é, ou como cria babuínos, o que é ilegal nessa parte do país, mas se você não quiser se meter em problemas...

  - É ilegal? – Tot parecia como se descobrisse algo novo – Esse século é muito interessante, não é?

  O macaco grasnou outro “Agh!” e um click! apareceu em minha mente, juntamente com um arrepiou em minha espinha e um pulo involuntário da parte de meu corpo. Como eu pude não perceber?

  - Você é Tot! O Tot! O cara do Egito Antigo!

  O deus sorriu. Novamente. Ele tava treinando para um comercial de Congate, é isso?

  - Exato, minha querida. Enfim, como veio parar aqui? – ele franziu a testa, estudando-me novamente – Os babuínos se irritaram muito quando algo interrompeu o jogo deles.... Sorte que sua esfinge estava aqui para apaziguar tudo...

  O que Tot definiu como “apaziguar” estava prestes a ser quebrado, pois Odisseu se colocou entre nós, apoiado nas patas traseiras com as asas abertas e as garras a postos ameaçadoramente em direção ao cientista, com o bico aberto para o alto, rugindo em fúria. Coisas que se deve saber sobre um grifo:

Apesar da cabeça ser de águia, eles podem sim rugir feito um leão. Nunca, NUNCA, chame um grifo de esfinge. Isso é como chamar Afrodite de meretriz, o que, apesar de meia-verdade, é um insulto horrível.

  Tot pareceu surpreso e pegou uma guitarra, que surgiu sei-lá-de-onde, para acertar Odisseu. O cara poderia ser bonitinho e me lembrar Hermes, mas ninguém toca no meu grifo. Já sabem o que acontece.

  O aparelho musical bateu contra a cabeça emplumada e isso foi o suficiente para despertar minha fúria, enquanto se ouvia um acorde agonizante de blues e Odisseu se movia para o lado por causa da pancada. Dei um soco bem no nariz um tanto quanto pontudo do deus. É, soquei um deus. E não era Ares. Puxa, os campos da Punição nunca pareceram tão perto!

  - Ai!

  O babuíno rosnou e me atacou, pulando em minhas costas. Pera, como ele foi parar ali... ? Isso não importa. Gritei de dor. Acho que quebrei uma costela. Uma não, duas.

  O roqueiro-cientista louco se recuperou rapidamente do golpe, e já voltara a duelar contra o bico feroz de Odisseu enquanto este já havia se voltado e mordido o ombro do deus. Estava uma loucura. Sabe 25 de março em dias úteis? Pois é.

  Um trovão ribombou no pelos mantos azuis do céu e um clarão surgiu ao nosso lado. Por experiência de semideusa, fechei os olhos.

  - Tot, meu amigo – disse uma voz nova no local, que fez meu coro cabeludo se arrepiar – Se importaria de se afastar de minha namorada?

  Grunhi e levantei os olhos, mas para isso tive de imobilizar as mãos do primata raivoso que se apoiara em meus ombros e usava minha cabeça como bom-gos. Já comentei que só dava pra usar a droga da mão direita e a esquerda pendia solta?

  Continuando, apareceu o mais improvável: Hermes, ao me lado, segurando uma espada em uma mão e o caduceu em outra, o elmo alado branco brilhado contra o sol, enquanto suas roupas de maratona foram substituídas por um jeans e por uma camiseta normal vermelha. Ele usara a lâmina para afastar Odisseu, enquanto seu caduceu pressionava o peito de Tot para que ele recuasse. As cobras se moviam inquietas.

  Olá, disse Martha.

  Hey you, falou George.

  Será que todos os animais mágicos machos estavam musicais hoje ou era apenas fruto de minha imaginação confusa que entrava em colapso após perceber que duas mitologias podiam interagir de um modo no qual ninguém explodisse? Era poder – essência, melhor dizendo –, de Hermes e de Tot, juntos, no mesmo lugar. Claro, já havia estado no Olimpo, mas, cara, essas auras eram tão diferentes que parecia impossível que nenhuma combustão ocorresse.

  - Na... Namorada? – foi a única coisa que pensei em dizer.

  Hermes sorriu e me dirigiu uma piscadela. Não importa se o cara do Egito fosse atraente, o sorriso do cara da Grécia era o único que me tirava o ar. Me senti culpada por ter olhado para outro deus. Isso soa mais estranho do que parece, acredite.

  - Ah, Hermes, oi – o cientista, que agora eu tinha certeza que era louco, abaixou a guitarra destruidora de penas, e tentou parecer mais calmo através do rosto coberto por molho para churrasco – Como vão as coisas no outro lado?

  - Normais, após a guerra – suspirou Hermes, afastando os braços já que os dois indulgentes haviam concordado em manter as hostilidades baixas – E neste lado?

  - Os Kane são interessantes... – admitiu Tot.

  Kane? Seriam semideuses?

  - Imagino – concordou o deus dos viajantes – Agora, se não se importa, posso levar Andressa?

  - Ah, claro. Eles não parecem hospedes bons, de qualquer jeito...

  Tot gesticulou de modo que me deixou ofendida. Indaguei Hermes com os olhos mas ele apenas me retribuiu um olhar de Depois.

  Odisseu, que agora mantinha-se de quatro novamente, embora com os pelos das costas formando uma linha arrepiada, grasnou para o babuíno. O macaco respondeu e ambos pareceram felizes e se entender.

  - Hora de dizer adeus, cara – falei, esperando que minha voz não soasse tão aliviada quanto estava – Agradeço a hospitalidade, Tot. Vamos, garotos.

  Hermes escondeu o riso e envolveu os braços em minha cintura. Corei, apesar de sentir uma leve pressão onde doía em minhas costas. Seus lábios tocaram minha orelha.

  - Você precisa descansar... – ele sussurrou, e eu tremi.

  - Muito bem – disse o deus egípcio, parecendo constrangido – Pode ir se pegar em outro lugar?

  O cara dos mensageiros assentiu e as asinhas de seu elmo começaram a bater. Me agarrei nele, segurando firmemente seus ombros, enquanto o metal da lamina tocava minha camiseta e a extensão do caduceu se apoiava na parte de trás de meus ombros. Medo de cair. Uma droga.

  - Vou te segurar – ele prometeu. E eu confiei.

  Argh! Isso está parecendo muito Crepúsculo! Ou mais um sonho molhado de adolescente. Hmm...

  Enfim, ele decolou e Odisseu veio atrás. Só lembro de desmaiar com a cabeça em seu ombro, era como se a escuridão me devorasse aos poucos por dentro, recolhendo cada informação que eu tinha armazenado nesses poucos minutos. Era como se minha memória fosse apagada, e deixasse um rastro dolorido para trás.

***

  Acordei ao que parecia ser uns 40 minutos depois, com minha cabeça latejando. Abri os olhos e tentei reconhecer o lugar, mas não consegui. Estava cercada por arvores, em uma clareira banhada pelo sol. A autora desta fic não estaria se confundindo com outra história, não?

  Fui me sentando aos poucos, esperando a dor, mas não senti nada. Coloquei as mãos a cabeça, e fiquei mais surpresa ao ver que meu braço esquerdo estava perfeitamente bem.

  - Calma... – ouvi o sussurro.

  Ao meu lado estava sentado Hermes, cuidando de uma fogueira improvisada onde assava algo que parecia ser carne. Odisseu estava deitado entre duas arvores que pareciam formar um arco. Ao lado do deus, seu caduceu estava cravado na terra e a espada descansa em algumas pedras.

  Estiquei as costas completamente, quase retendo um bocejo, mas fui paralisada pela cena, na qual agora eu prestava mais atenção. Seria um sonho? Afinal, os deuses podiam fazer conexão com os meio-sangues através de sonhos, certo?

  - O que...?

  - Nada – ele respondeu rapidamente, colocando um braço sobre meus ombros e tirando a faixa molhada que estava em minha testa. Eu nem tinha reparado nela – Só se acalme... Você teve um sonho turbulento...

  - Sonho...? – apertei os olhos tentando me lembrar, mas como era se as últimas horas tivessem sido apagadas... Lembrava-me de sumir da caverna do tirano e de aparecer em Memphis, mas nada mais.

  Os lábios dele tocaram minha bochecha e eu pude sorrir.

  - Senti sua falta... –murmurei, o que era tolice, pois fazia pouco tempo desde a última vez na qual nos vimos. E eu sabia que se realmente algo rolasse entre nós, o tempo que nos separaria seria infinito.

  - Assim como eu... – ele me beijou novamente – Foi difícil resistir à tentação de te ver... Mas quando aquele filho da-... Desculpe, mas quando ele estava te tirando completamente da rota, tive de interferir.

  - Não quero te decepcionar... – disse, sem pensar.

  - Sei que não...

  - Mas é que...

  - ... você é apenas mais uma tola apaixonada?

  - A maior de todas.

  - Que bom, pois também sou um.

  Me virei e fitei-o por um momento. Hermes sorria, mas tinha tirado seu capacete, deixando seus cachos caírem pelas laterais de seu rosto fino e astuto. Toquei-o levemente, correndo meus dedos até seus cabelos, entrelaçando-os com os pequenos redemoinhos. Me inclinei sob seus lábios e o beijei de modo gentil.

  “Ah, que meigo!” é o caralho! Me segurei muito para não pular nele, mas, por sorte, não precisei bancar a tarada dessa vez. Ele segurou minha cintura mais uma vez e nos colocou de frente um para o outro, puxando-me para cima dele enquanto intensificava o beijo.

  Hermes se deitou de costas e me ajeitou em seu corpo, para como ficássemos colados, em uma posição bem... ãhn.... Digamos que quem visse não pensaria que estaríamos fazendo coisas inocentes.

  Suas mãos traçavam minha espinha enquanto eu brincava com seu cabelo. Uma mão desceu demais, o que me fez parar para encará-lo.

  - O que? – ele franziu a testa.

  - Sei que você é rápido, mas...

  - Entendi... – embora dissesse que tivesse entendido, Hermes não parecia feliz com isso.

  Sorri e voltei a beijá-lo, dessa vez com mais vontade.

  O clima começava a esquentar, esquentar de verdade, mas ambos paramos do nada.

  - Agora não – ele disse, eu concordei – Bom, minha querida... Espero que descanse bem... Te deixei mais perto agora. Boa sorte.

  Hermes me deu um último beijo, me colocando gentilmente para o lado enquanto recolhia suas coisas. Depois me dirigiu uma piscadela, com sua boca formando algo como “Coma o que está fogueira, vai precisar” ou “Eu te amo”, mas isso seria apenas fruto de minha imaginação.

  Com mais uma piscada, ele me sussurrou para fechar os olhos. Através de minhas pálpebras, pude sentir o clarão do poder divino de Hermes se concentrando para a transportação. Ou seria teletransportação?

  Me deitei de costas com os braços sob a cabeça, fitando o céu, que agora começava a permitir a entrada de estrelas. Odisseu acordou de seu sono e veio ao meu lado.

  Cara legal, disse ele.

  - Pois é...

  Me deitei de lado e adormeci, mas não antes de ouvir o GPS apitar e anunciar que chegamos ao nosso destino. É, amanhã seria um longo e cansativo dia repleto de monstros. Afinal, vida da prole dos deuses gregos é assim.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Bem, pois é... Pra quem não entendeu: a Andressa perdeu a memória nesse pedacinho. Coisa bem Jason. E pra deixar claro: eu já tava com a ideia fudida de misturar a coisa grega com a romana antes de ler O Herói Perdido, e confesso que não pude deixar de xingar o Tio Rick. Estavamos meio que em sintonia em relação a algumas coisas.... É, ambos somos fodas, isso ajuda. E peço desculpas pela linguagem neste capítulo. Parei de escrever e irá demorar um tempo, um tanto quanto demasiado, para eu voltar a escrever de um modo adequado.