Back to December escrita por Kim Jin Hee


Capítulo 1
I go back to december all the time


Notas iniciais do capítulo

Uma one que estava há muito na minha cabeça. Espero que gostem.



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A neve se prendia ao chão e às copas das árvores mais cedo naquele ano, trazendo rapidamente o inverno. O inverno deixava tudo mais bonito na opinião de Rose. As pessoas tinham as bochechas constantemente coradas, as mãos cobertas por luvas e as orelhas protegidas por gorros e cachecóis. Os banhos e chás ficavam mais quentes e a melhor sensação do mundo era sentar de frente à lareira e tomar chá com biscoitos ouvindo o reconfortante crepitar do fogo.
Rose amava o inverno, no entanto, a estação trazia muitas lembranças à ruiva. Principalmente com a notícia que rondava a cidade pequena e enfeitava os jornais: o Senhor e Senhora Malfoy estavam de volta trazendo, pela primeira vez, seus dois filhos à pequena cidade de Hogsmeade.
Todas as lembranças que Rose havia reprimido todos esses anos longe de Hogsmeade voltaram à tona e a assolavam. Pareciam correr para ela, como uma massa escura e densa de culpa, arrependimento e tristeza que poderiam sufocá-la a qualquer momento.
Essas lembranças nada tinham a ver com as duas crianças, tampouco com a senhora Malfoy. Essas lembranças tinham ligação apenas com o senhor Malfoy, o dono da maior produção de café das redondezas.
Todas as lembranças que entristeciam Rose tinham a ver com Scorpius Malfoy em uma noite fria de inverno.
A mulher segurava o jornal, com o coração apertado e olhos marejados. Os olhos tão azuis quanto os do pai eram enfeitados por olheiras fundas, escondidas por camadas de maquiagem. A ruiva estivera tendo dificuldade para dormir, desde que as fofocas começaram a rondar Hogsmeade. E agora, a foto da família na primeira folha a assustava e só comprovava o que as más línguas estavam dizendo. Podia ser ela. Podia ser ela a senhora Malfoy, a mulher ruiva ao lado do loiro bonito. A mãe de Jasmine e Jacob Malfoy, as crianças da foto. Mas não era. Rose jogou a oportunidade fora quando ignorou o loiro na véspera da noite de Natal.
Jasmine, a filha mais nova do casal, sorria pra câmera, mostrando sua primeira janelinha. Já Jacob parecia imitar o pai, com um olhar superior e postura ereta. Embora estivessem de maneiras diferentes, eram muito parecidos e tinham as feições de um Malfoy, entretanto, os traços eram da mãe. Rose conhecia bem a senhora Malfoy para saber exatamente os trejeitos e traços que passaram dela aos filhos. Scorpius Malfoy continuava igual ao que era anos antes, porém mais maduro. O tempo havia feito bem a ele. Os cabelos que antes eram bagunçados e compridos estavam curtos e bem penteados e as roupas de marca haviam sido trocadas por ternos e gravatas. Contudo, os olhos dele continuavam sendo os olhos dele. Firmes e bonitos, intensos e perscrutadores, até mesmo em uma foto de jornal. Por fim, seu olhar parou na mulher. O tempo havia feito bem a ela também. Lily Luna Potter – agora Lily Luna Malfoy – continuava linda, com seus belos olhos castanhos, cabelos ruivos lisos e postura de primeira dama. Lily se encaixava. Coisa que nunca aconteceria com Rose.
A ruiva segurava o jornal trêmula, as lágrimas embaçando sua visão cada vez mais, sua respiração ficando cada vez mais difícil.
Mesmo após dez anos, Rose ainda se sentia a menina assustada que havia deixado Scorpius na véspera de Natal, com rosas na mão, simplesmente porque estava com medo da reação de todos.
“Rose? Está tudo bem?” James perguntou, tocando o ombro da prima.
Ela não respondeu, tampouco saiu de seu torpor. A torneira aberta, água quente caindo na pia e a ruiva apenas observava o jornal, sem conter as lágrimas. James observou a manchete que assustava tanto a prima e imediatamente entendeu.

Casal dono da maior produtora de café da região, Scorpius e Lily Malfoy retornam à Hogsmeade para passar o Natal com a família.

“Meus pais não me disseram nada, Rose. Eu...” James começou a se desculpar, mas a prima o cortou.
“Está tudo bem, James. Eu já deveria ter superado.” Ela sorriu triste e saiu da cozinha.
Pegou o casaco e as luvas que havia deixado no sofá e calçou as botas que estavam na entrada. Deu um abraço no primo e saiu em direção à neve que caía. O casaco impermeável e grosso a deixava protegida, porém, suas orelhas estavam geladas, mesmo cobertas pelo gorro e cachecol, e ela tinha certeza de que as pontas dos seus dedos estavam roxas dentro das luvas. Pelo menos suas unhas estavam doloridas.
Ela precisava de um tempo.
Mesmo que James a ajudasse bastante, ele não entendia completamente o que havia acontecido. Ela não era a única culpada. Uma parte dela sabia que se não tivesse fugido de Scorpius naquela noite há dez anos, eles talvez estivessem bem. Mas outra parte culpava o loiro por querer que tudo fosse do jeito dele, sem nunca ouvir ou pensar no lado dela.
Ignorando o fato de que a neve grudando em suas botas e em seu cabelo era familiar demais para ela, entrou no pub mais próximo e pediu um whisky. Estava sentada próxima o suficiente da porta para sentir o ar gelado invadir o local quando esta foi aberta. A sineta tocou e o barulho dos passos foi ritmado até o balcão. Ela não se atreveu olhar quem era, mas seu coração se acalmou quando ouviu a voz de Hector Zabine pedindo uma vodca.
Logo, seu coração se apertou novamente ao sentir o vento gelado bater-lhe no rosto e ouvir o chapinhar irregular que as botas do novo cliente faziam no piso de madeira escura. Ele mancava. Exatamente como ela se lembrava ele mancava da perna esquerda devido à prótese que usava desde os dezesseis anos quando caíra de um cavalo e quebrara a canela em tantos lugares ao ser pisoteado pelo animal, que médico algum foi capaz de consertar.
Ela não precisava olhar para saber que era ele. E isso só se confirmou quando ele pediu um whisky, com a mesma voz grossa de sempre. E foi aquela mesma voz que a fez dar um salto da cadeira, dois minutos depois.
“Weasley?” Ela havia esquecido de como seu sobrenome ficava tão maravilhoso sendo pronunciado por ele. “Vejo que voltou.”
“O bom filho à casa torna.” Ela respondeu seca, querendo diminuir a conversa.
“Fui até sua casa.” Ele disse baixo, sentando-se na cadeira em frente a ela. “James disse que estava aqui. Eu queria te ver, Rose.”
Ela o olhou, escondendo o misto de felicidade e decepção que a pegou naquele momento.
Todos aqueles anos, tudo o que ela queria era que ele houvesse chegado à Nova Iorque e dito aquilo. Tudo o que era queria era que ele pelo menos escrevesse alguma carta, ou tivesse levado-a no aeroporto. Mas a única carta que Rose recebeu dele, dois anos depois, foi o convite de casamento. E agora aquilo. Dez anos depois de sua última conversa, ali estava ele, dizendo que queria vê-la.
“Como Lily está? E as crianças?” Ela perguntou querendo omitir o fato de que também queria vê-lo. “Faz tanto tempo que Lily não me manda uma foto... Jasmine tinha apenas dois anos da última vez. E Jacob, uau! Ele está um perfeito homenzinho nossa...” A ruiva se interrompeu, sentindo que estava tagarelando livremente, o que significava que estava nervosa. Tomou um gole de seu whisky, sentindo o álcool esquentar seu corpo. Scorpius repetiu o gesto e sorriu.
“As crianças estão bem. A vida longe fez bem a eles. Não cresceram presos a esse lugar, como eu fiquei. As pessoas precisam ter asas... Agora eu entendo isso.” Ele disse olhando profundamente nos olhos de Rose. Seus olhos acinzentados, adornados por belos cílios grossos, eram uma tempestade. Rose sentia-se nua. Não das roupas pesadas e grossas que vestia, mas das armaduras que usava para esconder todo o sentimento que escondeu durante esses anos.
Com ele olhando-a daquele jeito, parecia que eles nunca haviam se separado, que todos aqueles dez anos haviam voltado e que Rose tinha vinte anos novamente. O homem à sua frente usava um gorro verde musgo, e cachecol da mesma cor. Exatamente como o garoto que ela costumava namorar. O senhor Malfoy, agora era Scorpius. E Rose desejava que continuasse assim. Mas não era verdade.
“A neve chegou mais cedo esse ano, não?” Ele disse fazendo-a reprimir uma careta. Aquele não era seu Scorpius. Ele nunca conversaria sobre o tempo com ela.
“Ouvi dizer sobre uma tempestade de neve. Hoje a noite.” Ela disse sorrindo levemente. “O inverno está mais rigoroso ultimamente.”
Ele apenas assentiu e tomou o resto de seu whisky. A ruiva brincou com o próprio copo, mas não o tomou.
“Eu tenho que ir. Lily está me esperando para começar a embrulhar os presentes de Natal e montar a árvore na casa dos meus pais.” Ele revirou os olhos sorrindo, como se aquela fosse uma tradição que Lily havia levado à família. “Foi bom te ver, Rose.”
Ele deixou uma nota de vinte libras sobre a mesa e começou a se afastar, mancando. Rose não percebeu que havia chamado o nome dele, até que ele parou e girou sobre a perna direita. Ela não sabia o que dizer, mas quando os olhos dele encontraram os dela, ela sabia o que ele esperava. Um pedido de desculpas.
Rose se lembrava pelo que devia desculpas. Dali há dois dias, completariam dez anos que Scorpius havia lhe pedido em casamento. Em plena véspera de Natal, com rosas numa mão e uma caixinha com uma anel na outra. Mas tudo o que Rose conseguia ver eram algemas. Âncoras no lugar de rosas e anel. Um decreto de prisão no lugar de um pedido de casamento. Porque Scorpius era ancorado em Hogsmeade. Ele não queria sair de lá e não queria que Rose saísse. Mas ela queria sair. E nunca mais voltar.
E ela fez isso, até seis meses atrás, quando sua avó adoeceu e ela teve de voltar para cuidar de Molly. E quando voltou, teve que reviver todas as lembranças daquela cidadezinha inútil. Agora, o motivo de suas lembranças a olhava com um pedido mudo no olhar. Mas aquilo não era justo. Ele também devia desculpas. Não é certo querer cortar as asas de alguém.
Ela não podia mais ficar ali. Não aguentava mais.
Pegou o casaco e passou por ele e ignorando seus chamados saiu para a neve que caía mais branda agora. Suas botas ainda afundavam e a impediam de andar mais rápido. Ela ouviu o barulho irritante da perna mecânica de Scorpius e odiou a neve por não deixá-la correr.
“Rose! Espere!” Ele gritava tentando alcançá-la.
“Pra quê?” Ela se virou bruscamente, fazendo-o parar também. “O que quer ouvir? Um pedido de desculpas?” Ela riu pelo nariz e o sentiu arder pelo frio. “Isso é orgulho demais pra engolir.”
“Aposto que consegue.” Ele sorriu torto. Novamente, seu Scorpius.
Que agora, era o Scorpius de sua prima.
“Me desculpa. Eu sinto muito por aquela noite. Eu só queria liberdade, queria sair dessa droga de lugar e olha onde eu estou novamente! Minha liberdade foi a prisão mais dolorosa do mundo, sabendo que você estava magoado comigo, e sentindo saudades suas. Que tipo de liberdade é essa? Ser preso à alguém, mesmo que não esteja com esse alguém não é liberdade. É tortura. Sentir sua falta todos os dias eram uma tortura. Saber que você se casou com minha prima também.” As lágrimas já escorriam pelo rosto gelado de Rose, traçando uma linha quente, que logo era apagada pelo frio cortante. Ela fechou os olhos, se lembrando. “Sabe, quando mandou aquele convite, qual era a intenção? Porque se era me fazer perceber que eu tinha perdido, se a intenção era me fazer desejar voltar no tempo e consertar tudo, perceber que você era tudo o que eu tinha, num mundo onde ninguém tem nada... Você conseguiu. Eu apaguei o nome da Lily e escrevi o meu por cima. Eu voltei àquela noite e aceitei seu pedido, e então estava tudo bem. Eu seria a senhora Malfoy. Eu estaria com o homem que eu amo. Tudo estava bem. Se não fosse uma mentira.” Ela havia esquecido da presença dele, até ouvir o barulho de chaves. “Era isso que você queria? Um pedido formal de desculpas? Bem, você teve. Adeus, Malfoy.”
“Isso é seu.” Ele mostrou o molho de chaves, que continha uma peça incomum. Era um anel. O mesmo anel de nove anos e vinte e oito dias atrás. Ele o tirou do meio das chaves.
“Por que guardou isso?” Ela perguntou sussurrando.
“Porque é seu. Eu tinha que devolver.”
“Eu não te liguei no seu aniversário.” Ela disse de repente. “Eu nem to dormindo direito, porque as drogas das rosas que eu deixei morrer sempre vem a minha mente.”
“Mas nós ficamos juntos no verão. No outono. E em sete invernos antes daquele. Tínhamos doze anos, lembra?” Ele riu. Ela se lembrava de tê-lo beijado escondido, atrás de uma árvore e depois lhe dar um soco. “Aquele soco doeu.” Ele disse como se estivesse lendo seus pensamentos. Talvez estivesse.
“Me desculpe.” Pediu rindo. “Mas eu tinha que manter as aparências.”
Ela segurava o anel dentro do bolso. Queria poder colocá-lo no dedo, mas achava que não seria certo fazer aquilo na frente dele.
Ela sentia falta de tudo. Queria que todas aquelas lembranças se juntassem a outras, mas era pedir demais.
“Em setembro completou quinze anos. Que seu avô faleceu.” Ela assentiu, mostrando que sabia. “Lily não se lembrou, mas eu sim. Foi a primeira vez que eu te vi chorar. Nem quando o Hector encheu seu tênis de formiga ou sua mochila de areia.” Ela riu com a lembrança. O Zabine era uma peste. “Você nunca havia chorado. Mas naquele fim de tarde, você chorou tanto que parecia que nunca mais ia parar. Tínhamos quinze anos. Talvez aquilo nem tenha acontecido mesmo, talvez seja só minha mente pregando peças, mas eu lembro.” Ele disse suspirando.
“Aconteceu.” Respondeu triste. Lembrar do avô era triste. “Me desculpe, eu não sei o que quer com isso tudo. Me fazer mal? Conseguiu.” Ela desabafou. “Eu já pedi desculpas. E juro que se eu pudesse voltar no tempo, eu faria tudo diferente. Eu seria a Senhora Malfoy agora, eu te amaria do jeito certo. Mas eu não posso, então...” Rose não conseguiu terminar a frase.
Os lábios de Scorpius continuavam do jeito que ela se lembrava. O beijo dele ainda era o que tirava seu fôlego e fazia seus pés saírem do chão. Ele ainda era seu Scorpius. Pelo menos enquanto seus lábios estivessem colados.
Enquanto estivessem se beijando, estavam novamente em dezembro de dez anos atrás, e estava tudo bem.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. O final é alternativo, cada um imagina o que quiser.