Viajantes - O Príncipe de Âmbar [HIATUS] escrita por Kath Gray


Capítulo 14
Capítulo XIII


Notas iniciais do capítulo

Awnt! *-* Kawaiii-ne!!!!!!
Eu, pessoalmente, amei esse capítulo ♥ Essas crianças são muito FOFAS!!!! E a relação do Ty com a Katherine... ♥
Bom, espero que aproveitem!!!



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Dean estava horrorizado. Horrorizado por ver pessoalmente as consequências de uma luta real. Horrorizado por ouvir aquelas palavras da boca de uma garota que sequer completara quinze anos.

Mas, ao mesmo tempo, sentiu surgir um profundo fascínio - e até admiração - pela estranha garota.

Katherine, porém, fez pouco caso da coisa toda. "Você teria feito a mesma coisa em meu lugar", repetiu, e, espreguiçando-se, anunciou que sairia para uma caminhada. Jogou a mochila habilmente sobre ombros e despediu-se, dizendo que se encontrassem de novo mais tarde na Praça.

No caminho de volta, o trajeto começou em silêncio. Porém, Dean estava incomodado com o que dissera antes; não queria passar a impressão de que duvidava do que dissera Ty, e estava um pouco envergonhado de que ele pudesse ter entendido dessa maneira.

Porém, assim que começou a falar, Ty interrompeu-o.

— Está tudo bem. - disse ele, tranquilizando-o. - Ela já está acostumada. Você não é a primeira pessoa que diz isso para ela. - Ele pareceu imergir em lembranças, e seu olhar ficou distante por alguns momentos. - Isso costumava ser um assunto delicado... esse preconceito relacionado ao seu tamanho... mas agora ela nem liga. Quer dizer, ela ainda fica revoltada quando não consegue ajudar alguém porque ele não põe fé na aparência dela ou ri como se ela tivesse dito uma piada engraçada e a impede de entrar na luta, mas agora ela sabe usar a presença de espírito para compensar, então não tem muito prejuízo. Na verdade, acho que às vezes ela até se diverte. Ela adora surpreender.

— Ela é boa nisso... - comentou Dean, lembrando-se da luta contra Derek.

Ty riu.

— É, é mesmo - concordou.

Mais alguns minutos se passaram silenciosos, mas Dean não conseguiu se segurar.

— Ty... aquilo que você falou lá atrás, de ela participar das guerras e tudo o mais... era mesmo verdade?

— Achei que tivesse percebido quando ela lhe mostrou suas marcas de guerra - respondeu Ty, erguendo uma sobrancelha para ele. - Sim, era tudo verdade. Cada palavra. - Ele tornou a olhar para frente. - Em muitos lugares ela é considerada uma heroína. Em outros, uma criminosa procurada. Mas em todos é uma lenda. - Dessa vez, ele não sorria ao falar, mas sua voz transbordava orgulho e admiração solenes. - Ela já recebeu vários nomes. Tempestade. Esperança. Nós a chamamos de Andarilha.

Dean ouvia a tudo atentamente. "Nós"? Quem era "nós"? Seria realmente possível que aquela garotinha já tivesse feito tudo aquilo? Ele já tinha visto a prova, mas ainda assim era difícil acreditar.

— Ty, o que você acha da Katherine?

A pergunta pareceu pegá-lo de surpresa, mas não muito. Ele já tinha sentido que era para ali que a conversa rumava, de uma forma ou de outra.

Seu rosto assumiu uma expressão carinhosa, e seus lábios formaram um sorriso tenro. Quando falou, sua voz era suave.

— Nós nos conhecemos há apenas cinco anos, mas o que eu sinto por ela é o mesmo que sentiria por uma irmã. Talvez até mais forte. Ela é mais velha que eu, mas às vezes é difícil saber quem realmente é o irmão mais velho. Até hoje me lembro da primeira vez em que a vi. Mesmo quando era tímida, sua alegria era contagiante. Ela é a garota mais gentil, alegre e generosa que já conheci, mas também a mais honesta, justa e honrada. Ela traz consigo tudo o que uma boa pessoa deveria ter... todas as virtudes que todo mundo deveria trazer consigo, mas que nos são tão raras. E ela conseguir manter a bondade depois de tudo o que passou... essa é uma força que poucos teriam, Dean. Muito poucos.

Algo na forma que ele chamou seu nome mexeu com Dean profundamente. Naquele momento, mesmo que por uma fração de segundo, ele entendeu a magnitude do que ouvira, mas logo depois a sensação foi embora, deixando apenas uma vaga sensação em seu subconsciente.

— O fato de ela se manter intocada pelo ódio depois de tanta dor e sofrimento... não há palavras para dizer o quanto a admiro. - continuou Ty. - Mas, mais do que isso, estar com ela me faz querer protegê-la. Eu não sei por que, mas quero fazê-la feliz. Consegue entender?

Ao ouvir a resposta, Dean não ficou apenas surpreso. A profundidade e intensidade dos sentimentos de Ty eram algo além do que ele jamais sentira, e, por isso, não conseguia compreender. Mas mesmo sem entender perfeitamente, ele conseguia sentir. Sentia a importância de cada palavra que chegara aos seus ouvidos.

Novamente ele ficou em silêncio, mas dessa vez era um silêncio de respeito. Se não à Kath, aos sentimentos de Ty.

Finalmente, eles viram o fim da floresta e a luz da Praça.

O Povo do Leste já estava ativo e enérgico, e a vida borbulhava na área onde, à noite, se juntavam para dançar e cantar.

Eles encontraram Katherine carregando uma caixa de frutas e verduras recém-colhidas, conversando alegremente com Lucy e uma garota que Dean não conhecia, que também ajudavam no carregamento.

— Ah! Dean! - exclamou ao vê-lo. - Essa aqui é a minha amiga, Rowan.

— Prazer em conhecê-lo! - a garota jogou todo o peso da caixa em uma só mão e estendeu a outra para cumprimentá-lo. Ela era um pouco mais baixa que Dean, e, assim, muito mais alta que Kath. Seus cabelos castanho-claros tinham uma sutil nuance ruiva em seu reflexo e chegavam até pouco abaixo dos ombros, um pouco acima das costas. Sua expressão trazia o característico bom humor do Leste, mas de uma forma diferente. Parecia um pouco menos jovial, mas não menos enérgica, e seu sorriso intenso carregada um certo desafio.

— O prazer é meu - respondeu Dean, apertando a mão estendida. Curioso, percebeu que raramente usava ou ouvia o cumprimento em seu mundo, mas por algum motivo parecia adequado à situação. - Eu sou Dean.

— Fiquei sabendo - respondeu ela, por sua vez, erguendo uma sobrancelha. - Você deu um susto no povo da cidade. Você teve sorte. Se tivesse vindo em qualquer outra época, teria se afogado; é raro a Katherine estar aqui nas redondezas.

— Ahn? Como assim?

— Ainda não explicou a ele? - Rowan virou-se para Kath.

— Ainda não. Estamos indo para o Norte em dois dias, então imaginei que Shira poderia explicar melhor que eu.

— Legal! Manda um beijo para ele por mim - brincou.

— Só um beijo? - provocou Kath.

Rowan fingiu pensar.

— Hmm... manda um peteleco, também. Bem no olho. E tira uma foto da careta.

— Desculpe, esqueci de pegar uma câmera nova quando comprei os chocolates - riu a garota menor.

— Que pena - a outra fingiu lamentar. - A careta dele é única.

— É mesmo, né? Ele torce o canto direito da boca...

— Ei, meninas, eu sei que o papo é bom, mas eu já não tenho a mesma energia de jovem de vocês - interrompeu Lucy, brincando. - Podemos parar para conversar depois de levarmos as caixas? Meus braços estão ficando cansados.

— Tá bom, mãe! - respondeu Rowan, com um sorriso falsamente culpado.

Ty adiantou-se e se ofereceu para carregar a caixa para a mãe de Rowan, mas esta recusou, rindo.

— Ah, não precisa... só estou fazendo drama - respondeu ela, divertida. - Acho que ainda tenho alguns anos de vitalidade.

Por fim, ficou decidido que ela carregaria a caixa, mas Ty andou até o casebre de onde elas vinham e voltou trazendo outra caixa para ajudar. Dean, achando que devia fazer algo também, acabou imitando-o, e os cinco terminaram juntos o trajeto até algumas mesas compridas perto do penhasco. Elas estavam dispostas em uma fileira comprida perpendicular ao despenhadeiro. Nas proximidades, haviam sido postos vários bancos também compridos, ajeitados aos pares, espalhados por uma longa extensão da extremidade da praça.

Os cinco começaram a ajeitar as frutas sobre as mesas em simpáticas pilhas, separando por tipo. Além disso, Dean viu várias pilhas de comidas como aquelas que os irmãos - ele não conseguia deixar de pensar neles assim - haviam levado para o café da manhã: pães, geléias e sucos, além de grãos, legumes e verduras. Porém, Dean não via nenhuma carne.

Quando questionou Ty a respeito, o garoto imediatamente cortou-o, cobrindo sua boca com a mão.

— Shira pode explicar melhor do que eu - disse, em voz baixa. - Por enquanto, apenas tenha em mente que o Povo do Leste não come carne.

Dean era um carnívoro entusiasta e incorrigível, mas mesmo ele não pôde deixar de gostar da profusão de sabores que era um almoço nos Reinos do Leste.

Quando o sol subiu alto no céu, todos haviam se reunido para as refeições. A convivência constante dos moradores também era algo a que Dean não estava acostumado - de onde vinha, não era incomum ver melhores amigos sentados lado a lado no sofá mexendo em seus celulares com fones de ouvido -, mas ele não demorou a se acomodar, e logo fazia o possível para participar da conversa.

Mal Katherine serviu-se e sentou-se no chão, um enorme grupo de crianças reuniu-se ao seu redor. Com idades que variavam de cinco a dez anos, todos mostravam o mesmo jeito alegre e extrovertido. Assim como Ty, pareciam vê-la como uma espécie de irmã mais velha, e brincavam animadamente ao seu redor. Sua popularidade não parava por aí, pois volta e meia algum adulto - Dean imaginou serem os pais das crianças - passavam pelo amontoado bagunçado e trocavam algumas palavras com o grupo. Alguns inclusive bagunçavam de maneira brincalhona o cabelo de Kath, que, quando solto, despenteava-se com facilidade.

— As crianças gostam bastante dela - comentou Dean para Rowan, que estava sentada ao seu lado em um dos bancos, virada para a rodinha improvisada dos mais novos. - Por quê?

— Sei lá - respondeu ela, sem parar de comer. - Ela é um ímã para crianças. Não, esquece: ela é um ímã, ponto. Por algum motivo, todos a amam.

Em seu círculo de admiradores, Katherine deu uma gargalhada. Seu riso era engraçado e contagiante, e fez várias crianças rirem também.

Logo Ty juntou-se ao grupo, cruzando as pernas ao sentar com o prato de madeira sobre o colo. As crianças logo o introduziram na conversa.

Rowan pareceu perceber os olhares de soslaio que Dean mandava para a cena - olhares que ele julgava discretos, mas que a ela pareciam gritantes como um bando de Thaiatís em revoada.

Finalmente, a impaciência tomou conta e Rowan pôs-se de pé em um salto. Puxando-o bruscamente pela manga, ela bufou:

— Vem logo, cara! Por que vocês, novatos, são sempre tão contidos?

Dean nunca soube como não derrubou a comida do prato quando foi jogado de qualquer jeito no meio de um dos muitos pequenos círculos provisórios do amontoado de crianças.

— Ei, podemos nos juntar a vocês? - perguntou ela, sentando-se logo em seguida com muito mais graça do que Dean.

— Mas é claro! - sorriu Kath.

— Ei, esse é o garoto que apareceu do nada no meio do mar? - um dos garotos debruçou-se em direção a Dean, com os olhos brilhando. Seus cabelos caramelo eram mais curtos, mas bagunçados igual aos de Ty.

Dean ficou aturdido com a pergunta. Ele mexeu-se um pouco, sem jeito, e sentiu o rosto esquentar. Se tivesse aberto a boca, começaria a gaguejar. Kath percebeu o desconforto.

— Desculpe por isso - pediu ela, levando a mão à nuca, também sem jeito. - Kie não pensa muito antes de falar, e também não é muito discreto.

— Como é quase se afogar? - perguntou outro garoto, ainda menor e de olhos escuros bem abertos, com igual entusiasmo.

Uma das garotas maiores desferiu-lhe um tapa na cabeça, cujo estalo fez Dean se encolher internamente.

— Ei! - exclamou ele em protesto, com a voz aguda, levando as mãos à cabeça doída.

— Você não simplesmente sai perguntando para as pessoas como é quase se afogar, seu besta! - irritou-se ela, com sua vozinha de criança. - É falta de educação!

Katherine cobriu a boca com a mão, tentando disfarçar o riso. Ty não se deu o trabalho.

— Ei, como é ser salvo pela mana Kath? - perguntou uma menina de aspecto curioso e olhos brilhantes.

A pergunta pegou de surpresa não apenas Dean, como também Katherine. Confuso, ele percebeu que a maioria das crianças inclinava-se para frente, curiosa pela resposta.

— Eu... hmm... ahn... o quê? - Dean estava atordoado. Kath, ainda mais confusa, não falava nada.

— A gente sempre ouve histórias das aventuras da irmãzona, mas nunca vimos nada ao vivo porque aqui é muito pacífico - explicou um dos meninos, como quem repete algo que ouviu dos pais.

Dean surpreendeu-se ainda mais com a resposta, mas Katherine pareceu compreender. Depois de um instante atônita, seu rosto se tornou subitamente suave. Ela sorriu graciosamente e seu rosto ficou um pouco mais corado.

— Awn, vocês são muito fofos! - exclamou, avançando na menina que fizera a pergunta e envolvendo-a em um abraço esmagador.

— Ei! Me larga! - gritou a pequena, tentando manter a expressão rabugenta, em vão. - Você está me esmagando!

Depois de muito se debater, a garotinha foi solta, chorando de rir, e Kath se virou para o menino que respondera Dean.

— Vem cá, você também! - chamou. Ele tentou afastar-se, mas ela foi mais rápida. Abraçando-o com ainda mais força, ela começou a bagunçar seus cabelos castanhos compulsivamente. Logo ele também morria de rir.

Dean cutucou Ty com o ombro, discretamente.

— Por que eles ficam chamando a Kath de 'irmãzona'? - perguntou, em voz baixa. Naquela idade, a diferença era gritante, mas a garota certamente não devia ser três anos mais velha do que eles.

— Bom, ela é mais da metade da vida deles mais velha - respondeu Ty. - É meio natural eles chamarem ela de 'irmã mais velha'.

— Pera, o quê? - Dean pensou se não teria se confundido com a frase um tanto incomum do garoto loiro. - Quantos anos ela tem?

— Em seis meses ela completa dezesseis - respondeu ele. - Geralmente, a data passa batida por causa da agitação, mas pelo menos esse ano eu quero fazer uma comemoração especial.

Dean voltou os olhos para ela, surpreso. Ela ainda bagunçava o cabelo do pequeno.

Dezesseis?

Ele se virou novamente para Ty, abrindo a boca para falar, mas de repente algo o atingiu em cheio na face.

A fruta rosada tinha o interior quase totalmente liquefeito, e mais parecia uma bexiga d'água. Assim, quando estourou na cabeça de Dean, o suco escorreu por todo o seu rosto, pegando parte da camisa.

Por um momento, todos se calaram. Então, caíram no riso ao mesmo tempo, com ainda mais gosto do que antes.

Ele voltou os olhos para Kath. A garota tentava segurar o riso, mas era óbvio quem tinha jogado a fruta.

Sem pensar, ele inclinou-se e pegou uma fruta de um dos pratos das crianças. De aspecto azulado, ela tinha uma consistência bem semelhante à que o acertara.

O projétil interrompeu a risada de Katherine, que soltou um arquejo surpreso.

Então, ela virou-se para Dean, com um olhar desafiador. Com a lateral da mão, ela limpou uma faixa de líquido na altura dos olhos.

— Ah... então é assim, é?

Subitamente, uma das meninas pôs-se de pé em um salto e gritou em plenos pulmões:

É GUERRA!

O grito reverberou por todo o agrupamento, enquanto todos seguiam o exemplo da primeira e punham-se de pé.

Antes que Dean percebesse o que se passava, ele foi pego pelo fluxo. Deixando-se levar, ele percebeu que o grupo dividira-se em meninos e meninas.

O grupo dos meninos dirigiu-se a uma das mesas, onde, um a um, muniram-se de frutas iguais às que Dean lançara.

— Aqui. - Um dos meninos maiores, vendo que Dean também pegara uma fruta, estendeu outra para ele. - Como você é novato, pode pegar duas.

Era engraçado ser chamado de 'novato' por um garoto com a metade do seu tamanho, mas Dean aceitou a esfera azulada do tamanho de sua mão.

Na outra ponta da longa fileira de mesas, as meninas muniam-se de frutas rosadas, iguais às que Kath usara para atacar Dean, de uma maneira estranhamente organizada em meio a toda aquela confusão. Igual aos garotos, elas se armavam uma de cada vez, mas com uma rapidez e um ritmo constantes.

Subitamente, elas correram para o bosque. Tão logo pegavam as frutas, os garotos seguiam-nas, bradando gritos de guerra.

Assim que todos chegaram ao começo do bosque, eles se aproximaram uns dos outros, agora de uma forma menos caótica. Em meio à agitação, Dean pensou que, sem contar as crianças, ele e Ty provavelmente estavam em desvantagem contra Kath e Rowan. Nem lhe passou pela cabeça a seriedade com que ele encarava algo que, pouco tempo antes, era improvável que ele sequer participasse.

Eles correram floresta adentro, sem dificuldade para locomover-se em meio às árvores espaçadas e distantes umas das outras. Alguns minutos depois, eles ainda se embrenhavam cada vez mais fundo no bosque, quando as últimas meninas sumiram de seu campo de visão.

Ao gesto do garoto maior - o mesmo que dera a fruta a Dean - todos pararam de repente, sua velocidade passando do êxtase absoluto para o zero em poucos instantes.

O silêncio era absoluto. Ty, assim como os outros, mexia a cabeça de um lado para o outro, tentando perceber alguma coisa. O clima era de tensão.

Então, um dos garotos soltou uma exclamação súbita e caiu de costas no chão com um baque.

Todos viraram-se imediatamente. O líquido rosado escorria por seu rosto em abundância.

O primeiro instinto de Dean foi se preocupar; a fruta podia ser mole, mas era pesada, e poderia facilmente ter machucado o pequeno menino de traços frágeis.

Porém, antes que desse o segundo passo, o garoto sentou-se, enxugando os olhos, como se nada tivesse acontecido.

Seu grito ecoou pela floresta.

­- EMBOSCADA!

Nesse momento, as frutas começaram a surgir de todos os lados, atingindo um a um os guerreiros das frutas azuis e tingindo-os de rosa e vinho.

As meninas surgiram de cima e de trás das árvores, saltando sobre os meninos e imobilizando-os. Uma delas, nem muito nova nem muito velha, jogou dois inimigos um sobre o outro no chão e sentou em cima.

Dean sentiu um forte impacto abrupto em suas costas e caiu de cara no chão.

Katherine, que saltara dos galhos acima deles, sentou-se sobre Dean, enquanto Rowan neutralizou Ty.

— Fim de jogo - anunciou a ruiva para eles.

Uma das meninas repetiu o anúncio, em voz alta. Por todo o campo de batalha, as vitoriosas ecoaram o grito.

— Sete a três para as meninas - disse Katherine, levantando-se e estendendo a mão para ajudar Dean. Rowan fez o mesmo com Ty, assim como todas as outras guerreiras.

Tanta coisa tinha acontecido nos últimos minutos que era difícil acreditar que tão pouco tempo havia se passado do início da batalha ao massacre, mas aos poucos Dean começava a compreender o ritmo do dia-a-dia dos irmãos: longas calmarias seguidas de picos de intensa alegria, caos e agitação.

Quando voltaram para a praça, ele não sabia o que esperar, mas não se surpreendeu quando os adultos apenas sorriram à visão dos garotos pintados de rosa e das garotas de sorriso triunfante que saíram do meio das árvores.

A multidão começou a dispersar-se, pegando seus pratos e terminando as refeições pendentes. Ao contrário de antes da brincadeira, eles agora espalhavam-se por toda a área em pequenos grupos de três ou quatro. Era divertido vê-los conversando; alguns pareciam contar piadas, e outros, gesticulando, contavam histórias. Dean sentou-se com Ty, Kath e Rowan, mas o tempo inteiro virava a cabeça para ver os outros. Novamente, eles ficaram no gramado, ignorando os bancos por completo assim como quase todos os jovens do Povo do Leste, à exceção de um ou outro pequeno, que sentava-se com os adultos para conversar. Era até estranho como ali as pessoas de todas as idades pareciam conviver tão bem quando no Domo de Dean eles costumavam distanciar-se, como se um muro intransponível separasse as crianças dos adolescentes e os adolescentes do mundo adulto.

Era bonito, de certa forma.

Depois de mais ou menos meia hora, as pessoas começaram a levantar-se. Juntamente com aqueles com quem haviam passado o tempo do almoço, muitas vezes ainda conversando, todos se dirigiram a uma pequena vala já escavada nas fronteiras da floresta, próxima a algumas árvores.

Quando chegou a vez do grupo de Dean, ele observou, curioso, que as pessoas estavam colocando os pratos empilhados de forma cuidadosa dentro do buraco. De início, ele estranhou, porém, observando mais atentamente, ele percebeu uma pequena irregularidade bem no centro do próprio prato de madeira. Uma semente.

Primeiro, Kath aproximou-se do buraco e colocou o prato sobre a pilha. Eles não usavam talheres. Logo Dean seguiu-a e colocou seu prato sobre o dela.

— Diferentemente do início da noite, nós não costumamos nos reunir para a refeição do meio-dia - disse Kath, enquanto Ty também desfazia-se do seu prato. - Fazemos isso apenas quatro vezes ao mês, de sete em sete dias, após os quatro ápices das fases lunares, como ontem, que foi o ápice da lua cheia. Fazemos os pratos com a madeira de alguma árvore recém-caída e enterramos as sementes depois. Assim, não atrapalhamos o ciclo da natureza.

— Mas várias sementes juntas não vão criar muitas árvores no mesmo lugar? - perguntou Dean. - Isso não é ruim?

Kath deu um risinho.

— Acho que você nunca plantou nada, não é mesmo? - disse. - Mesmo em seu mundo, quando vão plantar, vocês costumam usar muitas sementes de cada vez. É para ter certeza de que ao menos uma árvore vai nascer... eu acho. Para ser sincera, também não sou nenhuma especialista em jardinagem. Ah, com licença.

Se afastando alguns passos, Katherine pegou alguma coisa pendurada na cintura da calça. Era um pequeno apito de madeira, preso pelo fio. Respirou fundo uma vez e então, levou-o à boca e soprou.

Todas as crianças que haviam participado da brincadeira responderam ao som. Afastando-se um pouco dos adultos e do penhasco, mais para perto do centro da Praça, as crianças reuniram-se, ficando lado a lado em um círculo inesperadamente organizado.

Agora que todas ficavam ombro-a-ombro, o diâmetro da esfera era impressionante. Com todas tão amontoadas, Dean não percebera que havia tantas crianças ali. Ele terminou por assumir uma posição exatamente oposta a Katherine.

— Primeiramente, eu gostaria de parabenizar a todos pela excelente batalha de uns... dois minutos e meio. - Katherine começou a falar. Seu tom, inicialmente mais sério, ainda mantinha aquele jeito meio brincalhão, como quem faz uma imitação caricata de uma pessoa séria.

As crianças aplaudiram e comemoraram. Logo o barulho cessou, e todos ficaram novamente silenciosos.

— Segundo - anunciou ela. - Eu gostaria de parabenizar Deaniel Gray, nosso novo companheiro, por completar a iniciação. Dean, dê um passo à frente.

Apesar de ela ter dito um passo, de alguma forma ele sabia o que realmente devia fazer. Em três passos relativamente largos, ele ficou de pé bem no meio do círculo.

— Meus parabéns. - continuou ela. - A partir de agora, você é oficialmente um Amigo do Leste.

E, dizendo isso, ela se curvou, cruzando um braço à frente do corpo e um atrás, em um gesto solene.

Ele ficou confuso por alguns momentos - não sabia o que fazer - mas um olhar de soslaio para Rowan permitiu-lhe captar os gestos da garota, que respondiam-lhe a pergunta que seus olhos transmitiam.

Imitando a garota, esperando conseguir fazê-lo com a mesma elegância de Katherine, Dean também curvou-se.

Mesmo com a cabeça baixa, ele pôde ver de relance um vislumbre do sorriso brilhante da garota.

Então, os dois se endireitaram.

Em alguns segundos, tudo tornou ao caos.

Algumas crianças começaram a pular, comemorando. Outras apenas batiam palmas, entusiasmadas. Outras ainda começaram a gritar de alegria, com as mãos junto à boca como se quisessem tornar o som ainda mais alto.

Gritar de alegria... Dean nem sabia que isso era possível.

Envolto em toda aquela energia e agitação, ele sentiu uma felicidade indescritível tomando-o por completo, a partir da região do peito onde ficava o coração. Ele não sabia se isso era fruto de seu subconsciente, resultado de toda uma vida ouvindo sobre as relações do coração e os sentimentos, mas foi o que sentiu.

Que sensação estranha era aquela? Aquela estranha alegria inexplicável que lhe dominava? Aquela felicidade sem motivo, aquela euforia vinda de lugar nenhum?

Alguém jogou um punhado de grãos para cima, que caíram sobre eles como confete.

Ele sentiu um aperto súbito na altura da cintura. Seus olhos baixaram e pousaram em uma linda garotinha, que abraçava-o com força.

Ela olhou para cima. Sorria de orelha a orelha, jovial. Seu sorriso era brilhante e simpático, gracioso e delicado. O abraço súbito tirou-lhe o ar e a ação por um momento, deixando-o sem fala.

Era tudo tão confuso, mas ao mesmo tempo tão claro... Ele não sabia o que estava acontecendo, mas sabia que isso não tinha importância. Não sabia por que se sentia tão feliz, mas sabia que não precisava saber. Nem tudo precisa de um motivo, uma razão, uma explicação. Às vezes, algo era pelo simples fato de ser. Não havia nenhum porquê. Nenhuma causa clara.

Abaixando-se, ele abraçou a menina com força e ergueu-a no ar, girando, sorrindo também. O sorriso mais largo que dera em muito, muito tempo.

Naquela noite, as crianças dominaram a Praça.


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Notas finais do capítulo

Essa é, oficialmente, a guerra de comida mais organizada da história da humanidade ^^' Xp
Bom, o que acharam do capítulo? Gostaram da Rowan? (Ah, se eu escrevi 'Robin' em algum lugar sem querer, me avisem? É que eu estava vendo uma história com uma personagem 'Robin', então volta e meia escrevia errado... mas acho que corrigi todos)
E do Kie e das outras crianças? (Ah, obs: se lê 'Ky'. Ou 'Kai')
Bom, comentem o que acharam! ^^



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