A Seleção da Herdeira escrita por Cupcake de Brigadeiro


Capítulo 57
Apenas continue respirando. Respira fundo. E vá. | A Escolha (Bônus)


Notas iniciais do capítulo

GEEENTE, eu quebrei a tradição de sempre postar no meu aniversário, que é no dia 28/03, masssss eu não me sinto mal, porque, bem, esse capítulo é uma das poucas coisas boas que me aconteceram com esses 19 anos de idade. Tanta coisa ruim acontecendo, e que me aconteceu, mas quero deixar esse capítulo como um presente para as coisas boas que aconteceram nesse mês de Março, embora conturbado! Um feliz aniversário para a Clara, Ana Letícia, e a Ana, em especial, por fazerem aniversário neste último dia do mês, sendo pessoas muito importantes na minha vida, de verdade!
Bem, e também para parabenizar o amigo da minha amiga Clara, que conseguiu uma vaga para estudar Direito, que sempre foi o objetivo dele!!!! Esse capítulo é para celebrar!
Obrigada a todos vocês que acompanham, que comentam, recomendam, e fazem isso tudo aqui possível. De coração. Obrigada, gente ♥



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Às vezes é difícil encontrar, encontrar meu caminho para as nuvens

Ignore, pessoas podem ser tão barulhentas

Você me faz lembrar da época em que as coisas não eram tão complicadas

Tudo que eu preciso é ver seu rosto

Sinto meu sangue correndo, juro que o céu está caindo

Como eu sei se essa merda é inventada? Oh

O tempo passa e eu não consigo controlar minha mente

Não sei mais o que tentar, mas você sempre me diz

Apenas continue respirando e respirando e respirando e respirando

E, oh, tenho que continuar, continuar respirando

Apenas continue respirando e respirando e respirando e respirando

E, oh, tenho que continuar, continuar respirando, mmm, sim

Meu, meu ar

Meu, meu ar

Meu, meu ar, meu ar

Meu, meu ar

Meu, meu ar

Meu, meu ar, sim

— Breathin, Ariana Grande

— Mas o senhor está realmente bem com Prim?

Estou me recuperando bem… fica calma, eu estou vivo, e agora sem riscos de infecção ou coisas semelhantes. Sua irmã está bem. Não sabemos como ela está conseguindo estar tão bem, mas está tudo bem. Descanse.

Suspirei, concordando, me despedindo de meu pai por telefone. Ele está no Canadá, juntamente com Prim. Há 10 horas desde o fim do pior ataque que o palácio já sofreu um dia, e também ao redor do país. Toda Panem foi envolvida por caos e desordem, não somente a Capital.

— Princesa, é aconselhável que não ponha uma blusa, evitando suspender o braço — a enfermeira aconselhou, serenamente.

— Tudo bem, muito obrigada — respondi, forçando um sorriso. Ela tem sido gentil desde que fui apagada pela anestesia para operar a bala alojada em meu ombrp. Pude entender, então, um pouco do que Peeta passou.

Peeta.

Gale.

— Infelizmente, precisamos de uma reunião inadiável com o executivo. Muitas decisões precisam ser tomadas, Katniss… e sem seu pai, que está em um outro país, e impossibilitado de qualquer coisa agora, você é a rainha. Oficialmente a rainha. Só falta uma cerimônia.

Tio Charles, um dos ministros de maior confiança, me deu a notícia que eu já esperava. Sei que posso confiar nele, meu pai o chama de irmão.

— Tudo bem… há alguma notícia dos Selecionados e seus familiares?

— Por alto, sabemos que houveram três baixas ao todo. O Selecionado Blane… um de seus irmãos, e a mãe do Selecionado Calvin, que ainda está desaparecido, como o Selecionado Cato e Peeta. Os outros passam bem. Assim como sua família. Gale foi o primeiro a ser localizado. Está bem agora, sem danos à saúde, ou lesões permanentes. As buscas não param.

Assenti, sentindo outra vez uma vontade apertada de chorar, mas não o fiz. Não tive forças para chorar.

— Peçam para que abram todos os esconderijos. Peeta estava se recuperando de um grave ferimento no abdômen, há algumas semanas, e eu sei que foi muito ferido. Calvin está com as irmãs, e Cato, da última vez que tive notícias, estava totalmente debilitado, correndo risco de vida. Por favor. Podem permitir que me transfiram para meu quarto, e de lá podem convocar todos os executivos do parlamento.

Ele concordou, tranquilo.

Antes que saísse, porém, segurei em seu braço.

— E minha mãe? — ele suspirou, como se não quisesse falar sobre o assunto, como eu mesma havia pedido, logo que sai da cirurgia. Eu ainda não parei por quinze minutos desde que tudo aconteceu. Minha voz sai fraca, e ainda estou usando máscara de oxigênio, porém sei que ainda não é a hora de descansar.

— O corpo já foi encontrado, e tratado na medida que fora possível. Estava queimando quando chegaram. Não iremos dizer qual foi a principal causa da morte. Seu pai foi notificado, assim como Prim, que… bem, reagiu melhor do que nós mesmos estávamos esperando. Não haverá homenagens póstumas, mesmo porque a imagem dela foi muito afetada nos últimos meses, é melhor evitar. Assim que sair do hospital, faremos um statement, para comunicar os acontecimentos, que você está bem, e prestar todas as condolências necessárias para a ocasião. Nós estamos do seu lado, Katniss.

— Obrigada, tio Charlie.

Falei, baixo, mas ele deu um meio sorriso, assentindo.

— Vou pedir para que entrem daqui vinte minutos.

Suspirei, com cautela, para que o ferimento em meu ombro esquerdo não doesse mais do que está, mesmo comigo imobilizada. Minha cabeça arde, mesmo com todos os medicamentos, todavia não é algo que eu esteja preocupada. Ter cortado metade de toda minha medicação para focar em medicamentos com curandeiros naturais me ajudou de uma forma inexplicável, assim como a meditação.

Meu seio direito ficou exposto, no caso, ele não possui nenhum ferimento, nem em meu lado direito, de forma geral, graças a Deus. Apenas endireitei minha postura, mesmo com a tipóia em meu braço esquerdo.

— Majestade, é mais conveniente que use uma tiara para a ocasião, não acha? — Ruth, uma das minhas enfermeiras sugeriu, com um sorriso gentil.

— Tem alguma por aqui? — assentiu em concordância, delicadamente pegando uma que estava em uma gaveta com senha do outro lado do quarto. Tirou de lá uma tiara grande ( http://www.miguelalcade.com.br/wp-content/uploads/2015/03/dianaspencer.png ), porém eu sei que é o que a ocasião requer. Eu estou com um shorts de pijama, meu cabelo solto em uma completa desordem, e não posso sequer me cobrir com uma manta sem que isso prejudique meu ombro machucado.

— Podem colocar em mim, por favor. É o máximo que vou conseguir me arrumar hoje.

Ela e Nanny, a outra enfermeira, concordaram, e arrumaram meu cabelo na medida do que fosse possível, para que, mesmo quando eu me mexesse, a tiara não caísse. Cobriram minhas olheiras com um pouco de maquiagem, assim como alguns dos meus ferimentos provocados por estilhaços. Não foi um milagre, mas ajudou bastante.

Quando entraram, seis homens e duas mulheres, não me constrangi em nada. Eu sou a rainha, preciso agir como uma. Endireitei minha postura, mesmo que fizesse doer mais meus ferimentos, não me senti acuada por estar com um dos meus seios expostos e o outro estar coberto somente por faixas.

— Majestade, temos agora informações definitivas sobre o estado de outras cidades ao redor do país. Foi um grande atentado, muitas as baixas. De uma forma diferente do que aconteceu no palácio, com casos de estupros, como no que aconteceu há seis anos atrás, as mortes ao redor do país foram marcadas por tiros, disparados de maneira aleatória, segundo a perícia feita.

— E quantas foram as baixas? — perguntei, séria, vendo algumas fotos em meu Smarter, enquanto Trevor mostrava alguns gráficos em uma TV no meu quarto de hospital.

— Ainda não temos ao certo quantos aqui dentro do palácio, porém ao redor do país, até o instante, cinco mil, quatrocentas e setenta e oito pessoas foram assassinadas em Panem nas últimas vinte e quatro horas.

O número me deixou nervosa. Me fez querer pedir para que esvaziem o quarto, e que por favor me deixem em paz. Mas não consegui. Eu preciso continuar, eu preciso resolver essa situação.

— Acabaram de encontrar os Selecionados desaparecidos, e me deram agora um número oficial de baixas. Todos os que estão em hospitais, fazem parte de uma outra lista — Justine, uma das ministras, anunciou, interrompendo Trevor por um instante, de maneira educada, e ele cedeu seu espaço para que ela pudesse falar.

— O que aconteceu com os que estavam desaparecidos? — perguntei, sentindo meu coração bater muito acelerado no peito.

— Cato Mason foi encontrado completamente desacordado, com um ferimento irreversível em sua perna direita, e encontra-se em coma induzido — lágrimas ficaram engasgadas na minha garganta, mas consegui me manter. — Amanhã os médicos estão planejando acordá-lo. Sua mãe morreu no atentado, enquanto sua irmã está acompanhando sua recuperação. O selecionado Calvin Carter foi encontrado bem, apenas com alguns ferimentos leves, e sua família passa bem. Peeta Mellark… —  meu coração parou de bater por alguns instantes. — Ele… bem, encontrado com muitos ferimentos, entre leves e medianos, com uma luxação na nuca, e sua família passa bem também. Gale não teve nenhuma sequela, e está em recuperação.

Fechei meus olhos por um instante, e permiti que apenas uma lágrima caísse. Não quero chorar na frente dessas pessoas. Eu quero chorar até não conseguir mais. Mas não na frente dessas pessoas. Suspirei minimamente aliviada por eles estarem vivos. De luto por cada familiar que perderam. De luto por todos os que morreram injustamente. De luto pelos que morreram mesmo que matando outros.

— Qual o número total de baixas? No palácio? — perguntei, abrindo meus olhos devagar, aumentando meu tom de voz, em um claro esforço para não começar a chorar.

— Duzentas e quinze pessoas, majestade.

Assenti, sentindo meu estômago se revirar.

— Já trouxeram reforço médico? — perguntei.

— Precisamos de sua assinatura, majestade. Há mais de quatrocentos feridos, e setenta deles em um estado muito grave, incluindo o selecionado Cato Mason, que precisou passar por uma cirurgia urgente e complexa para fazer a remoção de sua perna ferida.

— Onde eu assino? — Logo me estenderam uma folha, que li rapidamente, onde fazia a solicitação de uma equipe de médicos, assim como suprimentos.

— O próximo passo, majestade, é fazer um anunciamento sobre quais providências serão tomadas a partir de agora, junto com as providências, e… bem, majestade, as pessoas precisam de uma Rainha. Oficialmente.

— O povo quer um líder, mas não uma soberana absoluta.

— E como esperam que eu faça isso? Como eu vou fazer isso sozinha? Meu pai está no Canadá com Prim, sem a menor possibilidade de transferência para cá.

— Bem, não queremos, e nem estamos na posição de pedir alguma coisa, e nem há o que cobrar de você nesse momento, mas fazer uma escolha para seu casamento, com algum dos dois Selecionados que indicou para a Final.

Suspirei, concordando. Encarei todos aqueles gráficos, e papéis que já tinha para que eu lesse e posteriormente venha assinar até o pôr-do-sol.

— Quanto tempo eu tenho até poder fazer um pronunciamento para todo o País?

— Quando achar que estiver ok o suficiente para trazermos algumas pessoas para te entrevistarem. Amanhã pela tarde, seu quarto será liberado, há uma equipe generosa trabalhando para mudar o ambiente, assim como o de sua mãe, que ocupava a suíte da Rainha. Pode escolher para onde irá ficar a partir de agora, amanhã, e então, se sentir confortável, fazer o pronunciamento.

Concordei, balançando a cabeça em concordância.

— Prefiro continuar em meu quarto. E o quarto para o Escolhido?

— Está também passando por modificações, todos os quartos, na verdade. Todos estão sendo reformados para que sejam habitados o mais rápido possível.

—  Tudo bem, eu vou analisar minhas opções. Vou ler o que me deram para assinar. Podemos dar seguimento à reunião? — perguntei, tranquila, embora dentro de mim houvesse um furacão de questionamentos e ansiedades avassalando todos meus sentimentos. Eu preciso me manter calma. Eu tenho controle sobre minha mente, sobre minhas vontades. Eu posso controlar tudo isso o que há em mim. Eu sou forte. Eu sou capaz de lidar com isso.

— Claro. Podemos mudar para a pauta das finanças. Descobrimos três contas secretas, que a rainha mantinha. O valor ainda não foi todo contabilizado, porém…

May, uma das secretárias da economia, deu prosseguimento para a reunião, trazendo números, e eu dividia minha atenção nas informações que trazia dados valiosos e que eu nunca descobriria a menos que trouxessem. Minha mãe feriu o Governo mais do que todos nós imaginávamos. E também trouxe, de fato, coisas positivas. Minha mente deu giros e giros. Assinei os documentos, envolvendo liberação de tropas, outros eram pedidos de Médicos Sem Fronteiras etc.

— Acho que por hoje já foi o suficiente, senhores — Maggs diz, entrando no quarto com uma bandeja com minha janta, pouco depois de duas horas massantes, embora produtivas, de reuniões e discussões sobre o que faríamos, e o que já estava começando a ser feito. — O ferimento foi grave, eu os alertei que o máximo era que ficassem aqui por meia hora. Precisam se lembrar que é a rainha que está aqui, mas que está ferida, e precisa se recuperar.

Todos assentiram, com certo pesar.

Não levou mais que dois minutos para que se despedirem e deixar o quarto, me deixando, enfim, com meus pensamentos, Maggs e as enfermeiras.

— Obrigada, Maggie — agradeci sinceramente, enquanto elas tiravam cuidadosamente a tiara pesada de minha cabeça, e refaziam meu curativo. Minhas costas estão queimando. — Amanhã tem mais.

Ela suspirou.

— Infelizmente. Embora eu esteja liderando todo o inferno que se tornou a ala hospitalar, não acredito que você possa tomar atitudes como já se responsabilizar por tudo o que quer que tenha acontecido ao redor do País, uma vez que todos nós já tenhamos notícias de que de todos os massacres, o pior aconteceu aqui, e você foi uma das grandes vítimas.

— Obrigada mais uma vez, Maggie, por toda sua preocupação, mas eu me sinto razoavelmente bem. De verdade. Estou conseguindo organizar meus pensamentos, e estou colocando isso da melhor maneira possível. Só estou com muita dor no corpo, por causa de toda a situação, mas estou bem melhor.

— Que bom que está, mas não precisa se cobrar tanto agora, querida. Enfrentou tanto quanto muita gente. Você lutou. Merece ao menos se recuperar de saúde. Acredito que duas semanas seja suficiente para seu caso.

— É verdade, majestade. Mas se ainda insiste, não faça nada que a sobrecarregue, de nenhuma forma. Não vale a pena.

Assenti, concordando com os conselhos.

Logo que terminaram, me deixaram à vontade, com meus pensamentos, passando bem longe do que escutei agora na reunião com os ministros do país.

Eu preciso ainda raciocinar o que está acontecendo.

Gesticulo meus dedos, seguidas vezes, respirando fundo, para conseguir absorver o que quer que estivesse acontecendo. Eu não sinto como se estivesse prestes a desaparecer em uma escuridão sem fim. Simplesmente me sinto triste, com saudades de meu pai e Prim, que deveriam estar aqui. Sobre minha mãe, e sua morte, por minhas mãos… não sei definir. É algo tênue entre paz e tristeza. Não deveria ter sido dessa forma, para nenhuma de nós duas. Não deveria ter chegado ao ponto que chegamos. Não deveria. Mas infelizmente, chegou, e tudo o que posso fazer é… aceitar?...

Não sei como eu consigo continuar gesticulando meus dedos, com muitos ferimentos, mas todos em seu devido lugar. As luxações não me incomodam tanto quanto deveriam.

Eu estou na medida do possível. Quase bem.

Fiquei acordada por mais alguns minutos, depois de tentar assistir um filme na TV em meu quarto, e não consegui sonhar com nada.

*

Já no dia seguinte, marcando 24 horas do final de todo o terror espalhado ao redor do país, após assinar uma outra grande pilha de documentação, permissões, conversar com meu pai, Prim, e Nicolau, é claro, que está vindo para Panem me ajudar por quanto tempo quer que seja necessário. Eu amo um amigo, e este é Nicolau.

Eu estava dando alguns passos pelo quarto, mexendo em meu Smarter, quando a pessoa mais inesperada apareceu: Gale.

Diferentemente de mim, que caminho sem a ajuda de nada, apenas com uma enfermeira por perto, com uma mão em minha barriga e outra na base da minha coluna, para que eu não perdesse a postura enquanto mexo no aparelho, Gale apareceu com uma muleta, mas não mancava tanto assim.

— Céus, Gale! — exclamei, largando o Smarter, que só não caiu no chão porque Nanny foi mais rápida em pegá-lo, assustada pela minha reação repentina. O moreno riu, abrindo os braços, ainda segurando a muleta, e me envolveu em um abraço reconfortante.

— Não imaginei que já pudesse vir sem avisar, mas tentei a sorte. Queria saber pessoalmente como está — disse, carinhosamente, me fazendo sorrir, sentindo meu rosto ficar corado com seu carinho, mesmo depois de tudo o que passamos há poucas horas atrás.

— Obrigada,  Gale. Não sabe o quão feliz eu estou por você estar vivo! E andando!

Riu novamente, me fazendo ver suas covinhas em suas bochechas, lindas. No meio do desespero, acreditei que nunca mais pudesse vê-lo, ainda mais com a última visão que tive, sujo com fuligem e sangue, para proteger minha vida.

Nos sentamos na cama, depois que liberei as enfermeiras, e não me incomodei por estar com um short de pijama fino e curto, ou com apenas um kimono, já que ainda é complicado que eu levante um braço o bastante para conseguir vestir uma blusa. Eu até estava com uma calça há poucos instantes, para a reunião com ministros e secretários, mas não faço questão desse tipo de formalidades com alguém como Gale.

— Bem… já que estamos aqui, acho que agora é uma boa que eu me explique. Sobre a Guarda, Katniss.

Ele foi direto ao ponto, colocando uma mecha de cabelo minha atrás da orelha, fazendo um carinho onde meu brinco deveria estar.

— Gale, sabe que não tenho raiva de você por causa disso, eu entendo o que quer que tenha sido seus motivos… não se sinta forçado a nada, por favor. De verdade.

Esclareci, olhando bem em seus olhos idênticos aos meus. Há um turbilhão de sentimentos, dos quais eu sequer posso pronunciar.

Respirou fundo, e sorriu torto.

— Você precisa saber.

E me contou. Contou tudo, que auxiliava a Guarda e os Nortistas desde o princípio, e o seu medo, durante os primeiros ataques, era que algo realmente sério e grave poderia acontecer com a vida de todos os envolvidos, não muito pela dele, mas a minha, meu pai, e desde o caso em que Finnick foi espancado junto com Annie, a vida de Peeta, por quem a Guarda secretamente infiltrou novas pessoas ao Palácio, de maneira que mesmo sem eu saber, os autorizei que trabalhassem aqui, com perfis impecáveis, rostos singulares, pra proteger Peeta.

Aparentemente, eu e o Mellark transparecemos demais os nossos sentimentos um pelo outro. Nessa parte da conversa, fiquei totalmente constrangida, o que fez Gale brincar, embora nos olhos dele houvesse ciúmes.

— Nunca entrei aqui realmente para competir pela sua mão, mas sua confiança, apenas para que me mantivesse perto o suficiente para que eu pudesse saber como você era, e influenciá-la para prestar atenção em situações de Panem que nunca tiveram voz anteriormente. Meu trabalho era esse. No meio do caminho, eu verdadeiramente me apaixonei por você, embora nunca tenha agido de forma falsa, ou para ter vantagens em alguma coisa em particular. Sua fuga do palácio, o tiro que Peeta sofreu, tudo isso eu estava ciente, e ajudei a eliminar outros vestígios que deixaram pelo palácio no dia.

— Então era você quem irritou meus pais, quebrando um quadro importante, no corredor anterior ao que estávamos passando com Peeta — assentiu.

— Como sabia que vocês imaginaram que não iriam conseguir chegar a tempo em algum lugar seguro, teriam que passar pela Cozinha. Só se esqueceu que era bem no dia em que seus pais vão para checar como estão os serviços. Foi quase sorte.

Balancei a cabeça, sem acreditar. Porém logo mudou o assunto, me explicando o que havia acontecido no dia do atentado. A ajuda de Nicolau com as armas havia sido crucial para todo o trabalho que conseguiram realizar, onde sem ele, poderia ter sido muito pior. Gale me trouxe um pen-drive, com assuntos confidenciais.

— A Guarda Escarlate não quer nenhum cargo comissionado no seu governo. Querem apenas paz, tranquilidade, onde haja igualdade entre os mais pobres com os mais ricos. Há muito de Panem que você não conhece. Aqui tem alguns arquivos que possam ajudar como você deva começar o seu governo, com quem quer que seja sua escolha, inclusive se quiser fazer tudo isso sozinha. Você tem todo o direito, e terá todo o apoio que for necessário para conseguir fazer o que é justo e certo neste país, e em todos os outros dos quais você governa.

Colocou em minhas mãos, fechando-as cuidadosamente envolta do pequeno dispositivo, quase do tamanho de um grão de arroz.

— Obrigada, Gale — agradeci, sincera, em um tom de voz baixo, para não começar a chorar, e acabar fazendo ele também chorar. Ele renunciou absolutamente tudo para estar aqui, passar quase seis meses de sua vida, podendo uma vez descoberto, colocar em cheque toda uma causa, e a vida de sua própria família.

O que não poderia fazer ao meu lado?

— Gale… — fiquei sem ter o que dizer. Todas as vezes que penso que já me decidi, eu não consigo. Sempre volto atrás.

— No fundo do seu coração, Katniss, sabe qual é a verdade. Sabe qual é a sua escolha, desde o princípio, e não precisa ter medo de escolher. Nesse momento, ele está lá na ala hospitalar ajudando os enfermeiros e os técnicos, para poder cuidar de outras pessoas. Ainda não veio até aqui porque disseram para ele que você estava bem, viva, e já tomando providências para colocar Panem no lugar.

Perdi o compasso, sentindo meu coração ficar acelerado, só de pensar na possibilidade de um Peeta aqui bem na minha frente, quase chorei. E tudo o que Gale fez para inclusive me proteger da minha mãe, fazendo com que os nortistas arrumassem ocasiões que a fizessem sair do palácio, para me dar alguma trégua. Isso tudo porque eu me abri para ele antes de qualquer outra pessoa sobre os abusos que minha mãe cometia contra mim.

— Você sabe quem é responsável pelos sentimentos que só quando a gente ama, provocam na gente. Tem um nome e sobrenome, Katniss. Você é totalmente livre para poder escolher isso. Mas caso ainda não se sinta pronta para isso, está tudo bem também. Ele não faz a menor ideia de que eu estou aqui agora, mas tenho pelo conhecimento de que concorda que quem deva tomar a atitude seja você, no tempo que estiver pronta. Você é a protagonista da sua própria história agora. Somos meros coadjuvantes.

Gale então beijou minha bochecha, carinhosamente, como um amigo faria, mesmo que tenha deixado oficializado mais uma vez o quanto gosta de mim, muito mais do que um amigo.

— Boa sorte, Katniss. Uma boa vida. De verdade.

Desejou, se levantando da cama, apoiando-se na muleta.

— O quê? Como assim? Você vai embora?

Perguntei, me colocando de pé também.

— Sim, eu vou para a Austrália. Minha passagem foi agendada junto com a dos meus pais. Imaginei que fosse ser melhor para mim, sair um pouco de toda essa emoção… essa vida no fundo nunca foi para mim. Eu só quero tocar meu violão debaixo de um coqueiro, como quem não quer nada, sabe? — disse de um jeito tão leve e despreocupado, que ri, mas não consegui deixar as lágrimas não virem aos meus olhos. Meu riso logo virou um choro, já com saudade. — Não chora porque eu estou indo, Katniss, calma… vão ser só alguns meses. Minha vida está aqui em Panem…

Me consolou, afagando meus cabelos, e sua respiração é pesada. Também quer chorar. É sempre difícil ter que se despedir das pessoas. Ainda mais das que já tivemos que nos despedir sem saber se realmente um dia poderíamos nos ver novamente.

— Você realmente volta? — assentiu, dando um sorriso tranquilo. — Se não voltar, ordenarei que o busquem de volta.

Daí foi a vez dele de rir, divertido. Nunca há um tempo ruim para Gale.

— Ok, Majestade, eu volto em seis meses. Não estarei para futuras cerimônias… pela minha saúde emocional, mas saiba que eu vou estar sempre, Katniss, em qualquer circunstância, orando e desejando o melhor para você. Não existe alguém que eu conheça que mereça mais ser feliz do que você.

Suspirei, o abraçando mais uma vez. Eu não poderia ter mais sorte do que ter tido eles como meus Selecionados.

Nos despedimos, e logo Madge entrou, junto com Johanna, e uma Annie um pouco ofegante e suada, com uma mão em sua barriga bem discreta.

Ordenei particularmente que Annie fosse trazida para os cuidados reais logo após o ataque, enquanto Finnick anda auxiliando em outras áreas. Por uma sorte, conseguiram escapar do sangrento ataque que ocorreu na Cozinha, onde os Sulistas já entraram atirando sem a menor importância com quem quer que estivesse na frente, eles estavam no estábulo, tendo a oportunidade de salvar muitas crianças que estavam no jardim na hora da abordagem, e se protegerem em um dos esconderijos mais seguros, por ser mais improvável.

— Gale acabou de sair daqui com uma expressão de paz, mas um pouco triste. O que aconteceu? — Annie fofoqueira e inquieta, logo veio me perguntando, eufórica.

— Gente… eu não sei se eu estou totalmente pronta para poder falar sobre o que aconteceu, de verdade...

Embora um pouco decepcionadas com a minha notícia, concordaram.

— Tiveram alguma notícia positiva sobre os desaparecidos? Encontraram mais pessoas desde a última reunião? — perguntei, voltando a me sentar na cama, colocando com muito cuidado o dispositivo dado por Gale junto com documentos importantes.

— Bem… sim. Encontraram Delly, Katniss — Madge disse, depois de trocar um olhar nervoso com as outras duas. Isso logo me deixou ansiosa.

— E como ela está?

— Se recuperando na medida do que pode. Quebrou o pulso, achavam que era irreversível, mas por sorte já conseguiram realizar novos exames nesta tarde. Quase quebrou a clavícula também, mas… ela passa bem. Apenas achamos que gostaria de saber disso. Infelizmente, mais algumas baixas de amigos nossos, mas as coisas estão caminhando positivamente na medida do que é possível.

Trouxeram notícias de outras pessoas que eu conheço, como Rue, que infelizmente perdeu o noivo na tragédia, e que precisaram amputar uma perna de Cato, não houve mesmo um reparo, o que acabou comigo.

Todavia, meu tio Frank já está acordado, reagindo bem aos tratamentos para uma forte pancada que sofreu na cabeça, minhas primas passam bem, assim como minha tia Anastacia, mas não vieram me visitar por motivos que isso poderia trazer emoções fortes demais. Mais do que já tenho vivido.

— Amanhã, quem sabe, você não possa ir vê-los — Johanna disse, com um sorriso bem tranquilo e carinhoso para mim. Ela sempre foi a mais calma, mas se tornou ainda mais doce com a sua gravidez, que está na reta final. Se não fosse Troy, seu marido, eu realmente não estaria viva.

Ele se safou por uma questão de milagre. Foi baleado de raspão no braço, e insistiu em fazer minha guarda particular durante a noite, que é inclusive quando Johanna ajuda as enfermeiras a cuidarem de mim, para que eles também passem um tempo juntos.

— Eu adoraria — respondi, esticando meu braço bom pra pegar batatas fritas que estavam na bandeja que Madge carregava. — Será que eu tenho mesmo que me casar?

Perguntei, de maneira séria. Estou em um pequeno surto de ansiedade. Eu tenho que me decidir agora?

— Katniss, olha só tudo o que você está fazendo sozinha. Você só tem que casar se você quiser — Annie respondeu. As outras concordaram.

— Se for quem todo o país imagina que vá ser… não será um peso nas suas costas. Só faça essa decisão quando você sentir que deva fazer. Não se apresse.

Madge completou.

Suspirei, fechando meus olhos, passando meus polegares em minha têmpora, de maneira para acalmar meu turbilhão de sentimentos.

Dois toques na porta.

— Majestade? Desculpa interromper, mas apenas para deixar um recado que o ministro Charlie deixou para você — Nanny disse, entregando para Annie um envelope branco pequeno.

Agradeci, e ela logo se foi, enquanto eu já lia o bilhete.

— Mais uma reunião amanhã pela tarde. Mais secretários. Céus. Eu preciso de férias, mas antes, tenho que colocar toda Panem no lugar de novo — falei, decidida.

— Estaremos aqui para te ajudar, e descansar apenas quando você o fizer. É para isso que somos suas amigas — Johanna declarou, abrindo as cortinas, revelando um céu arroxeado e bonito, dando lugar para a imensidão da lua e suas estrelas.

— Para isso, peço para que busquem mais refrigerantes e hambúrgueres. Tenho que contar uma coisa para vocês, e preciso que me ajudem também a organizar toda essa papelada que me trouxeram hoje.

— E o que quer nos contar?

Respirei muito fundo, caminhando até a grande janela, observando o Sol ir embora calmamente no horizonte. Você está pronta para fazer essa escolha. A conversa que Gale teve comigo, foi no mínimo esclarecedora, eu não me senti traída por ele ter estado infiltrado todo esse tempo aqui, uma vez que é bem claro tudo o que ele sente por mim, esteja tão nítido em seus olhos incríveis. Não é como se eu pudesse me aborrecer com ele.

Porém, a forma da qual falou e deixou tão clara coisas que eu estava negando para mim mesma…

Antes de dizer para elas minha resposta, digitei para meu pai. Logo ele me respondeu, com um coração azul.

Não consigo sentir nada a não ser paz ao pensar no assunto, e quero chorar, um tanto perturbada por me sentir dessa maneira no meio a tanto caos, crises e surtos internos que eu enfrento, ou ao menos deveria estar enfrentando.

— Eu fiz minha escolha. Amanhã, quero que todos os ministros saibam, e que o chamem para estar comigo.

Aos dezoito anos, não tenho como estar tão certa de todas as coisas, mas dessa, eu tinha certeza. Não havia como estar errada sobre. É definitivo, tanto quanto a noite dar lugar ao dia, o Sol ceder seu espaço para a Lua.


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