Mestre escrita por Yokichan


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Pessoal, aconselho lerem o capítulo ao som dessa música, que é a música do Utakata e da Hotaru no anime: http://www.youtube.com/watch?v=xINPjMxM0EI
 
Fiquei chocada com o fim desse episódio, quis matar o Pain e o Kishimoto. ç.ç /chorourios
Espero que gostem, e deixem reviews.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/64462/chapter/1

“Meus sentimentos estão dentro dela.”

 

 

 

 

         Durante muito tempo, meu coração esteve fechado por conta do irremediável ódio que cresceu dentro de mim, por conta da dor descomunal pesando sobre minhas costas. Ninguém poderia suportar a minha carga ou tratar minha profunda ferida, porque eu estava sozinho. Amor e esperança estavam banidos para sempre de meu coração, e então o ódio espalhou-se livremente. Todas as portas permaneciam fechadas, sem luz, sem chão ou céu, porque no escuro toda a dor pode ser escondida da verdade. Eu recusaria com todo o meu furor a palavra “mestre” pelo resto de meus dias, se ela não houvesse iluminado meus olhos com seu brilho inconfundível. Hotaru, a única que não hesitou perante minha fortaleza intransponível.

         Por incontáveis vezes eu a neguei, a privei de minha presença, a afastei da esperança de um dia poder ser minha aprendiz. Embora ela perseverasse com todas as suas forças, meu coração estava fechado, e dele nada entrava ou saía. Seus olhos inocentes minguavam ao tentar sustentar os meus, pesados e frios, resistindo melancolicamente aos meus “nãos” sempre tão rígidos. No entanto, quando eu pensava que estava livre para seguir minha jornada solitária pelo escuro, ali estava ela, pronta para tudo. Eu não entendia o motivo de Hotaru insistir veementemente em me ter como seu mestre, se dentro de mim aquele sentimento de lealdade já não existia mais. O elo entre confiança e amor havia se rompido em meu coração, e docemente Hotaru o regenerou. Quando eu percebi que poderia perdê-la para sempre, foi quando descobri que seus sentimentos estavam dentro de mim, protegidos com exímio zelo.

         Não. Eu não poderia permitir que ela se fosse, eu não deixaria que nada a machucasse. Aquele delicado fio de primavera dançava para longe de mim, e por mais que eu corresse para alcançá-lo, tudo parecia tristemente impossível. Hotaru estava se perdendo no escuro da dor, esperando por seu mestre que talvez nunca chegaria para lhe segurar a mão. A imensidão de luz me envolvia, tão pálida e ofuscante que por alguns momentos eu imaginei que aquele seria o fim. E então, os soluços frágeis de Hotaru me conduziram pelo caminho certo.

         Tão pequena encolhida sobre o próprio corpo, tão sozinha como eu por muito tempo estive. Ali estava ela, ajoelhada sobre as delicadas margaridas que se estendiam até onde meus olhos eram capazes de enxergar. Suas pálidas mãos escondiam um rosto umedecido pela dor, derrotado pela decepção. O motivo das lágrimas de Hotaru estava imóvel diante de seu corpo sucumbido, e este era eu.

         O céu tremulava sobre nossas cabeças, e eu sabia que não tínhamos muito tempo além daquele tênue instante.

 

- Hotaru... – chamei num murmúrio, hesitando perante seu sofrimento.

 

- Eu não quero machucar ninguém... – ela choramingou sobre as mãos. – E mesmo assim, eu machuquei Utakata.

 

         Seu corpo tremia enquanto ela soluçava, vacilava, tombava pelo peso do arrependimento sobre seus frágeis ombros. Um arrependimento que eu havia causado, uma dor que Hotaru só havia conhecido por minha culpa. Mesmo não tendo conhecimento de meu passado escuro, ela havia compreendido a minha amargura sem correr para longe. Só então eu percebi o quanto aquela pequena e resistente Hotaru havia depositado sua esperança em mim.

         Absorto, ajoelhei-me diante dela e esperei por seu olhar.

 

- Eu estou bem aqui. – afirmei, acolhedor. – Eu estou bem.

 

         E então, meu pequeno raio de sol parou focado em mim. Lágrimas rolavam por seu rosto pálido de porcelana enquanto ela tentava convencer-se de que eu estava mesmo ali, seu mestre renegado, seu alicerce esmaecido. O que eu havia feito com Hotaru até aquele momento? Por que eu não havia percebido o quanto ela era essencial para mim? Não era apenas eu que não estava mais sozinho, assim como Hotaru também não estava. Eu decidi que queria tê-la ao meu lado naquele momento, e eu faria com que aquilo acontecesse.

 

- Não... Eu sou tão fraca, Utakata. – lamentou-se ela, derrotada. – Alguém como eu deveria desaparecer para sempre! – sua voz vacilou enquanto ela chorava.

 

- Não! Eu não vou permitir. – prometi, tocando minha mão em seu ombro.

 

         Mesmo que eu precisasse inverter a ordem de céu e terra, eu não deixaria que nada tocasse Hotaru, porque eu enfim havia descoberto a verdade sobre tudo. O escuro só era escuro porque eu não queria ver a luz, e finalmente aquela mortalha havia caído de meu corpo. Agora, Hotaru era a chama que me mantinha vivo, era por ela que eu caminharia.

 

- Uma discípula deveria escutar o seu mestre. – soltei, fitando-a docemente, e pela primeira vez em muito tempo eu senti que poderia nascer novamente.

 

         Ela me olhou surpresa, praticamente incrédula. Seus orbes esmeraldinos ainda transbordavam graciosamente, enquanto de meus lábios nasceu um sorriso que apenas Hotaru poderia vislumbrar. Apenas ela, porque ela fora a única capaz de quebrar minha camada de gelo, capaz de penetrar em meu escurecido coração.

 

- Você disse... Mestre... – murmurou ela, emocionalmente chocada.

 

         Afavelmente, passei meus braços ao redor dos ombros de Hotaru, protegendo-a não só com minha força, mas também com meu amor. Ela deixou os olhos caírem, e então o silêncio nos contemplou.

 

- Vamos voltar, Hotaru. – pedi serenamente naquele deleite de luz. – Acredite no seu mestre.

 

         E então, tudo estaria bem outra vez. Quando a tempestade passasse, eu poderia caminhar sobre os destroços com minha intocável aprendiz, adorar seu sorriso iluminado sem ser atropelado pelo tempo que não tínhamos, segurar sua mão para que ela jamais se perdesse. Eu estaria ali o tempo inteiro para minha Hotaru, e enquanto ela colhesse as margaridas da doce primavera, eu cuidaria para que as pétalas jamais caíssem, para que o sol jamais dormisse, para que o escuro nunca chegasse. Eu não teria medo, porque o olhar precioso de Hotaru estaria guardado dentro de meu coração aquecido. Ela, minha fonte inesgotável de esperança, meu eterno amanhecer. Muito mais do que mestre e aprendiz, para sempre.

 

 

 

 

“Meus sentimentos estão dentro dela, como estão dentro do meu coração.”


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!