Caravaneiros do Limbo escrita por GlauSimões


Capítulo 6
One Step Closer to Knowing


Notas iniciais do capítulo

Então...primeira atualização de 2016. Sim, em Abril!Lamento por essa demora recorde!:(
O motivo continua sendo a faculdade, pois esse é meu penúltimo semestre,o que significa que me formarei no final do ano (Aleluia!). Consequentemente, estou envolvida com as últimas cadeiras e com o projeto de TCC. Essa sigla suga as tuas energias. Eu passo a semana lendo artigos e livros para basear o argumento teórico e quando chega o final de semana, a inspiração para a fanfic não vem.Tenho vontade de me encher de tapas.>.< .

Apesar de tudo, continuo afirmando que escreverei essa fanfic até o fim.

Deixei a notícia boa para o final !( Mazaaa) O próximo capítulo 7 não deve demorar tanto para ser postado por que eu já tenho uma parte dele escrita (milagre!).

Recados dados, aproveitem a companhia dos Winchester huahauah.

Agradeço infinitamente a paciência de vocês e quero vê-los nos comentários :P

Desejo uma ótima leitura!

Beijos



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— Ouviram?! Vão embora! — o fantasma lançou os gêmeos em direção à parede oposta. Se os irmãos estivessem em sua forma física, certamente causariam prejuízo ao hospital por atingirem e danificarem alguns equipamentos.

O espírito tratou de consumir a energia vital de Joshua. Havia algo estranhamente doentio e prazeroso naquele ato que ultrapassava a barreira de uma mera relação entre obsessor e obsediado. O paciente arfou e sentiu que toda a parca energia recuperada era drenada de si e o negrume da inconsciência o envolveu por completo.

— Por que você está fazendo isso com ele? — questionou Olívia ao se levantar, assumindo qualquer risco.

— Vocês devem ser novatos. — a feição abrandou por compreender que a dupla não estava ali para disputar o paciente e um ligeiro esgar surgiu em seu rosto desfigurado.

— Ele não é uma vítima inocente como vocês pensam. Nós éramos colegas de trabalho. Ele iniciou o incêndio que culminou em uma explosão. A perícia afirmou ser um acidente, mas não acredito nisso. — o fantasma olhava para o enfermo com intensa fúria e revolta. Vincent e Olívia se entreolharam ao perceber que a raiva o havia enlouquecido. Espíritos acreditam naquilo que querem e fazem disso sua verdade.

— Joshua merece o que está passando. Eu sei que ele deve estar ouvindo tudo ali dentro. — o espírito afirmou com profunda convicção.

A pequena demonstração de poder alertou os gêmeos a ponderarem a interação com o espírito que esbanjava inegável astúcia. Qualquer frase ou questão mal interpretada pelo fantasma insano poderia resultar em maiores problemas.

— O que você quer dizer com isso? — perguntou Olívia evitando não focar sua atenção na porção do rosto do homem castigada pelas cicatrizes de queimaduras.

— Eu estou morto, mas não sou idiota! Tem alguma coisa errada com Joshua. Ele mudou de personalidade desde o último outono. Há algo dentro dele que não é capaz de salvá-lo. — a réplica soou impaciente e áspera.

Atento às palavras do espírito, Vincent passou a observá-lo a fim de adquirir algumas informações sobre ele enquanto era vivo. O uniforme de trabalho composto de uma camiseta vermelha e calça preta lhe pareceu intrigantemente familiar. Uma pequena placa de identificação parcialmente enegrecida devido ao fogo estava fixa em uma das alças do suspensório e informava as últimas letras do nome do funcionário: “ard”.

Ainda que os gêmeos tivessem alguns minutos de projeção astral, eles optaram por encerrar a sessão naquele momento, pois não seria possível resgatar o paciente identificado como Joshua enquanto ele estivesse subjugado ao fantasma. Por tanto, para livrá-lo desse mal, eles teriam que se reunir com os Winchester e elaborar um plano.

Os irmãos Winchester ainda estavam paralisados olhando para o punhado de cinzas.

— Que porra foi aquela?! — Dean exclamou.

— Um cão negro. Cães negros são espíritos que assumem aquela forma para realizar a última prova antes de se tornar um demônio. Isso significa que o tempo está esgotando! — o conhecimento privilegiado confirmou que a entidade não estava ali por coincidência.

— Quem é você ou eu deveria dizer o que? — Sam questionou.

— Eu sou um remanescente. — disse o homem, um tom monótono, embora o tom estivesse carregado de acentuada veneração.

— Você é um ceifeiro! — Sam estreitou os olhos.

— Eu costumava ser um deles antes dos Portões do Céu serem fechados. Minha missão foi resumida a dois encargos: o primeiro, convencer meus semelhantes a não se suicidarem e segundo, procurar por vocês. — esclareceu o ceifeiro em um timbre entremeado por repulsa e impaciência.

 — Por que você está procurado por nós? — Dean lançou a instigante pergunta que acendeu um brilho interessado no olhar do ceifeiro como se tal pergunta tivesse atendido alguma expectativa sua.

 — Essa é uma boa pergunta, Dean. Por que recorrer aos Winchester quando foi um deles que tentou matar a Morte? — o representante do Anjo da Morte pontuou enfaticamente. O subordinado do Cavaleiro Pálido percebeu que a acusação foi o suficiente para o caçador enrijecer o semblante.  — Cá entre nós, matar a Morte é um tanto paradoxal, não concorda? — o ceifeiro direcionou uma piscadela a Dean.

O caçador aceitou a provocação e disparou uma resposta que soou como um desafio velado: — Se Morte está viva por que somos nós, meros mortais, que estão dando o suor e sangue nessa luta, a qual Ela deveria estar travando? — os lábios do caçador se repuxaram para um lado formando um sorriso sarcástico.

— A Chefia me avisou sobre sua petulância incurável! Morte está operando de um lugar distante, uma espécie de refúgio temporário, para evitar que seja disputada como um brinquedo por duas crianças birrentas e as principais interessadas neste caos. — uma pontada de desprezo surgiu em seu timbre conforme elucidava as conjunturas para os dois humanos.

  — Crowley e Metatron. O Escriba está preso... — apontou Sam.

  — Um não quer ser encontrado e o outro está onde quer estar, por enquanto. — Nada é garantido em tempos de desordem e não se deve subestimar os infortúnios provindos dela. — o ceifeiro deteve as palavras de Sam com despeito. — A Morte intervirá através de nós no momento certo, quando vocês estiverem preparados. — um aviso foi feito.

— O que você quer dizer com isso? Receberemos ajuda? — perguntou Dean.

— Seria muito conveniente chamá-los de pretenciosos ao considerarem tal coisa, porém não posso fazê-lo.Vocês estão enganados se pensam que as conseqüências do fechamento dos Portões dos Céus são o grande problema. O desafio maior será se os Portões ainda estiverem selados quando a suprema força destrutiva chegar! — alarmou o representante da Morte.

Emudecidos, os irmãos Winchester apenas relancearam um olhar um ao outro.  Ambos estavam imersos em um estado de atordoamento que nem notaram que o ceifeiro havia partido da mesma forma que chegou, misteriosamente. Dean ouvia o eco das palavras da Morte sobre as implicações da destruição da Marca de Caim e a conseqüente libertação da Escuridão. Atento às reações do irmão, Sam sentiu a laringe estreitar ao engolir o pavor.

Regressados do Limbo, os dois pares de olhos se abriram e as pupilas se ajustaram de acordo com a iluminação do ambiente. Os organismos liberavam suor frio, resultado da ligação dos corpos com os espíritos em desdobramento. Os peitos dos caçadores ondulavam inconstantes em busca de ar fresco enquanto o pavor os anestesiava momentamente, privando-os de qualquer raciocínio não relacionado com o relato do ceifeiro, o qual serviu como um lembrete: se os itens sobrenaturais de segurança, cadeado e chave, fossem violados através da destruição da Marca de Caim, ela estaria livre de seu exílio e assolaria a Terra com o mais puro e primitivo mal.

Sam percebeu seu irmão segurar o próprio antebraço em um gesto impensado e desenhar uma Marca imaginária sobre ao manga do casaco que cobria a região onde uma vez a autêntica se instalou. Um vinco de preocupação marcou a testa do Winchester mais novo assim que o ex-portador da Marca de Caim lhe fitava, os olhos verdes estavam quase saindo das órbitas e neles estava estampado o medo que Dean tinha dos efeitos que a Escuridão poderia exercer sobre ele.

— Vocês estão bem? — a pergunta simples os resgatou para os enigmas do presente.

— Sim, estamos! — Sam dissimulou tom tranquilo com proficiência.

— Porém, não graças a vocês. Tivemos sorte em resolver um contratempo que tivemos com um cão negro! — o breve relato de Dean soou áspero e um tanto acusatório. O olhar do caçador intercalava entre os irmãos Lavigne, contudo, os semblantes dos caravaneiros se mantiveram inabaláveis. Secretamente, somente um olhar mais apurado e íntimo conseguiria perceber a consternação se exteriorizar em um rápido pestanejar em Olívia, o do gêmeo.

A mulher sentiu a apreensão estrangular a boca do estômago e o gosto amargo do erro e da falha escalar em sua garganta. A especialista nas dinâmicas do Limbo reconheceu que procedeu mal em deixar duas pessoas iniciantes sozinhas em incursões nesta dimensão sem o apoio de um caravaneiro experiente. Aquela reprimenda aberta soou mais presunçosa para Vincent do que para Olívia, que a considerou mais profissional do que deveria. Vincent apertou o ombro da irmã em um aviso que ela deveria ponderar aquelas palavras, uma vez que erro ocorreu mais por falta de prudência do que de responsabilidade.

Olívia ouviu seu pai resmungar algo ininteligível em sinal de desagrado com a intenção de Dean. O breve constrangimento que acometeu a especialista no Limbo, por sua falha ter sido identificada e exposta, se dissolveu e sua voz, geralmente calma, soou alta e resoluta: — Eu reconheço que falhei, no entanto não temos tempo para acusações.  Nós somos uma equipe e isso não irá se repetir. É apenas uma questão de prática para as disparidades de nossas atuações serem supridas. — a mulher manteve as de gemas azuis escuras cravadas no caçador, as quais assumiram um brilho confiante a que medida que ela exercitava sua posição de líder nas viagens astrais.

— Este cão negro em particular não colará grau. — Sam retomou o tema anterior. — Eles estão a serviço de Crowley. — o caçador compartilhou a informação. Seu tom era suave com o intuito de amenizar as palavras do irmão.

— Vocês encontraram o anjo doente? — Dean abordou o cerne da operação de incursão no Limbo.

— Sim. Nós achamos o anjo, mas esse não é um caso de resgate comum. — assinalou Olívia.

— Temos um caso que os farão caçar. — revelou Vincent.

— Caçar? — os irmãos perguntaram em perfeita sincronia.

— Um espírito vingativo, especificamente. Ele está vampirizando o anjo que encontramos no hospital e não será fácil resgatá-lo enquanto estiver subjugado a seu obsessor. — Olívia esclareceu.

 — Vocês têm alguma informação de quem seja esse espírito? — perguntou Sam, olhando Olívia e Vincent, alternadamente.

 — Não muitas. Sabemos que as últimas letras do nome dele é “ard” e que ele morreu em uma explosão durante o trabalho, a qual a perícia afirmou ser acidental. — Vincent arqueou uma das sobrancelhas. — Ele trajava uma camiseta vermelha, calça preta e um suspensório na mesma cor. Eu acho que o uniforme era o padrão de uma rede alimentícia. — o caravaneiro acrescentou à sua contribuição.

— Ótimo! Isso é o bastante para começarmos uma investigação. — constatou Sam, enquanto as engrenagens de sua mente funcionavam rápida e assertivamente com as informações cedidas. O caçador olhou para Donald que estava sentado ao computador e lhe perguntou, já que o outro estava conectado a um sistema de monitoramento da livraria: — Você se importa se eu utilizar o computador? — a resposta não foi verbalizada, porém Donald se levantou da cadeira e indicou o lugar vazio.

Os demais integrantes do grupo se reuniram em volta do computador para iniciar a primeira etapa da pesquisa: descobrir o nome do homem vítima fatal do acidente. Vários nomes que terminavam com as três letras mencionadas foram sugeridos, tais como Howard, Bernard, Leonard, Gerard e Edward. Alguns deles foram descartados à medida que não estavam relacionados com alguma notícia em potencial.

— Olhem esta aqui! — Donald, que preferiu se abster dos diálogos até o momento, apontou demonstrando que estava tão compenetrado na tarefa como os outros. A manchete indicada anunciava a morte de três pessoas e quinze feridos em uma explosão acidental em uma unidade do restaurante de fast-food Biggerson’s.

Bastou ínfimos milésimos de segundos para a notícia divulgada por um jornal de Nebraska pipocar na tela do computador. A principal foto da matéria registrou a destruição causada pela explosão: destroços do restaurante estavam espalhados sobre a calçada e no meio na rua. Uma fita zebrada preta e amarela isolava o local para a atuação dos bombeiros e equipes de resgate.

— Escutem isso: “entre as vítimas fatais se encontram Gerard, de 43 anos, que deixou a esposa e dois filhos.” — Sam reproduziu o trecho relevante que exibia uma foto pequena do homem.  — Vocês o reconhecem? —  perguntou o caçador.

— A causa da morte o deixou um pouco desfigurado, mas é ele com certeza. — confirmou Olívia, convicta.

 — Yahtzee! — vibrou Dean. — Vamos para o Abrigo pegar nossos trajes e fazer uma visitinha à viúva, mas antes disso eu preciso tomar uma cerveja. — o caçador expôs os planos

●●●

O brilho lunar prateado banhava o vasto terreno do cemitério demarcado por centenas de lápides vigiadas por corujas e corvos, no entanto, os pássaros não eram os únicos visitantes vivos naquelas redondezas. Apetrechos incomuns e de gosto questionável contornavam um túmulo enquanto duas pessoas o violavam , cavando-a.

Os caçadores removiam a terra com pás, um gesto repetitivo que se tornava mais árduo à medida que a cova ficava mais profunda. Uma poeira irritante aos olhos e às vias respiratórias pairava no ar e aderia à pele suada dos irmãos Winchester, que apesar de concentrados na tarefa também estavam atentos a qualquer sinal sobrenatural, principalmente a uma aparição de Gerard.

O buraco na terra já havia alcançado cerca de um metro e meio de profundidade quando os caçadores expiraram vapor condensado, indicando que a temperatura havia decaído abruptamente.

— Aqui vamos nós! — comentou Sam prescrutando o ambiente em volta a procura de Gerard.

Em uma atitude precavida, Sam despejava sal no chão a fim de formar um círculo protetor ao entorno da cova. O caçador ouviu o irmão chamá-lo em um sinal de alerta, porém não foi ágil o suficiente para reagir e uma dor dilacerante o dominou: as mãos de Gerard transpassaram as costas de Sam e envolveram os pulmões do caçador, impedindo o pleno funcionamento dos órgãos. O organismo de Sam reagia involuntariamente em uma busca sôfrega e ineficaz por oxigênio. O caçula dos irmãos Winchester sentiu seu coração acelerar e as batidas desenfreadas estremecerem não apenas seu peito, mas suas entranhas por completo.

— Aguenta aí, Sammy! — Dean buscou pela espingarda carregada com cartuchos de sal, mas o espírito a arremessou para longe. — Fantasma filho da puta!

Instintivamente, o caçador pegou a pá e correu em direção a Gerard, que desta vez estava compenetrado demais em matar Sam do que em antever os movimentos do outro. Dean golpeou precisamente o fantasma com o bico de ferro do instrumento e o fantasma se desintegrou em uma fumaça cinzenta. Sam desabou de joelhos sobre a grama, inspirando o ar ruidosamente. Um tanto atordoado e com a visão turva, Sam percebeu que lentamente a sensação de ardência abrandava conforme sua respiração recobrava o compasso natural. Dean passou um dos braços do irmão pelos seus ombros e o ajudou a se levantar.

— Estou bem!Vamos terminar o serviço. — disse Sam.

O caçador mais novo retomou a tarefa de delinear um círculo de sal, porém, Gerard reapareceu e seu olhar resplandecente de rancor demonstrou que ele estava disposto e decidido em concluir o que começou, contudo, dessa vez, Sam foi mais rápido e disparou certeiramente dois tiros de sal no fantasma, retardando-o.

A pá chocou-se contra o solo e soou um baque oco, o ataúde estava debaixo dos pés de Dean. Um estalo seco indicou que o caixão foi arrombado e aberto: o cadáver em avançado estágio de decomposição apresentava uma pele escurecida com aspecto oleoso e ainda exalava um odor pútrido. Apesar da ampla experiência dos Winchester nesta atividade criminosa, o cheiro nauseabundo que parecia entranhar-lhes nas narinas recontorceu os estômagos dos irmãos.

— Rápido, Dean! Ele está vindo! ­— alertou Sam ao observar os pequenos grãos de sal se dispersarem devido ás rajadas de vento manipuladas pelo espírito.

Sam despejou sal e o líquido inflamável sobre os restos mortais de Gerard e Dean finalizou o serviço ao jogar um isqueiro aceso no caixão. A combinação química explodiu em altas labaredas que não tardaram em produzir fumaça, indicando que os restos orgânicos estavam sendo consumidos.

 — Adeus Duas-Caras! — disse Dean exibindo seu senso de humor, desfrutando a vitória.

A feição de Gerard mudou de rancorosa para a de surpresa ao sentir que seu elo com o mundo dos vivos foi rompido. O espírito escancarou a boca flamejante em um urro excruciante e um clarão de fogo e cinzas findou o ciclo de vingança.

●●●

Os Winchester estavam de volta ao hospital de Lincoln em menos de vinte e quatro horas. A maioria das cadeiras da sala de espera do pronto-atendimento estava ocupada por pessoas que traziam os traços da agonia no rosto, seja por que necessitavam de assistência médica ou devido à ansiedade de notícias de algum internado. Um lugar agourento que Dean e Sam estiveram mais vezes do que gostariam e de onde colecionavam lembranças desagradáveis.

Desta vez, eles foram fisicamente e tal condição exigiu que eles se dirigissem ao balcão da recepção para se identificarem. Um rapaz de pele tão escura quanto ébano os atendeu com cordialidade, um sorriso contido exibindo as fileiras de dentes muito brancos : — Como posso ajudá-los? — a voz soou fluída com um sotaque que denunciava que ele era imigrante.

— Viemos ver Joshua Knightley.— Sam respondeu.

— Ele é parente ou amigo de vocês? — o homem negro elaborou as perguntas ordinárias.

— Sim. Ele é nosso primo. — o Winchester mais alto ouviu a si mesmo mentir com incrível persuasão. A prática leva a perfeição. Ora, ocultar a verdade era um hábito corriqueiro de um caçador.

— Ele ainda inspira cuidados intensivos, portanto tentem ser breves. — o recepcionista pediu consultando o cadastro do paciente no sistema.

Nos arredores dali, uma enfermeira da unidade de tratamento intensivo estava encerrando uma conversa com um casal e avistando-a, o recepcionista a chamou: — Leslie!

— Ngale! — a enfermeira retribuiu em um tom prestativo, demonstrando um pouco de dificuldade em pronunciar o nome do colega senelagalês. Ela tinha grandes olhos castanhos e cabelos dourados até os ombros.

— Eles são primos de Joshua. Poderia levá-los para vê-lo?

— Claro! Venham comigo, por favor. — Leslie os guiou caminhando poucos passos à frente.

Conforme eles avançavam nos corredores, o cotidiano de um ambiente hospitalar se desdobrava diante os olhos dos Winchester: médicos e enfermeiros com pranchetas nas mãos e estetoscópios pendurados sobre os ombros, e visitantes entrando e saindo dos quartos.

— Então, Leslie... mais um dia cheio. — Dean arriscou iniciar uma conversa trivial, atento às curvas femininas escondidas sob o uniforme branco padrão da profissão.

— Sim. Como todos os outros. O número de pacientes internados com doenças repentinas tem aumentado muito nas últimas semanas. Eu não sei o que está acontecendo nesta cidade. — lamentou a enfermeira, caminhando graciosamente.

— É de fato preocupante. Nós temos acompanhado as notícias. — se esforçou em manter o diálogo superficial e viu o semblante do irmão se distorcer em uma risada reprimida que foi disfarçada com um pigarro exagerado.

— Vê? É disso que eu falo! Interação real! — Dean sussurrou ao irmão, que apenas lhe rolou os olhos.

Assim que eles entraram na unidade de tratamento intensivo, ouviram a sinfonia dessincronizada oriunda dos diversos aparelhos hospitalares. O trio passou por alguns leitos até alcançar o do paciente pretendido. Joshua estava desperto. Não tinha dor de cabeça e tampouco sentia tontura, no entanto, ainda estava visivelmente magro. Os olhos castanhos pareciam grandes demais para o rosto sutilmente corado, os traços da saúde sendo recuperados aos poucos.

— Joshua, seus primos vieram lhe visitar. — a enfermeira loira anunciou.

— Como ele está? — perguntou Sam não dando chance ao paciente, visivelmente confuso, de falar.

— Ele teve uma melhora muito significativa e surpreendente de ontem para hoje. — Leslie analisou as anotações feitas no prontuário e continuou: — Se ele continuar reagindo bem ao tratamento nos dias seguintes, ele poderá receber alta na próxima semana e seguir o tratamento com os remédios em casa. Ela explicou. — Vocês têm quinze minutos. — alertou Leslie antes de deixar o recinto.

Dean acompanhou a deslocação da enfermeira discretamente e franziu o cenho ao perceber que ela manteve a postura profissional e não lhe destinou um olhar insinuante ou um sorriso afetado.

— Talvez você esteja perdendo o jeito. — Sam provocou, divertindo-se.

— O que?!  Não estou não! — reagiu Dean, o lábio se repuxando em aversão ao comentário.

— Por que vocês estão aqui? — questionou o anjo atraindo a atenção dos Winchester. Sua língua não estava mais dolorida.

— Estamos aqui para te ajudar. —Sam respondeu.

— Ajudar? — o paciente ecoou em réplica. — Então vocês sabem sobre... — a voz soou fraca, quase trêmula ao passo em que lembranças recentes e dolorosas invadiam sua mente. Um brilho cegante e alvo arrebentou em uma explosão atômica, arrastando todos os anjos que encontrou pelo caminho. Logo, viu-se em uma queda livre, caindo no vazio, desprovido de suas asas e em velocidade crescente. Estava fadado a um destino desconhecido, e talvez, a uma nova existência. Desvanecidas as sombras do passado, seus olhos recobraram o castanho opaco.

— O fechamento dos portões do céu e a repercussão disso? Sim, sabemos. — Sam afirmou, laconicamente.

— Quem são vocês? — perguntou Ambriel.

 — Somos caçadores. — Sam revelou. O anjo olhou para Dean como se esperasse alguma resposta. O caçador apenas esticou os lábios preguiçosamente num sorriso forçado e logo sua feição retornou a ser séria. — Fomos nós que tiramos o Gerard da sua cola.  — o caçador caçula concluiu.

— Viemos tirar você daqui e deixá-lo em algum lugar seguro. Por isso, você vem conosco. — disse Dean

— Não posso. Estou doente! — o anjo expulso declarou a observação com uma ingenuidade desmedida, tornando o óbvio em algo extraordinário.

— Nós percebemos. — o Winchester mais velho destilou escárnio antes de complementar: — Não se preocupe, iremos providenciar tudo o que você precisa.

O celular de Dean tocou, interrompendo a conversa.

— Cas?!

— Dean, onde você está? —  a voz grave do anjo soou do outro lado da linha.

Uma enfermeira, que estava a alguns leitos de distância do de Ambriel, os olhou com uma feição furiosa, provavelmente por causa do uso indevido do celular naquele ambiente. Porém, enquanto ela se aproximava deles, algo inesperado foi evidenciado: os olhos, coroados por longos cílios, tornaram-se pretos por completo.

Alheio a presença do demônio, Dean prosseguiu o diálogo: — Estou em um hospital de pronto atendimento em Lincoln na rua... — com um gesto simples de mão da enfermeira possuída, o celular foi arrancado de Dean e jogado no chão. A voz de Castiel ainda soava no aparelho, indicando que este ainda funcionava plenamente.

— Exorcizamus te, omnis immundus spiritus. Omnis satânica po ... — Sam começou a recitar o ritual de exorcismo, contudo, antes que ele pudesse concluí-lo, a enfermeira fechou a mão em punho, gesto que calou Sam, e seguida, com um movimento de braço, ela arremessou o caçador para longe.

Dean resgatou a Faca dos Curdos da cintura e enfrentou a enfermeira possuída, mas ela bloqueou o golpe preciso com o antebraço. A mulher ergueu o Winchester mais velho do chão pelo pescoço, estrangulando-o. O aperto constrito em volta do cabo de madeira da faca tornava-se frouxo à medida que a privação de oxigênio enfraquecia o caçador. Por fim, a arma branca caiu no chão em um baque metálico. O rosto de Dean estava avermelhado e uma veia saltava-lhe na testa.

Ainda sentindo dor, Sam rastejou no chão, de modo a não ser percebido pelo demônio, pegou a faca mágica cautamente e desferiu uma nova investida, a qual resultou ser frustrada, pois seu ataque foi paralisado pelo poder psíquico de seu alvo. A ponta afiada e fria da lâmina direcionada ao fígado da mulher. O caçador grunhia entre dentes ao mesmo tempo que empregava força em vão no golpe. A faca não movia um mísero milímetro.

Dean ameaçava a mergulhar na inconsciência quando, repentinamente, alguém pousou a mão sobre a cabeça do demônio e uma intensa luz dourada emanou dos olhos e boca da enfermeira. Os orbes queimaram-se de dentro para fora e pareciam duas crateras fumegantes. Dean desabou ao chão, porém, logo foi erguido do chão por Sam e Cas. O caçador se esforçou em tosses frouxas ao passo que se recuperava do ataque.

Ambriel ainda debilitado assimilava os acontecimentos que se desdobrou diante de seus olhos quando Castiel lhe reconheceu e disse seu nome. O anjo, usando um  sobretudo, depositou uma mão em seu peito e um tipo de energia lhe atingiu as entranhas. O corpo enfermo arqueou em protesto da breve, porém pungente dor. Ambriel estava curado da anemia hemolítica.

Um par olhos os observava. Atordoada na sua cama, uma paciente testemunhou todos os confrontos que ocorreram naquela sala. Encolhida, tremendo e com olhos inundados de lágrimas, ela mirava o corpo da enfermeira no chão, flácido e inerte. Recobrando aos poucos a cognição, ela levantou o olhar para o trio de desconhecidos e emitiu um grito estridente e ensurdecedor que atraiu a atenção dos poucos enfermeiros presentes no setor, mas que não tinham visto o acontecido. Desta forma, os olharem destes se direcionaram a colega morta e àqueles que estavam perto do corpo dela.

— Vamos, vamos! Rápido! — apressou Sam, auxiliando o anjo a se sustentar em pé.

 Lá estavam eles percorrendo os corredores a passos pressurosos. Dean ia à frente a fim de chegar primeiro ao Impala para que o motor já estivesse rodando quando os demais alcançassem o veiculo de fuga. Sam apoiava o anjo que ainda caminhava em passos cambaleantes e Castiel ficou na retaguarda, assegurando proteção angelical em caso de uma nova investida de algum demônio infiltrado entre os perseguidores. Acusações de rapto e de assassinato eram disparadas atrás deles, incitando mais pessoas a persegui-los.

Assim que o trio ganhou o estacionamento, ouviam-se os rugidos intermitentes e agressivos do carro negro que os aguardava. Dean viu pelo retrovisor uma dezena de pessoas saírem do hospital em alvoroço. Arrancou em disparada assim que o trio entrou no carro: os pneus cantantes marcando o asfalto e liberando um cheiro de borracha queimada.

— Espero que ele seja muito importante, pois provavelmente seremos procurados pela polícia! — disse o motorista ao considerar que as identidades falsas atrapalhariam a investigação, no entanto, as imagens do sistema de vigilância os denunciariam.

— Ele é! Ambriel é um Guardiões dos Portões do Céu. — Castiel revelou.


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