Draco Malfoy não era tão ruim como todos pensavam. Atrás da fachada mesquinha de um garoto mimado e rude, escondia-se uma boa pessoa. Ele vivia de baixo de camadas. Camadas muito bem maquiadas para parecerem reais, mas eu conhecia sua verdade face. Ele mostrou-a para mim, sem querer... Foi um engano, que quando ele percebeu, já estava feito.

Eu olhei a Fera nos olhos, e enxerguei humanidade neles. Suas orbes acinzentadas pareciam com uma grande tempestade. De fato, acredito, deveria haver uma tempestade dentro dele. Bastou alguns segundos para eu reconhecer o pedido de socorro gritando em seus olhos.

Achei que nunca diria isso na minha vida, mas, desde aquele dia, me tornei obcecada por Draco Malfoy. Era como se, a partir daquele instante, o mundo se virou de cabeça para baixo e nada mais parecia estar em seu devido lugar. Sua personalidade horrível tornou-se enigmática, completamente tentadora. Ele era um quebra-cabeça para mim.

Às vezes, eu me perdia observando-o absorvido em um livro na biblioteca. A testa franzida, os olhos cinzas presos nas palavras, deslizando de um lado para o outro. Ou quando ele distraidamente se recostava na cadeira e passava a mão suavemente em seu queixo. Ele era maravilhosamente lindo, do tipo que te deixa sem fôlego caso você olhar demais. Era como se houvesse uma aura sob os cabelos loiros platinados. Mas então, quando saia da biblioteca, aquela aura se desfazia em farelos bem diante dos meus olhos. Os olhos, outrora tranquilos, voltavam à tempestade habitual, e a postura relaxada era substituída pelos ombros tensos.

Foram tantas as vezes que eu quis me aproximar dele e perguntar se estava tudo bem. Eu sabia que não estava, e esperava tão desesperadamente que ele me contasse por quê. A curiosidade chegava a doer.

Toda a situação era bastante patética, isso era claro para mim. Eu, Hermione Granger, seguindo o terrível Draco Malfoy como uma sombra. Era extremamente frustrante me deparar com essa realidade. Como eu acabei me tornando essa versão triste de mim mesma? Será que foi quando Ron me rejeitou ou quando eu chorei por isso no ombro de certo loiro e vi bondade dentro dele pela primeira em todos os anos que eu o conhecia?

Ah, eu não faço ideia! Só, em algum momento, eu me vi tornando mais interessada em Malfoy do que em qualquer outro garoto que eu conheci na vida.

Foi algo tão fora do normal, que quando ele se sentou do meu lado em silêncio, cogitei a ideia de alguém estar se passando por ele com polissuco. Porém era ele mesmo. Era o mesmo Malfoy de sempre, só que em uma versão dele mesmo que eu jamais tinha visto antes. Me pergunto, será que alguém além de mim viu essa versão dele?

A versão quebrada e gentil. A versão com olheiras escuras de baixo dos olhos e ombros caídos. A versão que se sentou do meu lado – uma ‘sangue-ruim’ – e disse num sussurro gentil que tudo ficaria bem.

Era uma cena inédita! Eu repousando minha cabeça em seu ombro, enquanto ele passava as mãos gentilmente pelo meu cabelo. E quando eu solucei alto e comecei a encharcar sua camisa branca de lágrimas, ele continuou lá, ainda acariciando meu cabelo e sussurrando palavras gentis.

Nós não nos falamos depois disso.

O cheiro dele ficou preso nas minhas vetes durante vários dias. Talvez, não fossem necessariamente minhas roupas. O cheiro dele simplesmente ficou impregnado em mim, no meu nariz. Mesmo depois de trocar de roupas, se tomar banho e lavar o cabelo. Ainda estava lá, como um lembrete daquele Draco Malfoy humano que eu conheci uma vez.

E tornou-se tão impossível olhar para ele nos corredores e não me lembrar daquele momento. Eu corava de vergonha por ter chorado na frente dele, embora isso não fizesse sentido. Por que me sentir envergonha de quebrar na frente dele, quando ele também se quebrou diante dos meus olhos? Nós nos vimos de baixo das camadas. Os muros haviam caído. Erámos somente Hermione e Draco, dois adolescentes que se conheciam há quatro anos, não Granger e Malfoy, inimigos desde o primeiro ano em Hogwarts.

Do fundo do meu coração, esperava que ele se sentisse da mesma maneira. Que ele notasse minha presença na sala sem ao menos ter que me olhar. Desejava que, em algum momento, ele também ficasse me observando as espreitas, mesmo que eu jamais percebi isso acontecendo.

Queria que ele pensasse em mim. Se lembrasse de mim. Sentisse alguma coisa além da indiferença que ele parecia demonstrar na frente de todos.

Merlin sabia o quanto eu queria descascar aquelas camadas e ver diariamente aquele rapaz gentil todos os dias! Nós poderíamos ser amigos. Poderíamos ser mais que amigos. Poderíamos ser qualquer coisa que quiséssemos.

Bastava que ele me permitisse isso.