Seguindo em frente escrita por Miss Fictions


Capítulo 2
Parte II


Notas iniciais do capítulo

Mil perdões pela demora, chuchus! Nunca demorei tanto assim para atualizar uma fic ;__;
Estou tão atrasada com tudo que nem terminei de passar essa parte pra inglês ainda D;
De qualquer maneira, aqui está a segunda parte! Eu havia dito que seriam apenas duas, mas me empolguei e serão três agora heheh
Espero que gostem, boa leitura n_n



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Acordo e vejo um teto branco. Meus movimentos parecem pesados e eu sinto um imenso dejavu. Antes que eu pudesse me lembrar dos acontecimentos que me fizeram vir parar aqui de novo, alguém abre a porta da pequena sala.

“Ah, você já acordou.” A voz de Hanji preenche a sala e ouço a porta ser fechada.

Ela se aproxima e senta na cadeira ao meu lado. Ainda com os movimentos meio lerdos, tento me sentar na maca, suspirando fundo.

“Quer me contar o que aconteceu ontem à noite?” Ela me pergunta, já segurando sua prancheta para fazer anotações.

Lembro-me de estar com Levi. Nós conversamos bastante sobre faculdade e estávamos nos dando bem. Eu estava gostando da companhia dele e creio que ele estivesse gostando da minha também.

Mas algo interrompeu nosso momento. Algo direcionado a Levi. Algo o incomodou e o difamou.

Reiner.

“Eu estava com o Levi e o Reiner apareceu...” Começo a dizer lentamente. “E ele ficou acusando o Levi de ter pegado algo dele...”

“Você lembra o que era?” Hanji me incentiva.

“Uma... carta?” Dou de ombros. “Lembro que Levi disse que não havia pegado e que não sabia onde estava... Mas o Reiner não acreditou nele e agarrou o braço dele, deixando até vermelho de tanta força que usou...”

“Certo.” Hanji concorda com a cabeça. “E o que você fez?”

Pauso um pouco para pensar. Lembro de ter o empurrado uma vez, mas não consigo me lembrar do que fiz depois.

“Lembro de ouvir algumas pessoas gritando... Acho que ouvi uma chorando, também.” As vozes parecem emboladas em minha cabeça. “E o Levi estava me mandando parar.”

“Você se lembra de ter parado?”

“Não consigo me lembrar de mais nada.” Coloco a mão na testa.

“Eren, vou ser sincera com você.” Hanji ajeita os óculos. “Você teve sorte de o Moblit e o Mike aparecerem logo que viram a confusão. Você e o Reiner já estavam um em cima do outro, prestes a se acabarem em socos.”

“Nossa.” Eu suspiro, bravo comigo mesmo. Como pude me descontrolar novamente dessa forma?

“Vou ter que aumentar sua medicação.” Ela me diz, escrevendo algo na prancheta. “E você precisa fazer mais dos exercícios de relaxamento que te propus.”

“Sim.” Respondo fracamente.

Ainda chocado por saber que realmente havia feito aquilo, saio da sala de Hanji e sigo direto para meu quarto. Tento me recordar do que houve, mas as memórias estão embaçadas e confusas.

Como sempre.

Assim que adentro meu quarto, sou recebido por um Jean agitado.

“Fiquei sabendo da confusão que você arrumou ontem.” Ele me diz de sua cama, me encarando friamente. “Onde você estava com a cabeça?”

“Eu não sei.” Respondo sem paciência, seguindo para minha cama. Deito-me e olho para o teto, tentando me acalmar.

“Você é maluco. Quero ver o que vão fazer com você agora... Devem aumentar sua estadia.”

“A Hanji me disse que aumentarão meus medicamentos, mas não falou nada sobre aumentar minha estadia...” Eu me apoio em meus ombros, olhando para ele. “Será que vou ter que ficar mais tempo?”

“Sei lá.” Jean dá de ombros. “Só sei que você não devia ter feito aquilo.”

“Eu sei que não deveria. Não é como se eu quisesse ter feito.” Deito-me novamente, irritado. “Eu não consigo controlar.”

“Qual foi a causa, exatamente?”

“O Reiner chegou implicando com o Levi, dizendo que ele pegou algo dele. Não me segurei mais na hora que ele o segurou com força...” Levanto as mãos e as olho. “Mas não me lembro de nada depois disso. Não sei o que fiz e nem como sai de lá.”

Jean se ajeita na cama, pensativo, enquanto eu continuo encarando minhas próprias mãos. Realmente não me lembro de nada, e a angustia que isso me dá cresce dentro de mim.

Acredito que Jean não vá dizer mais nada até que, repentinamente, ele interrompe meus pensamentos.

“Eu sei como é.” Ele murmura em um tom irritadiço.

Viro a cabeça para olhar para ele, curioso.

“Sabe?” Eu pergunto, o estimulando a continuar a falar.

“Sei.” Ele reflete minha posição e se deita também em sua cama, olhando para o teto. “Eu também tenho TEI.”

Demoro um pouco a compreender o que Jean realmente estava me revelando.

“Achei que você não tinha nada.” Eu brinco.

“Acho que me dei conta que continuar negando não vai me ajudar.” Ele suspira, nervoso. “Principalmente depois de ver você tendo aquele ataque ontem.”

“Você viu?”

“Cheguei no final, quando já estavam separando você e o Reiner. Mas eu olhei pra você e vi seu olhar perdido, como se outra coisa estivesse te controlando. Como se não fosse você. E me dei conta de como nosso transtorno existe e é perigoso.” As palavras de Jean soam sinceras, e seu tom é diferente do normal. “Na hora eu me lembrei de como minha mãe disse que eu fico e decidi que não quero mais assustá-la.”

Fico feliz com a decisão de Jean, mesmo que tenha sido baseada em algo que foi ruim para mim.

“Então decidiu tomar os remédios?”

“Sim.” Ele inspira fundo. “Vou fazer tudo direito de agora em diante. Pra sair logo daqui.”

“Ainda bem.” Sorrio para ele. “Logo logo isso vai acabar.”

“É.”

Ficamos em silêncio por mais alguns minutos, até Jean me convidar para o almoço e nós irmos juntos até o refeitório. Esperava me encontrar com Levi lá, mas ele nunca aparece. Será que foi por causa de ontem? Será que o assustei?

Será que estraguei tudo?

Tenho vontade de procurá-lo depois, mas Christa planeja uma atividade extra antes da atividade do dia e intima todos a participarem. Só consigo ficar livre no fim do dia, quando saio correndo da sala de música para procurar o Levi.

E o encontro sentado perto dos telefones.

Antes que eu fosse até ele pronto para me desculpar, ele se levanta e caminha em passos rápidos até mim.

“Você tá bem?” Ele me pergunta, me olhando.

“Tô, eu acho.” Passo a mão por meu cabelo, sem jeito.

“O que eles fizeram contigo depois de ontem?” Levi continua perguntando, parecendo aflito. “Fiquei preocupado quando eles te sedaram. Não esperava que fosse necessário tanto...”

“E-Eu... Acho que dormi na sala da Hanji. Ela conversou comigo quando eu acordei... E ela só aumentou minha medicação.” Eu explico. “Mas e você? O Reiner não te encheu mais?”

“O Moblit encontrou a carta que ele estava falando que eu peguei. Ela estava na sala de jogos.” Levi cruza os braços, balançando a cabeça. “Ele ficou super calmo depois disso, como se nada tivesse acontecido.”

“Que bom.” Respiro aliviado. “Eu não ia gostar de saber que ele ainda tá falando aqueles absurdos.”

“Eu nem estava me importando com aquilo. Só me preocupei quando você entrou no meio.” Ele desvia o olhar e olha para chão.

“E-Eu...” As palavras de Levi me deixam preocupado. “Eu te assustei?”

“Claro que não.” Ele rapidamente levanta o olhar e olha para mim de novo. “Eu só não queria que se machucasse por uma coisa tão boba.”

Tento ficar aliviado, mas não consigo. Lembro do que Jean me disse, sobre não querer mais assustar sua mãe, e penso como minhas crises assustam todos a minha volta.

Queria tanto nunca mais ter isso.

“Ei, Eren.” Levi chama minha atenção, notando como estou perdido em pensamentos, e eu olho em seus olhos. “Eu não tenho medo de você.”

Sinto algo quente em meu peito quando ele me diz isso assim, com tanta firmeza, e abro um sorriso. “Obrigado.”

Noto que ele sorri de leve de volta, mas logo vira o rosto.

“Então, por que não esquecemos isso?” Ele sugere, mexendo em seu próprio cabelo.

“Acho uma ótima idéia.”

Levi me puxa para me sentar no banco perto dos telefones com ele. Ele coloca os pés para cima, relaxado, e eu me acomodo da forma que acho mais confortável. Não falamos nada de primeira, cada um perdido em seus próprios pensamentos, até que ele quebra o silêncio de forma inesperada.

“Sabe...” Ele inclina a cabeça para trás e fecha os olhos. “Acho que a coisa que mais sinto falta de fora daqui são meus gatos.”

“Você tem gatos?” Entro no assunto, feliz que ele tenha se aberto.

“Dois. Um preto e um malhado.” Ele conta calmamente, tornando a olhar para mim.

“Com quem eles estão?”

“Com a Isabel. Minha cunhada.” Ele suspira. “Acho que eles estão bem, eles gostam dela.”

“Deve ser difícil ficar longe deles. Sinto saudades de brincar com meu cachorro, também.”

“Esses animais nunca vão saber como são importantes pra gente.”

“Eu acho que eles sabem sim.” Falo com empolgação. “Aposto que eles estão com saudades suas, também.”

“Sim.” Ele não prolonga. Noto que sua expressão se torna um pouco nervosa, mas ele logo balança a cabeça. “Sinto falta de banho de banheira, também.”

“Nossa, nem fala...” Acabo rindo. “Esses chuveiros daqui são tenebrosos.”

“Eu tomo banho correndo aqui, odeio banheiros coletivos.”

“Eu nunca te encontrei no banheiro mesmo.”

“Vou no horário em que ninguém vai.”

“E qual horário é esse?” O cutuco.

“Até parece que vou te contar. Depois você resolve aparecer lá e estraga toda minha privacidade.”

“Eu não ia...” Faço um beiço. “Eu vou sempre na hora que todo mundo vai. Daí fico escutando as conversas alheias e me mantendo informado.”

“Que divertido.” Ele franze a testa. “Acho que prefiro ter meu momento isolado mesmo.”

“Você não devia se isolar demais.” Eu olho para ele. “Você pode perder a oportunidade de conhecer gente nova.”

“Quem quer falar comigo vai falar, eu me isolando ou não. Tenha você como exemplo.” Ele me olha de volta, arqueando uma sobrancelha. Eu sorrio.

“Eu te irrito?” Pergunto de brincadeira.

“Não.” Ele quase sorri. Meu coração fica até mais acelerado, por algum motivo. “Posso dizer até que sua ingenuidade me diverte.”

“Eu não sou ingênuo, sou só... sincero.”

“Honesto, então.” Ele se ajeita, cruzando os braços. “Mas me conte, o que você sente falta lá de fora?”

“Hm...” Penso. “De ficar jogando na internet.”

“Que nerd.” Ele revira os olhos. “Eu devia ter imaginado.”

“Acho que não teria outra coisa a se esperar de um cara da minha idade.” Dou de ombros. “Sinto falta de música, também.”

“Música, sim.” Ele concorda, balançando a cabeça. “Ontem eu estava com uma de minhas favoritas na cabeça... Daria qualquer coisa pra escutar.”

“Que música era?”

“Somewhere only we know, do Keane. Conhece?”

A música instantaneamente me vem à cabeça. Era uma de minhas favoritas, também.

E repentinamente sinto uma vontade forte de fazer algo a respeito. Eu queria escutá-la também.

“Espera aqui.” Eu me levanto abruptamente. “Eu já volto.”

Não espero que ele me responda e saio correndo.

Caminho pelos corredores aflito, buscando uma forma de encontrar a música. Será que na sala de televisão? Seria impossível termos sorte de essa música especificamente passar em um canal de clipes. E na sala de música? Todos os CDs que vi lá eram de músicas instrumentais, então duvido encontrar este lá.

Ainda pensando em uma forma de conseguir a música, passo pela recepção e encontro a recepcionista mexendo no facebook, em seu computador. Vou direto até ela.

“Com licença.” Peço, chamando sua atenção.

Ela se vira para mim com uma expressão indiferente. “O que quer? Se é pra usar o telefone, vocês sabem que só podem usar o do corredor.”

“Não é isso...” Eu cutuco o balcão com os dedos. “Você pode baixar uma música pra mim?”

“O quê?”

“Uma música. Vai levar um segundo. É importante.” Eu falo rapidamente. “Por favor.”

Ela me olha por mais alguns segundos até mexer sua mão para pegar um pendrive de sua mesa. “Espero que seja importante mesmo.”

“É sim.” Eu sorrio. “Serei eternamente grato por isso.”

Poucos minutos depois eu volto correndo até onde Levi estava, segurando o pendrive, e o levo sem dizer nada até a sala de música. O coloco sentado em uma das cadeiras e pego o radio da estante para ligá-lo na tomada. Os outros pacientes que estavam ali olham para mim, curiosos, mas eu os ignoro e continuo ajeitando o rádio.

Eu ponho a música para tocar e olho para Levi. Seu rosto se ilumina na hora que reconhece a música.

“Como você conseguiu?” Ele me pergunta, incrédulo.

“Dei um jeitinho aqui e ali.” Rio, indo até ele.

Estendo minha mão em sua frente e ele me olha, confuso.

“Você não vai me fazer fazer isso, né?” Ele dá uma olhada em volta.

“Vou.” Abro um sorriso. “Vem logo.”

Não espero que ele tome a iniciativa de levantar sua mão e a pego, puxando-o para se levantar. Uma senhora do fundo começa a aplaudir empolgada, o que faz Levi esconder o rosto.

“Você me paga.” Ele murmura por trás de sua mão enquanto eu levanto seu outro braço para colocar ao redor de meu pescoço.

“Você estava me devendo uma pela música.”

Logo depois ele deixa de vergonha e coloca sua outra mão em meu ombro. Eu coloco minhas mãos cautelosamente em sua cintura e nós ficamos dando pequenos passos de um lado para o outro, mais curtindo a música do que propriamente dançando.

Mas nossa pequena ação foi suficiente para incentivar os outros a dançarem também. Quando me dou conta, metade da sala já estava cheia com outros pacientes dançando, sozinhos ou em duplas. Eu e Levi rimos disso.

Pena que a música dura tão pouco e não havia nenhuma outra música no pendrive. Resolvo colocar um CD qualquer para que os outros continuem dançando e eu e Levi saímos de lá, ainda risonhos. Passo para entregar o pendrive na recepção e, depois, nós dois andamos em passos lentos de volta aos quartos.

“Obrigada por aquilo.” Levi fala, ao virarmos o corredor. “Foi gentil da sua parte.”

“Não foi nada.” Eu olho para o chão, sorrindo encabulado. “Queria fazer alguma coisa pra te agradar.”

“E conseguiu.” Ele cruza os braços, divertindo-se. “Bom, acho melhor irmos dormir.”

“Sim.” Não queria realmente deixá-lo, mas acabo concordando para não ser estranho.

“Te vejo amanhã?”

“Não vou a lugar algum.”

“É bom mesmo.” Ele ri de leve. “Boa noite.”

“Boa noite.”

Levi se vira e começa a caminhar lentamente em direção ao seu quarto. Eu continuo parado no mesmo lugar, sem vontade alguma de voltar para o meu, até que ele repentinamente se vira de novo.

“Sabe de uma outra coisa que eu sinto falta do mundo lá fora?” Ele fala, pensativo.

“O que é?”

“Sentir a brisa. Ver o céu aberto.” Ele fala pausadamente. “Seria legal sair um pouco.”

Ele não diz mais nada e torna a seguir para seu quarto. Quando ele some de minha vista, acordo dos meus pensamentos e começo a seguir para o meu quarto também, ainda com suas palavras em mente.

Entro em meu quarto e, ignorando Jean, sigo direto para minha cama. Ele comenta algo sobre ter ficado sabendo de nossa dança agora pouco, mas minha mente está nas nuvens.

“Você sabe de uma forma de sair daqui?” Eu pergunto abruptamente, provavelmente interrompendo enquanto ele falava.

“Hã?” Ele franze o cenho. “Já quer fugir?”

“Não...” Eu balanço a cabeça. “Quero só ficar ao ar livre. Ver o céu e tal.”

“Ah...” Jean concorda, entendendo. “Você pode ir ao terraço.”

“Sério?” Sento-me rapidamente, empolgado. “Como eu faço pra ir lá?”

“Escada de emergência, três andares pra cima.” Jean explica. “Só não deixa ninguém te ver e cuida pra não fazer barulho com a porta, os monitores não curtem muito a ideia de gente se jogando de lá de cima... Eu fui lá uma vez e fiquei entediado, então nem valeu o risco de ser pego.”

“Ah, pra mim vai valer.” Torno a me deitar na cama, contente.

“O que pretende fazer, hein?” Ele joga um travesseiro em mim, curioso.

“Só uma surpresinha pro Levi.” Respondo sem hesitar.

Jean faz algumas brincadeiras com isso, mas depois não fala mais nada, me deixando planejar mentalmente o que eu faria para a noite seguinte.

Meu plano seria perfeito.

~*~

Passo o dia inteiro ansiando para que a noite chegasse logo. Levi aparece no almoço e eu tento fingir ao máximo que não estava planejando nada – mesmo que eu seja péssimo nisso e o tenha deixado desconfiando de algo.

Ao final da atividade do dia, aguardo até que os corredores estejam vazios e procuro Levi. Por sorte ele estava perto dos telefones como sempre, então eu apenas passo por ele e o puxo pelo braço para me acompanhar. Sem entender nada, ele me segue enquanto eu dou uma passada rápida em meu quarto para buscar os travesseiros e o cobertor que havia separado e depois nos guio direto para a escada de emergência. Faço um sinal para que ele faça silêncio, olho em volta e vou até ela, abrindo a porta o mais cuidadosamente que consigo.

Três andares acima e estamos no terraço. Abro a outra porta e o deixo passar primeiro.

“Não acredito nisso.” Ele sai olhando para o céu que, por outra sorte, estava estrelado e sem nuvens. “Como achou esse lugar?”

“O Jean me contou.” Fecho a porta com cuidado e me aproximo dele. “Vem, vamos arrumar um canto pra deitar.”

Procuramos um canto onde o chão estivesse limpo e jogamos os travesseiros para deitarmos. Levi não para nem por um segundo de admirar o céu, até que uma brisa passa e ele fecha os olhos para senti-la. Eu fecharia os meus também se não estivesse tão atendo às suas reações.

“Ok, você se superou.” Ele me diz em certo momento. “Eu não esperava nada quando disse aquilo pra você.”

“Eu nunca saberia desse lugar.” Continuo olhando para ele, enquanto ele olhava para o céu.

Seus olhos se iluminam com o luar, e o vento que batia hora ou outra apenas deixava o clima ainda mais perfeito.

“Estar aqui quase me faz ter vontade de sair desse lugar.” Ele suspira.

Suas palavras me surpreendem um pouco.

“Você não quer mesmo sair?”

“Não.”

Continuo em minha confusão, temendo perguntar coisas demais e o deixar desconfortável. Mas ele logo nota a situação que me deixou e decide esclarecer.

“Não há mais nada pra mim lá fora.” Ele pronuncia lentamente. “Nada lá fora faz sentido mais.”

Penso em algo para dizer para ele, mas não consigo formular nada. Nada que eu dissesse poderia ajudar de alguma forma.

“É por isso que você não participa das atividades?”

“Sim. Não tenho motivo nenhum pra sair daqui.”

Sinto um aperto no peito ao ouvir isso. Essa falta de vontade e de esperança me deixa angustiado.

Mas não havia nada que eu pudesse fazer. Então apenas mostro que estou ali e seguro sua mão, apertando-a de leve. Esperava que ele logo fosse recolhê-la, incomodado com o contato, mas ele não o faz. E ele aperta minha mão de volta.

Ficamos em silêncio por mais alguns minutos. Deixo que ele se acalme e organize seus pensamentos e acabo me perdendo em meus próprios. Até que eu sinto o anel em seu dedo e fico curioso.

“Como vocês se conheceram?” Acabo perguntando, falando antes de pensar.

Temo ter sido apressado e mordo a língua, me arrependendo de ter dito. Levi pensa por alguns segundos antes de dizer qualquer coisa.

“Conheci o Farlan na universidade.” Ele fala suavemente. “Éramos amigos, no começo.”

“Acho relacionamentos que começam por amizade tão bonitos.” Falo sinceramente.

“Também acho.” Sua expressão se torna nostálgica. “Eu e ele sempre nos demos bem, e quando começamos a namorar, tudo sempre foi perfeito.”

“Vocês se casaram depois de quanto tempo?” Prolongo, já que ele não parece com problemas de falar sobre o assunto.

“Logo que nos formamos já procuramos um lugar pra morarmos juntos. E... bom, nós apenas íamos morar juntos, sem extravagâncias, mas o Farlan me pediu em casamento no dia da mudança. Quando ele colocou esse anel em meu dedo eu nunca me senti mais seguro.” Ele fala pausadamente, como se as memórias fossem duras de serem ditas. “Porém nunca chegamos a oficializar a relação, já que não podemos ainda nesse país idiota. Mas isso não me fez sentir menos casado com ele.”

“Como ele fez o pedido?”

“Ah, foi de forma bem idiota. Bem a cara dele.” Ele ri de leve. “Ele me fez carregar uma caixa da mudança do caminhão até nosso andar, mas a caixa parecia completamente vazia. Chegando lá, ele me mandou abrir e eu encontrei o anel dentro dela. Foi só isso.”

“Ele foi criativo.” Eu rio junto.

“Criatividade é uma palavra que não combina com ele. Mas, é, ele deu seu jeito e eu gostei, no fim. Acho que eu gostaria de qualquer coisa que ele fizesse.”

Imagino que seja lindo amar alguém assim.

Eu simplesmente não vejo o tempo passar durante a madrugada. Conversamos sobre nossa adolescência, sobre nossas famílias, eu conto mais para ele sobre meu transtorno, ele me conta mais sobre o seu relacionamento com o Farlan...

E, quando nos damos conta, o sol está nascendo no horizonte. Nos sentamos para assisti-lo mais atentamente e mantemos o silêncio nesse momento para apenas admirá-lo.

Pouco depois, Levi fala que está com sono demais para raciocinar e decidimos voltar – até porque em breve os corredores estariam cheios e seria difícil passarmos despercebidos. Recolhemos os travesseiros, dobramos o cobertor e andamos em passos preguiçosos até a porta para a escada de emergência.

“Sabe...” Levi fala suavemente, como se estivesse com muito sono para pronunciar as palavras. “O Farlan foi meu primeiro namorado.”

“Você deu sorte de o primeiro já ser perfeito.” Respondo sem pensar muito.

“Sim, dei mesmo.” Ele suspira, parando de andar. “Acho que eu nunca cheguei a flertar com outra pessoa sem ser ele. Eu nunca beijei alguém além dele.”

Paro também, demorando a processar suas palavras, e fico sem saber o que responder. Meu coração dá um pulo em meu peito e eu tento me controlar, não entendendo direito o motivo de estar me sentindo assim.

Talvez fosse o sono acumulado, afinal.

“Você tem vontade de experimentar?” Pergunto, quase gaguejando.

“Às vezes a idéia passa pela minha cabeça.” Ele me olha.

Eu olho de volta para ele, trêmulo, e ficamos nos olhando por alguns segundos. Eu realmente não sabia o que dizer, até porque eu não tinha certeza do que ele queria dizer com isso.

“Esquece, tô falando bobagem.” Levi repentinamente balança a cabeça. “Eu realmente não sei fazer isso.”

Talvez meus sentidos não estivessem tão atordoados assim e minha interpretação inicial foi a certa.

Ou talvez não.

Mas nunca fui uma pessoa que pensa muito antes de agir, então dou um passo em sua direção e ele não se distancia. Ele não se distancia nem quando delicadamente coloco a mão em seu rosto.

E ele não se distancia quando me inclino para beijá-lo. Na verdade, ele lentamente se acostuma com o contato e eu espero pacientemente, até que estamos nos beijando intensamente. Deixamos tudo cair no chão e ele coloca suas mãos em meu pescoço, me puxando mais para perto, enquanto eu pateticamente coloco minhas mãos em sua cintura sem saber o que eu podia fazer além disso.

Eu não esperava um final tão intenso para nossa noite.

Quando enfim paramos de nos beijar, continuamos com os rostos próximos, sentindo a respiração pesada um do outro.

“Isso foi bom.” Levi suspira.

“É.” Concordo, meio zonzo.

“Acho melhor a gente voltar pro quarto agora.”

“É.” Concordo de novo feito idiota.

Seguimos de volta para os quartos e eu vou em modo totalmente automático, sem conseguir pensar em nada. Após nos despedirmos com um boa noite e uma risada preguiçosa, entro em meu quarto, vejo que Jean ainda dorme e me atiro em minha cama.

“Meu deus. Eu beijei o Levi.” Eu murmuro.

Em qualquer outra noite eu perderia o sono pensando no assunto, ainda pasmo. Mas acabo perdendo para ele e logo apago, sem tirar o Levi da cabeça.

~*~

Perco todas as atividades programadas para meu dia. Não converso com Hanji, não vou almoçar, e acordo quando já estava na metade da atividade de expressão artística, então nem faria sentido ir mais.

Acabo ficando na cama, olhando para o teto, e repetindo em minha mente o que aconteceu na noite anterior. Pouco depois, Jean aparece no quarto e nem me pergunta o motivo de eu ter sumido durante o dia. Ele pega algumas revistas em seu armário, deita na cama e começa a ler. Alguns minutos de silêncio depois, ele repentinamente o quebra.

“Vocês ficaram?”

“É.” Respondo fracamente.

“Sabia.” Jean ri ironicamente. “Ele tava no corredor quando passei, perto dos telefones. Acho que ele tava te esperando.”

No instante que escuto isso, me levanto e sigo direto para o corredor. Levi ainda estava lá, olhando para as próprias unhas, e só nota a minha presença quando estou perto. Sento-me ao seu lado sem dizer nada e ficamos em silêncio, até que alguém tivesse coragem para dizer algo.

“Fazia tempo desde a última vez que dormi bem.” Ele quem quebra o gelo, do nada.

“Você acordou há pouco tempo?” Dou o meu melhor para soar natural.

“Sim. Comi alguma sobra no refeitório e vim direto pra cá.”

“Uh... Você estava me esperando?” Não resisto perguntar, querendo cutucá-lo.

Ele olha para mim com as sobrancelhas franzidas. “Eu sempre venho pra cá.”

“Tá, mas... você queria que eu aparecesse, né?” Eu continuo provocado, em tom de brincadeira.

Levi nota minha intenção e revira os olhos. “Talvez. Satisfeito?”

“Sim.” Não escondo a minha alegria. “Ainda me acha chato?”

“Vou achar mais se não parar com essas coisas.”

“Essas coisas?”

“Essas brincadeirinhas assim.” Ele gesticula no ar.

“Ah, esqueci que você não sabe flertar.” Talvez eu tivesse pegado pesado na brincadeira. Ele me olha com um olhar tão frio que eu sinto minha espinha congelar. “Desculpa.”

“Aquele beijo te deixou bem à vontade, hein.” Ele se ajeita no banco, não soando irritado em seu tom. Ainda bem.

“Acho que eu não sei flertar também.”

“Depois fala de mim.” Ele estala a língua. “Mas saiba que eu notei suas intenções desde o inicio.”

“M-Mas...” Eu coro. “Eu não tinha intenção alguma!”

“Claro. Você simplesmente quis deliberadamente vir falar comigo, na maior inocência.” Ele balança a cabeça. “Confessa.”

“Pior que é verdade.” Eu rio, nervoso.

“Tsc, você estava super dando em cima de mim naquele dia da sala de televisão. Não parava de me encarar e dar corda pra conversa...”

Começo a me lembrar daquele dia e como nossa conversa fluiu de forma tão boa.

“Tá, naquele dia eu senti algo diferente.” Acabo confessando, e ele dá uma risadinha. “Mas foi a partir daí, eu juro. Antes disso era na mais pura inocência.”

“Ok, eu acredito.” Ele olha para mim, com um olhar relaxado que eu estava amando ver em seu rosto. “Até porque foi o dia que caiu a ficha pra mim também.”

Eu provavelmente virei um pimentão. “Sério?”

“Não pensa demais. Eu só pensei ‘oh, quem sabe’ e prolonguei a conversa.” Ele desvia o olhar. “Mas era a última coisa que eu esperava que fosse acontecer, foi só um pensamento no fundo da minha mente.”

“Se você ficou surpreso, imagine eu, que mal sabia se era possível conversar com você... você estava tão distante.”

“Eu sou distante, essa é minha personalidade normal. Você quem é sem noção mesmo e veio se aproximando.”

“Desculpa.” Eu coraria mais se fosse possível.

“Tudo bem. Você é algo que me dá um pouco mais de vontade de sair da cama.”

Isso me deixa tão feliz que eu me aproximo dele no banco, encerando a distância entre nossas pernas.

“Tsc, não é pra ficar à vontade de novo.” Ele me olha torto, em tom de brincadeira.

“Não tô. Só quero ficar mais perto de você.”

Ele ri suavemente e morde o lábio. “Por que eu, hein? Por que foi cismar justo com o mais fodido desse lugar?”

“Por que não?” Eu retruco, e ele me olha.

Sem dizer mais nada, ele descansa a cabeça em meu ombro e eu coloco o braço em torno de seu corpo. Ficamos assim por um tempinho, até que um assunto novo surge e tornamos a conversar.

Não nos beijamos de novo nessa noite, mas meu coração bate forte como na noite anterior até eu conseguir dormir.

Eu não esperava nada disso, mas isso não poderia estar sendo melhor. E espero muito que para ele também.

~*~

Acho que esse foi o dia em que menos prestei atenção em nada. Minha mente pensava em qualquer coisa relacionada ao Levi, como seus olhos azuis acinzentados maravilhosos, seu nariz pequeno e levemente arrebitado, seus lábios finos que eu mal esperava beijar de novo... Hanji com certeza notou isso, já que teve que chamar minha atenção milhares de vezes durante a nossa conversa. Ela me olha o tempo todo com cara de desconfiada e eu não falo nada, claro.

Já esperava que só veria Levi no fim do dia, depois de todas as atividades, e conto os minutos para que tudo acabe. E lá estava ele, sentado perto dos telefones. Eu vou até ele, tentando controlar a alegria, e me sento ao seu lado.

“Ei.” Eu cumprimento.

“Ei.” Ele fala suavemente. “Como foi o dia?”

É engraçado vê-lo se forçando a puxar assunto. “Bom. E o seu?”

“O mesmo de sempre.” Ele boceja. “Não dormi muito bem.”

“Sério?” Fico um tanto preocupado. Dormi como um bebê pensando nele, e algo em mim esperava que fosse ser assim com ele também.

“Sim. A noite é o momento mais difícil pra mim, minha mente não para.” Ele se ajeita, desconfortável.

“A minha também fica assim à noite.” Eu explico. “Mas... Eu estava feliz ontem, então dormi bem. Achei que você também—“

“Eu só fiquei pensando em muitas coisas como sempre e não consegui dormir.”

A forma que ele me corta me faz suspeitar sobre as coisas que ele pensou. Repentinamente assim estar com outra pessoa, sendo que ele nem cogitava tal coisa, deve deixá-lo muito confuso e assustado.

“Desculpa. Eu não quero ser um incomodo pra você e nem nada... quero que você se sinta relaxado e tranqüilo comigo. Sem pressão.”

“Tsc, já esqueceu que eu disse que dormi bem depois daquela noite no terraço?” Ele me dá uma cotovelada. “Você me faz sentir bem. Eu só tô... confuso.”

É, provavelmente minhas suspeitas foram certas. Coloco meu braço em torno dele como na noite anterior e ele se acomoda, colocando a cabeça em meu ombro.

“Ficar perto de você assim é bom.” Ele suspira suavemente.

“Eu também gosto disso.”

“Acho que eu dormiria bem melhor com você como travesseiro.” Ele continua, provavelmente meio sem pensar. “Ei, não quer dormir comigo esta noite?”

Olho para ele com meus olhos exageradamente arregalados e ele levanta a cabeça, não demorando a entender o que eu entendi.

“Não nesse sentido, besta.” Ele revira os olhos. “Só dormir. Pela companhia.”

“Ah.” Respiro fundo, me recuperando da surpresa. “Mas e o Reiner?”

“Ele nunca entra no quarto, muito menos à noite. Ele é outro que tem problemas com a noite...” Ele dá de ombros. “O que me diz?”

“Tá. Tá. Pode ser.” Gaguejo. “Eu adoraria... Dormir com você também.”

Tudo acontece da forma mais sem jeito possível. Eu o sigo até o quarto, ele me indica onde é sua cama e, depois que ele se deita, eu sigo com cuidado para deitar ao seu lado.

Nós nos ajeitamos de forma que dividir o travesseiro não ficasse ruim e, depois, ficamos nos encarando no escuro. Nossos rostos estavam tão próximos que eu sentia sua respiração, e isso logo me retoma à minha vontade de beijá-lo. Eu mordo o lábio, tentando me controlar.

“Você quer me beijar de novo, não quer?” Ele me pergunta do nada. Eu coro profundamente.

“E-Eu não—“

“Não adianta mentir, eu vi você encarando meus lábios.” Ele dá uma risadinha de leve.

Seu sorriso me traz um sentimento de leveza maravilhoso.

“Eu posso te beijar?” Pergunto.

Levi começa a rir de novo, mas sinto certo nervosismo em sua risada.

“O que foi?”

“Isso.” Ele suspira. “Você.”

Fico confuso. “O que tem eu?”

“Você não existe.”

Acabo rindo. “Existo sim, vem mais pra perto pra sentir como eu sou quentinho.”

Eu sou muito besta pra falar algo assim. Pelo menos isso funciona; Levi se aconchega melhor perto de mim, fechando os olhos, e eu coloco meus braços em torno dele.

“E o meu beijo?” Eu não resisto perguntar, mais de brincadeira do que qualquer coisa.

Levi reabre os olhos apenas para revirá-los para mim. “Vem pegar.”

Com um pouco de hesitação eu aproximo meu rosto ao dele para um beijo lento e delicado. Ele nitidamente estava ainda se acostumando com a idéia, então eu não podia forçá-lo demais.

Depois nos ajeitamos para dormir e eu beijo sua testa. Não resisto observá-lo até que ele dormisse completamente para ter certeza de que ele estava bem. Só depois disso consigo cair no sono, e confesso que nunca dormi tão bem.

~*~

Nem vi a semana passar, de tantas coisas que aconteceram em tão pouco tempo. Foi como se repentinamente a vida tivesse ganhado um brilho extra e uma razão especial para eu estar aqui – além de melhorar, claro, mas eu estou sendo um bom menino e estou fazendo tudo direitinho. Quando acordo depois daquela noite perfeita, ainda com Levi abraçado em mim, me dou conta que era o dia de visitas de novo e ambos ficamos estabanados tentando nos ajeitar.

E eu acabo mal o vendo durante o dia. Meus pais me visitam, me trazendo mais roupas, e conversamos bastante sobre diversas coisas – principalmente sobre coisas de casa, como se eles estivessem me atualizando para que eu não me sentisse a par de tudo. Isso me fez sentir bem.

Levi também recebe a visita de sua cunhada novamente. Passa pela minha cabeça ir cumprimentá-la, mas eu logo decido que seria muito apressado. Se ele quiser me apresentar a ela ele irá, um dia.

Só me encontro com Levi de novo no banco perto dos telefones. Vou até ele com um sorriso enorme estampado no rosto.

“Ei.” Eu faço o mesmo que no dia anterior e já chego me sentando perto dele, colocando o braço no encosto do banco atrás dele.

Eu esperava que ele fosse me olhar torto e fazer alguma ironia, mas tudo que ele faz é me dar uma olhada e depois voltar sua visão para encarar um ponto aleatório do chão.

Será que eu fiz algo errado?

Sem jeito, eu tiro o braço e dou um espaço de cinco centímetros entre nossas pernas.

“O que foi?” Eu pergunto, nervoso.

“Eu...” Ele começa, sem olhar para mim, com o tom de voz bem baixo e soando levemente inseguro. “Eu acho que fui longe demais ontem.”

“Ontem?”

“É. Te pedindo pra dormir comigo assim... Não sei o que deu em mim.” Ele balança a cabeça e se ajeita, parecendo desconfortável.

“Bom...” Eu fico sem saber o que dizer. “Se serve de consolo, eu dormi muito bem.”

“Eu também.” Ele fala sem hesitar, apesar de que ainda evitando olhar para mim. “Só acho que foi meio rápido. Temos que desacelerar um pouco.”

Pauso por alguns segundos para pensar. Não era como se tivéssemos feito algo muito intimo; eu apenas o fiz companhia durante a noite.

Mas eu não deixo de entender o ponto dele. Se eu já estava achando tudo meio rápido, imagino como deve ser para ele.

“Tudo bem.” Eu digo suavemente, pegando sua mão e a apertando.

Aí sim ele enfim me olha, arqueando uma sobrancelha de leve.

“Esperava ao menos uma frase de contestação.” Ele suspira. “Você é tão fácil de lidar.”

“Eu entendo, então não tenho o que contestar.” Digo sinceramente.

“As pessoas sempre encontram algo quando a situação não segue os seus desejos pessoais.”

“Mas meu desejo é te ver bem. Não faria sentido eu desrespeitar seu pedido...”

Ele fica me olhando por alguns segundos. “Você deve ser um anjo.”

E, quase contrariando seu pedido para desacelerarmos, Levi repentinamente se debruça e pressiona seus lábios contra os meus. Mas, repentino como foi, ele logo se afasta de novo.

“Melhor eu ir dormir.” Ele se levanta.

“Ok.”

Eu vou dormir após isso perdido em pensamentos. Provavelmente ter visto sua cunhada o fez lembrar-se de Farlan, o que o deixou confuso de novo. Fico pensando se havia algo que eu pudesse fazer, mas apenas chego a conclusão de que estou fazendo o certo: o dando o espaço necessário.

~*~

A atividade em grupo do dia seguinte consistia, principalmente, em encher balões. Milhões deles. Somos recrutados logo após o almoço para o serviço, que, aparentemente, seria para fazermos algo divertida durante a noite.

Não vejo Levi enquanto estou ocupado com isso – e não o culpo por fugir dessa vez – mas Jean fica perto de mim reclamando o tempo todo como eu.

Quando enfim a quantidade de balões parece suficiente, eles fazem a lista de "presença" e vão atrás dos faltantes. Levi aparece pouco depois, sem que precisassem buscá-lo em seu quarto, e eu suspeito que ele estava apenas aguardando o momento certo para nao precisar acabar com seu oxigênio. Ele para perto de mim e só me da uma olhada, antes que os monitores começassem a falar.

E a atividade era muito pior do que encher balões. Era estourá-los, e eu simplesmente odeio o barulho disso. Alguns reclamam, mas os monitores falam algo sobre brindes escondidos dentro de alguns balões que davam direito a uma sobremesa surpresa e todos sao convencidos.

Menos Levi, que logo me cutuca.

"Vamos dar o fora daqui?” Ele cochicha, olhando em volta. “Eu vou enlouquecer se ficar aqui ouvindo balões sendo estourados.”

“Uh, tá...” Eu concordo, confuso. “Mas como sairemos?”

“Vamos só fugir da ala. A recepcionista não está lá, então a porta está sem vigia.”

Pelo visto, Levi já estava planejando fazer isso desde antes. Mesmo com medo de acabar encrencado depois, eu o sigo quando ele sai da sala, aproveitando que os monitores estavam distraídos – apenas Jean nota nossa fuga e dá um sorriso malicioso para mim, que eu tento ignorar.

E assim estamos no corredor, e logo na recepção. Olhamos duas vezes para ver se ninguém iria nos ver e saímos pela porta, assim tão facilmente fugindo da ala.

"Se eu soubesse que seria fácil assim, já teria fugido pra comprar comida." Eu estico os braços para cima, aliviado.

"Uma coisa é escapar da ala, outra é fugir do hospital." Levi cruza os braços. “Todos ficam meio desnorteados no domingo, então é mais fácil fazer essas coisas.”

"Só espero que a gente nao acabe muito encrencado."

"Eu nem me importo." Levi da de ombros. "E agora, pra onde vamos?"

“Quer dar um passeio?” Eu sugiro, por mais que seja uma idéia muito estranha para um hospital.

“Hm...” Levi não parece muito empolgado, mas fica pensativo. “Podemos ir na sala de espera no primeiro andar. Acho que lá tem chá à vontade.”

Ele fala sobre o chá quase em um murmuro e vira o rosto. Acho que descobri o que o incentivou a escapar da ala.

“Ok, podemos ir lá. Mas antes quero ir na maternidade.”

“Pra que quer ir lá?”

“Pra ver os bebês, óbvio!”

Ele só me olha, meio descrente, e eu não deixo que ele reclame o puxando para o elevador.

Eu nunca havia visto as incubadoras através daquele vidro, como sempre mostram nos filmes, mas sempre quis. Bebês são umas gracinhas, e recém nascidos me deixam apenas fascinado. Como podem ser tão pequenos e frágeis?

“Ai. Meu. Deus.” Eu falo pausadamente quando chegamos em frente ao vidro. Quase todas as incubadoras estavam ocupadas, repletas daqueles serezinhos enrugados projetos de seres humanos. “Que coisinhas mais fofas!”

“Credo.” Levi nem se aproxima do vidro e cruza os braços, franzindo a testa.

“Credo o quê? Eles são lindinhos, olha!”

“Eu tô vendo, e não, não são nada fofos.” Ele resmunga. “São nojentos e babam.”

“Como você pode não gostar de bebês?” Eu olho para ele, incrédulo.

“Não gostando.” Ele revira os olhos.

“Que pessoa fria você.”

Esperava que ele fosse me xingar por chamá-lo assim, mas ele só desvia o olhar e ri de leve.

“O que foi?”

“Nada.” Ele balança a cabeça, escondendo o rosto com a mão. “Isso só me deu um dejavu.”

“Um dejavu?”

“É. O Farlan me disse a mesma coisa quando eu disse que não gostava de bebês. E ele ficava falando como você, que eles são uns fofos e blábláblá.”

Eu não devia dizer isso e quanto mais eu penso, mais eu acho errado. Mas não posso negar que fiquei um pouco feliz ao ter algo em comum com o ex dele.

Logo depois já saímos da maternidade e descemos para a sala de espera. Temos que desviar de alguns seguranças, mas somos confundidos com visitantes e podemos andar tranquilamente. A sala não estava cheia, haviam apenas algumas pessoas sentadas nos bancos, e Levi segue direto até o balcão.

“Depois de meses, enfim.” Ele pega um dos copos de papel descartáveis e enche seu copo de chá da garrafa térmica.

“Você gosta muito de chá.” Eu comento, pegando outro copo.

“É meu vício.” Ele beberica, fechando os olhos. “Ah, agora sim.”

Havia biscoitos na mesa também, então pegamos alguns e nos sentamos para assistir televisão. Era quase como na sala de televisão da ala, mas com comida à vontade e menos gente.

Depois de dois programas de culinária e três copos de chá – para cada um – decidimos que era melhor voltarmos, já que já eram quase dez da noite. Passamos no balcão de novo para enchermos os bolsos de biscoitos e uma jarra colorida no canto me chama a atenção. Abro-a como quem não quer nada e encontro milhares de pirulitos dentro.

“Achei uma mina de ouro.” Encho a mão, sentindo que Levi me olha torto.

“Isso é para crianças.”

Mesmo com seu comentário, eu o ofereço um. “Fala que não quer?”

Revirando os olhos, ele toma o pirulito e o abre. Eu só dou uma risadinha e fecho o pote, julgando a quantidade que peguei suficiente para alguns dias.

Satisfeitos, decidimos sair da sala de espera e seguimos até o elevador. Enquanto o aguardamos, ficamos olhando para um mostruário com panfletos diversos sobre doenças, até que Levi nota uma caixa de papelão logo ao lado dele.

“Olha, acho que isso está mais referente à nossa faixa etária.” Ele aponta.

Eu demoro para distinguir o que as embalagens coloridas eram, e a ficha só cai quando eu leio a placa que dizia “preservativos”. Começo a rir imensamente.

“Que... coloridos.” Eu me aproximo e pego uma das embalagens. “E olha, tem carinhas felizes desenhadas em cada uma.”

“Eles se esforçaram.” Levi pega uma azul, que tinha uma carinha piscando o olho.

“Acho que eu quero uma de cada.” Vou coletando as camisinhas, vendo se as carinhas se repetiam.

“Vai começar uma coleção?” Ele ri. “Vou ficar só com essa azul mesmo.”

“Onde mais vou encontrar camisinhas tão divertidas?” Pego uma da rosa, da azul, da verde e da amarela. “Pronto.”

“Só quero ver o que vai fazer com elas.”

“Encher balões?” Eu sugiro e, após alguns segundos, nós dois caímos na gargalhada.

O elevador chega nesse instante, então enfio os pacotes no bolso e entro logo após ele. Nosso andar era um dos últimos, então nos encostamos à parede do fundo e ficamos em um silêncio agradável até chegarmos lá.

Tudo já estava feliz o suficiente para mim, mas Levi faz meu coração pular quando ele, do nada, segura minha mão, pouco antes de chegarmos ao nosso andar. Eu aperto a mão dele de volta e entrelaçamos nossos dedos, o que o faz dar um passo para o lado para apoiar a cabeça em meu ombro.

Meu coração quase explodiu com isso e, se a noite tivesse acabado assim, eu estaria transbordando de alegria.

Continuamos de mãos dadas mesmo quando voltamos para a ala, sendo o mais discretos que conseguíamos. A atividade provavelmente havia acabado, já que estava tudo bem silencioso, então a maioria das pessoas provavelmente estavam em seus quartos dormindo. Por sorte não encontramos ninguém no caminho, então podemos ainda nos despedir propriamente antes de irmos dormir.

Eu o levo até a entrada de seu quarto, que pela cortina transparente eu já percebo que estava vazio – Reiner realmente nunca fica no quarto – e calculo as palavras para pedir um beijo de novo.

“Eu posso—“ Mal consigo terminar a frase e ele fica na ponta dos pés para me beijar.

E o beijo estava diferente de muitas formas. Tá que o nosso primeiro beijo foi já bem intenso, até mais do que eu esperava, mas, depois dele, só ficamos com beijos suaves e delicados.

Esse beijo, entretanto, me deixa atônito. Sem ar. Eu nunca esperei ficar excitado só com um beijo, e esse quase me deixou. Nossas línguas... o jeito que ele morde meu lábio... meu deus.

Quando enfim terminamos, eu tenho tantas perguntas em minha cabeça que fico paralisado, em estado de choque. O que foi isso? E por quê? Ele não queria desacelerar? Meu deus, como alguém pode beijar tão bem?

“Ei, acho que sei de um uso melhor pras suas camisinhas do que encher balões.” Ele fala em meio aos meus pensamentos, e eu continuo parado tentando decifrar o que ele disse.

Era o mesmo Levi? Como assim, ele estava mesmo dizendo isso? Pior que seu beijo foi tão quente que a idéia me deixa ainda mais excitado – não daquele jeito; não ainda, pelo menos.

“Você quer dormir comigo?” Ele pergunta, vendo minha expressão de choque. “Daquele jeito, dessa vez.”

Foco, Eren, foco.

“M-Mas...” Eu me forço a raciocinar. “L-Levi, e o que você me disse ontem...?”

“Esquece aquilo.” Ele morde o lábio, ansioso. “Eu só... Queria que você me tocasse. Eu quero isso agora.”

Era repentino, mas ele parecia bem calmo e sensato ao contrário de mim, que estava quase explodindo.

“É sério isso, Levi?” Eu pergunto, tentando me acalmar. “Tem certeza?”

“Tenho.” Ele afirma com certeza. “Por quê? Você não quer?”

“C-Claro que eu quero! E-Eu só... to surpreso, é repentino.”

“Eu sei. Mas você faria isso por mim?”

Eu queria gritar que eu faria por mim também, mas me controlo e respiro fundo. Eu não podia deixar meus hormônios falarem mais alto, até porque a situação era esquisita demais.

“E-Eu...” Balanço a cabeça, tentando organizar os pensamentos. “Nossa, eu adoraria isso.”

“Então vem cá.”

Nós entramos em seu quarto e fechamos a cortina, que não escondia muita coisa. Mas, quando apagamos a luz, fica tudo tão escuro que dá um leve ar de segurança. O corredor já estava apenas com luzes noturnas e, como esse quarto era o último do corredor, seria muita falta de sorte que notassem algo estranho.

Bom, tem o Reiner também, que poderia aparecer a qualquer instante.

O que me deixa mais intrigado é como Levi não parece preocupado com nada disso. Enquanto minha mente está a mil por hora pensando nessas coisas, ele ajeita um pouco sua cama, tirando algumas peças de roupa jogadas em cima, e olha para mim.

“Melhor tirar essas coisas do bolso.” Ele se aproxima e enfia a mão em meu bolso para pegar todas as coisas que coletei lá embaixo.

Eu continuo avoado, mesmo com ele estando tão perto de mim, e fico do mesmo jeito até que ele termina e me puxa pra cama.

Eu só volto a prestar atenção no mundo real quando ele me beija de novo, já vindo para o meu colo. Eu nem sei onde tocá-lo, então apenas coloco minhas mãos em sua cintura. Ele continua me beijando, até decidir virar minha cabeça para morder minha orelha, e talvez aí que eu me dou conta que ele falava sério.

“Pode me tocar de verdade.” Ele suspira em meu ouvido e eu juro que nunca ouvi alguém mais sexy.

Por qualquer motivo que tenha o feito querer isso assim, tão de repente, eu ia ser o mais carinhoso e perfeito possível. Eu o toco por baixo de sua camiseta, sentindo como ele se arrepia, e aproveito para começar a beijar seu pescoço. Ele parece gostar do toque, relaxando ao ponto de fechar os olhos, e eu continuo.

Suas pernas se encaixam mais firme em torno de meu corpo enquanto eu continuo beijando cada canto de seu pescoço e de seu rosto. Minhas mãos percorrem suas costas por baixo da camiseta e eu o pressiono contra mim, mas provavelmente isso estava andando muito lento para ele, o que o faz mover minhas mãos para a linha de sua calça.

Claro que tocá-lo ali me deixava muito mais nervoso, mas eu sigo lentamente e movo minhas mãos por suas coxas, subindo até sua bunda e apertando de leve. Isso o faz gemer, então eu continuo, cada vez um pouco mais intensamente, até que eu decido mover minha mão direita para frente.

Ele já estava parcialmente duro quando o toco. Eu o acaricio de leve, analisando suas reações e vendo se ele estava gostando ou não. Ele se segura em mim com mais força e abre mais as pernas, então eu continuo. Eu sentia que ele ficava cada vez mais excitado, e sua respiração até ficava mais pesada.

Seu gemido em meu ouvido não deixa de me deixar excitado também. Começo a tocá-lo mais intensamente, sentindo o contorno de seu pênis através da calça, até que decido que já era o suficiente para parar de enrolar. Lentamente coloco minha mão por dentro de sua cueca e o toco diretamente. Ele se arrepia e geme, cravando suas unhas em minhas costas.

Mas, quando eu começo a masturbá-lo, eu sou repentinamente empurrado. Olho para ele e encontro seus olhos cheios de lágrimas.

“O que foi?” Fico imensamente preocupado. “Eu te machuquei?”

“Eu não posso.” Ele morde o lábio e, sem jeito, levanta a calça e vai para o canto da cama, se escondendo com um travesseiro.

“Levi—“

“Vai embora, Eren.” Ele esconde o rosto com o braço. “Sai daqui.”

Ele estava controlando o máximo para não desabar em lágrimas na minha frente.

“Calma, não precisamos fazer mais nada disso, tá?” Eu tento acalmá-lo. “Eu só não posso te deixar assim—“

“Sai daqui!” Ele grita, me interrompendo, e eu nunca esperava vê-lo desse jeito.

E ele desaba. Começa a soluçar em lágrimas, e eu fico sem ação. Não podia ir embora com ele assim, de forma alguma. Mas, quando eu tento me aproximar de novo, ele se encolhe ainda mais no canto.

“Não encosta em mim!” Ele pede. “Vai embora, Eren!”

Eu não conseguia nem argumentar com ele nesse estado. Hesito mais um pouco, até que ele torna a gritar para que eu saísse e eu decido fazê-lo antes que alguém escutasse e viesse ver o que estava acontecendo.

Saio correndo de seu quarto e vou para o meu. Encontro Jean dormindo pacificamente e me jogo em minha cama, sem sono algum.

E não consigo pregar os olhos nem por um segundo.


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Notas finais do capítulo

Waahh ;___; Desculpem por acabar em momento tão tenso!
Mas espero que tenham gostado! A próxima parte será a última de verdade agora e eu devo demorar o mesmo tanto para postá-la (vou me esforçar para não enrolar! ;_;)
Muito obrigada por lerem, até lá n_n