Perspectiva de Christine.

Aprendi uma lição para a vida inteira: Nunca atravesse uma vitrine. Nunca.

Se estão interessados em saber, remover caquinhos de vidros das suas costas é doloroso. E isso acabou com a minha alegria de ter matado um general com apenas uma mera agulha. Caramba, eu daria tudo para ver a cara do titio Hades quando o general chegou ao mundo inferior. Tipo:

Hades: Do que você morreu.

General: Foi uma agulha, senhor.

Gargalhei enquanto pensava nisso, e todos me olharam como se eu fosse louca. Eu estava na minha cama enquanto Rosie tirava os cacos de vidro que estavam cravados nas minhas costas.

— Está se sentindo bem? — Damien, que estava no sofá e jogando videogame, gritou.

Me sinto lisonjeada por ele ter parado de jogar seu joguinho idiota para tirar uma da minha cara.

Vanessa que estava sentada do lado de Damien, para a raiva de Rosie, gargalhou.

— Deixa para lá, acho que ela deve ter batido a cabeça quando caiu — ela disse e deu um tapinha no braço de Damien.

Rosie virou a cara para a cena e cravou a pinça afiada na minha pele. É desnecessário comentar sobre a minha vontade incrivelmente grande de cravar a pinça nos olhos dela.

— Você será uma péssima médica no futuro, garota ruiva — Alec comentou. E olhe, a criatura esperta estava com um bloqueio mental e por mais que Rosie cravasse a pinça em mim, ele não ia sentir.

— Concordo — Falei ao mesmo tempo que Idia.

Aí ela cravou a pinça em mim. De novo.

— É culpa de vocês que estão fazendo sombra — Rosie protestou.

Alec e Idia estavam estirados no outro lado da cama e Idia estava deitada encima da cabeça dele, igual ela faz comigo na hora de dormir.

Olhei para a gatinha traidora. Ela estava me deixando de descanteio só por que não comprei saches de sardinha para ela.

— Você está tentando roubar minha gata!

Alec me olhou com aquela cara de inocente. Já bastava o Mingau que gostava mais dele do que de mim.

— Não estou.

— Traidor.

Ele riu.

Pensei na hipótese de tentar empurrar ele da cama com o pé, mas isso provavelmente faria Rosie cravar a pinça em mim, ou na pior das hipóteses, arrancar um pedaço das minhas costas.

É, isso não seria agradável. Nem um pouco.

Tive vontade de matar aquele general idiota só mais uma vez. Aquele viado conseguiu acabar com meu dia. Sério. Mas veja o lado bom, todos generais de Trivia estavam mortos, pelo visto Ankh já tinha sido morta por outra pessoa.

Pelo menos os assassinatos que ocorreram foram vingados. E melhor: Só tínhamos aquela noite em Las Vegas e pela manhã já poderíamos voltar ao normal.

Só restava acreditar que o Campo de Treinamento ainda estivesse inteiro.

Rosie se afastou, pelo visto ela finalmente tinha acabado de tirar todos os cacos de vidro. Senti Alec encostar a mão nas minhas costas e um frio percorreu minha pele. Não demorou para as minhas costas estarem intactas novamente.

Então eu tirei todos para fora do apartamento e fui tomar um banho. Depois fui dormir.

Aí eu tive mais um daqueles sonhos loucos que só acontecem comigo.

[...]

Veja o lado bom: eu sabia que estava sonhando. Conseguia ver as coisas na minha frente perfeitamente, mas não conseguia me mover ou sentir meu corpo.

E eu estava de frente para Trivia, e soube que eu estava sonhando, por que ela não me via. Tenho certeza, por que se ela me visse iria voar para o meu pescoço. E foi bom também essa coisa de não conseguir se mover, senão eu teria rasgado a cara dela em pedacinhos.

Não que a cara dela já não estivesse feia por si só. O rosto dela estava coberto por cicatrizes de queimadura, totalmente deformado. É, Trivia, pelo visto você pode se curar automaticamente, mas ainda fica com as cicatrizes. Não vi os braços dela, que estavam cobertos por mangas longas, mas as mãos dela estavam igualmente deformadas.

— Está apreciando o exército, irmãzinha?

Atrás dela estava Thanatos, com os olhos dourados brilhando tão intensamente que achei que ele estava falando comigo.

Os dois estavam em uma espécie de sacada e abaixo deles havia... pontinhos escuros. Vários deles e alguns brilhos dourados.

Aquilo era um exército. Um exército inteiro visto do alto. Trivia iria atacar o Campo de Treinamento com o seu exército inteiro. Não era só dezenas de monstros. Eram centenas ou milhares.

— Isso vai ser divertido — Trivia disse.

É, vai ser muito divertido quando eu arrancar sua cabeça fora, pensei.

A cena mudou.

Eu não estava mais olhando a cara deformada de Trivia. Ah, eu tinha que parabenizar Alec pelo o que ele fez.

Eu estava em uma das salas que eu mais conhecia no Campo de Treinamento: A sala de Ilithya. Por que sempre fui parar lá depois das minhas encrencas. Lá Raphael e um homem com roupa neon cintilante olhavam para a janela.

— Ilithya iria detestar isso, Mikhail — Raphael falou.

O cara de roupa cintilante, Mikhail, assentiu.

Na janela dava para ver tudo. Os adolescentes do Campo de Treinamento saindo e entrando soldados. Era isso. Eles estavam mandando os alunos para casa para não serem massacrados e tinham chamado um exército para pegar Trivia de surpresa.

Mas isso não ia funcionar. Eu vi! Tinha centenas de monstros, iriam acabar com aquele exercito.

Quando abri a boca para gritar “Saiam daí, idiotas. Tem centenas de monstros que vão transformar vocês em jantar”, eles sumiram.

Ou eu saí de lá, vai saber.

A minha frente estava a Balança do Equilíbrio. Eu conheço ela por que eu tive que “ajustar” ela uma vez. E não, isso não foi divertido.

Então lá estava a Balança, e ela parecia estar normal, nenhum dos pratos pendendo para o outro lado. E isso era bom, senão eu teria que fazer outra excursão ao templo.

Sabe o que eu disse sobre a Balança estar normal? Esquece.

Uma névoa ou neblina, sei lá, esbranquiçada rodeou a Balança. Na última vez que eu estive dentro daquele templo, bom, não havia neblina. Aquilo era estranho.

Não gostei de ver aquela neblina. Eu senti alguma coisa se agitando, algo pior do que Trivia, Erebo e até mais forte que minha mãe. Mas podia ser alguma neurose minha talvez.

A névoa se aproximou da Balança e de repente comecei a me sentir mal. Tinha algo muito errado acontecendo.

E isso foi confirmado quando a névoa cobriu a Balança e... a Balança virou pó.

Acordei em um pulo. Idia, que estava deitada na minha cabeça, me olhou inquisidoramente.

— Você está se sentido bem, Chris? Sério, você está muito estranha.

Sacudi a gata para ela calar a boca.

— Algo muito errado está acontecendo, Idia.

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