All Out War escrita por Filho de Kivi


Capítulo 23
The Long Con


Notas iniciais do capítulo

Hei!

E aí pessoal, como estão?

Bom, pelo visto minhas postagens passaram do fim de semana para as segundas hehe...

Acreditem, eu bem que queria fazer postagens mais regulares, e mais frequentes também, mas enfim, ultimamente não venho conseguindo realizar tal feito... De qualquer forma, temos aqui mais um capítulo, e por sinal, um SENHOR CAPÍTULO! Ficou enorme, mas acreditem, não está desinteressante! Não havia como resumi-lo, pois o que acontece nele é muito, muito importante!

Temos um POV de Goodwin, e no final do capítulo um pequeno momento envolvendo a visão do xerife Rick Grimes... Não vou adiantar muito, mas é um capítulo bastante político!

Queria agradecer mais uma vez a minha amiga Menta, que além de comentar maravilhosamente em todos os capítulos, tem se mostrado cada vez mais como uma super-amiga! Obrigado por todo o apoio que tem me dado, dentro e fora do nyah! Kiitos!

E é claro, novamente venho aqui lembrar aos leitores fantasmas (como diria Menta) que podem ficar a vontade para comentar quando quiserem! Eu ficaria muito feliz em saber o que estão achando desse meu singelo trabalho, vamos lá, não se acanhem!

Bom, acho que é isso... Espero que gostem do capítulo, ele carrega uma grande tensão e é bastante decisivo para a continuidade da fic! Um conhecido conflito será finalmente resolvido...

Boa leitura!



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As palavras de Gabriel transpassaram os ouvidos de Goodwin, perdendo-se em sua mente, totalmente ignoradas pelo caçador. Apesar de suas feições calmas e tomadas de bonança parecerem extremamente ressentidas pelo que ocorreu, James, internamente, deixava reverberar um único pensamento.

Está acabando, finalmente está acabando.

Descendo do altar e deixando o púlpito, o padre abriu espaço para que o mandatário de Alexandria, recém-chegado de sua missão no Hill Top, cabisbaixo, provavelmente sentindo-se impotente ante as perdas que ocorreram bem debaixo do seu nariz, tomasse a palavra, possivelmente para mais um emaranhado de frases feitas incentivadoras.

Apesar de ter agido por puro impulso, Goodwin começava a ver naquele momento, que os seus temerários atos talvez tivessem servido de gatilho para a definitiva conclusão do seu plano. Afinal de contas, tudo ocorreu quando Rick deixara Alexandria, desguarnecida, desprotegida mais uma vez. Pelo visto, ninguém ali nutria nenhuma desconfiança voltada ao pacato engenheiro da comunidade, o homem que passava o dia inteiro no escritório de planejamento junto a Eugene. Não haveriam de levantar dúvidas sobre sua índole.

Nem mesmo os olhares atravessados de Andrea em sua direção poderiam mudar o fato de que ele havia conseguido domar o xerife e seu grupo, trazendo a maioria dos moradores para o seu lado, manipulando-os sem que ao menos desconfiassem.

Isaiah cumprira o seu papel mais uma vez, e deixara o caminho livre para que a ascensão de James Goodwin se concluísse, obviamente, ante a queda de Rick Grimes.

O que não tardaria a ocorrer.

Grimes aparentava ser um homem muito impulsivo, inteligente a seu modo, mas nem de longe parecia possuir a calma de Goodwin para armar os mais diferentes tipos de estratégias. Alguma hora, mais dia, menos dia, o xerife tropeçaria nas próprias pernas. Quando esse dia finalmente chegasse, todo o esforço, todos os pecados, todo o distanciamento de sua própria esposa... Tudo teria valido a pena.

Estava muito perto de ser concretizado. Perto demais.

Respirando fundo, o mandatário olhou para todos aqueles que de forma tristonha, encaravam-no, ainda buscando forças para prosseguir. Sem olhar para James, o que na visão do engenheiro representava uma iminente derrota interna do ex-policial, Rick iniciou o seu discurso, eloquentemente como sempre, mas aparentemente baqueado.

— Definitivamente não há muito o que ser dito... Não há nada que eu possa dizer para acalentar os corações de vocês! – O xerife ergueu o olhar, estufando o peito – Vivemos em comunidade, tentamos resistir a todas as mudanças do mundo... Damos apoio uns aos outros, nos apegamos uns aos outros... Coisas como essa já deveriam ter sido ultrapassadas, já deveríamos ter passado do período onde mortes misteriosas ocorrem a cada semana...

Grimes e James se encararam pela primeira vez naquela noite. Goodwin controlou sua enorme vontade de exprimir um grande sorriso em direção ao mandatário, achando melhor manter sua pose de bom moço na primeira fila da igreja.

— Acidentes que nos pegam de surpresa, levando preciosos integrantes de Alexandria... – Prosseguiu Rick – Estamos de luto, e devemos deixar que esse sentimento nos dome por completo, de uma única vez, para que após superá-lo, possamos finalmente prosseguir... Precisamos prosseguir!

Os olhares desconfiados continuavam sendo desferidos em direção ao xerife, que pela primeira vez em muito tempo não possuía a maioria ao seu lado.

James esticou o braço alguns centímetros para o lado, tocando a mão de Susie, que mantinha um sonolento Jacob em seu colo. O casal passava por uma maré de desentendimentos, muito por conta do foco total de Goodwin em estipular um novo governo para Alexandria. Assim que ele finalmente tomasse conta do lugar, e expulsasse toda a escória que ele considerava maléfica para a continuidade da comunidade, suas atenções poderiam se voltar para a retomada de seu casamento. Apesar de não ter demonstrado como deveria nas últimas semanas, Goodwin amava demais sua esposa, e o bebê provido pelos dois.

— Melina e Sam* não puderam estar presentes nesse cerimonial... – O xerife gesticulava bastante com a mão esquerda – Ainda é muito difícil para o garoto aceitar a morte do pai, e Melina amava muito Nick, ainda está em choque... – Uma breve pausa fora feita, James olhou rapidamente para os lados, tentando encontrar Isaiah entre os presentes – Yumiko também passou mal após receber de Rosita a notícia de que Magna não resistira ao grave ferimento que sofrera...

Os olhares se encontraram novamente. Um contraposto entre a face cansada de Grimes, e a passividade nos orbes de Goodwin.

Então ele realmente conseguiu! Pensou James, tentando conter sua felicidade interna. Isaiah cumpriu com o combinado!

— Vamos enterrar os nossos mortos... Vamos viver o nosso luto e continuar... É o que devemos fazer agora. Não tenho muito mais a acrescentar a respeito disso...

Rick realmente parecia diferente, abatido, entregue após mais um grandioso baque. Talvez o peso da liderança fosse grande demais para os seus ombros, talvez tivesse chegado a hora de transferir essa responsabilidade, passar o posto para alguém que pudesse suportar tudo, e tivesse forças para contornar qualquer situação.

Talvez a hora de James Goodwin tivesse chegado.

— Preciso também prestar contas sobre minha viagem ao Hill Top, para que saibam tudo o que se passou por lá... – Grimes prosseguiu, tentando mudar o foco – Não estou exagerando quando digo que criar laços com essa nova comunidade será muito benéfico para Alexandria... Eles podem nos suprir com comida e água, além de recursos que jamais teríamos a disposição!

Será preciso avaliar esses laços com o Hill Top... James conjecturava sozinho. Jesus, o homem que veio até nós, parece-me um lobo sorrateiro, não sei até que ponto a relação entre as duas comunidades deverá se estreitar...

— Eles utilizam um sistema de escambo, e como todos sabem, não temos muito o que oferecer a eles no momento... Nossos estoques de comida estão cada vez mais baixos...

Um tiro no pé, senhor Grimes! Você não deveria declarar em alto e bom som que não foi competente o bastante para manter sua comunidade bem suprida...

— Mas temos nossa força, além de nossa habilidade em eliminar ameaças...

Não a meu ver... O riso interno não teve como ser contido.

— Foi isso o que ofereci! Não estou pedindo para que todos se armem, não acredito que precisaremos de um exército, mas teremos que pôr alguns dos integrantes de nossa comunidade em perigo, tudo por um bem maior!

Outro tiro no pé... O que aconteceu com você, Rick?

— Entendam... É muito importante que esse acordo seja firmado, para que Alexandria possa sobreviver! Precisamos do Hill Top, e o Hill Top precisa de nós!

Tenho que admitir, você é corajoso, xerife! Não é qualquer um que vem a público para colocar tantos problemas em pauta de uma única vez... Corajoso e burro!

— Não acredito que esses Salvadores, como eles mesmos se intitulam, representem um perigo real... Topamos com um grupo na estrada, e conseguimos contornar a situação com facilidade! De qualquer forma, precisava discorrer a respeito disso em uma reunião... Queria saber a opinião de vocês!

Chegara a hora de se manifestar, de ganhar ainda mais o apoio dos veteranos. Rick parecia cavar seu próprio túmulo, afinal, como ele não conseguia perceber todo o espaço que estava dando para o seu maior opositor? Erguendo a mão lentamente, tentando demonstrar timidez, Goodwin pedira a palavra, e fora subitamente autorizado por Grimes, por intermédio de um aceno positivo com a cabeça.

Enchendo o pulmão de ar, o engenheiro levantou-se de seu banco, tomando a frente.

— Desculpe-me senhor Grimes, mas não sei se essa seria uma decisão muito sensata... – Ele evitada fitar o xerife, voltando-se apenas para a multidão – Estamos passando por um momento muito delicado, eu mesmo... – Goodwin levou uma das mãos ao rosto, objetivando passar a impressão de estar se emocionando – Eu mesmo não tenho dormido essas últimas noites, pensando no acidente horrível que acabou vitimando Magna... Me sinto muito, muito culpado!

Sua aparente fragilidade conquistava ainda mais adeptos.

— Declarar uma guerra agora, em um momento em que ainda estamos tentando superar perdas tão doloridas, não me parece justo... Você diz que precisamos arriscar mais vidas... Agora sou eu que peço que me entenda senhor Grimes – James voltou-se em direção ao púlpito, encarando diretamente o mandatário – Isso não será justo conosco!

Um burburinho iniciou-se entre os ouvintes do discurso. Estava faltando apenas uma faísca para que o fogo da indignação se alastrasse por toda Alexandria. Goodwin havia conseguido o que queria, sua revolução estava sendo iniciada naquele momento.

— Foi bom que você tenha tocado na palavra justiça...

A frase de Grimes chamara imediatamente a atenção do engenheiro, que interrompeu os paços direcionados ao banco em frente ao altar.

— Você me lembrou de algo muito importante, obrigado senhor Goodwin! – Rick não parecia mais cansado ou derrotado, suas feições haviam se modificado completamente – Já que você fez a ponte com o assunto, lembro-me agora que precisamos resolver mais uma questão antes de darmos por encerrada essa reunião...

Parando em frente à esposa, James direcionou o olhar novamente para o líder, que não mais temia em enfrentá-lo.

— Já que você supõe que minha tomada de decisão não será justa, farei justiça agora... Porque não iniciamos o seu julgamento, senhor James Goodwin? – Asseverara Rick, amplamente decidido em suas atitudes.

O que acha que está fazendo, Rick? O engenheiro não esperava por aquilo. Arqueando as sobrancelhas, só conseguira pronunciar uma frase, ainda absorto ante a súbita tentativa de virada.

— Que palhaçada é essa... Isso não faz sentido algum!

O xerife sorriu, dando um passo em direção ao pequeno degrau que separava o altar dos lugares reservados aos fiéis. Seus olhos fixavam-se em Goodwin, com toda a certeza ele queria intimidá-lo.

Não, ele não pode... Com certeza ele está blefando!

Aproximando-se ainda mais do recém-réu, Rick manteve um aspecto vitorioso em seu rosto, contrastando com a preocupação evidente que passara a reverberar no interior de James.

— Posso provar tudo o que você fez com Spencer, Nick e Magna... – Sussurrou o xerife, próximo ao ouvido do engenheiro.

— Você pode tentar, mas duvido que consiga... – Devolveu Goodwin, apenas para Rick, em uma tentativa de não demonstrar fraqueza.

Grimes sorriu mais uma vez, afastando-se brevemente do conspirador e voltando a exclamar, dessa vez para que todos ouvissem.

— Vamos ver então... Há uma pessoa aqui que poderá nos ajudar a esclarecer muitas coisas – O mandatário ergueu o coto em direção à saleta eclesiástica, onde padre Gabriel utilizava como dormitório – Pode vir... Isaiah!

O burburinho se alastrou entre os moradores que assistiam ao cerimonial. Faces embasbacadas se mostravam presentes em meio a exclamações sussurradas, lançadas ao vento. Alguns mais exaltados, indignados com as acusações direcionadas a Goodwin, faziam questão de provocar o xerife em voz alta, para que ele ouvisse e soubesse quem possuía maior popularidade.

A algazarra se manteve por alguns segundos, até a entrada de Isaiah-Matti, saindo da saleta sinalizada pelo acusador. James tombou a cabeça levemente para o lado esquerdo, ainda tentando organizar os pensamentos, formulando uma estratégia, ao mesmo tempo em que esforçava-se para não sair do personagem que havia criado. Rick queria jogar, e por isso mesmo o engenheiro não poderia deslizar, a aparente situação desfavorável poderia voltar-se a seu favor se as peças certas fossem movidas.

Respirando fundo, James apenas observou o companheiro de sobrevivência aproximar-se do altar. Trajando um casaco de couro, o homem mudo que agora exibia os cabelos loiros cortados rente ao couro cabeludo, não mais escondia a face sob um lenço, deixando que todos pudessem ver a enorme cicatriz ao lado da boca. O mesmo ferimento que levara parte de sua língua com ele.

Mantendo as sobrancelhas arqueadas, o caçador que fora inquirido por Grimes, gesticulava com os braços enquanto trocava olhares com os membros da ‘plateia’, como se não fizesse a menor ideia do que estava ocorrendo por ali.

Olhando para Susie, notou que a mulher não demonstrava a mesma indignação no olhar compartilhada por seus demais admiradores. Diferentemente de todos ali, ela o encarava com firmeza, queixo erguido, segurando firmemente o seu bebê no colo. Parecia carregar uma certeza nunca antes vista, definitivamente ela estava diferente.

Um leve arrepio subiu pela espinha do caçador, que preferiu deixar aquele sentimento apenas na casa do abstrato, precisava focar toda a sua atenção para o teatro armado por Rick. Era preciso virar a mesa, usar o passo dado pelo xerife como a cartada final a seu favor.

— Eu não entendo, senhor Grimes... – Um sorriso amarelo brotara em seus lábios – Não consigo entender que acusações teriam contra mim... Isso não faz sentido algum!

Isaiah mantinha os braços paralelos ao corpo, olhando de forma assertiva para o réu. Não, esse filho da puta não fez isso! James tentava compreender o motivo de Matti estar ali, trazido por Rick, diante de todos, principalmente após ser nomeado como uma de suas testemunhas.

Não vai dar certo Rick... Mesmo que você tenha conseguido arrancar alguma coisa do Isaiah, o que acho bastante difícil, ninguém acreditará em um maluco bizarro como ele!

— Os últimos dias foram bem difíceis... – Rick reiniciou o discurso, ganhando novamente a atenção da multidão – Passamos por muita coisa no Hill Top, e ainda arriscamos nossas vidas no trajeto de volta, quando enfrentamos os Salvadores...

Vou deixar você falar xerife, vamos ver até onde quer levar tudo isso!

— Matamos um grupo de milicianos não apenas para proteger a minha vida, ou a de Carl, Michonne e Glenn... Matamos aqueles homens para não permitir que nenhum mal chegue até Alexandria!

O xerife passou a caminhar lateralmente.

— Assim que cheguei, recebi de Andrea a notícia de que Nicholas havia morrido e Magna estava por um fio... Logo depois, a morte de Magna acabou sendo confirmada... – Rick seguia de um lado a outro no altar – Além disso, Hall, o nosso médico, havia misteriosamente desaparecido em meio à madrugada...

— Rosita recebeu treinamento por tempo suficiente para assumir nossa enfermaria, portanto, o caso de Vincent não era uma prioridade... Mas Nick e Magna, sim!

Os olhos atentos dos ouvintes movimentavam-se seguindo a silhueta do xerife, que parecia bastante a vontade enquanto se manifestava.

— Eu senti que precisava dar uma resposta a vocês, principalmente após a morte de Spencer, debaixo do meu nariz... Sei também o que a maioria de vocês acha que ocorreu naquele dia, e por isso precisei pensar bastante nas últimas horas... Precisei pensar em uma maneira de cessar as coisas horríveis que vem ocorrendo em nossa comunidade!

Você fala bem Rick... Mas não o bastante.

Grimes estacionou em frente à Isaiah, que seguia posicionado defensivamente, cruzando os braços enquanto encarava a multidão.

— Isaiah, você teve parte de sua língua cortada, certo?

O xerife olhava diretamente para os olhos do biólogo, que respondia igualmente com seriedade.

Você sabe o que fazer Isaiah, não se precipite... Chegou a hora de tirarmos esse sujeito do pedestal... Você sabe o que fazer!

O homem mudo balançou a cabeça positivamente.

James assistia a tudo sem se manifestar, hora ou outra olhava para trás, balançando a cabeça como se ainda não entendesse o que estava ocorrendo.

— Isso ocorreu antes de conhecer James Goodwin, correto?

Mantendo a mesma postura corporal, Isaiah-Matti respondeu novamente de forma positiva com a cabeça.

— E você pode nos mostrar?

O questionamento do mandatário causou novo alvoroço em meio àqueles que permaneciam atônitos, assistindo a oratória do xerife, que parecia calcular cada passo e cada frase.

Ainda olhando por alto, Isaiah não demonstrava incômodo com nenhuma das colocações de Rick Grimes. Após ser solicitado, o homem não tardou em abrir a boca da forma mais escancarada que conseguiu, exibindo a língua multilada e arrancando algumas exclamações de ojeriza.

— Bom... – Rick retomou, mantendo total controle da situação – Está mais do que claro que esse homem não poderá responder de forma oral a nenhuma pergunta aqui feita, portanto, farei de forma didática alguns questionamentos que ele possa nos esclarecer apenas com um simples ‘sim’ ou ‘não’...

Goodwin seguia estático, aguardando o prosseguimento do ‘espetáculo’ criado pelo xerife. Seria aquilo desespero? Uma pífia tentativa de expô-lo diante da comunidade? Será que Rick não era tão esperto quanto o caçador havia pressuposto?

Até tal instante, nada se encaixava ou fazia sentido para o engenheiro, que por conta disso, preferiu seguir a maré, observando de perto as ações tomadas pelo mandatário, para que em seguida pudesse contratacar a altura.

— Quando Spencer fora morto... – Rick mantinha-se assustadoramente seguro, parecia até que o xerife havia ensaiado cada frase de seu discurso – Ele estava sob minha custódia, após tentar tomar a comunidade, ensandecido em uma de nossas missões para conseguir suprimento nos arredores...

Os passos em linha reta, tracejados por sua bota, seguiam por cinco metros, antes de retornarem ao ponto de início. Em meio ao vai e vem, o xerife seguia discorrendo.

— Eu o mantive preso em uma de nossas casas vazias, uma das novas, após a ampliação dos muros em mais dois quarteirões, planejada e executada por Abraham... – Rick parou, olhando para os demais – Sei o que vocês pensam, sei o que ‘acham que sabem’. Seria muito fácil acabar com o Spencer, na verdade, eu poderia ter feito aquilo quando o tive sob minha mira... Um tiro na cabeça, assim como fiz com Pete... Tudo estaria acabado!

Olhos arregalaram-se após as últimas frases, até mesmo Goodwin espantou-se momentaneamente com a franqueza apresentada pelo policial.

— Motivos não me faltariam para acabar com ele... Spencer ficou louco após a morte dos seus pais, principalmente a de Douglas, da forma como se sucedeu...

A lembrança do suicídio do antigo mandatário de Alexandria ainda estava presente na mente dos veteranos, que não haviam conseguido superar essa perda por completo. Douglas conduzira a comunidade por bastante tempo, e era querido por todos ali.

— Mas não foi o que eu fiz... Não era o que eu queria para essa comunidade, não quero que as coisas se resolvam dessa maneira... – O xerife pausara brevemente, precisava se retratar – Não quero mais que as coisas se resolvam dessa maneira!

Nick não abriu o bico, eu o calei antes que ele pudesse dizer alguma coisa... James dividia sua atenção entre a fala eloquente de Grimes e seus milhares de pensamentos tentando encontrar uma brecha, uma falha mísera que fosse em seus planos. Não tem como o ‘xerife Woody’ provar nada, a não ser que...

— Eu ainda estava pensando em uma forma de puni-lo, uma maneira de resolver esse entrave sem precisar chegar a um extremo... – O coto de Grimes movia-se acompanhando suas palavras – Três vezes por dia servíamos água e comida para ele, e justamente para não haver desconfiança quanto aos meus métodos, eu pedia para que pessoas aleatórias cumprissem essa missão...

— Na manhã em que Andrea encontrou o corpo de Spencer, ela verificou que as portas estavam trancadas! As chaves estavam sempre em meus bolsos – Rick tocou com a mão esquerda sua calça, em cima de um dos bolsos laterais – Alguém havia deixado uma das janelas abertas, e fora por ela que o assassino entrou durante a madrugada, espancando-o até a morte!

Não cometemos nenhum erro... Não cometemos nenhum erro...

— Não encontramos nenhuma prova, nenhum indício de quem poderia ter feito aquilo... E nenhuma das pessoas que escolhemos para levar comida e água a Spencer nutria qualquer rusga contra ele... Até ontem à noite, tudo seguia no campo da incógnita...

Até ontem à noite? James seguia quieto, a garganta secava a cada minuto que se passava.

— Esse homem nos procurou ontem à noite, e nos relatou por escrito tudo o que ocorreu nos últimos meses... – Rick apontou para Isaiah, que confirmou novamente em um aceno – Isaiah me escreveu dizendo que precisava pôr um fim em um emaranhado de atitudes impensadas, que iriam acabar trazendo um grande mal para Alexandria... Além disso, ele disse que estava disposto a se redimir, que assim como muitos de nós, buscava apenas uma motivação para prosseguir sobrevivendo...

Isaiah, não...

— Você confirma tudo isso, Matti? – Inquiriu Grimes.

O biólogo respondera positivamente. O xerife então continuou.

— Ele veio por livre e espontânea vontade, e me esclareceu exatamente tudo a respeito do que ocorrera, tudo o que vinha tirando o meu sono durante todo esse tempo...

Que porra é essa, Isaiah? O que você fez?

O silêncio passou a imperar no cerimonial, que agora se metamorfoseara em tribunal do júri. Nenhum dos presentes encorajava-se a se manifestar, apenas assistindo a tudo, absortos. O burburinho cessara, substituído por vidrados orbes, seguindo atentamente a voz firme e pausada de Rick Grimes.

— No dia em questão, três pessoas diferentes foram selecionadas para levar a comida até Spencer... – O xerife agora posicionara-se em frente ao homem mudo – Magna, Nicholas e Heath... – Uma nova pausa – Isaiah disse-me que fora Nicholas quem destrancou uma das janelas! Você pode me confirmar essa informação?

A confirmação fora dada por Matti.

Filho da puta... Filho da puta!

— Ele também me disse que isso fora feito a pedido dele... – Grimes voltara-se agora em direção a James, apontando com a mão esquerda – James Goodwin! Você pode me confirmar essa informação?

Novamente Isaiah balançara a cabeça positivamente.

O que aconteceu com ele? Que merda aconteceu com ele? Porque ele resolveu pular fora assim... Porque desistiu quando faltava tão pouco?

A plateia assanhou-se novamente, voltando a se manifestar de forma mais exaltada. A acusação era muito grave, e ainda parecia absurdo demais acreditar no que o xerife lhes contava. Como um homem pacato como James, que seguia sua rotina diária junto a Eugene, poderia bolar um plano tão mirabolante quanto esse? Tudo soava irreal demais.

— Isso é um absurdo! – Goodwin não pôde mais esperar, subiu o pequeno degrau que o separava do altar, ficando no mesmo nível do xerife – Está muito claro o que está ocorrendo aqui! – Apesar de efusivo, o caçador tentava não se deixar levar pelo ódio interno, precisava manter-se centrado de certo modo – O senhor Grimes está tentando justificar os seus erros, arranjando um bode expiatório para os crimes que ele próprio cometeu!

Exclamações de concordância foram ouvidas em meio ao emaranhado de pessoas.

— Ele deve ter forçado Isaiah a prestar esse papel, a fazer parte desse teatrinho! Provavelmente o ameaçou! – James virou-se para Rick, olhando-o nos olhos – Todos nós sabemos do que ele capaz... Todos sabem o que ele já fez aqui e lá fora, quando esteve na estrada!

O falatório se expandiu.

— Porque diabos eu teria motivos para matar Spencer, para atentar contra a vida dele? Você era o único aqui que possuía uma rixa com ele! – Goodwin apontara diretamente para o xerife – Eu ouvi as histórias Rick, ouvi sobre a obsessão de Spencer com Andrea... Isso deve ter te incomodado bastante, não?

A cutucada proposital inflamara ainda mais o clima. James também possuía suas cartas, e sabia exatamente quais colocar na mesa para anular o jogo de Rick. O jogo de Rick e Isaiah, que surpreendentemente mudara de lado. Apesar desse grande baque, Goodwin seguia concentrado, sabia que podia manter tudo sob controle.

— Minha relação com Spencer sempre fora a de boa vizinhança, a mesma que tenho com todos vocês! – Sua forma expansiva de falar lhe era bem particular – Eu tenho mulher e um filho para criar, não sou um assassino! O poder deve tê-lo enlouquecido, Rick! – O xerife seguia estático, sem modificar suas feições – É um absurdo estar sendo acusado... Chega a ser patético!

Rick sorriu, não parecia estar enfraquecido ou desgastado.

— Isaiah... – Grimes ignorou todo anunciado do caçador – O objetivo de Goodwin em exterminar Spencer era justamente para que toda a culpa caísse sobre mim, correto?

O biólogo confirmara. James passou a balançar a cabeça negativamente em sinal de indignação.

— Isso continua sem fazer sentido algum! – O caçador interrompera o xerife novamente – Hipoteticamente falando, como você vem conjecturando de forma absurda, porque diabos Nicholas me ajudaria nesse plano? Os dois eram amigos, ele jamais desejaria a morte de Spencer!

Ainda não acabou Rick, ainda não acabou!

— Matti também está aqui para esclarecer a respeito disso... Na verdade ele está aqui para esclarecer tudo! – Grimes seguia calmo – Isaiah relatou-me que Nicholas fora induzido a destrancar a janela para que James entrasse, pensando que o senhor Goodwin quisesse apenas conversar com o filho de Douglas!

Eu o subestimei Isaiah, você é mais esperto do que imaginei! Então planejou tirar o corpo fora?

— Nicholas sempre se posicionou contra a minha liderança, e acabou encontrando em James um apoio, alguém que aparentemente compartilhava com sua indignação... Mas ele não imaginava que esse homem faria algo tão brutal... Você pode confirmar tudo o que eu acabei de dizer, Matti?

Um novo aceno positivo.

— E é justamente a partir daí, que os crimes começam a se interligar... – James estancou, calado, sem reação. Rick prosseguiu – Nicholas, obviamente, deduziu o que ocorreu na noite em que Spencer fora assassinado e, por conseguinte, deduziu também quem seria o autor do crime...

As vozes voltaram a se calar, nem mesmo Goodwin se manifestava. Ele precisava buscar uma saída, não conseguia acreditar que todo o seu planejamento pudesse estar desmoronando daquela maneira. Tão perto, tão longe.

— Nicholas decidiu que contaria a verdade, que entregaria James pelos crimes cometidos! Ele estava se sentindo culpado, afinal de contas, direta ou indiretamente, ele havia ajudado o assassino do seu próprio amigo...

Como em um teatro grego, os três protagonistas ante o altar olhavam diretamente para o seu público.

— Goodwin percebeu que estava encurralado, e por isso, acabou com a vida de Nick, resolvendo parcialmente os seus problemas... Como Magna flagrara toda a sua ação, ele também a atacara, forjando toda aquela história do acidente e do ataque de errantes...

Foi um acidente... – Goodwin interpôs-se novamente – Eu a ataquei achando que era um dos carniceiros, os mesmo que mataram Nicholas, enquanto saímos na caçada... Tanto foi um acidente que a trouxe de volta, tentei salvar a vida dela...

Rick agora o olhava nos olhos, sem pestanejar.

— Você é inteligente Goodwin, sei que pensou em tudo... – O sorriso irônico seguia estampado no rosto do mandatário – Você a trouxe de volta para que ninguém desconfiasse de você, para que seguissem achando que é apenas um simples engenheiro... Mas não tardou em pedir a Isaiah que terminasse o serviço, afinal, se Magna sobrevivesse, poderia contar tudo o que viu a todos!

James fechara brevemente os olhos, sua cabeça começava a entrar em pane.

— Isaiah, você pode confirmar novamente o que acabei de dizer?

Matti voltou o olhar para Goodwin, sinalizando de forma positiva logo em seguida.

Respirando fundo, James tentou retomar sua concentração, não podia entregar-se tão facilmente. Apesar da estratégia de Rick aparentemente ter sido muito bem construída, Goodwin ainda possuía a simpatia da maioria, mesmo que agora abalada, após tanto ter sido dito. O caçador ainda continha uma poderosa arma, que precisava ser gasta em sua totalidade agora. Sua retórica precisaria ser bastante convincente e eficaz, só assim ele poderia laçar o xerife.

— O grande problema aqui... – James arqueou as sobrancelhas, fixando um olhar sério sobre todos. Tentava assim eliminar a aparente tensão em sua face – É que suas acusações estão sendo baseadas no depoimento de traidor... – Goodwin e Isaiah defrontaram-se – Um homem louco que não sabe o que está dizendo, e que provavelmente fora induzido por você... Além disso, Nicholas e Magna nunca poderão confirmar essa sua versão, já que pelo que sei, os mortos não contam histórias...

James voltara-se novamente para os moradores de Alexandria, que de tão atônicos, não mais esboçavam manifestação. Susie, Tom, Leah, Andrea, Abraham, todos atentamente apenas observavam o desenrolar do enfrentamento, um confronto que se desenhara desde que Goodwin colocara os pés na utópica comunidade.

— Está muito claro... – Goodwin mais uma vez encheu os pulmões com ar, preparando-se para mais uma rodada de sua oratória – Que Rick planejou e armou todo esse circo, porque sabia que eu representava um risco a Alexandria... Um risco ao seu regime ditatorial, pregado a base do medo! – Sua voz ressoava eloquentemente – Na sua mente perturbada, eu não passo de um conspirador que quer tirá-lo do poder!

— Ele criou tudo isso, todas essas acusações baseadas em mentiras, em denúncias de um homem visivelmente perturbado – Esticou a mão esquerda, indicando Isaiah – E no depoimento de pessoas mortas... Tudo para me desmoralizar, já que em sua cabeça, eu seria um postulante a seu cargo, um opositor... – Seus gestos expandiam-se cada vez mais – Eu nunca quis nada disso, nunca cogitei ser líder, eu apenas queria seguir minha vida, cuidar de minha família... Só que agora, vendo toda essa palhaçada, começo a perceber que esse homem não é o líder ideal para nossa comunidade... Rick levará esse lugar às ruínas! Ele está louco, esse homem está louco!

Você apostou muito alto xerife... Nunca comemore antes de ver a mão de seu adversário...

— Se Rick Grimes foi capaz de algo tão baixo apenas para eliminar sua posição, imaginem o que ele não poderá com Alexandria? Me ouçam quando digo que esse homem não pode mais prosseguir nesse posto... Ele vai acabar com tudo que vocês construíram com o suor de seus trabalhos, sob o sangue daqueles que amavam!

O xerife voltou a sorrir, arrumando os cabelos calmamente.

— Antes que decidam se eu devo ou não deixar a liderança... – Sua expressão entregava toda a ácida ironia – Peço que aguardem apenas mais um pouco, preciso chamar outra pessoa, que também tem algumas palavras pertinentes a dizer nesse momento... – Grimes voltou-se novamente em direção à saleta paroquial – Pode vir...

Assim como todos, Goodwin também direcionou o olhar para a porta, aguardando a nova testemunha de Rick. Quem poderia ser? Isaiah era o único a saber dos planos de James, e já havia contado tudo.

Rick seguia muito confiante, provavelmente estava seguro de si, mas por que motivo? Como ele poderia prosseguir tão firme após ser desbancado? As palavras de James, direcionando os moradores em definitivo contra o xerife e pedindo sua renuncia, deveriam soar como um doloroso golpe contra Grimes, e não fortalecê-lo.

A porta se abriu, o coração de Goodwin começara a acelerar, a tensão já estava encravada no ar da igreja. Saindo lentamente pela porta, cambaleante, precisando ser amparada para que pudesse caminhar, uma imagem fantasmagórica fizera os batimentos cardíacos do caçador alcançarem um pico elevadíssimo. Arregalando os olhos, sem acreditar no que estava vendo, James sentiu-se esmorecer-se, tomar-se por uma angústia nunca antes vivida. Tão perto e tão longe de seus objetivos.

Magna, andando com dificuldades, ajudada por Yumiko e Gabriel, dirigira-se até o centro do altar. Alguns gritos de espanto foram ouvidos em meio aos moradores, e todos, sem exceção, não puderam esconder o susto que levaram ao se depararem com a imagem da mulher, viva, diante de todos.

O burburinho retornara, aqueles que ainda tinham forças para falar, após tamanho choque, dividiam-se entre comentários a respeito da ‘ressurreição’ da batedora e das acusações feitas por Rick a Goodwin, que a partir daquele instante, passaram a fazer bastante sentido.

James não conseguia mais raciocinar. Sua mente sempre veloz e tenaz, perdia-se agora em uma única palavra, que tomava conta de seu interior e reverberada em sua cabeça, repetidas vezes e sem cessar.

Como... Como... Como...

— James Goodwin solicitou a Isaiah que terminasse com o serviço, que tirasse a vida de Magna durante a madrugada, já que assim, ninguém jamais saberia de seus crimes, e a morte dela seria sempre considerada apenas um incidente... – Com o coto, Grimes apontara para Magna – Como podem ver, ele não fez isso... Foi exatamente nesse momento que ele me procurou, para contar tudo, pois não queria mais seguir em frente com os planos de James... – O xerife olhou para Matti – Você também confirma isso?

Mais um aceno positivo fora dado.

— Após descobrir tudo o que Goodwin planejara, tudo o que fez para tomar o controle de Alexandria... Decidi que precisaria jogar com inteligência, por isso pedi que retirassem Magna da enfermaria e a levassem para a casa de Yumiko, e por isso também pedi para que Rosita dissesse a todos que ela havia falecido... Eu precisava que James continuasse achando que tudo estava seguindo conforme ele imaginou!

Goodwin seguia atônito, sem reação.

— Hall conseguiu realizar uma dificílima cirurgia, reconstituindo parte do fígado de Magna e interrompendo a hemorragia... Com a ajuda dele e de Rosita, que cuidou sozinha e com muito sucesso de todo o pós-operatório, ela ficará bem... E por conta da ajuda deles, ela poderá nos dizer agora exatamente o que ocorreu no dia em que fora acidentalmente atacada por James Goodwin...

A mulher encarou James, os olhos fundos e a pele pálida acusavam que ela ainda estava em fase de recuperação. De toda a forma, era como se um fantasma surgisse de repente em frente ao caçador, frustrando tudo o que sonhara, o que trabalhara tanto para modificar. Ele precisava de Alexandria e Alexandria precisava dele, não era possível que tudo acabaria ali.

Eu não posso perder esse lugar... Não posso...

— Andrea já estava desconfiada que o bonitão aí estivesse armando pra cima do Rick, e também desconfiava que ele seria o autor do assassinato de Spencer... – A voz de Magna saíra rouca, um tom abaixo de seu normal – Por isso ela me mandou segui-lo, pediu para que sorrateiramente eu conseguisse alguma prova, um indício que fosse... Ficar na cola dele também impediria que mais alguém fosse ferido, pelo menos era o que nós pensávamos!

A mulher parara brevemente, a posição ereta parecia incomodá-la, possivelmente as dores ainda não haviam abandonado-a.

— Eu o vi saindo naquela manhã, acompanhado do Nick, vi os dois se direcionarem até o bosque, e também vi os dois pararem no meio do caminho, em uma clareira, um local onde não conseguiriam caçar nem um esquilo... – Magna pôs um dos braços envolta do pescoço de Yumiko, firmando-se de forma mais segura de pé – Eles começaram a discutir, com o Nick sempre dizendo que não estava mais suportando, que precisava contar toda a verdade... Que precisava contar que Goodwin era o assassino de Spencer! Esse homem – Apesar de fraca, conseguira juntar forças para esticar um dos braços em direção a James – Aproveitou a distração de Nick e o acertou com uma pedra, assim que ele foi ao solo, não tardou em acertá-lo outras vezes... Dezenas de vezes, até que a cabeça estivesse totalmente esmagada!

O caçador fechou os olhos, abaixando a cabeça.

— Não tinha zumbi nenhum nas redondezas, a área toda estava limpa... Eu apareci, apontei minha arma para ele, mas... Ele foi mais rápido, jogou sua faca de caça e me acertou no abdome! Eu não lembro de muita coisa depois disso, mas posso dizer com toda a certeza... Não foi um acidente! Goodwin matou Spencer, matou Nick... E tentou me matar!

Rick aproximou-se de James, dando dois passos em sua direção. Sacando a pistola da cintura, o xerife posicionou sua arma habilmente com a mão esquerda, direcionando-a para o frontal do engenheiro.

— Acabou Goodwin, acabou...

O caçador, ainda de cabeça baixa e olhos cerrados, apenas aguardou o disparo do xerife, o golpe final, que selaria sua derrota. Nunca mais veria a esposa que tanto amou, nunca mais veria o filho, fruto do puro sentimento nutrido por Susie. A gana em transformar a comunidade em um local mais seguro, a sua maneira, seguindo sua forma de pensar, talvez tivesse extrapolado todos os limites. James acabara indo longe demais, e chegara a hora de sentir as consequências.

— Um tiro resolveria tudo... – Grimes olhava fixamente para o seu alvo – Apenas um disparo vingaria todo o mal que você causou... Mas se eu fizesse isso, estaria apenas assinando em baixo o seu discurso! – O xerife passara a baixar lentamente sua arma – Eu não vou matar James Goodwin, ele merece isso, mas não vou fazê-lo!

James abriu os olhos, ainda mais espantado.

— Quero provar a todos vocês que sou o líder que Alexandria precisa, independentemente de gostarem ou não de mim... Eu quero que essa comunidade siga outro rumo a partir de agora, criando laços com o Hill Top, civilizando-se... Por isso, não executaremos mais ninguém a partir de agora! – Rick guardou sua pistola no coldre – Lembro-me que Douglas me contou que seu maior sonho era que Alexandria se transformasse em um símbolo do retorno a vida em sociedade, uma miniatura do mundo como era antes... Porque então não realizamos esse sonho?

— Puniremos James Goodwin com o banimento! Daremos a ele a chance de retomar sua história, de repensar sua trajetória, de recomeçar! Aliás, quem nesses tempos difíceis não precisou recomeçar do zero? Se alguém for contra essa decisão, por favor, manifeste-se agora...

Alguns moradores trocaram olhares, girando a cabeça para os lados, aguardando que alguém dissesse algo. O silêncio prosseguiu. Rick então finalizou.

— Ótimo... Está decidido então, daremos um veículo, água e comida o bastante para que possa se virar por alguns dias... James Goodwin seguirá seu trajeto, só que agora longe de Alexandria!

[...]

Sentado no chão, recostado em uma das paredes daquele minúsculo cubículo, em frente à porta que a cerca de uma hora fora trancada pelo lado de fora, Goodwin fitava os olhos em uma das sombras proporcionadas pela pouca luz que conseguia atravessa a fresta inferior do portal de entrada.

Ainda sem reação, quieto desde que fora julgado, condenado e desbancado diante de todos os moradores de Alexandria, o caçador ainda conjecturava onde havia ocorrido o seu deslize, tentando encontrar o ponto de ruptura em um plano que até então, tinha tudo para dar certo.

Talvez tivesse sido o seu acesso de fúria contra Nick, ou talvez a forma como atacou Magna, ou até mesmo o voto de confiança que dera a Isaiah, o homem que o salvou da morte e que acabou traindo-o tempos depois. Independentemente disso tudo, James sabia que não haveria mais volta, e por mais que remoesse todos os acontecimentos, nenhuma epifania mudaria o fato de que ele estava banido, e Alexandria, antes tão cobiça, precisaria ser deixada para trás.

Um ruído na maçaneta anunciava a chegada de um visitante. Sem esboçar nenhuma ação, James apenas observou a porta girar sobre gonzos enquanto era aberta compassadamente. Em meio às sombras, com o rosto parcialmente encoberto pela penumbra, Susie, ainda com Jacob nos braços, adentrou o cômodo, a despensa improvisada como cela, dando apenas um passo, antes de se posicionar em frente ao prisioneiro. Estacionado atrás de sua esposa, um homem armado observava a tudo, provavelmente para assegurar que Goodwin não iria fugir.

— Eles deixaram que você viesse?

Susie o olhava por alto, séria, resoluta.

— Você precisa se despedir do seu filho...

Um nó tomou conta da garganta do caçador, que exprimiu um sorriso, sem encarar sua esposa.

— Então você realmente passou para o outro lado... Escolheu a comunidade...

A jovem mãe agachara-se, aproximando-se ainda mais do pai de seu filho.

— Eu não escolhi lado nenhum James, eu estou do lado do meu filho... Vou sempre fazer o que for melhor para o meu filho!

Erguendo os olhos, Goodwin arrostou os tristes orbes de sua amada, percebendo que ela também se entristecia.

— Eu não sabia de nada... – Voltou a dizer Susie – Não sabia que o Rick planejava um julgamento e nem sabia que você havia cometido tantas atrocidades...

James aproximou o rosto, mantendo o tom de voz sereno.

— Eu não fiz nada que Rick também não tenha feito, não sou o vilão dessa história... Quem não consegue enxergar e encarar o mundo de hoje em dia como ele é, não sobrevive! Eu só fiz o que fiz Susie, porque queria que o Jacob pudesse crescer em um lugar plenamente seguro... Que não precisasse fugir às pressas quando a comunidade fosse tomada por errantes ou pessoas mal intencionadas! Eu só fiz o que fiz porque alguém precisava fazer... Precisava ser feito!

Os olhos de Susie encheram-se de lágrimas. Visivelmente ela lutava consigo mesmo para tentar manter sua postura impassível.

— Você mentiu pra mim James, mentiu durante esse tempo todo... A vida te deu uma segunda chance, permitiu que nos encontrássemos de novo, permitiu que você encontrasse o seu filho outra vez... Mas você preferiu aproveitar esse tempo planejando um golpe em Alexandria, matando, traindo... Você fez o que fez por você mesmo!

Era melhor deixar ela falar, eles necessitavam daquela conversa. James precisava acertar as coisas em definitivo, já que provavelmente, nunca mais a veria outra vez.

— Espero que você aproveite melhor essa nova chance... – Retomou Susie, levando Jacob em direção ao pai – Seja rápido, não me deram muito tempo...

Goodwin tomou o filho nos braços, sendo imediatamente tocado por uma grande emoção. Olhando o rosto de seu garoto, tão inocente, ainda desconectado da realidade, sem saber de nada que ocorria a seu redor, o duro homem de várias facetas, apresentou uma que há muito não era vista. Beijando de leve a testa da criança, James sentiu escorrer uma lágrima por seu lacrimal esquerdo, quente, acolhedora, acomodando-se em sua bochecha antes de pingar em seu braço.

Cuida da sua mãe, grandão... Não deixe que nada de ruim aconteça com ela, e nem com esse lugar! É que aqui que você vai crescer, é aqui que vai conhecer o mundo... Papai não vai estar poder estar por perto, mas saiba que ele te amo muito!

O caçador entregou a criança de volta para a mãe, que a acomodou em seus braços antes de levantar-se virando as costas. Parando de súbito, a mulher esticou uma das mãos, retirando de um dos bolsos um pedaço de papel dobrado e amassado, jogando para o marido logo em seguida, que tomou o regalo em posse.

— Isaiah pediu que eu entregasse isso a você... Ele não virá aqui, na verdade, ninguém mais virá...

Goodwin seguiu olhando para a amada, que o fitou por breves segundos antes de virar-se novamente.

— Susie... – O chamado de James fizera a mulher parar o passo, voltando-se novamente em sua direção – Eu te amo, muito! Isso nunca foi mentira...

A mulher fechara os olhos brevemente, encarando o teto antes de retornar o olhar em direção ao marido.

— Eu também te amo James...

Susie finalmente deixara o recinto, batendo a porta e trancando-a novamente. Respirando fundo, o caçador tentava mensurar tudo o que ocorrera, mas eram informações demais para que ele conseguisse digerir em tão pouco tempo. Recostando a cabeça na parede e ajeitando o posicionamento das costas, Goodwin tomara em mãos o papel que recebera de Susie, abrindo-o logo em seguida.

Escritas com caneta azul, as letras de fôrma bem desenhadas sobre o papel pautado, foram prontamente identificadas como sendo de Isaiah, já que James conhecia muito bem sua caligrafia. Desamassando o papel o quanto pode, e direcionando-o para o único ponto iluminado da despensa, próximo à fresta da porta, Goodwin iniciou a leitura do que ali se encontrava escrito.

De forma direta, o biólogo manifestara-se em poucas palavras:

“Estou apenas sobrevivendo James, consegui levar seus planos em prática até o limite, mas percebi que estávamos entrando em um caminho sem volta, e acredite, eu sei muito bem quando algo passa dos limites, quando perde o controle... Já vi esse filme mais de uma vez, e sei que o final nunca é feliz!

Não poderia deixar que você colocasse tudo a perder, pois eu sei que nunca daria certo, não da forma louca como você pensava! Se te serve de consolo, eu pedi a Rick que não o matasse, que lhe desse uma nova chance, pois sei que você não é um monstro, assim como eu também não sou... Nós podemos encontrar a redenção, amigo, acredite!”

Amassando o papel com uma das mãos e lançando-o contra a parede, Goodwin bufou alto, fechando os olhos e controlando sua respiração. Era preciso agora traçar um novo plano, dessa vez visando sua própria sobrevivência. Em poucos instantes ele estaria de volta à estrada, e por sua experiência do lado de fora dos muros, sabia que precisaria de muito esforço para conseguir sobreviver em meio aquela selva.

*****

Colocando duas caixas de suprimentos e algumas garrafas d’água no porta-malas de um velho Ford, Rick Grimes começava a preparar o veículo que seria dado a James Goodwin, o integrante exilado de Alexandria.

Verificando todos os pontos, o xerife checara cada detalhe naquele carro, não deixando passar nada, já que tal preparativo também fazia parte do complemento do seu plano, o mesmo que conseguira dobrar e destroçar o engenheiro diante dos veteranos, que ainda encontravam-se atordoados após tantas revelações.

Rick vencera, isso era um fato, mas sua conquista ainda não podia ser dada como completa. Faltava um pequeno detalhe, a cartada final, para que finalmente pudesse deitar a cabeça no travesseiro, satisfeito por finalmente ter se livrado de tamanho problema.

E com a aproximação de Abraham, a passos largos, caminhando em sua direção, esse último quesito poderia ser logo, logo finalizado.

— Mandou me chamar, xerife? – Manifestou-se o corpulento bigodudo, estacionando em frente à Grimes.

— Sim, preciso que faça o que combinamos... – Rick olhou brevemente para os lados, atestando se não era ouvido por ninguém – Quero que você e Heath sigam esse carro, ele está com pouco combustível, não andará por muito tempo. Há uma moto escondida atrás de uma das árvores, do lado de fora dos muros...

O ruivo o ouvia com atenção.

— Saiam como se estivessem apenas realizando mais uma missão de limpeza, e então o sigam, com cuidado e sem que ele os perceba...

Abraham balançara a cabeça positivamente.

— Não posso permitir que esse homem permaneça vivo, ele representa um perigo real a Alexandria! Não podia condená-lo a morte, isso só traria mais caos e mais dissidentes... – O xerife aproximou-se ainda mais do bigodudo – Ninguém pode saber disso!

Centrado, o ex-militar balançara a cabeça em afirmativa.

— Preciso que você e Heath terminem isso... Preciso que matem James Goodwin!


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Notas finais do capítulo

*Melina e Sam: O nome da esposa de Nicholas não é citado nas hq’s, por isso tomei a liberdade de chamá-la de Melina. Na série de tv, Sam é o nome do filho de Jessie e Pete, enquanto que no material original, esse na verdade é o nome do filho de Nick.

E então, o que acharam?

Gostaram da resolução do conflito entre Rick e Goodwin?

Bom, no próximo capítulo chegaremos finalmente à adaptação da edição de número 100 das hq’s... Nossos personagens finalmente encontrarão ‘Algo a Temer’!

Nos vemos nos comentários...

Moi moi!



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