Ana escrita por J R Mamede


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Esta fic foi inspirada na música "Always Hate Me", de James Blunt. Caso queira escutá-la enquanto ler a one, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=L26kI17ZaJk



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Sabe aquele garoto estúpido da escola, que se acha a melhor pessoa do Universo, sempre com uma gracinha humilhante reservada para os que ele considera fracos? Bem, este garoto sou eu.

Na verdade, eu fui assim. Hoje, acredito, evoluí bastante, abandonando o meu lado egoísta, maquiavélico e narcisista.

Mas demorei a perceber o quanto fui um completo imbecil, ferindo pessoas que não mereciam ser machucadas com minhas palavras afiadas como adagas.

Uma delas é Ana Clara Vieira, uma garota que estudou comigo desde a pré-escola, cuja vida transformei em um inferno por longos anos.

Desde criança eu era um moleque atentado, sempre querendo chamar a atenção dos outros, através de comentários deselegantes e desnecessários. Eu mirava uma vítima e minha diversão começava. Para o azar de Ana, ela fora a escolhida naquele mês de fevereiro de 2000. Diziam as más línguas que em 2000 o mundo acabaria. Acho que Ana desejou isto naquele momento, ou, pior: seu próprio mundo havia acabado.

─ Ei, seu bicho estranho. ─ Era assim que me referia à menina, por conta de suas roupas de vovó e de sua aparência medonha, pelo menos para o olhar fútil de um jovem parvo. ─ Estou falando com você, garota feiosa!

Lembro-me dela se encolher no pátio da escola no horário do intervalo. Meus amiguinhos tão encapetados quanto eu, riam da situação. Gargalhavam de prazer, dando-me mais combustível para eu ferir a pobre menina com minha língua ácida.

Como ela não reagia, Júlio, um de meus amigos, aconselhou-me a deixá-la de lado e procurar outra forma de diversão.

─ Vamos, Pedro ─ falou, ainda rindo. ─ Vamos jogar futebol antes que o recreio acabe.

Concordei, sem antes atribuir mais um olhar desdenhoso à Ana, a qual continuava estática em seu canto.

Hoje penso que ela devia chorar muito. Talvez não na escola, mas com certeza em sua casa, trancada em seu quarto.

Na quarta séria, novamente Ana havia tido o desprazer de fazer parte da mesma turma em que eu estudava. Aos dez anos, minha maldade aumentara, na mesma proporcionalidade de minha malícia. Eu era um garoto grosseiro, que vivia falando palavrões, sempre acabando de castigo, seja em casa ou na escola, ao lado da diretora.

O meu momento preferido era a hora da chamada. A professora verificava a presença dos alunos em sua lista cheia de nomes diversificados, dando-me a oportunidade de entrar em ação.

─ Ana Clara Vieira ─ chamara a professora o primeiro nome de seu caderno escolar.

Feiosa! ─ Eu dizia em forma de espirro, fazendo todos os meus colegas gargalharem, exceto, é claro, a própria professora Flávia e a humilhada, Ana.

─ Senhor Pedro Medeiros! ─ repreendia-me minha mestre. ─ O que o senhor disse?

─ Não disse nada, professora. ─ Fazia-me de desentendido, quase uma vítima. ─ Apenas espirrei.

Ela lançava-me um olhar de censura, porém, não fazia nada em relação, apenas quando minha bagunça era nítida e escandalosa.

Quando a professora Flávia voltava a fazer sua chamada, eu observava Ana com meu sorriso diabólico estampado no rosto. A menina fitava-me rapidamente, desviando o olhar logo em seguida. Devia achar que eu era o próprio diabo em pessoa e, como era de uma família fortemente católica, preferia evitar o contato com Lúcifer.

Eu adorava perturbar várias pessoas, mas Ana era especial. Ela, por ser toda recatada, vestir-se mal e ter o cabelo castanho escorrido escondendo-lhe a face, dava-me mais prazer de zombar. Ana era a minha piada perfeita.

Já na oitava série, Ana havia encorpado e seus seios haviam aumentado, como acontece naturalmente na puberdade. Continuava a vestir-se como uma anciã, sempre em tons escuros e tecidos grossos. Seu estilo era o mesmo: o cabelo cobrindo-lhe o rosto, sempre quieta nas aulas, sem amigos e, nos intervalos escolares, vivia na biblioteca, debruçada sobre um livro.

Continuava a mesma feiosa de sempre, era o que eu pensava.

Às vezes, quando a senhora Lúcia, a bibliotecária, não estava em seu posto, Júlio, Marcos e eu íamos enfezar a coitada da Ana, pegando o livro que ela lia tão atenciosamente, atrapalhando-lhe o sossego e a paz.

Céus! Por que eu era tão otário?

─ Que porcaria você está lendo, sua esquisita? ─ perguntei aos risos, passando o livro para Júlio.

─ Olha só! ─ falou meu comparsa. ─ “Orgulho e Preconceito” de Jane Austen. Que merda! ─ zombou o moreno, passando o volume para Marcos.

─ Devolvam-me! ─ pedia a garota, tentado alcançar seu objeto, enquanto a fazíamos de bobinha.

─ Que porcaria de livro ─ comentou meu outro parceiro. ─ É um daqueles romances chatos que só garotas virgens curtem.

Eu ria largamente, porém, não sei bem o motivo, pois eu era virgem aos catorze anos e, tenho certeza, que Júlio e Marcos também eram. Entretanto, como bons machos, vangloriávamos daquilo que nunca tivemos.

─ Por favor, me deixem em paz! ─ suplicava Ana.

Percebia que ela queria chorar, dando-me mais prazer com a cena. A maldade é algo tão estranho, que toma conta de nosso íntimo com tanta potência, deixando-nos cegos diante da realidade. Pouco me importava se eu estava ferindo Ana Clara Vieira com minhas “brincadeiras” e com meus insultos. Eu, simplesmente, queria curtir a vida à custa do sofrimento dos outros.

─ O que foi, feiosa? ─ provoquei-a. ─ Vai chorar? Quer a mamãezinha?

Fomos interrompidos, pois a senhora Lúcia havia voltado, pegando-nos no flagra. Rapidamente, Marcos devolveu o livro para Ana e tentamos fingir que nada havia ocorrido.

─ O que estavam fazendo? ─ investigou a mulher, com o cenho franzido.

─ Nada ─ disse simplesmente.

─ Se vocês não querem livros emprestados, então tratem de ir embora, pois aqui é um lugar reservado para leitura e necessitamos de silêncio, fui clara?

─ Como água ─ rebati, fazendo meus amigos soltarem umas risadinhas.

Saímos da presença da bibliotecária e de Ana, deliciando-nos com a cena recentemente executada.

Como estávamos no último ano antes de partirmos ao Ensino Médio, o baile de formatura estava sendo organizado pelo colégio e, em padrões americanos, a escola queria fazer uma festa apenas para os alunos e estes deveriam formar casais entre si.

Eu, como sempre, quis usar meu humor negro para a festa. Não tinha namorada na época e não tinha nenhuma garota de quem eu gostasse na escola. Achava a Mariana da minha turma muito bonita, porém, não quis convidá-la para ser meu par. Achei que deveria encerrar a oitava série com chave de ouro.

─ Você vai convidar a feiosa? ─ questionou Júlio, incrédulo.

─ Vou sim ─ afirmei. ─ Como não terá pais no baile, eu vou poder sacanear a garota de forma magistral. Na festa, nós três iremos atacar ovos nela. Vai ser o show do ano!

─ Cara, mas a diretora vai nos pegar ─ preveniu Marcos, não gostando muito da ideia. ─ Já chega de zoar a menina, vai, Pedro. Deixa para ano que vem.

─ Não, não, tem que ser nesta festa de final de ano ─ rebati. ─ Quanto à diretora, foda-se ela! O que ela vai fazer? Me dar uma advertência? Uma suspensão? Estou saindo dessa merda de escola mesmo; é o nosso último ano aqui.

─ Ah, eu topo! ─ concordou Júlio. ─ Vai ser legal ver a cara da songamonga toda lambuzada de ovo cru.

─ Também topo, então ─ afirmou Marcos.

─ Beleza, então está combinado ─ falei, todo animado com o plano. ─ Vou procurar a coisa feia para fazer o convite oficial.

─ Só não sei como irá convencê-la a ir com você ─ retrucou Marcos. ─ A garota te odeia, Pedro. Acha você uma grande babaca.

Não dei importância para o meu amigo, porquanto já tinha uma boa argumentação para convencer Ana a ir comigo. Ela, como uma católica devota, sabia a força do perdão. Era só eu enrolá-la com uma conversinha mole de que estava arrependido, ajoelhando-me, se necessário fosse, para pedir o seu perdão.

Não tinha erro!

Avistei-a no mesmo lugar: na biblioteca. Aproximei-me, percebendo que ela ficara alarmada com minha presença, temendo que eu fizesse algo de errado. Ela mirou ao meu redor, provavelmente constatando se Júlio e Marcos não estavam comigo, aliviando um pouco mais a tensão quando percebeu que eu estava sozinho.

─ Olá, Ana. ─ Acho que fora a primeira vez que a chamara pelo nome. ─ Como está?

─ O que você quer, Pedro?

─ Seu perdão, Ana. ─ E começa o jogo, pensei. ─ Estamos prestes a nos despedirmos, pois não sei se irá para o mesmo colégio que eu ano que vem. Acho que está mais do que na hora de eu me desculpar por todo o mal que fiz a você, redimindo-me com um convite.

─ Convite? ─ perguntou, ainda receosa com a nossa conversa.

Observei-a por um tempo. Pensei que, se ela arrumasse aquele cabelo e usasse umas roupas próprias para sua idade, talvez não seria tão horripilante assim. Ela tinha olhos bonitos e uma boca avermelhada, que me fez cogitar a hipótese de beijá-la. Claro que esse pensamento surgiu e se foi com rapidez. Nunca, jamais beijaria Ana Clara Vieira!

─ Sim, Ana ─ Apoiei minha mão na sua, deixando a encenação mais realista. ─, quero convidá-la ao baile. Aceita ir comigo? Eu a busco em casa, se quiser. Por favor, seja minha companheira. ─ Fiz a expressão mais carinhosa possível. Eu era um bom ator. Pessoas más interpretam muito bem.

─ Por que eu, Pedro? ─ investigou a menina. ─ Por que não leva outra pessoa?

─ Precisa ser você, Ana, pois preciso mostrar o quão arrependido estou das besteiras que fiz e falei.

Ela refletiu um pouco e parecia bem hesitante. Vai logo, vadia, aceita de uma vez, pensei, impaciente.

─ Tudo bem, Pedro ─ ela sorriu timidamente. ─ Eu vou ao baile com você.

Agradeci, aplicando-lhe um beijo na bochecha, deixando-a corada. Abandonei minha parceira de baile, eufórico pelo primeiro passo de meu plano ter dado certo.

No dia do baile fui buscar Ana em sua casa, como o prometido. Ela não morava tão longe de mim, dando para ir caminhando. Seu pai atendeu a porta, medindo-me dos pés a cabeça. Era um homem magro, alto e com aspecto de professor de História.

─ Então é você quem levará minha filha à festa? ─ perguntou, um tanto sério. ─ Quero que a traga antes das onze, estamos entendidos? ─ Assenti, sem pestanejar. ─ E se eu descobrir que você deu bebida alcoólica ou alguma droga a minha filha, juro que vou até a sua casa e não responsabilizo pelos meus atos de pai irado.

─ Sim, senhor ─ concordei.

Fiquei um tanto temeroso com aquela figura paterna protetora, mas não ia desviar de meus planos: Ana se melecaria com claras e gemas de ovos.

Ela apareceu logo em seguida, trajando um vestido rosa medonho e o cabelo preso em um coque estranho. Pelo menos eu poderia ver melhor seu rosto, principalmente quando o massacre começasse.

─ Você está linda, Ana ─ menti.

Ela agradeceu com um sorriso recatado e percorremos o restante do caminho em silêncio.

Chegamos ao baile e avistei meus amigos dançando com suas parceiras. Logo que me viram, depositaram-me um olhar de cumplicidade. Eu dançaria um pouco com Ana bem no centro do salão e, quando ela menos esperasse, Júlio e Marcos apareceriam com a cartela de ovos, e nós três dispararíamos nela.

Na época, arquitetar este plano fora tão prazeroso quanto beber água após uma longa caminha em um dia quente. Hoje, sinto tanta vergonha por isto, que tenho vontade de morrer. Sinto nojo por ter feito o que fiz.

Juro que me arrependo de cada ato maldoso que fiz com as pessoas, mas, em especial, com Ana. Destruí o baile de formatura de uma garota que nunca me fez nada.

E, como o planejado, meus amigos se aproximaram, surpreendendo Ana com suas presenças. Quando ela percebeu que Júlio me passava dois ovos, olhou-me fixamente nos olhos e percebeu qual era minha intenção. Acho que ela enxergou perfeitamente o demônio que morava em minha alma.

A pobre fora o centro das atenções naquele baile de 2008. Todos riam dela sendo atacada por claras e gemas. Algumas tiveram compaixão, enviando-lhes olhares de pesares. Porém, ninguém lhe estendeu a mão.

Ana saiu correndo da festa. E eu não fiquei com nenhum peso na consciência.

Só fui perceber que tinha consciência quando o pai de Ana havia feito uma visita em minha casa uma semana depois do ocorrido, reclamando para meus pais de meu comportamento. Meus pais estavam envergonhados de minha atuação, não sabiam nem o que dizer ao pobre homem.

Ali, descobri que Ana não tinha mãe. Era filha única e vivia com o pai desde os nove anos, idade esta que perdera a mãe. O homem afirmou aos meus pais que a jovem, antes da morte da figura materna, sofria de depressão, pois algo a atormentava. Logo deduzi que era eu. Após o falecimento da mãe, a depressão se agravara, porém, com a minha “brincadeira” do baile, a coisa só piorou.

─ Ela vive trancada em seu quarto, e só sabe chorar ─ dizia o pai. ─ Não quer comer, não quer sair, não quer ler. Seu filho conseguiu destruir minha filha. Ela está morrendo aos poucos por culpa dele!

Meus pais apenas lamentavam, sem saber quais palavras eram adequadas para o momento.

Eu, que até então escutava tudo escondido atrás da porta, acabei sendo visto pelo pai de Ana, o qual me fuzilava com seus olhos castanhos.

─ Você, seu moleque, está satisfeito? ─ Ele começou a chorar e eu não sabia o que fazer. Lembro-me de ter me sentido, pela primeira vez em minha medíocre vida, um grande bosta. ─ Você arruinou a vida de minha filha. Eu te odeio tanto!

O homem saiu de minha casa desnorteado, e eu sentia meu coração pular em meu peito tão forte que pensei que iria escapar de meu corpo.

Minha mãe lançou-me o pior olhar que eu já havia visto dela. Não era raiva, reprovação, rancor. Era de grande decepção. Minha mãe e meu pai deixaram bem claro, naquele dia, que sentiam muita vergonha de ter um filho como eu.

Eu sentia muita vergonha de ser eu.

No Ensino Médio descobrira que Ana havia se mudado para outra cidade. Desejei, sinceramente, que ela se recuperasse e fosse feliz. Desejei que ela encontrasse o caminho para a felicidade e que nunca mais cruzasse com um babaca como eu para atormentá-la.

Em 2012, finalmente ingressei na faculdade, cursando Direito. Meu pai era advogado e achei que deveria seguir seus passos.

Foi então, nos primeiros dias de aula, que conheci uma garota muito bonita, a qual trajava um vestido florido de alça, e os cabelos castanhos jogados nas costas. Fiquei flertando com ela à distância, resolvendo me aproximar e conhecê-la melhor.

─ Olá ─ saudei. ─ Tudo bem? Meu nome é Pedro, e sou novo por aqui.

─ Olá, Pedro ─ falou a garota. ─ Eu também sou novata.

─ E como você se chama?

─ Natália ─ respondeu, após fitar-me por um instante.

─ E você tem alguma coisa para fazer neste final de semana, Natália? Será que se eu a convidasse para jantar, seria muito abuso?

─ Abuso, não, apenas estranho, já que nos conhecemos agora ─ rebateu, mas sem ser indelicada. ─ Mas aceito o convite, Pedro. Podemos marcar neste final de semana.

Deixei meu número de celular com ela, mas ela não quis deixar o dela. Combinamos de marcar o jantar em um restaurante próximo da universidade, assim, ficaria fácil para os dois acharem o local.

Estava feliz por ter conseguido passar em uma faculdade boa, e estava mais feliz por ter conhecido uma garota bonita, que parecia muito legal, embora eu não pudesse dizer isto com convicção, já que a conhecera em pouco tempo e não tivemos muito tempo para conversar.

Achei que, com o nosso jantar, conseguiríamos nos conhecer melhor e, quem sabe, até começarmos algum relacionamento.

Após o incidente com Ana, eu havia mudado completamente. Sempre quis saber de seu paradeiro e pedir perdão sincero. Eu havia amadurecido depois do que havia feito com a coitada, eu consegui enxergar a vida de outra forma, arrependendo-me de meus atos e de não ter dado a oportunidade a mim mesmo de conhecer a Ana, de ter sido amigo dela.

Eu deixei a minha vida de garoto traquina, abandonando as amizades erradas e investindo em novas e melhores. Comecei a trabalhar no Ensino Médio, tendo meu dinheiro para comprar o que desejava, mas, também, para ajudar nas despesas de casa. Não achava certo ser bancado pelos meus pais, não depois de ter dado tanto trabalho a eles.

Comecei a pegar firme nos estudos, possibilitando-me uma vaga em uma ótima faculdade. Minhas notas no Ensino Médio eram excelentes, sem comparação àquelas de um menino rebelde sem nenhuma causa.

Estava feliz e satisfeito comigo mesmo, com meu desenvolvimento. Porém, ainda pesava o coração quando me lembrava de Ana. Ficava imaginando o que acontecera com ela, perguntando-me se havia melhorado da depressão e se, finalmente, conquistara a tão merecida felicidade.

Eu tentava me convencer de que ela conseguira enfrentar todos os obstáculos da vida, mas nunca tivera a certeza, então isso me afligia. Eu só queria que ela tivesse uma vida boa.

No final de semana que marcara com Natália, arrumava-me diante do espelho, ainda envergonhado com o rosto que refletia ali. Nunca consegui me olhar como antes. A vergonha ainda era grande.

Rumei ao restaurante marcado e sentei-me a uma mesa desocupada.

─ O senhor deseja alguma coisa? ─ perguntou-me o garçom.

─ Por enquanto não, obrigado. Estou esperando alguém.

─ O senhor por acaso é Pedro Medeiros? ─ questionou.

─ Sim, por quê?

─ Uma moça deixou esta carta ao senhor.

Entregou-me um papel dobrado ao meio e se retirou.

Comecei a ler e o conteúdo fora surpreendente, fazendo-me chorar no restaurante, sem me importar com as outras pessoas.

“Caro Pedro,

Você não me reconheceu quando me convidou para jantar, mas eu o reconheci. Você, fisicamente, mudou pouco, enquanto eu, pelo visto, mudei bastante.

Desculpe ter mentindo para você, dando um nome falso. Natália fora o primeiro nome que viera à mente.

Por muito tempo, Pedro, você me humilhou e me desprezou, chamando-me sempre de feiosa e fazendo-me acreditar que, de fato, eu o era. O único dia em que me senti bonita fora quando me convidara ao baile. Não acreditei, sabia? Fiquei tão feliz, que parecia que ia explodir. Apesar de você sempre me tratar mal, eu sempre quis seu bem. Sempre o achei bonito e sonhava que, assim como acontece nos romances que eu adoro ler, você me valorizaria e me pediria em namoro. Eu sei, grande estúpida eu sou, não é? Só percebi minha estupidez quando você e seus amigos me humilharam em público no baile de formatura.

Eu chorei tanto e quase acabei com a minha vida. Senti ódio de você, muito mesmo. Porém, com o tempo, percebi que o problema não era eu, mas, sim, você. Percebi que você era vazio e cheio de problemas, e não eu. Consegui me recuperar após várias sessões de terapia. Hoje me sinto forte e pronta para qualquer ovada. Hoje, se você quisesse me derrubar, saiba que eu me levantaria instantaneamente.

Obviamente, não irei jantar com você. Não posso fazer isso, não comigo. Desculpe deixá-lo sozinho no restaurante. Saiba que não tenho raiva de você, mas peço que mantenha distância de mim. Cumprimentarei você normalmente na faculdade, sem problemas, mas não passará disso.

Espero que você tenha amadurecido. Acho que ainda tem muito a evoluir, pois ainda tem a mania de ver apenas o exterior das pessoas, pois, só fui mudar meu visual para algo considerado belo pelos padrões sociais, que você me notou. Eu sempre estive ao seu lado, Pedro, mas você só me enxergava para me fazer passar vergonha.

Fique com Deus, Pedro, e que Ele guie a sua vida para um caminho abençoado e próspero.

Atenciosamente,

Ana Clara Vieira.”

Ao terminar de ler a carta de Ana, fiquei, sinceramente, muito contente em descobrir que ela havia conseguido superar a péssima fase de sua vida, em que eu havia sido o grande responsável. Guardei a folha em meu bolso e pretendia guardá-la pelo resto de minha vida, para servir de lição.

Retirei-me do restaurante e fui caminhando até minha casa.

Ana, por muito tempo, fora minha melhor piada. Hoje, vejo que Ana fora, na verdade, meu aprendizado para viver melhor.


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Notas finais do capítulo

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