Meus olhos demoraram de focar uma imagem, tudo o que eu via era branco.

—Chamem o doutor Guilles, ele acordou. — Christopher, meu enfermeiro, gritou ao meu lado.

—O que aconteceu? — perguntei.

—Você teve um surto, tivemos que mantê-lo em coma induzido.

—Quanto tempo? — ele não respondeu. — Quanto tempo, Christopher? — gritei.

—Pouco mais de um mês, precisávamos de uma diminuição da sua atividade cerebral, ela estava muito intensa.

—E meus pais? — ele abaixou a cabeça. — Ligaram pelo menos?

—O que acha de sairmos um pouco? — Chris perguntou com voz forçada de ânimo olhando pela janela. — Kyle e Isaac estão lá fora.

—Não sabia que eu podia sair.

—E não pode. — ele respondeu com um sorriso maroto.

***

Fazia dois anos que meus pais havia me internado na clínica, Christopher era sobrinho e agora estagiário do meu médico, doutor Guilles, éramos grandes amigos e eu, secretamente, nutria um sentimento mais profundo por ele.

Flashback on

Christopher costumava andar pelos corredores com o tio e nossos olhares sempre se cruzavam quando ele passava por meu quarto, por algumas vezes pensei em iniciar algum assunto mas, quem gostaria de conversar com um maluco? Um dia, eu estava deitado encarando o teto quando o ouvi a porta ser aberta abruptamente, o garoto de cabelos castanhos me encarava com um brilho levado no olhar e um sorriso travesso nos lábios

—Eu não estou aqui. — Ele falou e enfiou-se debaixo da minha cama, me limitei a fazer o que sempre fazia no hospital de malucos, ignorei.

Cerca de dois minutos depois, uma menina morena de olhos verdes escuros, aparentando quinze anos adentrou em meu quarto. Assim como Chris, ela andava pelos corredores, mas até então eu não sabia quem ela era.

—Viu um garoto de cabelos castanhos encaracolados passar por aqui? Estou procurando meu namorado. — Ela perguntou, com um sotaque enjoativo.

—Ouvi alguém correr para a ala sul. — Respondi dando de ombros.

Ela nem ao menos agradeceu, simplesmente abriu a porta e saiu.

—Christopher Hale. — Ele falou saindo de debaixo da cama estendendo a mão.

—Adam Lancaster?! — Respondi atônito. — Porque está fugindo da sua namorada? Foi o sotaque, não foi?

Ele riu, uma risada doce, limpa, contagiante e cativante. — Ela é minha prima, veio do interior para estudar na capital e está em minha casa, dá em cima de mim desde os doze anos, odeio aquela menina, e sim, o sotaque dela é terrível.

—Boa sorte com ela.

Ele se dirigiu a porta e antes que essa se fechasse se virou para mim. — A propósito, pode me chamar de Chris, todos me chama de Chris.

—Até mais... Chris.

Flashback off

***

—Olha só quem acordou. — Kyle falou com um sorriso de pirraça.

—Parabéns... atrasado pra caramba, eu passei no seu quarto no dia, mas acho que você não deve ter ouvido. — Isaac falou com um sorriso igual ao de Kyle.

—Também estou muito feliz em vê-los. — Respondi sarcasticamente.

Isaac era meu primo, estava ali por ser um sociopata, fomos internados juntos, Kyle também era um sociopata, o conheci por causa do meu primo, eles recebiam tratamentos juntos, eu nunca achei muito seguro dois sociopatas juntos, mas... Eles eram legais de conversar quando não estão lhe difamando ou... planejando a sua morte. Essa era minha vida naquele lugar, ficar no quarto, encarar paredes e conversar com médicos, enfermeiros e sociopatas.

Não demorou muito para que doutor Guilles me encontrasse e me mandasse voltar para meu quarto, Chris levou um sermão, mas ninguém leva muito a sério os sermões do meu médico. Fui submetido a alguns exames e fui punido a ficar passar o dia todo no quarto.

A noite já havia caído quando Chris voltou trazendo meu jantar, ele sempre trazia o suficiente para nós dois e comíamos e conversávamos.

—Como foi ficar em coma esse tempo todo? — ele perguntou. — Quer dizer, fazia alguma ideia?

—Foi... Estranho. — falei — Era como se... Foram cerca de três meses reais que vivi.

—Eles estavam lá?

—Sim. Sabe o que é curioso? Bryce e Bryan eram reais, você e Kyle, alucinações.

—Você estava no mundo criado por “eles”, faz sentido.

—Mas meu primo era real.

—Não sei, não entendo.

—Mas devia, não é você que quer ser neurocientista? — Zombei.

—Exato. Quero ser, ainda não sou.

Começamos a conversar banalidades e por fim, Christopher foi embora. Aquela era a minha realidade, essa era a verdade.

***

Eu dormia um sono conturbado, e acordei ao sentir alguém se sentar em minha cama.

—Olá, Adam. — Bryce sussurrou em meu ouvido, me assustando. Com susto me sentei rapidamente na cama.

—O que foi dessa vez, Bryce? — perguntei.

—Você precisa acordar.

—Já me fez fazer isso. Agora me deixa descansar um pouco.

—Você precisa acordar desse estado, dessa realidade criada. Precisa acordar dessa alucinação, Adam.